BRASÍLIA - O diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, afirmou nesta terça-feira, 10, que a decisão de suspender os testes da vacina Coronavac, produzida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantã para combater a covid-19, foi técnica. Segundo ele, as informações sobre um "evento adverso grave" com um dos pacientes enviadas pelo instituto eram incompletas e, de acordo com o protocolo da agência, a regra prevê determinar a paralisação imediata nestes casos. A decisão provocou um mal-estar entre a agência federal e o governo de São Paulo,comandada por João Doria, adversário político do presidente Jair Bolsonaro.
"As informações foram consideradas incompletas, insuficientes para que continuasse permitindo o procedimento vacinal", disse Barra Torres."Quando temos eventos adversos não esperados, a sequência de eventos é uma só: interrupção dos estudos. A responsabilidade é nossa, de atestar a segurança de uma vacina e sua eficácia. Que outra decisão é possível diante de um evento adverso grave não esperado e com informações incompletas? O protocolo manda que seja feita a interrupção do teste", afirmou o diretor, que é almirante e assumiu o cargo por indicação de Bolsonaro. Ele é próximo do presidente e inclusive já participou de manifestação em Brasília a favor do governo durante a pandemia da covid-19.
A Secretaria de Estado da Saúde considera que suicídio foi a causa provável da morte do voluntário da vacina Coronavac, de acordo com as informações disponíveis até o momento, conforme o Estadão apurou com fontes da pasta. A informação foi confirmada também por outras pessoas familiarizadas com o caso. De acordo com o governo do Estado, é "impossível" que o fato esteja relacionado com a vacina.
Mesmo com informações incompletas sobre os motivos da suspensão dos testes, Bolsonaro atribuiu à vacina chinesa casos de "morte, invalidez e anomalias" ao comentar a notícia em uma rede social. "Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Doria queria obrigar a todos os paulistanos tomá-la. O Presidente disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha", publicou o presidente. A declaração foi criticada por deputados e senadores por politizar a corrida por uma vacina contra o coronavírus. O governo federal tem como principal aposta a vacina produzida pela farmacêutica AstraZeneca em parceria com a Universidade Oxford.
Barra Torres rebateu qualquer suspeita sobre interferência política na decisão de suspender os testes. A paralisação ocorreu no mesmo dia em que o governo de São Paulo anunciou a chegada do primeiro lote da Coronavac no próximo dia 20. "A decisão é técnica. Não depende de aval de diretores", afirmou Barra Torres, apontando ao seu lado o responsável pela Gerência-Geral de Medicamentos e Produtos Biológicos, Gustavo Mendes, e a diretora Alesssandra Bastos, diretora de Coordenação e Articulação da Anvisa.
"Ah, mas ontem teve tal notícia e nosso ato foi para... colocar água no chopp. Minha gente, o tema da covid-19 é o tema dominante dos senhores há 10 meses. Qualquer decisão de gestão tomada em qualquer dia terá, se assim quiser que tenham, correção. Alguma coisa que possa ser dita: decidiu porque houve essa notícia. As notícias seguem todos os dias", disse Barra Torres. "Por que a correria? Ansiedade parece ser maior do que a resposta."
Barra Torres ainda comparou a suspensão com o auxílio do árbitro de vídeo no futebol. "Para nós, o VAR talvez não seja quadrado, mas redondo. Simbolizando uma lente de aumento. Para que, no período em que esteja interrompido o estudo, tudo seja esclarecido."
Alessandra Bastos, responsável pela área de medicamento, disse que não há a menor possibilidade de dúvida neste tipo de caso, por isso a necessidade de suspender imediatamente. "Quando ainformação não é completa, inteira, não dá segurança para seguir. Isso (interromper) é previsto em protocolo internacional. Não há surpresa que quando ocorre evento adverso grave não esperado exista a suspensão do ensaio clínico."
Gustavo Mendes, responsável pela análise das notificações do Butantã, criticou a politização da questão. "Decisão de politização põe em xeque nosso trabalho. E isso é muito ruim. Pedimos que o trabalho técnico seja respeitado."