Em 2022, as operadoras de planos de saúde registraram os piores índices de sua série histórica – um prejuízo operacional de R$ 11,5 bilhões e taxa de sinistralidade (relação entre despesas com serviços médicos e receita das mensalidades) de 89,2%. Os números ameaçam a sustentabilidade do negócio, o que prejudicaria empresas e consumidores.
Aumentar preços e investir as reservas em aplicações financeiras são só tratamentos paliativos. A cura para a crise exige estratégias para enfrentar as consequências do envelhecimento da população, da chegada de tecnologias e medicamentos cada vez mais caros e das altas despesas com processos judiciais.
A crise não é uma questão de evasão de clientes. Em junho, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) registrou número recorde de 50,7 milhões de beneficiários. “São mais pessoas fazendo mais procedimentos. Não há como sustentar, com esse alto nível de sinistralidade. E, como parte da mensalidade do jovem ajuda a pagar o custo dos idosos, e a população está envelhecendo, esse esquema está em perigo”, disse José Cechin, superintendente executivo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), durante painel sobre a crise vivida pelas operadoras durante o Summit Saúde e Bem-Estar 2023, evento promovido pelo Estadão na última quinta, 5.
Para enxugar os gastos, as operadoras precisarão encarar temas espinhosos. “Nosso sistema de saúde suplementar não existe em nenhum lugar do mundo. Trouxemos o princípio da integralidade do sistema público para o privado. E essa conta não fecha”, aponta Renato Casarotti, presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) e vice-presidente de Relações Institucionais do UnitedHealth Group Brasil.
“Temos que discutir de forma mais pragmática a incorporação de tecnologia, o registro muito rápido aqui no Brasil de drogas para doenças raras com testes ainda incipientes. Uma vez aprovadas, geram a judicialização e pagamos mais caro do que qualquer outro País”, diz a diretora-executiva da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), Vera Valente.
Outros assuntos sensíveis que precisam ser enfrentados envolvem retrabalho e desperdício. “Falamos pouco sobre quanto o erro médico compõe os custos assistenciais. Estima-se que cerca de 30% dos tratamentos têm algum grau de efeito adverso. Precisamos ter uma área de governança clínica, notificar e discutir incidentes clínicos”, sugere Ricardo Salem, diretor de Saúde da Care Plus.
O excesso de pedidos de exames, por vezes repetidos, expõe outra carência do setor: a ausência de um prontuário único, digital e compartilhado de cada beneficiário – e sujeito à portabilidade. “Mas há muita operadora que ainda se sente proprietária dos dados”, lamenta Casarotti.
Durante o Summit Saúde, os especialistas concordaram que a adoção da inteligência artificial, tanto na gestão quanto na promoção de uma cultura de autocuidado, também terá impacto no urgente equilíbrio financeiro dos planos de saúde.