Se você tomar uma decisão no auge de uma emoção, será uma decisão ruim, diz psicólogo Daniel Goleman


Autor do livro ‘Inteligência Emocional’ fala sobre benefícios da meditação e da atenção plena para manter a calma e fazer boas escolhas no dia a dia

Por Ana Lourenço
Foto: Frank Ward
Entrevista comDaniel GolemanPsicólogo, escritor e autor do best-selller 'Inteligência Emocional'

Durante 12 anos, o psicólogo, pesquisador e jornalista americano Daniel Goleman escreveu para o jornal The New York Times sobre o cérebro e as ciências comportamentais. Mas sua fama veio mesmo em 1995, quando lançou o best-seller “Inteligência Emocional”, livro que transformou a maneira de se pensar nas emoções e na própria inteligência.

Nele, Goleman explica como o controle das emoções é essencial para a inteligência de um indivíduo, e foca em uma série de habilidades capazes de melhorar os relacionamentos, a vida profissional e até o bem-estar físico. O termo “inteligência emocional” se popularizou e passou a ser utilizado em universidades e escolas para mostrar a importância da autoconsciência, da regulação das emoções, da empatia e das habilidades sociais no dia a dia.

Agora, Goleman lança mais um livro que conversa bastante com o mundo atual, o “Por que meditamos: A ciência e a prática da clareza e da compaixão” (Editora Objetiva). De acordo com o psicólogo, sua relação com a atenção plena e a meditação é de longa data. Filho de um casal de professores universitários de Stockton, Califórnia, ele conta que seu interesse original na meditação era ser mais relaxado. “Eu era um estudante ansioso e preocupado, e queria ser mais calmo e ter mais clareza. Descobri que a meditação fazia isso por mim”, relata.

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Na faculdade, Goleman recebeu uma bolsa de viagem para a Índia, para fazer o seu pré-doutorado na Universidade Harvard, e voltou com a intenção de realizar sua pesquisa de dissertação sobre a meditação que aprendeu lá. “Meus professores falaram que era uma péssima ideia. O programa de psicologia clínica era muito psicanalítico e, naquela época, não via nenhuma promessa em algo estranho como a meditação. Mas eu fiz assim mesmo, e descobri que a meditação realmente ajudava as pessoas a se recuperarem rapidamente do estresse, o que já foi verificado, hoje em dia, em diversos estudos diferentes”, diz.

A paixão e o interesse pelo país asiático foram intensos, fazendo com que Goleman voltasse para lá muitas outras vezes e conhecesse vários mestres tibetanos. Um deles foi o professor de meditação Tsoknyi Rinpoche, com quem Goleman divide a autoria de seu novo livro.

Abaixo, confira uma entrevista exclusiva com o autor.

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Quais os benefícios da atenção plena (o mindfullness) e da meditação no mundo atual?

Hoje em dia, lidamos com mais crises que, consequentemente, geram estresse. Elas podem ser políticas, pessoais ou ter relação com o noticiário. O fato é que temos vários motivos para nos preocupar. Algo que pode ajudar é manter a calma para pensar no que fazer. E a meditação ajuda nisso.

Quais dificuldades você enfrenta em sua própria vida para ser uma pessoa calma e emocionalmente inteligente?

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Eu peço bastante ajuda à minha esposa (a psicoterapeuta Tara Bennett-Goleman) para isso. O livro dela, Alquimia Emocional, traz muitos avanços nessa área e me ajuda bastante. Mas eu também tento estar atento aos meus próprios sentimentos e administrá-los melhor, além de meditar todas as manhãs. Tudo bem falhar, mas a questão certa é: se isso acontecer, com que rapidez você se recupera? Essa é a chave. A vida nos surpreende com momentos de raiva, de preocupação, de pânico. Mas o importante é tratar esses estados.

Para além da clareza e calma da mente, a meditação tem outros benefícios?

Sim, isso é apenas o começo. Quanto mais você pratica, mais intensos são os benefícios. Um realmente importante é a empatia. Ou seja, preocupar-se com outras pessoas, sintonizar-se com elas. A meditação nos torna mais generosos ou mais propensos a ajudar os outros. Mais um ganho é o manejo do estresse. Meditadores experientes são acionados pela raiva ou ansiedade com menos frequência, e se recuperam mais rapidamente.

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No novo livro, cada capítulo começa com Rinpoche falando sobre sentimentos, emoções e técnicas de meditação. Na sequência, vem uma divisão descrita como “a ciência”, escrita por você. Por que isso?

O livro começou quando eu estava em um retiro, e daria uma palestra a respeito das descobertas científicas sobre a meditação. Eu tinha acabado de escrever A ciência da Meditação (2017) com Richard Davidson, que é um neurocientista, fundador e diretor do Center for Healthy Minds, da Universidade de Wisconsin-Madison, e revisamos as melhores pesquisas sobre esse tema. Então, Rinpoche propôs que eu compartilhasse isso com os alunos dele, porque achou que seria muito benéfico. Daí, decidimos escrever um livro para juntar a forma como ele ensina meditação e o que eu estava descobrindo sobre ciência e meditação.

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Sempre foi muito importante para você trazer esse olhar científico sobre a meditação?

Sim. Existe a fé cega, aquela que você faz porque te disseram que é verdade, e a fé inteligente, que você faz porque tem sentido para você, existe uma razão por trás e gera uma reflexão sobre o assunto. Na vida moderna, a ciência dá credibilidade e ajuda na tomada de uma decisão inteligente, a partir dos melhores fatos e dados. Desde os primeiros dias, quando tentei fazer alguns estudos científicos sobre meditação, sofri muita resistência. Então, reunir a melhor ciência a respeito do tema, de uma forma que qualquer um possa entender, é bem importante.

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No capítulo ‘Monstros bonitos’ você aborda a importância de nos tornarmos amigos de nossos sentimentos. Por quê?

Quando falamos sobre fazer amizade com as emoções, especialmente os sentimentos ruins, aqueles que você gostaria de não sentir, tem a ver com o fato de que você pode usar a meditação para moldá-los. Isso é chamado de desvio espiritual. É mais importante enfrentar e lidar com o sentimento, sendo ele bom ou ruim, ao invés de suprimi-lo.

E você acha que ficar familiarizado com esses sentimentos nos ajuda a lidar com eles?

Bem, eu acho que uma série de coisas acontecem. Mas, sim: quando você se familiariza mais com as situações e os sentimentos que pode sentir, ajuda a lidar melhor com isso. Porque se você tomar uma decisão no auge de um sentimento, será uma decisão ruim. Mas, se puder ficar calmo e pensar com clareza, provavelmente tomará melhores decisões. Se pudermos recuar um pouco em nossas mentes e perceber “ah, isso é raiva” ou “isso é ansiedade”, estaremos em uma posição melhor para administrar os sentimentos.

E como lidar com toda essa ansiedade que temos hoje em dia?

Ao longo da história da humanidade, na era pré-histórica, a ansiedade nos ajudou a sobreviver. E, talvez, por isso nossos cérebros, hoje, estão tão ligados na ansiedade. O problema é que a vida moderna desencadeia o mesmo tipo de reação que nos traz preocupações com coisas que não são ameaças à nossa sobrevivência, mas o cérebro e o corpo agem como se fossem. E é relativamente raro a ansiedade de fato sinalizar uma ameaça à sobrevivência. Mas, na vida moderna, você não pode controlar tudo o que acontece. O que podemos fazer é administrar melhor nossos sentimentos.

A meditação ajuda no manejo do estresse, no foco e até pode tornar as pessoas mais generosas ou mais propensas a ajudar os outros Foto: Freepik

Dicas do psicólogo Daniel Goleman e do professor Tsoknyi Rinpoche para colocarmos a meditação em nosso dia a dia:

  • Pratique o ato de “soltar”

A ideia é retirar da cabeça qualquer pensamento que esteja atrapalhando a atenção plena. Ela “nos permite aterrizar no momento presente e nos prepara para a meditação”, diz Rinpoche. Erga os braços e solte as mãos até baterem nas coxas. Expire forte e ruidosamente.

  • Faça amizade com seus sentimentos

Permita-se sentir as sensações e energias do seu corpo. A prática não exige nenhuma meta ou objetivo certo: simplesmente observe os sentimentos que aparecerem, sem julgamentos. Ou seja, não tente suprimir ou fingir que não existe. Também não precisa sentir vergonha pelo sentimento.

“Quando uma criança tem uma crise, em geral conseguimos separar a criança de sua emoção e suas ações. Mas, quando um adulto tem uma crise, esquecemos de fazer essa separação, acreditando que ele deveria se responsabilizar mais por suas emoções”, conta o professor.

  • Respire

Os autores trazem diferentes maneiras de respirar conscientemente. Uma delas é a respiração abdominal profunda, que seria a mesma que os bebês e os animais de estimação fazem, quando dá para sentir o subir e descer da barriga a partir da inspiração e expiração. “Gerenciar a respiração ajuda a gerenciar a nossa mente”, define Goleman.

  • Tenha constância

Não se preocupe com o tanto de tempo dedicado à meditação. O importante é ter regularidade na prática. Quanto mais horas praticadas ao longo da vida, mais rapidamente virão as mudanças. O ideal é praticar, nem que seja um pouquinho, todos os dias.

Durante 12 anos, o psicólogo, pesquisador e jornalista americano Daniel Goleman escreveu para o jornal The New York Times sobre o cérebro e as ciências comportamentais. Mas sua fama veio mesmo em 1995, quando lançou o best-seller “Inteligência Emocional”, livro que transformou a maneira de se pensar nas emoções e na própria inteligência.

Nele, Goleman explica como o controle das emoções é essencial para a inteligência de um indivíduo, e foca em uma série de habilidades capazes de melhorar os relacionamentos, a vida profissional e até o bem-estar físico. O termo “inteligência emocional” se popularizou e passou a ser utilizado em universidades e escolas para mostrar a importância da autoconsciência, da regulação das emoções, da empatia e das habilidades sociais no dia a dia.

Agora, Goleman lança mais um livro que conversa bastante com o mundo atual, o “Por que meditamos: A ciência e a prática da clareza e da compaixão” (Editora Objetiva). De acordo com o psicólogo, sua relação com a atenção plena e a meditação é de longa data. Filho de um casal de professores universitários de Stockton, Califórnia, ele conta que seu interesse original na meditação era ser mais relaxado. “Eu era um estudante ansioso e preocupado, e queria ser mais calmo e ter mais clareza. Descobri que a meditação fazia isso por mim”, relata.

Na faculdade, Goleman recebeu uma bolsa de viagem para a Índia, para fazer o seu pré-doutorado na Universidade Harvard, e voltou com a intenção de realizar sua pesquisa de dissertação sobre a meditação que aprendeu lá. “Meus professores falaram que era uma péssima ideia. O programa de psicologia clínica era muito psicanalítico e, naquela época, não via nenhuma promessa em algo estranho como a meditação. Mas eu fiz assim mesmo, e descobri que a meditação realmente ajudava as pessoas a se recuperarem rapidamente do estresse, o que já foi verificado, hoje em dia, em diversos estudos diferentes”, diz.

A paixão e o interesse pelo país asiático foram intensos, fazendo com que Goleman voltasse para lá muitas outras vezes e conhecesse vários mestres tibetanos. Um deles foi o professor de meditação Tsoknyi Rinpoche, com quem Goleman divide a autoria de seu novo livro.

Abaixo, confira uma entrevista exclusiva com o autor.

Quais os benefícios da atenção plena (o mindfullness) e da meditação no mundo atual?

Hoje em dia, lidamos com mais crises que, consequentemente, geram estresse. Elas podem ser políticas, pessoais ou ter relação com o noticiário. O fato é que temos vários motivos para nos preocupar. Algo que pode ajudar é manter a calma para pensar no que fazer. E a meditação ajuda nisso.

Quais dificuldades você enfrenta em sua própria vida para ser uma pessoa calma e emocionalmente inteligente?

Eu peço bastante ajuda à minha esposa (a psicoterapeuta Tara Bennett-Goleman) para isso. O livro dela, Alquimia Emocional, traz muitos avanços nessa área e me ajuda bastante. Mas eu também tento estar atento aos meus próprios sentimentos e administrá-los melhor, além de meditar todas as manhãs. Tudo bem falhar, mas a questão certa é: se isso acontecer, com que rapidez você se recupera? Essa é a chave. A vida nos surpreende com momentos de raiva, de preocupação, de pânico. Mas o importante é tratar esses estados.

Para além da clareza e calma da mente, a meditação tem outros benefícios?

Sim, isso é apenas o começo. Quanto mais você pratica, mais intensos são os benefícios. Um realmente importante é a empatia. Ou seja, preocupar-se com outras pessoas, sintonizar-se com elas. A meditação nos torna mais generosos ou mais propensos a ajudar os outros. Mais um ganho é o manejo do estresse. Meditadores experientes são acionados pela raiva ou ansiedade com menos frequência, e se recuperam mais rapidamente.

No novo livro, cada capítulo começa com Rinpoche falando sobre sentimentos, emoções e técnicas de meditação. Na sequência, vem uma divisão descrita como “a ciência”, escrita por você. Por que isso?

O livro começou quando eu estava em um retiro, e daria uma palestra a respeito das descobertas científicas sobre a meditação. Eu tinha acabado de escrever A ciência da Meditação (2017) com Richard Davidson, que é um neurocientista, fundador e diretor do Center for Healthy Minds, da Universidade de Wisconsin-Madison, e revisamos as melhores pesquisas sobre esse tema. Então, Rinpoche propôs que eu compartilhasse isso com os alunos dele, porque achou que seria muito benéfico. Daí, decidimos escrever um livro para juntar a forma como ele ensina meditação e o que eu estava descobrindo sobre ciência e meditação.

Sempre foi muito importante para você trazer esse olhar científico sobre a meditação?

Sim. Existe a fé cega, aquela que você faz porque te disseram que é verdade, e a fé inteligente, que você faz porque tem sentido para você, existe uma razão por trás e gera uma reflexão sobre o assunto. Na vida moderna, a ciência dá credibilidade e ajuda na tomada de uma decisão inteligente, a partir dos melhores fatos e dados. Desde os primeiros dias, quando tentei fazer alguns estudos científicos sobre meditação, sofri muita resistência. Então, reunir a melhor ciência a respeito do tema, de uma forma que qualquer um possa entender, é bem importante.

No capítulo ‘Monstros bonitos’ você aborda a importância de nos tornarmos amigos de nossos sentimentos. Por quê?

Quando falamos sobre fazer amizade com as emoções, especialmente os sentimentos ruins, aqueles que você gostaria de não sentir, tem a ver com o fato de que você pode usar a meditação para moldá-los. Isso é chamado de desvio espiritual. É mais importante enfrentar e lidar com o sentimento, sendo ele bom ou ruim, ao invés de suprimi-lo.

E você acha que ficar familiarizado com esses sentimentos nos ajuda a lidar com eles?

Bem, eu acho que uma série de coisas acontecem. Mas, sim: quando você se familiariza mais com as situações e os sentimentos que pode sentir, ajuda a lidar melhor com isso. Porque se você tomar uma decisão no auge de um sentimento, será uma decisão ruim. Mas, se puder ficar calmo e pensar com clareza, provavelmente tomará melhores decisões. Se pudermos recuar um pouco em nossas mentes e perceber “ah, isso é raiva” ou “isso é ansiedade”, estaremos em uma posição melhor para administrar os sentimentos.

E como lidar com toda essa ansiedade que temos hoje em dia?

Ao longo da história da humanidade, na era pré-histórica, a ansiedade nos ajudou a sobreviver. E, talvez, por isso nossos cérebros, hoje, estão tão ligados na ansiedade. O problema é que a vida moderna desencadeia o mesmo tipo de reação que nos traz preocupações com coisas que não são ameaças à nossa sobrevivência, mas o cérebro e o corpo agem como se fossem. E é relativamente raro a ansiedade de fato sinalizar uma ameaça à sobrevivência. Mas, na vida moderna, você não pode controlar tudo o que acontece. O que podemos fazer é administrar melhor nossos sentimentos.

A meditação ajuda no manejo do estresse, no foco e até pode tornar as pessoas mais generosas ou mais propensas a ajudar os outros Foto: Freepik

Dicas do psicólogo Daniel Goleman e do professor Tsoknyi Rinpoche para colocarmos a meditação em nosso dia a dia:

  • Pratique o ato de “soltar”

A ideia é retirar da cabeça qualquer pensamento que esteja atrapalhando a atenção plena. Ela “nos permite aterrizar no momento presente e nos prepara para a meditação”, diz Rinpoche. Erga os braços e solte as mãos até baterem nas coxas. Expire forte e ruidosamente.

  • Faça amizade com seus sentimentos

Permita-se sentir as sensações e energias do seu corpo. A prática não exige nenhuma meta ou objetivo certo: simplesmente observe os sentimentos que aparecerem, sem julgamentos. Ou seja, não tente suprimir ou fingir que não existe. Também não precisa sentir vergonha pelo sentimento.

“Quando uma criança tem uma crise, em geral conseguimos separar a criança de sua emoção e suas ações. Mas, quando um adulto tem uma crise, esquecemos de fazer essa separação, acreditando que ele deveria se responsabilizar mais por suas emoções”, conta o professor.

  • Respire

Os autores trazem diferentes maneiras de respirar conscientemente. Uma delas é a respiração abdominal profunda, que seria a mesma que os bebês e os animais de estimação fazem, quando dá para sentir o subir e descer da barriga a partir da inspiração e expiração. “Gerenciar a respiração ajuda a gerenciar a nossa mente”, define Goleman.

  • Tenha constância

Não se preocupe com o tanto de tempo dedicado à meditação. O importante é ter regularidade na prática. Quanto mais horas praticadas ao longo da vida, mais rapidamente virão as mudanças. O ideal é praticar, nem que seja um pouquinho, todos os dias.

Durante 12 anos, o psicólogo, pesquisador e jornalista americano Daniel Goleman escreveu para o jornal The New York Times sobre o cérebro e as ciências comportamentais. Mas sua fama veio mesmo em 1995, quando lançou o best-seller “Inteligência Emocional”, livro que transformou a maneira de se pensar nas emoções e na própria inteligência.

Nele, Goleman explica como o controle das emoções é essencial para a inteligência de um indivíduo, e foca em uma série de habilidades capazes de melhorar os relacionamentos, a vida profissional e até o bem-estar físico. O termo “inteligência emocional” se popularizou e passou a ser utilizado em universidades e escolas para mostrar a importância da autoconsciência, da regulação das emoções, da empatia e das habilidades sociais no dia a dia.

Agora, Goleman lança mais um livro que conversa bastante com o mundo atual, o “Por que meditamos: A ciência e a prática da clareza e da compaixão” (Editora Objetiva). De acordo com o psicólogo, sua relação com a atenção plena e a meditação é de longa data. Filho de um casal de professores universitários de Stockton, Califórnia, ele conta que seu interesse original na meditação era ser mais relaxado. “Eu era um estudante ansioso e preocupado, e queria ser mais calmo e ter mais clareza. Descobri que a meditação fazia isso por mim”, relata.

Na faculdade, Goleman recebeu uma bolsa de viagem para a Índia, para fazer o seu pré-doutorado na Universidade Harvard, e voltou com a intenção de realizar sua pesquisa de dissertação sobre a meditação que aprendeu lá. “Meus professores falaram que era uma péssima ideia. O programa de psicologia clínica era muito psicanalítico e, naquela época, não via nenhuma promessa em algo estranho como a meditação. Mas eu fiz assim mesmo, e descobri que a meditação realmente ajudava as pessoas a se recuperarem rapidamente do estresse, o que já foi verificado, hoje em dia, em diversos estudos diferentes”, diz.

A paixão e o interesse pelo país asiático foram intensos, fazendo com que Goleman voltasse para lá muitas outras vezes e conhecesse vários mestres tibetanos. Um deles foi o professor de meditação Tsoknyi Rinpoche, com quem Goleman divide a autoria de seu novo livro.

Abaixo, confira uma entrevista exclusiva com o autor.

Quais os benefícios da atenção plena (o mindfullness) e da meditação no mundo atual?

Hoje em dia, lidamos com mais crises que, consequentemente, geram estresse. Elas podem ser políticas, pessoais ou ter relação com o noticiário. O fato é que temos vários motivos para nos preocupar. Algo que pode ajudar é manter a calma para pensar no que fazer. E a meditação ajuda nisso.

Quais dificuldades você enfrenta em sua própria vida para ser uma pessoa calma e emocionalmente inteligente?

Eu peço bastante ajuda à minha esposa (a psicoterapeuta Tara Bennett-Goleman) para isso. O livro dela, Alquimia Emocional, traz muitos avanços nessa área e me ajuda bastante. Mas eu também tento estar atento aos meus próprios sentimentos e administrá-los melhor, além de meditar todas as manhãs. Tudo bem falhar, mas a questão certa é: se isso acontecer, com que rapidez você se recupera? Essa é a chave. A vida nos surpreende com momentos de raiva, de preocupação, de pânico. Mas o importante é tratar esses estados.

Para além da clareza e calma da mente, a meditação tem outros benefícios?

Sim, isso é apenas o começo. Quanto mais você pratica, mais intensos são os benefícios. Um realmente importante é a empatia. Ou seja, preocupar-se com outras pessoas, sintonizar-se com elas. A meditação nos torna mais generosos ou mais propensos a ajudar os outros. Mais um ganho é o manejo do estresse. Meditadores experientes são acionados pela raiva ou ansiedade com menos frequência, e se recuperam mais rapidamente.

No novo livro, cada capítulo começa com Rinpoche falando sobre sentimentos, emoções e técnicas de meditação. Na sequência, vem uma divisão descrita como “a ciência”, escrita por você. Por que isso?

O livro começou quando eu estava em um retiro, e daria uma palestra a respeito das descobertas científicas sobre a meditação. Eu tinha acabado de escrever A ciência da Meditação (2017) com Richard Davidson, que é um neurocientista, fundador e diretor do Center for Healthy Minds, da Universidade de Wisconsin-Madison, e revisamos as melhores pesquisas sobre esse tema. Então, Rinpoche propôs que eu compartilhasse isso com os alunos dele, porque achou que seria muito benéfico. Daí, decidimos escrever um livro para juntar a forma como ele ensina meditação e o que eu estava descobrindo sobre ciência e meditação.

Sempre foi muito importante para você trazer esse olhar científico sobre a meditação?

Sim. Existe a fé cega, aquela que você faz porque te disseram que é verdade, e a fé inteligente, que você faz porque tem sentido para você, existe uma razão por trás e gera uma reflexão sobre o assunto. Na vida moderna, a ciência dá credibilidade e ajuda na tomada de uma decisão inteligente, a partir dos melhores fatos e dados. Desde os primeiros dias, quando tentei fazer alguns estudos científicos sobre meditação, sofri muita resistência. Então, reunir a melhor ciência a respeito do tema, de uma forma que qualquer um possa entender, é bem importante.

No capítulo ‘Monstros bonitos’ você aborda a importância de nos tornarmos amigos de nossos sentimentos. Por quê?

Quando falamos sobre fazer amizade com as emoções, especialmente os sentimentos ruins, aqueles que você gostaria de não sentir, tem a ver com o fato de que você pode usar a meditação para moldá-los. Isso é chamado de desvio espiritual. É mais importante enfrentar e lidar com o sentimento, sendo ele bom ou ruim, ao invés de suprimi-lo.

E você acha que ficar familiarizado com esses sentimentos nos ajuda a lidar com eles?

Bem, eu acho que uma série de coisas acontecem. Mas, sim: quando você se familiariza mais com as situações e os sentimentos que pode sentir, ajuda a lidar melhor com isso. Porque se você tomar uma decisão no auge de um sentimento, será uma decisão ruim. Mas, se puder ficar calmo e pensar com clareza, provavelmente tomará melhores decisões. Se pudermos recuar um pouco em nossas mentes e perceber “ah, isso é raiva” ou “isso é ansiedade”, estaremos em uma posição melhor para administrar os sentimentos.

E como lidar com toda essa ansiedade que temos hoje em dia?

Ao longo da história da humanidade, na era pré-histórica, a ansiedade nos ajudou a sobreviver. E, talvez, por isso nossos cérebros, hoje, estão tão ligados na ansiedade. O problema é que a vida moderna desencadeia o mesmo tipo de reação que nos traz preocupações com coisas que não são ameaças à nossa sobrevivência, mas o cérebro e o corpo agem como se fossem. E é relativamente raro a ansiedade de fato sinalizar uma ameaça à sobrevivência. Mas, na vida moderna, você não pode controlar tudo o que acontece. O que podemos fazer é administrar melhor nossos sentimentos.

A meditação ajuda no manejo do estresse, no foco e até pode tornar as pessoas mais generosas ou mais propensas a ajudar os outros Foto: Freepik

Dicas do psicólogo Daniel Goleman e do professor Tsoknyi Rinpoche para colocarmos a meditação em nosso dia a dia:

  • Pratique o ato de “soltar”

A ideia é retirar da cabeça qualquer pensamento que esteja atrapalhando a atenção plena. Ela “nos permite aterrizar no momento presente e nos prepara para a meditação”, diz Rinpoche. Erga os braços e solte as mãos até baterem nas coxas. Expire forte e ruidosamente.

  • Faça amizade com seus sentimentos

Permita-se sentir as sensações e energias do seu corpo. A prática não exige nenhuma meta ou objetivo certo: simplesmente observe os sentimentos que aparecerem, sem julgamentos. Ou seja, não tente suprimir ou fingir que não existe. Também não precisa sentir vergonha pelo sentimento.

“Quando uma criança tem uma crise, em geral conseguimos separar a criança de sua emoção e suas ações. Mas, quando um adulto tem uma crise, esquecemos de fazer essa separação, acreditando que ele deveria se responsabilizar mais por suas emoções”, conta o professor.

  • Respire

Os autores trazem diferentes maneiras de respirar conscientemente. Uma delas é a respiração abdominal profunda, que seria a mesma que os bebês e os animais de estimação fazem, quando dá para sentir o subir e descer da barriga a partir da inspiração e expiração. “Gerenciar a respiração ajuda a gerenciar a nossa mente”, define Goleman.

  • Tenha constância

Não se preocupe com o tanto de tempo dedicado à meditação. O importante é ter regularidade na prática. Quanto mais horas praticadas ao longo da vida, mais rapidamente virão as mudanças. O ideal é praticar, nem que seja um pouquinho, todos os dias.

Entrevista por Ana Lourenço

Repórter do Estadão em São Paulo. Atualmente cobre turismo, na seção Bate-Volta SP, mas tem passagens pela editoria de saúde, cultura e decoração. Formada pela PUC-SP.

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