É tão fácil quando somos pequenos. Basta sentar ao lado de outra criança na praia ou no parquinho e começar a brincar. Alguns até chegam oferecendo: “Conheço uma brincadeira legal, quer jogar?”. Por que isso muda quando somos adultos?
A arte de fazer amizade pode ser difícil. Traumas, medos e inseguranças, às vezes, transformam um “olá” em desafio. Mas as relações sociais têm forte impacto na nossa saúde mental: e é preciso tomar coragem para fazer novas.
Foi o que fez a criadora de conteúdo Juli Batah, de 32 anos. ”Nunca tive dificuldade em sair sozinha, até porque sou muito introvertida. Quando estou com outras pessoas é que fica mais difícil”, conta. Percebendo que a dificuldade de encontrar amizades na vida adulta não era exclusiva dela, Juli montou o grupo Mapa das Minas.
“Minha ideia inicial era mostrar ideias de ‘rolês’ por São Paulo. Só que quando as minhas seguidoras perceberam que eu estava saindo sozinha, pediram para eu falar mais sobre isso. Foi quando vi uma demanda de pessoas que queriam ter mais coragem para sair sozinhas e conhecer outras pessoas”, explica.
Hoje, Juli comanda uma comunidade do Telegram com mais de 500 mulheres que combinam encontros pela cidade. Todas as faixas etárias são bem-vindas, mas a maioria está entre os 25 e 35 anos. Uma delas é a publicitária Milena Santos, de 33. Integrante do grupo desde junho de 2022, Milena sente que o mapa a ajudou a ter novas experiências.
“Entrei no mapa porque vi uma oportunidade de fazer novas amizades. Percebi que depois de certa idade, comecei a escolher encontros com pessoas que estou acostumada a sair e senti falta de fazer novas amizades e conhecer pessoas diferentes”, afirma.
Além dos encontros, Milena gosta os momentos compartilhados no clube, um espaço online onde as integrantes compartilham pensamentos e dicas e também recebem descontos e promoções de diferentes estabelecimentos. Para entrar, a taxa de adesão é R$ 35, além de mensalidade de R$ 15.
“No clube, tive a oportunidade de conhecer diversas mulheres de diferentes idades e vivências, que fez com que tivesse contato com outras visões de mundo. Ali, falamos de autoestima, indicações de livro, recebemos apoio. É um grande lugar de troca, de cuidado, de dicas. É uma ferramenta para tornar a vida mais leve”, conta Milena.
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O projeto desafiou Juli a se expor mais e se conectar verdadeiramente com as pessoas. “Hoje o grupo que temos é muito grande e não consigo me aproximar de todas as meninas que estão lá. Por isso, estamos no processo de criar um novo grupo com uma nova proposta, focada em bem-estar.”
A ideia, Juli explica, é deixar o Mapa das Minas existindo, mas sem abrir novas vagas para inscrições e, a partir do segundo semestre deste ano, abrir um novo grupo que não terá assinatura recorrente, mas funcionará por períodos. “A gente vai fazer ciclos de um ou dois meses com cada grupinho para a conseguir dar a atenção que as meninas precisam e se aproximar mais de quem está ali”, detalha.
Comida como forma de unir as pessoas
Em outro continente, a prestadora de serviços financeiros de 24 anos, Anita Michaud também faz amizades com desconhecidos pela cidade de Nova York. Tudo começou em maio de 2022, depois de ela se mudar para lá e se sentir perdida, sem amigos. “Era um sonho tão grande morar em Nova York que não me preocupei muito em como a minha vida seria. Eu estava em uma cidade incrível com milhões de coisas para fazer, mas ao mesmo tempo me sentia solitária de um modo que nunca me senti antes.”
Anita tentou se encontrar com amigos de conhecidos, aplicativos de encontros para amizades, mas percebeu que as relações não iam para frente. Após seis meses, Anita foi visitar os pais em Portugal e notou como a comida podia ser uma maneira de unir as pessoas.
“Voltei para Nova York e quis ter uma experiência gastronômica comunitária em casa. Foi um jantar com pessoas que existiam na minha vida: alguns do trabalho, outros do trabalho do meu parceiro, colegas que se mudaram para cidade e estudaram comigo etc. O resultado foi incrível e me deu a ideia de começar algo novo”, lembra.
Assim, em maio de 2022, nasceu o ‘Dinner With Friends’ (Jantar com Amigos, em tradução livre), um evento mensal no qual Anita convida nove estranhos (por meio do Instagram da página) para um jantar em sua casa, com o objetivo de criar uma comunidade. Os selecionados pagam uma taxa estabelecida pelo anfitrião (normalmente começa a partir de US$ 65, algo em torno de R$ 314) e recebem um jantar com três pratos diferentes e vinho ou coquetel ilimitado.
A ideia, que inicialmente foi criada sem plano de negócios ou pretensão de grandes crescimentos, deu certo. Anita conheceu centenas de pessoas interessantes, incluindo aquela que hoje chama de melhor amiga e teve uma lista de espera de mais de 800 ansiosos para participar de seu evento.
“O volume de de interessados ficou tão grande para eu administrar sozinha que desde abril tenho outras seis pessoas que hospedam jantares do ‘Dinner With Friends’”, relata. “Todos são bem-vindos, desde que venham com a mente e o coração abertos.”
Como conhecer pessoas novas na vida adulta?
Apesar de vivermos em uma época cheia de tecnologia e redes sociais, estamos mais desconectados do que nunca. Poucos são aqueles que conhecem os próprios vizinhos ou têm tempo para puxar conversas com estranhos. Mas se permitir conhecer histórias diferentes pode ser transformador.
“Todos desejamos que alguém tenha a coragem e nos dê ‘oi’ ou nos convide para algo, mas alguém precisa dar o primeiro passo. Que seja você”, aconselha Anita.
Uma ótima maneira de criar amizades é por meio de um hobbie. Fazer uma atividade rotineira em comum com outra pessoa pode ser o inicio do vínculo com um desconhecido. Mas para isso, vá disposto a oferecer o seu “verdadeiro eu”. Deixe o nervosismo de lado e tenha em mente que a busca por amizades, em qualquer idade, é um desejo humano universal.
Há 23 anos, o jornalista Ronni Abergel ao lado de seu irmão Dany e alguns colegas, criou a “Menneskebiblioteket”, conhecida como Human Library (Biblioteca humana, em tradução livre), em Copenhague. Ali, ao invés de ler histórias em livros, os visitantes escutam 30 minutos da história de vida de uma pessoa.
A ideia, conforme explicam em sua página, é criar um espaço seguro para o diálogo entre diferentes pessoas, partindo da premissa: “Não julgue um livro pela capa”. Cada “livro humano” representa um grupo da sociedade que muitas vezes é submetido a preconceito, estigmatização ou discriminação por causa de seu estilo de vida, diagnóstico, crença, deficiência, status social ou origem étnica.
Nessa pegad, os sites Traveling Spoon e Eat With juntam viagem com cozinha. Com opções no Brasil, eles juntam cozinheiros que abrem sua casa para receber turistas ou até eventos gastronômicos diferentes para os interessados.
Caso o leitor tenha vontade de experimentar algo similar, alguns aplicativos podem ajudar nessa tarefa.
- Bumble
Apesar de ser conhecido por ser um aplicativo de paquera, logo que baixado, o Bumble oferece uma opção de “BFF”, na qual você pode procurar por amizades. Fique atento, pois a versão namoro fica ligada mesmo após a escolha de outra versão. Para mudar, vá em configurações e desative o “modo date”. (Grátis, para iOS e Android, com versão paga por R$ 13,98 por mês).
- Meetup
Depois de selecionar suas preferências e localização, o aplicativo oferece uma série de grupos de encontros com opções similares ao gosto do usuário - desde treinamentos de idiomas, encontros noturnos ou passeios pelo parque. O usuário também pode criar grupos com intenções diferentes e participar de bate-papo de grupos criados. (Grátis, para iOS e Android, com versão paga por R$ 22,90 por mês).
- Boo
A função principal do aplicativo é encontrar pessoas (para namoros ou amizades) através do sistema de match (deslizar para direita ou esquerda). Mas, além disso, permite que o usuário publique fotos e textos em uma espécie de feed, que pode chamar atenção de outras pessoas com interesses similares. Na aba ‘Universos’, você também pode conferir publicações de outros usuários. Para entrar, o aplicativo oferece até um teste de personalidade para facilitar a busca de novos amigos. (Grátis, para iOS e Android, com versão paga por R$ 8,50 por mês).
- Slowly
O aplicativo preza, como o próprio nome diz, por conexões “lentas”. Lá, você pode se conectar com pessoas de diferentes países por meio de uma carta virtual. Diferente de um e-mail, ela pode demorar dias para chegar ao seu destinatário. É uma ótima forma também de treinar uma segunda língua. Você pode escolher seus amigos virtuais e eles também podem escolher você a partir dos seus interesses em comum e outras informações disponíveis. (Grátis, para iOS e Android, com versão paga por R$ 11,58 por mês).