Enquanto a comunidade médica de todo o mundo luta para encontrar a cura da Aids, São Paulo se transformou em um reduto da imigração da saúde. O motivo é que o sistema brasileiro de combate à doença é gratuito e considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um dos melhores do mundo. O Instituto de Infectologia Emílio Ribas, na Zona Oeste da Capital, serve como termômetro da maior afluência de pacientes europeus, africanos, asiáticos e latino-americanos. Referência nacional no combate ao vírus HIV, o hospital estadual recebeu, de janeiro a julho desse ano, 47 pessoas de outros países. O número já é mais de 80% dos estrangeiros atendidos no ano passado, quando a unidade recebeu 58 imigrantes, de diferentes nações. Segundo o diretor do Emílio Ribas, Sebastião André de Felice, os portugueses foram os mais atendidos, seguidos por angolanos e bolivianos. Ainda há pessoas da Espanha, Alemanha, China, Suécia e Suíça. "Ao contrário do que se imagina, o tratamento contra a aids nos países de primeiro mundo é extremamente caro. Em São Paulo, o atendimento pelo programa contra o HIV e a distribuição de remédios são de graça. Isso atrai os imigrantes, que já vêm referenciados para o Ribas", disse o diretor. Mesmo inferiores aos de outros países, por causa da lei dos genéricos, só os custos do coquetel de três anti-retrovirais bancado pelo governo podem passar de US$ 1 mil por paciente ao ano, preço inacessível para a maioria dos brasileiros. Outros remédios também são distribuídos. Em outros países, o custo anual dos remédios pode passar de R$ 10 mil e não é bancado pelos governos. Com dificuldade para falar português, J.G, de 25 anos, tenta explicar por que não volta para a Bolívia, sua terra natal. "Estava tudo pronto para eu voltar para La Paz. Mas há um mês descobri que tenho aids e não posso pagar o tratamento no meu país. Aqui no hospital, eu consigo até mesmo os oito remédios que preciso tomar todo dia." O boliviano perdeu 25 quilos, mas garante que está se recuperando. "Preciso encontrar forças. O jeito é continuar em São Paulo", disse. Ele chegou à Cidade para trabalhar no Brás, Centro, como costureiro. De acordo com o diretor do Emílio Ribas, a maioria desses pacientes possui algum tipo de vínculo na Capital. Eles se cadastram no hospital com o endereço de parentes ou amigos e, por essa razão, ganham direito ao tratamento. "Não deixamos de atender nenhum brasileiro por causa desses imigrantes. O número é pequeno perto dos cerca de 6 mil atendimentos mensais. Mas essa imigração da saúde pode, se tornar problema, caso aumente." Em outro hospital do Estado, o Centro de Referência de Tratamento em Aids e DST (CRT/Aids), na Vila Mariana, Zona Sul, também há algumas dezenas de estrangeiros em tratamento. Desde 1980, foram atendidos mais de 500 imigrantes da saúde na unidade. Segundo a diretora de internação do CRT, Rosana Del Bianco, não é apenas a gratuidade do serviço a responsável por esse tipo de imigração. "A rede pública brasileira também financia os procedimentos que evitam os efeitos colaterais. Com isso, a qualidade do vida do paciente melhora. Pelo menos aqui no Brasil é possível viver muitos anos com o vírus HIV." Mas isso não significa que os paulistanos estão livres da aids. Somente em 2005 foram registrados cerca de 1.600 novos casos da doença em moradores da Capital.