O transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) é um dos tópicos mais controversos da psiquiatria. Não pela primeira vez, a internet está repleta de informações conflitantes. Alguns deploram a falta de reconhecimento e diagnósticos e tratamentos insuficientes. Outros denunciam o excesso de diagnósticos e de tratamentos, e argumentam que a condição é usada como desculpa para uma paternidade mal resolvida.
Identificar os alicerces herdados do TDAH mostrou ser um desafio. Estudos de gêmeos com e sem os referidos sintomas sugerem que fatores genéticos carregam entre 70% e 80% da culpa por causá-lo.
Não existe, no entanto, como no caso (digamos) do daltonismo, um gene ou genes claros sobre os quais a culpa pode ser colocada. Em vez disso, a suposição é que uma série de pequenos e difíceis de detectar ajustes na sequência de letras de DNA (conhecidos como nucleotídeos) se combinam para provocar a suscetibilidade ao distúrbio. Fatores ambientais, tais como privação social e baixo peso ao nascer, desempenham um papel maior ou menor (ou às vezes nenhum) dependendo de quais ajustes genéticos estão presentes.
Agora, uma dúzia desses ajustes foi identificada pela primeira investigação em grande escala sobre o assunto. Um consórcio internacional de mais de 200 geneticistas e especialistas em TDAH publicou, na Nature Genetics, o que é conhecido como um estudo de associação genômica ampla (GWA). Os ajustes que estão sendo buscados, chamados de polimorfismos de nucleotídeo único, ou SNPs, são as diferenças mais simples possíveis entre dois genomas - ou seja, variações entre indivíduos de letras genéticas únicas em pontos específicos da sequência de DNA. Os pesquisadores analisaram os padrões de SNPs nos genomas de 55 mil europeus, dos quais mais de 20 mil foram diagnosticados com TDAH, buscando variantes SNPs consistentemente associadas à doença.
Entender o papel dos genes afetados por dezenas de SNPs levará a um melhor entendimento das causas do TDAH. Algumas, por exemplo, são variações nos genes, ou nos sistemas de controle dos genes envolvidos na determinação de como os cérebros se desenvolvem no útero e na primeira infância. Outros dizem respeito à comunicação das células cerebrais umas com as outras. Tal compreensão também pode levar a ideias para novos medicamentos para tratar a condição.
A comparação deste estudo com outros semelhantes sobre condições que podem estar relacionadas também pode ser informativa. O padrão SNPs encontrado, por exemplo, sobrepõe-se aos descobertos no GWAS (estudo de associação em genoma completo) da insônia. Como Stephen Faraone, da Upstate Medical University, em Syracuse, Nova York, um dos líderes do estudo do TDAH, observa, “nós sabemos há anos que crianças com TDAH têm problemas de sono”.
As dúzias de variantes identificadas, por si só, não reconhecem oficialmente o distúrbio. Os resultados não levarão, portanto, diretamente a testes genéticos para o TDAH. O que eles fazem, porém, é dissipar a ideia de que TDAH é apenas um mau comportamento, ou mesmo uma condição mística. E isso, por si só, pode ajudar a mudar atitudes em relação às crianças que as têm e em relação aos seus pais./ TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO
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