Mineral essencial para o funcionamento do corpo, o sódio contribui com o equilíbrio dos líquidos no nosso organismo, com participação em centenas de funções fisiológicas, como musculares e neurais – e só é possível obtê-lo por fontes externas, ou seja, pela alimentação, principalmente pelo sal de cozinha (cloreto de sódio). Mas, quando consumido em excesso, prejudica a saúde, muitas vezes de forma sorrateira, levando a problemas de saúde que podem culminar em enfarte ou acidente vascular cerebral (AVC).
“Estima-se que mais de 46 mil mortes ao ano por doenças cardiovasculares poderiam ser prevenidas ou adiadas caso a ingestão média de sal dos brasileiros fosse reduzida a 5 gramas por dia em adultos de mais de 30 anos”, diz a cardiologista Salete Nacif, do HCor, hospital referência em cardiologia, em São Paulo (SP). O brasileiro, de forma geral, extrapola esse limite: consome 9,3 gramas por dia, quase o dobro recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), segundo a Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, realizada pelo Ministério da Saúde.
O levantamento indicou consumo elevado em todas as faixas etárias e níveis de escolaridade, embora o excesso seja maior em homens e mais jovens. Esse comportamento alimentar é um fator importante para a alta prevalência de hipertensão (pressão alta), doença crônica que atinge cerca de 30% dos brasileiros, segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). Um estudo publicado neste mês no European Heart Journal revelou que aqueles que sempre adicionam sal às refeições correm um risco 28% maior de morte prematura do que aqueles que raramente o fazem.
Pelo bem de sua saúde, o engenheiro Guilherme Rabello, de 53 anos, deixou de lado o biscoito, o fast-food e a feijoada, para encher o prato de legumes – com pouco sal – escolhidos no bufê do restaurante na hora do almoço. Resolveu mudar depois que teve uma arritmia cardíaca, nas férias de 2018. Ele estava a bordo de um navio, no Caribe, e precisou desembarcar em uma ilha para receber atendimento médico, por estar com 180 batimentos por minuto.
“Meu coração quase saiu pela boca”, conta. Os exames não indicaram nenhuma doença, mas a cardiologista recomendou mudanças no estilo de vida, como a prática de exercícios físicos frequentes e alimentação com pouco sódio. “Sou cuidadoso, pois tenho histórico de pressão alta na família e quero reduzir o meu risco de ter problemas de saúde”, diz ele, que nunca mais apresentou arritmia.
Quando consumimos muito sódio, o corpo trabalha para retirar o excesso do corpo e buscar o seu equilíbrio de líquidos corporais. “Se uma pessoa come muito churrasco, sente sede, bebe mais líquido e elimina o excesso de sódio ao urinar mais. Mas, a longo prazo, isso pode sobrecarregar os rins e o coração. Uma pessoa que consome muito sal pode ficar com pressão alta, que lesa os rins, em um círculo vicioso”, explica o nefrologista Osvaldo Merege Vieira Neto, presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN).
As principais fontes de sódio na dieta do brasileiro são o sal adicionado diretamente nos pratos e os temperos à base de sal usados para preparar os alimentos (74,4%) e o consumo de alimentos processados e ultraprocessados (20,5%), segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2008-2009), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por isso, a primeira recomendação é tirar o saleiro da mesa de jantar.
“A tendência das pessoas é acrescentar mais sal se ele estiver ao alcance na hora da refeição. Mas, se o alimento já foi cozinhado e temperado com uma pitada de sal, não é preciso acrescentar mais”, recomenda a nutricionista Cintia Pereira da Silva, pesquisadora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
Rótulos de alimentos industrializados mudam em outubro
Mas, para que o sódio não prejudique a sua saúde, não basta controlar a adição de sal de cozinha no preparo dos alimentos, mas também restringir o consumo de alimentos processados e ultraprocessados, que recebem na indústria aditivos (como o sódio) para serem conservados por mais tempo ou para ficarem mais agradáveis ao paladar. “É preciso educar o olhar na hora de escolher um produto no supermercado. Sei que é uma utopia pensar que vamos preparar o nosso pão, o nosso molho de tomate, por exemplo, mas é preciso fazer uma reflexão sobre a comida que você está consumindo e fazer boas escolhas”, diz Cintia.
Em outubro, entram em vigor novas regras de rotulagem nutricional de alimentos. Entre as mudanças, a mais significativa é a inclusão do selo frontal que indica quando um alimento tem alto teor de gordura saturada, açúcar adicionado ou sódio. No caso dos alimentos sólidos ou semissólidos, o selo será acrescentado quando uma porção de 100 gramas tiver mais de 600 gramas de sódio. Nos líquidos, a sinalização será obrigatória quando houver mais de 300 gramas de sódio em 100 mililitros do alimento.
“A mudança na rotulagem faz parte de um movimento global pela melhora do entendimento da população em relação ao conteúdo dos alimentos. O consumidor está mudando de comportamento e quer entender o que consome”, diz Cintia. Ela estudou a rotulagem nutricional adotada no Chile, que desde 2016 alerta para o excesso de sódio, açúcar e gordura nos produtos alimentícios.
Ela acha que o selo frontal será importante para que as pessoas descubram que alguns produtos alimentícios não são saudáveis como parecem. Mas alerta que não basta evitar os alimentos sinalizados com o selo de alto teor de sódio. “Não quer dizer que o alimento que não tem o selo está isento de sódio e pode ser consumido à vontade. Essa visão binária é um risco.”
Embora sejam práticos, alimentos enlatados, embutidos e refeições prontas industrializadas devem ser consumidos com parcimônia, reforça a nutricionista Fernanda Sardella. “Nossa alimentação deve se basear em frutas, legumes e verduras. É um pilar importante para uma boa saúde, junto com a prática de exercícios físicos e hidratação”, orienta. Aos pacientes, ela sempre recomenda caprichar no uso de temperos naturais na hora de cozinhar como forma de reduzir o consumo de sal sem perder o sabor nas refeições. “Quando adotamos alho, cebola, gengibre, alecrim e outros temperos, sejam eles frescos ou desidratados, conseguimos reduzir a quantidade de sal e garantir o sabor.”
A cozinheira Betricia Daniela Barg, 46 anos, proprietária da Cuca Fresca Gastronomia, garante que passa longe do tempero artificial. “Um alimento industrializado contém muitos conservantes, aditivos químicos e o sódio é um inimigo da saúde. Não dá para comparar uma lasanha industrializada com uma feita em casa”, diz. Ela mesma foge dos produtos alimentícios processados e vê a diferença na saúde. “Quando me alimento com ingredientes frescos, meu organismo responde bem. Percebo melhora em tudo, do humor ao intestino.”
Como moderar o consumo de sódio
*Tente educar o seu paladar e diminuir, aos poucos, a adição de sal nas refeições.
*Tire o saleiro da mesa, para dificultar o ato de salgar - muitas vezes automaticamente - a refeição.
*Evite o consumo de alimentos ultraprocessados, inclusive os produtos doces. Refeições industrializadas prontas (lasanhas, escondidinhos, por exemplo), embutidos (presunto, mortadela, salame etc.), enlatados, bolachas doces e salgadas, molhos prontos (maionese, mostarda, ketchup, shoyu), salgadinhos, macarrão instantâneo embalados costumam ter muito sódio.
*Preste atenção nos rótulos dos produtos alimentícios. A nova rotulagem irá indicar os alimentos com alto teor de sódio, que devem ser evitados, mas isso não quer dizer que os alimentos que não têm podem ser consumidos à vontade. Portanto, é importante procurar no rótulo a quantidade de sódio presente no produto alimentício para ter uma ideia da quantidade ingerida.
*Atenção às bebidas industrializadas, que também contém sódio. Refrigerantes (inclusive diet/zero), chás, sucos e outras bebidas merecem atenção.
*Cozinhar sem sal e salgar na hora de servir pode ser uma boa estratégia, pois o alimento absorve menos sal. E fica mais fácil controlar a quantidade de sal ingerido.
*Abuse dos temperos naturais para dar sabor aos pratos, em vez de exagerar no sal: use orégano, cúrcuma, alho, cebola, salsinha, desidratados ou frescos.
*O sal de cozinha iodado comum é uma boa escolha e não precisa ser substituído por outros tipos de sal por razões nutricionais. O importante é usá-lo de forma consciente, sem excessos.
*Prepare uma receita de “sal de ervas”, que é uma mistura de sal com outros temperos, como forma de diminuir a quantidade do consumo de sal. A receita indicada pela nutricionista Fernanda Sardella leva 10g de alecrim, 25g de manjericão, 15g de orégano e 100g de sal marinho, que devem ser batidos no liquidificador e guardados em um pote bem fechado, guardado em local seco.