2025 é o limite para interromper alta de emissões e evitar catástrofe climática, diz painel da ONU


Planeta precisa cortar 43% das liberações de gases estufa em relação aos níveis de 2019; preservação de florestas e políticas de incentivo à energia renovável são caminhos apontados por cientistas

Por Emilio Sant'Anna

Novo relatório do Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC), das Nações Unidas, divulgado nesta segunda-feira, 4, mostra que 2025 é o limite para que a média anual global das emissões de gases do efeito estufa atinja seu ponto de inflexão e passe a cair. Segundo os cientistas do grupo, medidas como incentivar energias renováveis, novas tecnologias e preservar florestas para retirar da atmosfera o carbono resultante da queima de combustíveis fósseis serão cruciais. 

Para se ter uma ideia do tamanho do desafio: entre 2010 e 2019, essa média anual de emissões atingiu seus níveis mais altos da história. Manter a mesma rota coloca a meta de limitar o aumento de temperatura a 1,5ºC fora de alcance. Ficar dentro da meta signfica que nos próximos três anos as emissões precisam passar a cair de forma sustentada e chegar a 2030 com uma redução de 43% em relação a 2019. 

Combater desmatamento, como na Amazônia, é uma das principais tarefas para conter crise climática Foto: Greenpeace Brasil

Mesmo se a meta considerada for limitar o aumento a 2ºC, 2025 continua sendo a data-limite, com redução de um quarto do volume de emissões ante os patamares de 2019.

Ao mesmo tempo, as emissões de metano também precisam ser reduzidas em cerca de um terço. Ainda que essa receita seja seguida, é quase certo, diz o IPCC, que esse limite de temperatura (1,5ºC) será ultrapassado temporariamente, retornando a nível mais baixo até o final do século. Ou seja: o relatório deixa claro que a hora de investir em mudanças drásticas e sustentáveis é agora.

O documento aponta também, no entanto, que é possível passarmos raspando pelos desafios de manter o planeta mais seguro para a vida humana. Apesar dos recordes de emissões da década passada, o ritmo de crescimento foi mais baixo em relação às décadas anteriores. E, segundo o relatório do IPCC, há evidências crescentes de ações climáticas que já surtem efeitos positivos.

Desde 2010, houve reduções sustentadas de até 85% nos custos de energia solar e eólica energia e baterias, por exemplo. Um número crescente de políticas públicas e legislações mais refinadas melhorou a eficiência energética, reduziu as taxas de desmatamento e acelerou a implantação de energia renovável. 

“Uma das coisas que fica clara neste relatório é que limitar o aumento da temperatura a 1,5°C exigirá, ao mesmo tempo, reduzir as emissões e remover o carbono que já está na atmosfera. Isso demonstra a urgência em que estamos”, diz Carolina Genin, diretora de Clima do WRI Brasil.

Para limitar o aquecimento global, diz o documento, será necessário enfrentar uma grande transição no setor de energia, deixando para trás o consumo de combustíveis fósseis,aumento da eletrificação das frotas e desenvolvimento e melhoria da eficiência energética de combustíveis alternativos, como o hidrogênio. 

“O relatório ajuda a reforçar que não há cenário de 1,5°C sem a Amazônia. Para o Brasil, desenvolver soluções tecnológicas para retirar CO2 da atmosfera é algo caro e não faria sentido, pois temos as florestas, a melhor alternativa natural e de baixo custo para a captura e armazenamento de carbono”, diz Carolina. 

Para Laurence Tubiana, CEO da European Climate Foundation (ECF), orelatório do IPCC deixa claro que a maneira mais rápida de os governos garantirem a segurança energética é cortar custos e investir em energia limpa, deixando de lado os combustíveis fósseis. “Novas infraestruturas de gás, petróleo e carvão não apenas aumentarão os severos custos climáticos que já enfrentamos, mas também alimentarão a temível espiral geopolítica dos combustíveis fósseis, que tantas vezes têm sido associadas à tensão, conflito e volatilidade macroeconômica”, afirma.

Além de apontar a saída com o uso e desenvolvimento de tecnologias energéticas, o relatório do IPCC aponta que o setor financeiro tem um papel importante nesse processo. Embora os fluxos financeiros sejam hoje de três a seis vezes menores do que o necessário para impulsionar esse desenvolvimento, há capital e liquidez suficientes para fechar essas lacunas. Para isso, no entanto, o setor financeiro precisa de demonstrações claras de comprometimento de governos e da comunidade internacional em manter o aumento da temperatura abaixo do 1,5ºC.  

Os fluxos financeiros totais anuais para mitigação e adaptação às mudanças climáticas aumentaram em até 60% entre 2013/14 e 2019/20, mas o crescimento médio desacelerou desde 2018. Além disso, esses fluxos são desiguais e se desenvolveram de forma heterogênea entre regiões do globo e os setores econômicos. O cenário é ainda pior quando se constata que os financiamentos públicos e privados de empreendimentos que utilizam combustíveis fósseis ainda são maiores do que para a adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

Conforme o relatório Lacunas de Produção, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), de 2021, até aquele ano, os governos do G20 investiram mais de US$ 230 bilhões em medidas relacionadas ao combate à pandemia de covid-19 em setores responsáveis pela produção e consumo de combustíveis fósseis. No mesmo período, o valor investido em energia limpa foi de cerca de US$ 150 bilhões.

Na última semana, por exemplo, o presidente da COP-26 (Conferência Mundial do Clima), Alok Sharma, se reuniu com representantes de bancos, empresas, Estados e municípios, em São Paulo. Na pauta, o crescimento de uma aliança para a descarbonização dos serviços financeiros, iniciativa lançada mundialmente em 2021 e que tem hoje mais de 450 empresas com ativos de mais de US$ 130 trilhões.

Questionado sobre a expectativa em relação ao Brasil em ano eleitoral, Sharma diz esperar que o País confirme em atos os compromissos assumidos em Glasgow, seja qual for o resultado da disputa à Presidência.

Eventos climáticos extremos, como o temporal recorde que matou 234 pessoas em Petrópolis em fevereiro, serão cada vez mais comuns Foto: Wilton Junior/Estadão - 21/03/2022

Alta no desmatamento motiva pressão contra o Brasil

No Brasil, o desmatamento é a principal causa de emissões de gases de efeito estufa. Na COP-26, o País se comprometeu a cortar em 50% suas emissões até 2030, tendo como base o volume de 2005. O objetivo superou o que havia sido apresentado na NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) poucos dias antes do início da cúpula. Ainda assim, a posição frustrou expectativas por ter só igualado a meta assumida em 2015. Na gestão Jair Bolsonaro, o Brasil bate recordes sucessivos de desmatamento.

“Já estamos vendo os impactos climáticos generalizados causados por uma elevação de apenas 1,1°C na temperatura média do planeta acima dos níveis pré-industriais, inclusive no Brasil, onde recentemente centenas de pessoas perderam suas vidas por causa de eventos extremos”, afirma Mauricio Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil.

Em Petrópolis (RJ), por exemplo, um temporal recorde matou 234 pessoas de uma vez em fevereiro, a maior tragédia do tipo na cidade. Especialistas afirmam que eventos climáticos extremos serão cada vez mais frequentes com o avanço do aquecimento global. 

O relatório recebeu mais de 60 mil comentários de revisores especializados e de representantes de governos. Mais de 59 mil artigos científicos são mencionados no documento final aprovado por 278 autores. A aprovação do relatório final, que deveria ser concluído durante o final de semana, se estendeu mais do que o planejado. O documento só foi validado por todos os pares na manhã desta segunda-feira, 4.

Novo relatório do Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC), das Nações Unidas, divulgado nesta segunda-feira, 4, mostra que 2025 é o limite para que a média anual global das emissões de gases do efeito estufa atinja seu ponto de inflexão e passe a cair. Segundo os cientistas do grupo, medidas como incentivar energias renováveis, novas tecnologias e preservar florestas para retirar da atmosfera o carbono resultante da queima de combustíveis fósseis serão cruciais. 

Para se ter uma ideia do tamanho do desafio: entre 2010 e 2019, essa média anual de emissões atingiu seus níveis mais altos da história. Manter a mesma rota coloca a meta de limitar o aumento de temperatura a 1,5ºC fora de alcance. Ficar dentro da meta signfica que nos próximos três anos as emissões precisam passar a cair de forma sustentada e chegar a 2030 com uma redução de 43% em relação a 2019. 

Combater desmatamento, como na Amazônia, é uma das principais tarefas para conter crise climática Foto: Greenpeace Brasil

Mesmo se a meta considerada for limitar o aumento a 2ºC, 2025 continua sendo a data-limite, com redução de um quarto do volume de emissões ante os patamares de 2019.

Ao mesmo tempo, as emissões de metano também precisam ser reduzidas em cerca de um terço. Ainda que essa receita seja seguida, é quase certo, diz o IPCC, que esse limite de temperatura (1,5ºC) será ultrapassado temporariamente, retornando a nível mais baixo até o final do século. Ou seja: o relatório deixa claro que a hora de investir em mudanças drásticas e sustentáveis é agora.

O documento aponta também, no entanto, que é possível passarmos raspando pelos desafios de manter o planeta mais seguro para a vida humana. Apesar dos recordes de emissões da década passada, o ritmo de crescimento foi mais baixo em relação às décadas anteriores. E, segundo o relatório do IPCC, há evidências crescentes de ações climáticas que já surtem efeitos positivos.

Desde 2010, houve reduções sustentadas de até 85% nos custos de energia solar e eólica energia e baterias, por exemplo. Um número crescente de políticas públicas e legislações mais refinadas melhorou a eficiência energética, reduziu as taxas de desmatamento e acelerou a implantação de energia renovável. 

“Uma das coisas que fica clara neste relatório é que limitar o aumento da temperatura a 1,5°C exigirá, ao mesmo tempo, reduzir as emissões e remover o carbono que já está na atmosfera. Isso demonstra a urgência em que estamos”, diz Carolina Genin, diretora de Clima do WRI Brasil.

Para limitar o aquecimento global, diz o documento, será necessário enfrentar uma grande transição no setor de energia, deixando para trás o consumo de combustíveis fósseis,aumento da eletrificação das frotas e desenvolvimento e melhoria da eficiência energética de combustíveis alternativos, como o hidrogênio. 

“O relatório ajuda a reforçar que não há cenário de 1,5°C sem a Amazônia. Para o Brasil, desenvolver soluções tecnológicas para retirar CO2 da atmosfera é algo caro e não faria sentido, pois temos as florestas, a melhor alternativa natural e de baixo custo para a captura e armazenamento de carbono”, diz Carolina. 

Para Laurence Tubiana, CEO da European Climate Foundation (ECF), orelatório do IPCC deixa claro que a maneira mais rápida de os governos garantirem a segurança energética é cortar custos e investir em energia limpa, deixando de lado os combustíveis fósseis. “Novas infraestruturas de gás, petróleo e carvão não apenas aumentarão os severos custos climáticos que já enfrentamos, mas também alimentarão a temível espiral geopolítica dos combustíveis fósseis, que tantas vezes têm sido associadas à tensão, conflito e volatilidade macroeconômica”, afirma.

Além de apontar a saída com o uso e desenvolvimento de tecnologias energéticas, o relatório do IPCC aponta que o setor financeiro tem um papel importante nesse processo. Embora os fluxos financeiros sejam hoje de três a seis vezes menores do que o necessário para impulsionar esse desenvolvimento, há capital e liquidez suficientes para fechar essas lacunas. Para isso, no entanto, o setor financeiro precisa de demonstrações claras de comprometimento de governos e da comunidade internacional em manter o aumento da temperatura abaixo do 1,5ºC.  

Os fluxos financeiros totais anuais para mitigação e adaptação às mudanças climáticas aumentaram em até 60% entre 2013/14 e 2019/20, mas o crescimento médio desacelerou desde 2018. Além disso, esses fluxos são desiguais e se desenvolveram de forma heterogênea entre regiões do globo e os setores econômicos. O cenário é ainda pior quando se constata que os financiamentos públicos e privados de empreendimentos que utilizam combustíveis fósseis ainda são maiores do que para a adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

Conforme o relatório Lacunas de Produção, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), de 2021, até aquele ano, os governos do G20 investiram mais de US$ 230 bilhões em medidas relacionadas ao combate à pandemia de covid-19 em setores responsáveis pela produção e consumo de combustíveis fósseis. No mesmo período, o valor investido em energia limpa foi de cerca de US$ 150 bilhões.

Na última semana, por exemplo, o presidente da COP-26 (Conferência Mundial do Clima), Alok Sharma, se reuniu com representantes de bancos, empresas, Estados e municípios, em São Paulo. Na pauta, o crescimento de uma aliança para a descarbonização dos serviços financeiros, iniciativa lançada mundialmente em 2021 e que tem hoje mais de 450 empresas com ativos de mais de US$ 130 trilhões.

Questionado sobre a expectativa em relação ao Brasil em ano eleitoral, Sharma diz esperar que o País confirme em atos os compromissos assumidos em Glasgow, seja qual for o resultado da disputa à Presidência.

Eventos climáticos extremos, como o temporal recorde que matou 234 pessoas em Petrópolis em fevereiro, serão cada vez mais comuns Foto: Wilton Junior/Estadão - 21/03/2022

Alta no desmatamento motiva pressão contra o Brasil

No Brasil, o desmatamento é a principal causa de emissões de gases de efeito estufa. Na COP-26, o País se comprometeu a cortar em 50% suas emissões até 2030, tendo como base o volume de 2005. O objetivo superou o que havia sido apresentado na NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) poucos dias antes do início da cúpula. Ainda assim, a posição frustrou expectativas por ter só igualado a meta assumida em 2015. Na gestão Jair Bolsonaro, o Brasil bate recordes sucessivos de desmatamento.

“Já estamos vendo os impactos climáticos generalizados causados por uma elevação de apenas 1,1°C na temperatura média do planeta acima dos níveis pré-industriais, inclusive no Brasil, onde recentemente centenas de pessoas perderam suas vidas por causa de eventos extremos”, afirma Mauricio Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil.

Em Petrópolis (RJ), por exemplo, um temporal recorde matou 234 pessoas de uma vez em fevereiro, a maior tragédia do tipo na cidade. Especialistas afirmam que eventos climáticos extremos serão cada vez mais frequentes com o avanço do aquecimento global. 

O relatório recebeu mais de 60 mil comentários de revisores especializados e de representantes de governos. Mais de 59 mil artigos científicos são mencionados no documento final aprovado por 278 autores. A aprovação do relatório final, que deveria ser concluído durante o final de semana, se estendeu mais do que o planejado. O documento só foi validado por todos os pares na manhã desta segunda-feira, 4.

Novo relatório do Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC), das Nações Unidas, divulgado nesta segunda-feira, 4, mostra que 2025 é o limite para que a média anual global das emissões de gases do efeito estufa atinja seu ponto de inflexão e passe a cair. Segundo os cientistas do grupo, medidas como incentivar energias renováveis, novas tecnologias e preservar florestas para retirar da atmosfera o carbono resultante da queima de combustíveis fósseis serão cruciais. 

Para se ter uma ideia do tamanho do desafio: entre 2010 e 2019, essa média anual de emissões atingiu seus níveis mais altos da história. Manter a mesma rota coloca a meta de limitar o aumento de temperatura a 1,5ºC fora de alcance. Ficar dentro da meta signfica que nos próximos três anos as emissões precisam passar a cair de forma sustentada e chegar a 2030 com uma redução de 43% em relação a 2019. 

Combater desmatamento, como na Amazônia, é uma das principais tarefas para conter crise climática Foto: Greenpeace Brasil

Mesmo se a meta considerada for limitar o aumento a 2ºC, 2025 continua sendo a data-limite, com redução de um quarto do volume de emissões ante os patamares de 2019.

Ao mesmo tempo, as emissões de metano também precisam ser reduzidas em cerca de um terço. Ainda que essa receita seja seguida, é quase certo, diz o IPCC, que esse limite de temperatura (1,5ºC) será ultrapassado temporariamente, retornando a nível mais baixo até o final do século. Ou seja: o relatório deixa claro que a hora de investir em mudanças drásticas e sustentáveis é agora.

O documento aponta também, no entanto, que é possível passarmos raspando pelos desafios de manter o planeta mais seguro para a vida humana. Apesar dos recordes de emissões da década passada, o ritmo de crescimento foi mais baixo em relação às décadas anteriores. E, segundo o relatório do IPCC, há evidências crescentes de ações climáticas que já surtem efeitos positivos.

Desde 2010, houve reduções sustentadas de até 85% nos custos de energia solar e eólica energia e baterias, por exemplo. Um número crescente de políticas públicas e legislações mais refinadas melhorou a eficiência energética, reduziu as taxas de desmatamento e acelerou a implantação de energia renovável. 

“Uma das coisas que fica clara neste relatório é que limitar o aumento da temperatura a 1,5°C exigirá, ao mesmo tempo, reduzir as emissões e remover o carbono que já está na atmosfera. Isso demonstra a urgência em que estamos”, diz Carolina Genin, diretora de Clima do WRI Brasil.

Para limitar o aquecimento global, diz o documento, será necessário enfrentar uma grande transição no setor de energia, deixando para trás o consumo de combustíveis fósseis,aumento da eletrificação das frotas e desenvolvimento e melhoria da eficiência energética de combustíveis alternativos, como o hidrogênio. 

“O relatório ajuda a reforçar que não há cenário de 1,5°C sem a Amazônia. Para o Brasil, desenvolver soluções tecnológicas para retirar CO2 da atmosfera é algo caro e não faria sentido, pois temos as florestas, a melhor alternativa natural e de baixo custo para a captura e armazenamento de carbono”, diz Carolina. 

Para Laurence Tubiana, CEO da European Climate Foundation (ECF), orelatório do IPCC deixa claro que a maneira mais rápida de os governos garantirem a segurança energética é cortar custos e investir em energia limpa, deixando de lado os combustíveis fósseis. “Novas infraestruturas de gás, petróleo e carvão não apenas aumentarão os severos custos climáticos que já enfrentamos, mas também alimentarão a temível espiral geopolítica dos combustíveis fósseis, que tantas vezes têm sido associadas à tensão, conflito e volatilidade macroeconômica”, afirma.

Além de apontar a saída com o uso e desenvolvimento de tecnologias energéticas, o relatório do IPCC aponta que o setor financeiro tem um papel importante nesse processo. Embora os fluxos financeiros sejam hoje de três a seis vezes menores do que o necessário para impulsionar esse desenvolvimento, há capital e liquidez suficientes para fechar essas lacunas. Para isso, no entanto, o setor financeiro precisa de demonstrações claras de comprometimento de governos e da comunidade internacional em manter o aumento da temperatura abaixo do 1,5ºC.  

Os fluxos financeiros totais anuais para mitigação e adaptação às mudanças climáticas aumentaram em até 60% entre 2013/14 e 2019/20, mas o crescimento médio desacelerou desde 2018. Além disso, esses fluxos são desiguais e se desenvolveram de forma heterogênea entre regiões do globo e os setores econômicos. O cenário é ainda pior quando se constata que os financiamentos públicos e privados de empreendimentos que utilizam combustíveis fósseis ainda são maiores do que para a adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

Conforme o relatório Lacunas de Produção, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), de 2021, até aquele ano, os governos do G20 investiram mais de US$ 230 bilhões em medidas relacionadas ao combate à pandemia de covid-19 em setores responsáveis pela produção e consumo de combustíveis fósseis. No mesmo período, o valor investido em energia limpa foi de cerca de US$ 150 bilhões.

Na última semana, por exemplo, o presidente da COP-26 (Conferência Mundial do Clima), Alok Sharma, se reuniu com representantes de bancos, empresas, Estados e municípios, em São Paulo. Na pauta, o crescimento de uma aliança para a descarbonização dos serviços financeiros, iniciativa lançada mundialmente em 2021 e que tem hoje mais de 450 empresas com ativos de mais de US$ 130 trilhões.

Questionado sobre a expectativa em relação ao Brasil em ano eleitoral, Sharma diz esperar que o País confirme em atos os compromissos assumidos em Glasgow, seja qual for o resultado da disputa à Presidência.

Eventos climáticos extremos, como o temporal recorde que matou 234 pessoas em Petrópolis em fevereiro, serão cada vez mais comuns Foto: Wilton Junior/Estadão - 21/03/2022

Alta no desmatamento motiva pressão contra o Brasil

No Brasil, o desmatamento é a principal causa de emissões de gases de efeito estufa. Na COP-26, o País se comprometeu a cortar em 50% suas emissões até 2030, tendo como base o volume de 2005. O objetivo superou o que havia sido apresentado na NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) poucos dias antes do início da cúpula. Ainda assim, a posição frustrou expectativas por ter só igualado a meta assumida em 2015. Na gestão Jair Bolsonaro, o Brasil bate recordes sucessivos de desmatamento.

“Já estamos vendo os impactos climáticos generalizados causados por uma elevação de apenas 1,1°C na temperatura média do planeta acima dos níveis pré-industriais, inclusive no Brasil, onde recentemente centenas de pessoas perderam suas vidas por causa de eventos extremos”, afirma Mauricio Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil.

Em Petrópolis (RJ), por exemplo, um temporal recorde matou 234 pessoas de uma vez em fevereiro, a maior tragédia do tipo na cidade. Especialistas afirmam que eventos climáticos extremos serão cada vez mais frequentes com o avanço do aquecimento global. 

O relatório recebeu mais de 60 mil comentários de revisores especializados e de representantes de governos. Mais de 59 mil artigos científicos são mencionados no documento final aprovado por 278 autores. A aprovação do relatório final, que deveria ser concluído durante o final de semana, se estendeu mais do que o planejado. O documento só foi validado por todos os pares na manhã desta segunda-feira, 4.

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