‘Brasil não tem interesses claros, apesar de ter retórica’, diz Rubens Barbosa sobre pauta ambiental


Para o ex-embaixador nos Estados Unidos, País precisa ter prioridades e parar de evitar temas importantes

Por Paula Ferreira
Atualização:
Foto: Amanda Perobelli/Estadão
Entrevista comRubens Barbosa Presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior

BRASÍLIA - Antes mesmo de assumir o mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva buscou meios de se posicionar como uma liderança na pauta ambiental. Em novembro de 2022, foi à Conferência do Clima da ONU (COP-27), em Sharm el-Sheik, no Egito, e discursou em defesa do meio ambiente após sair vitorioso nas eleições. Dois anos depois, o presidente brasileiro não foi à COP-29, em Baku, e o País está sendo representado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.

Ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), Rubens Barbosa considera que, apesar da postura ativa na área, o Brasil ainda não é um líder global na pauta ambiental. Segundo ele, falta ao País clareza nas políticas para a área. Barbosa cita que o País evita temas importantes.

“A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tenha ainda quem vai coordenar a COP-30 (em Belém, no Pará)”, diz.

Em agosto, o governo lançou a Política Nacional de Transição Energética (PNTE). A expectativa é de captar até R$ 2 trilhões em investimentos em dez anos. Na ocasião, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que há previsão de R$ 700 bilhões no Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para investimento na área. Apesar disso, o presidente fala recorrentemente sobre a decisão de explorar novas frentes de petróleo. Em entrevistas, já chegou a admitir que sua postura é contraditória, mas que, enquanto a transição energética não resolve o problema, o País precisa ganhar dinheiro com o combustível fóssil.

Como o senhor avalia a posição do Brasil em termos globais em relação à pauta ambiental?

O Brasil raramente está no centro dos acontecimentos. Agora nós estamos no centro dos acontecimentos na questão do meio ambiente, da mudança do clima, na questão da transição energética, e na questão da segurança alimentar, que tem a ver com o clima também. O Brasil tem uma posição hoje de poder assumir esse debate. Acho que a posição do Brasil é muito forte, é a prioridade. O presidente declarou isso quando assumiu que a mudança do clima, a transição energética, a segurança alimentar, eram prioridades do governo. Eu vejo o Brasil como uma função muito ativa. Agora, a reunião do G20 e a reunião da COP-30 ano que vem mostram a importância que esses temas têm para a política econômica e a política externa do Brasil.

É possível afirmar que o Brasil é o grande líder do Sul Global nesta pauta?

Eu não disse que o Brasil era um líder global, falei que esses temas eram prioritários para o Brasil. O Brasil deveria ser (líder), mas nós não somos, porque não temos políticas efetivas nessas áreas. A Europa tem uma posição muito mais ativa do que o Brasil, por exemplo, em relação ao meio ambiente. Todos os países europeus têm uma posição de líderes realmente.

Agora, no Brasil, acho que falta definir prioridades dentro dessas áreas. Você tem problemas políticos, de organização interna, aqui no Brasil, e uma falha na (percepção da) necessidade de o Brasil assumir a liderança, porque esses temas são muito importantes por causa da Amazônia, da produção agrícola, da matriz limpa. O País teria uma posição importante, se tivesse uma visão clara dos objetivos e dos interesses que tem nessas áreas. O Brasil não tem interesses muito claros, apesar de ter retórica.

A gente não tem objetivos claros para defesa dos interesses brasileiros. A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tem ainda quem vai coordenar a COP-30. Estamos quase no fim do ano e não tem ninguém para assumir esse lugar. Há uma hesitação do governo nessas três áreas que impede que o Brasil efetivamente ocupe uma posição de liderança no mundo.

Bombeiros tentam conter o fogo no Pantanal; queimadas prejudicam a posição do Brasil na COP. Foto: CBM-MS

O senhor mencionou a falta de indicação da presidência da COP-30. Como essa lacuna pode influenciar as discussões na COP-29?

Devia ter nomeado já. A COP-29, no Azerbaijão, vai discutir a questão do financiamento. Se não resolver lá, esse assunto vai ser transferido aqui para o Brasil e vai ser o mote. Em Cali (na COP da Biodiversidade), a questão do financiamento também não foi resolvida. A ausência de uma autoridade brasileira para ser responsável pela coordenação disso tudo enfraquece a posição do Brasil. O presidente não foi em Cali, não vai no Azerbaijão, são problemas que influem na percepção externa sobre a posição do Brasil.

O governo tem um discurso dúbio em relação ao petróleo. Isso prejudica nas negociações climáticas?

Acho que não prejudica em nada. O Brasil deveria defender seu interesse nisso. A França tem uma posição muito forte no meio ambiente e ela está explorando o petróleo nessa região. Os americanos com a Shell, os ingleses estão explorando na Guiana. A Noruega explora petróleo lá no Mar do Norte. Há um discurso e há uma prática. A prática é diferente da retórica no mundo inteiro. Não adianta o Brasil querer tomar uma posição muito dura em tudo sem ver qual é o nosso interesse. Tem de ser feita uma análise do interesse brasileiro, balanceando o interesse da preservação do meio ambiente, da redução das emissões, e a questão dos combustíveis fósseis. A gente tem de ser realista. Não adianta defender uma posição abstrata quando o mundo inteiro está em outra. A Noruega explora o petróleo, faz um fundo e apoia soluções de meio ambiente. Aqui a gente pode fazer a mesma coisa.

Como a vitória de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos pode impactar nas negociações climáticas?

Vai ser muito complicada essa parte de mudança do clima, meio ambiente, transição energética. Essa discussão vai perder prioridade nos Estados Unidos. O Trump é a favor da exploração de petróleo, do gás. Já no primeiro mandato não deu importância (à questão ambiental), saiu do Acordo de Paris. Isso pode se refletir até na reunião do ano que vem aqui no Brasil, mas está um pouco cedo para fazer prognósticos.

O Brasil negocia em bloco na COP, muitas vezes com países como China e Índia. Como garantir os interesses desses grupos e ao mesmo tempo ter uma postura em defesa do meio ambiente?

O Brasil tem de defender seus interesses independentemente desses blocos e desses países. Todo mundo hoje defende o seu próprio interesse. Esse tema não entra muito nos BRICs (Bloco economias emergentes, como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) até porque a China é o maior poluidor e o Brasil, por causa das queimadas na Amazônia, está sendo um grande emissor também.

A questão das queimadas pode fragilizar o Brasil nas discussões da COP-29?

Não, mas o Brasil vai ser criticado por isso. As queimadas não só no bioma amazônico, mas no Pantanal, foram algo muito ruim para o Brasil às vésperas da COP.

Isso pode dificultar a obtenção de financiamento?

Acho que não. Acho que a gente tem de insistir nisso. É uma pauta que está lá e, se não resolver no Azerbaijão, o risco que a gente corre é que a COP do Brasil seja limitada a esse programa: Amazônia e financiamento, que não é a agenda da COP. O Brasil tem uma agenda muito maior.

BRASÍLIA - Antes mesmo de assumir o mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva buscou meios de se posicionar como uma liderança na pauta ambiental. Em novembro de 2022, foi à Conferência do Clima da ONU (COP-27), em Sharm el-Sheik, no Egito, e discursou em defesa do meio ambiente após sair vitorioso nas eleições. Dois anos depois, o presidente brasileiro não foi à COP-29, em Baku, e o País está sendo representado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.

Ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), Rubens Barbosa considera que, apesar da postura ativa na área, o Brasil ainda não é um líder global na pauta ambiental. Segundo ele, falta ao País clareza nas políticas para a área. Barbosa cita que o País evita temas importantes.

“A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tenha ainda quem vai coordenar a COP-30 (em Belém, no Pará)”, diz.

Em agosto, o governo lançou a Política Nacional de Transição Energética (PNTE). A expectativa é de captar até R$ 2 trilhões em investimentos em dez anos. Na ocasião, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que há previsão de R$ 700 bilhões no Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para investimento na área. Apesar disso, o presidente fala recorrentemente sobre a decisão de explorar novas frentes de petróleo. Em entrevistas, já chegou a admitir que sua postura é contraditória, mas que, enquanto a transição energética não resolve o problema, o País precisa ganhar dinheiro com o combustível fóssil.

Como o senhor avalia a posição do Brasil em termos globais em relação à pauta ambiental?

O Brasil raramente está no centro dos acontecimentos. Agora nós estamos no centro dos acontecimentos na questão do meio ambiente, da mudança do clima, na questão da transição energética, e na questão da segurança alimentar, que tem a ver com o clima também. O Brasil tem uma posição hoje de poder assumir esse debate. Acho que a posição do Brasil é muito forte, é a prioridade. O presidente declarou isso quando assumiu que a mudança do clima, a transição energética, a segurança alimentar, eram prioridades do governo. Eu vejo o Brasil como uma função muito ativa. Agora, a reunião do G20 e a reunião da COP-30 ano que vem mostram a importância que esses temas têm para a política econômica e a política externa do Brasil.

É possível afirmar que o Brasil é o grande líder do Sul Global nesta pauta?

Eu não disse que o Brasil era um líder global, falei que esses temas eram prioritários para o Brasil. O Brasil deveria ser (líder), mas nós não somos, porque não temos políticas efetivas nessas áreas. A Europa tem uma posição muito mais ativa do que o Brasil, por exemplo, em relação ao meio ambiente. Todos os países europeus têm uma posição de líderes realmente.

Agora, no Brasil, acho que falta definir prioridades dentro dessas áreas. Você tem problemas políticos, de organização interna, aqui no Brasil, e uma falha na (percepção da) necessidade de o Brasil assumir a liderança, porque esses temas são muito importantes por causa da Amazônia, da produção agrícola, da matriz limpa. O País teria uma posição importante, se tivesse uma visão clara dos objetivos e dos interesses que tem nessas áreas. O Brasil não tem interesses muito claros, apesar de ter retórica.

A gente não tem objetivos claros para defesa dos interesses brasileiros. A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tem ainda quem vai coordenar a COP-30. Estamos quase no fim do ano e não tem ninguém para assumir esse lugar. Há uma hesitação do governo nessas três áreas que impede que o Brasil efetivamente ocupe uma posição de liderança no mundo.

Bombeiros tentam conter o fogo no Pantanal; queimadas prejudicam a posição do Brasil na COP. Foto: CBM-MS

O senhor mencionou a falta de indicação da presidência da COP-30. Como essa lacuna pode influenciar as discussões na COP-29?

Devia ter nomeado já. A COP-29, no Azerbaijão, vai discutir a questão do financiamento. Se não resolver lá, esse assunto vai ser transferido aqui para o Brasil e vai ser o mote. Em Cali (na COP da Biodiversidade), a questão do financiamento também não foi resolvida. A ausência de uma autoridade brasileira para ser responsável pela coordenação disso tudo enfraquece a posição do Brasil. O presidente não foi em Cali, não vai no Azerbaijão, são problemas que influem na percepção externa sobre a posição do Brasil.

O governo tem um discurso dúbio em relação ao petróleo. Isso prejudica nas negociações climáticas?

Acho que não prejudica em nada. O Brasil deveria defender seu interesse nisso. A França tem uma posição muito forte no meio ambiente e ela está explorando o petróleo nessa região. Os americanos com a Shell, os ingleses estão explorando na Guiana. A Noruega explora petróleo lá no Mar do Norte. Há um discurso e há uma prática. A prática é diferente da retórica no mundo inteiro. Não adianta o Brasil querer tomar uma posição muito dura em tudo sem ver qual é o nosso interesse. Tem de ser feita uma análise do interesse brasileiro, balanceando o interesse da preservação do meio ambiente, da redução das emissões, e a questão dos combustíveis fósseis. A gente tem de ser realista. Não adianta defender uma posição abstrata quando o mundo inteiro está em outra. A Noruega explora o petróleo, faz um fundo e apoia soluções de meio ambiente. Aqui a gente pode fazer a mesma coisa.

Como a vitória de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos pode impactar nas negociações climáticas?

Vai ser muito complicada essa parte de mudança do clima, meio ambiente, transição energética. Essa discussão vai perder prioridade nos Estados Unidos. O Trump é a favor da exploração de petróleo, do gás. Já no primeiro mandato não deu importância (à questão ambiental), saiu do Acordo de Paris. Isso pode se refletir até na reunião do ano que vem aqui no Brasil, mas está um pouco cedo para fazer prognósticos.

O Brasil negocia em bloco na COP, muitas vezes com países como China e Índia. Como garantir os interesses desses grupos e ao mesmo tempo ter uma postura em defesa do meio ambiente?

O Brasil tem de defender seus interesses independentemente desses blocos e desses países. Todo mundo hoje defende o seu próprio interesse. Esse tema não entra muito nos BRICs (Bloco economias emergentes, como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) até porque a China é o maior poluidor e o Brasil, por causa das queimadas na Amazônia, está sendo um grande emissor também.

A questão das queimadas pode fragilizar o Brasil nas discussões da COP-29?

Não, mas o Brasil vai ser criticado por isso. As queimadas não só no bioma amazônico, mas no Pantanal, foram algo muito ruim para o Brasil às vésperas da COP.

Isso pode dificultar a obtenção de financiamento?

Acho que não. Acho que a gente tem de insistir nisso. É uma pauta que está lá e, se não resolver no Azerbaijão, o risco que a gente corre é que a COP do Brasil seja limitada a esse programa: Amazônia e financiamento, que não é a agenda da COP. O Brasil tem uma agenda muito maior.

BRASÍLIA - Antes mesmo de assumir o mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva buscou meios de se posicionar como uma liderança na pauta ambiental. Em novembro de 2022, foi à Conferência do Clima da ONU (COP-27), em Sharm el-Sheik, no Egito, e discursou em defesa do meio ambiente após sair vitorioso nas eleições. Dois anos depois, o presidente brasileiro não foi à COP-29, em Baku, e o País está sendo representado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.

Ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), Rubens Barbosa considera que, apesar da postura ativa na área, o Brasil ainda não é um líder global na pauta ambiental. Segundo ele, falta ao País clareza nas políticas para a área. Barbosa cita que o País evita temas importantes.

“A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tenha ainda quem vai coordenar a COP-30 (em Belém, no Pará)”, diz.

Em agosto, o governo lançou a Política Nacional de Transição Energética (PNTE). A expectativa é de captar até R$ 2 trilhões em investimentos em dez anos. Na ocasião, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que há previsão de R$ 700 bilhões no Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para investimento na área. Apesar disso, o presidente fala recorrentemente sobre a decisão de explorar novas frentes de petróleo. Em entrevistas, já chegou a admitir que sua postura é contraditória, mas que, enquanto a transição energética não resolve o problema, o País precisa ganhar dinheiro com o combustível fóssil.

Como o senhor avalia a posição do Brasil em termos globais em relação à pauta ambiental?

O Brasil raramente está no centro dos acontecimentos. Agora nós estamos no centro dos acontecimentos na questão do meio ambiente, da mudança do clima, na questão da transição energética, e na questão da segurança alimentar, que tem a ver com o clima também. O Brasil tem uma posição hoje de poder assumir esse debate. Acho que a posição do Brasil é muito forte, é a prioridade. O presidente declarou isso quando assumiu que a mudança do clima, a transição energética, a segurança alimentar, eram prioridades do governo. Eu vejo o Brasil como uma função muito ativa. Agora, a reunião do G20 e a reunião da COP-30 ano que vem mostram a importância que esses temas têm para a política econômica e a política externa do Brasil.

É possível afirmar que o Brasil é o grande líder do Sul Global nesta pauta?

Eu não disse que o Brasil era um líder global, falei que esses temas eram prioritários para o Brasil. O Brasil deveria ser (líder), mas nós não somos, porque não temos políticas efetivas nessas áreas. A Europa tem uma posição muito mais ativa do que o Brasil, por exemplo, em relação ao meio ambiente. Todos os países europeus têm uma posição de líderes realmente.

Agora, no Brasil, acho que falta definir prioridades dentro dessas áreas. Você tem problemas políticos, de organização interna, aqui no Brasil, e uma falha na (percepção da) necessidade de o Brasil assumir a liderança, porque esses temas são muito importantes por causa da Amazônia, da produção agrícola, da matriz limpa. O País teria uma posição importante, se tivesse uma visão clara dos objetivos e dos interesses que tem nessas áreas. O Brasil não tem interesses muito claros, apesar de ter retórica.

A gente não tem objetivos claros para defesa dos interesses brasileiros. A gente está evitando uma série de políticas. Não regulamenta o mercado de carbono, a transição energética está muito dúbia. E a coisa mais flagrante é a irritação de que a gente não tem ainda quem vai coordenar a COP-30. Estamos quase no fim do ano e não tem ninguém para assumir esse lugar. Há uma hesitação do governo nessas três áreas que impede que o Brasil efetivamente ocupe uma posição de liderança no mundo.

Bombeiros tentam conter o fogo no Pantanal; queimadas prejudicam a posição do Brasil na COP. Foto: CBM-MS

O senhor mencionou a falta de indicação da presidência da COP-30. Como essa lacuna pode influenciar as discussões na COP-29?

Devia ter nomeado já. A COP-29, no Azerbaijão, vai discutir a questão do financiamento. Se não resolver lá, esse assunto vai ser transferido aqui para o Brasil e vai ser o mote. Em Cali (na COP da Biodiversidade), a questão do financiamento também não foi resolvida. A ausência de uma autoridade brasileira para ser responsável pela coordenação disso tudo enfraquece a posição do Brasil. O presidente não foi em Cali, não vai no Azerbaijão, são problemas que influem na percepção externa sobre a posição do Brasil.

O governo tem um discurso dúbio em relação ao petróleo. Isso prejudica nas negociações climáticas?

Acho que não prejudica em nada. O Brasil deveria defender seu interesse nisso. A França tem uma posição muito forte no meio ambiente e ela está explorando o petróleo nessa região. Os americanos com a Shell, os ingleses estão explorando na Guiana. A Noruega explora petróleo lá no Mar do Norte. Há um discurso e há uma prática. A prática é diferente da retórica no mundo inteiro. Não adianta o Brasil querer tomar uma posição muito dura em tudo sem ver qual é o nosso interesse. Tem de ser feita uma análise do interesse brasileiro, balanceando o interesse da preservação do meio ambiente, da redução das emissões, e a questão dos combustíveis fósseis. A gente tem de ser realista. Não adianta defender uma posição abstrata quando o mundo inteiro está em outra. A Noruega explora o petróleo, faz um fundo e apoia soluções de meio ambiente. Aqui a gente pode fazer a mesma coisa.

Como a vitória de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos pode impactar nas negociações climáticas?

Vai ser muito complicada essa parte de mudança do clima, meio ambiente, transição energética. Essa discussão vai perder prioridade nos Estados Unidos. O Trump é a favor da exploração de petróleo, do gás. Já no primeiro mandato não deu importância (à questão ambiental), saiu do Acordo de Paris. Isso pode se refletir até na reunião do ano que vem aqui no Brasil, mas está um pouco cedo para fazer prognósticos.

O Brasil negocia em bloco na COP, muitas vezes com países como China e Índia. Como garantir os interesses desses grupos e ao mesmo tempo ter uma postura em defesa do meio ambiente?

O Brasil tem de defender seus interesses independentemente desses blocos e desses países. Todo mundo hoje defende o seu próprio interesse. Esse tema não entra muito nos BRICs (Bloco economias emergentes, como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) até porque a China é o maior poluidor e o Brasil, por causa das queimadas na Amazônia, está sendo um grande emissor também.

A questão das queimadas pode fragilizar o Brasil nas discussões da COP-29?

Não, mas o Brasil vai ser criticado por isso. As queimadas não só no bioma amazônico, mas no Pantanal, foram algo muito ruim para o Brasil às vésperas da COP.

Isso pode dificultar a obtenção de financiamento?

Acho que não. Acho que a gente tem de insistir nisso. É uma pauta que está lá e, se não resolver no Azerbaijão, o risco que a gente corre é que a COP do Brasil seja limitada a esse programa: Amazônia e financiamento, que não é a agenda da COP. O Brasil tem uma agenda muito maior.

Entrevista por Paula Ferreira

Repórter de políticas públicas em Brasília, atua na cobertura de temas relacionados a Educação, Meio Ambiente, Saúde e Segurança. Graduada em jornalismo e mestre em comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), foi vencedora do Prêmio Esso 2015 na categoria "Educação". Trabalhou no jornal O Globo, SBT e Band.

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