Chuva em São Sebastião: Como Japão, EUA e outros lugares do Brasil reagem a alertas de desastres?


Especialistas dizem, no entanto, que é preciso ter um plano de contingência, que aponte rotas de fuga seguras e locais de abrigo para a população, além de treinamentos regulares

Por Roberta Jansen
Atualização:

RIO - Tragédias como a de São Sebastião, litoral norte paulista, reforçam a importância de ter sistemas de resposta a alertas de desastres naturais, como de chuva forte. Para especialistas ouvidos pelo Estadão, sistemas de alarmes são uma medida indicada para áreas com alto risco de deslizamentos de terra. O modelo, dizem, não é solução definitiva, mas pode salvar vidas quando há um desastre como o do carnaval, que teve 65 mortos. Precisa vir acompanhado de outras estratégias, como definir rotas de fuga, treinar moradores, avisos em celulares, informes na mídia e ofertar abrigos para quem precisa deixar a casa às pressas.

Sirenes instaladas em comunidades do Rio desde 2011 – quando tragédia semelhante na Região Serrana deixou mais de mil mortos – vêm salvando vidas, conforme especialistas. Apesar de eventuais revezes do sistema de alarme (como avisos cujo eventos climáticos não são tão fortes quanto o previsto), ele é o mais usado internacionalmente quando é preciso alertar o maior número possível de pessoas rapidamente sobre uma ameaça iminente - seja ela natural ou não. São sirenes, por exemplo, que alertam a população da Ucrânia para bombardeios russos e indicam o momento de procurar abrigo.

No Rio, as sirenes nas comunidades em áreas de risco de deslizamento são acionadas pelo Centro de Operações Rio (COR) – órgão da prefeitura que monitora a cidade e integra ações para reduzir impactos de ocorrências como chuvas fortes, desabamentos, enchentes, incêndios. No COR é possível acompanhar o volume de chuva e o ponto em que determinadas encostas podem se tornar instáveis. Mas apenas soar a campainha não resolve.

“Não adianta acionar a sirene se as pessoas não sabem o que fazer”, diz Paulo Canedo, professor da Engenharia da Coppe, da Universidade Federal do Rio (UFRJ). “É preciso ter um plano de contingência para evacuação que indique, por exemplo, quem sai primeiro, para onde as pessoas vão, quem vai subir para salvar os idosos que não conseguem descer sozinhos, tudo isso. É muito complexo fazer plano de contingência.”

Após tragédia no litoral norte, governo de SP prometeu sirenes em áreas de risco Foto: Andre Penner/AP

Nos Estados Unidos e no Japão, por exemplo, os planos de contingência para tsunamis e furacões envolvem várias etapas de alerta – via mídia, mensagens de celular – até o acionamento das sirenes e de veículos que circulam com mensagens de som. Há também treinamentos regulares, com rotas de fuga estabelecidas.

Para os casos de temporais fortes, por exemplo, a Agência Meteorológica japonesa estabelece cinco níveis de alerta para a população. No nível três, idosos e moradores com deficiência já são orientados a sair da zona de perigo, justamente por levarem mais tempo para se deslocar. A evacuação de todos é recomendada só a partir do nível quatro.

Com alto risco de terremotos e ondas gigantes, no Japão o treinamento de respostas a desastres integra até currículos escolares. Um caso, conhecido como Milagre de Kamaishi, virou referência após alunos de uma escola na área costeira sobreviverem ao tsunami de 2011 justamente porque sabiam como agir.

Nos últimos anos, Alemanha e França também têm reformulado seu sistema de alerta, com sirenes e mensagens de celular. Na Cúpula do Clima no Egito, em 2022, as Nações Unidas anunciaram plano de reunir US$ 3,1 bilhões (R$ 16,1 bilhões) para que todo o planeta tenha cobertura de sistema de alerta até 2027. É caro, mas a Comissão Global de Adaptação calcula que US$ 800 milhões (R$ 4,2 bilhões) para países em desenvolvimento evitam prejuízo de até US$ 16 bilhões (R$ 83,4 bilhões) ao ano.

Acreditar no alarme

Outros problemas recorrentes são tomar a decisão de acionar a sirene e acreditar na sirene. “O prefeito, às vezes, pode ter dificuldade de acionar a sirene. Acontece de a sirene ser acionada, todo mundo sair de casa e, no fim, a chuva nem ser muito grande. Ai todo mundo xinga o prefeito”, pondera Canedo. “Outro problema é (fazer) a população acreditar na sirene e sair de casa. "

Líderes comunitários também podem acionar sirenes localmente. Em alguns lugares, são usados pluviômetros caseiros, feitos com garrafas PET, marcador barato e eficiente para estimar o volume de água e os riscos imediatos. Algumas lideranças também usam apitos para alertar os moradores e têm até grupos previamente treinados para resgatar aqueles com dificuldades de locomoção.

“Um plano de contingência precisa ser construído com calma, não com chuva caindo”, diz Marcelo Seluchi, do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden). “É preciso ter bom mapeamento das áreas de risco, rotas de fuga, saber onde estão os abrigos. É importante que a população saiba qual a rota de fuga mais próxima, para onde ir, fazer simulados, e saber qual o momento de abandonar as casas. Vai ter sirene, SMS, gente batendo na porta?”

O Cemaden monitora nacionalmente níveis de chuva e riscos de deslizamento e também envia alertas às Defesas Civis locais. Sobre São Sebastião, o órgão federal diz ter enviado alerta à Defesa Civil paulista mais de 24 horas antes. A precipitação, porém, foi subestimada: a previsão era entre 200 e 250 milímetros, e foram mais de 600 mm.

Esse é outro problema. As previsões do tempo e dos desastres naturais se baseiam em monitoramento de dados, usando séries históricas. Com a aceleração das mudanças climáticas, olhar para o comportamento da natureza do passado tem ajudado menos a prever o futuro.

A Defesa Civil paulista, por sua vez, afirma ter feito os alertas nas redes sociais, na mídia e também por meio de mensagens no celular. O número de aparelhos cadastrados no litoral norte, segundo o governo, é de 34 mil. O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) reconheceu, porém, que os alertas não foram efetivos e prometeu instalar sirenes em pontos críticos para chuvas.

Ocupação irregular torna as áreas vulneráveis às quedas de barreira Foto: Andre Penner / AP

O Rio também envia mensagens pelo celular para moradores de áreas de risco. E o COR faz alertas gerais, por meio da imprensa, sobre condições meteorológicas e eventuais riscos, além de mobilizar equipes dos Bombeiros.

Em Campos do Jordão (SP), equipes da Defesa Civil vão para as ruas preventivamente em caso de chuva forte fazer rondas. Caso constatem algum sinal de deslizamento iminente, a própria equipe bate de porta em porta, alertando moradores. É uma estratégia difícil, no entanto, de ser aplicada em cidades maiores ou em bairros de difícil acesso. “Cada município tem suas especificidades”, destaca Seluchi, do Cemaden. “As autoridades municipais é que têm de criar um plano de contingência e revisá-lo frequentemente.”

Especialistas concordam, no entanto, que tais medidas são emergenciais. Eficientes para evitar tragédias ainda mais dramáticas, mas distantes de ser a solução ideal. “Sirene serve para o lugar indevidamente ocupado, onde a coisa saiu do controle. Ou morre todo mundo ou põe uma sirene”, diz Canedo, especialista em recursos hídricos da Coppe-UFRJ. “Mas que tal não precisar ter sirene, tirar pessoas das áreas de risco? Ao menos não deixar novas comunidades nessas áreas?”

Historicamente, o Brasil não teve grande plano habitacional estruturado para a população mais pobre. O resultado é que esses grupos ocupam irregularmente as áreas mais desvalorizadas, entre elas, as encostas. Segundo especialistas, a melhor solução para o problema seria realocar tais pessoas ou, pelo menos, impedir que mais comunidades se criem em áreas de risco. Até porque, com o aquecimento global, eventos extremos, como a chuva de São Sebastião, ficarão cada vez mais frequentes.

Em Petrópolis, há um ano, encostas também rolaram Foto: Wilton Júnior/Estadão

Realocar famílias é possível?

A prefeitura de Maricá, no Rio, por exemplo, está tentando realocar as pessoas que vivem em regiões vulneráveis. Recentemente, anunciou a compra de imóveis desocupados na cidade para os moradores. Um “aluguel social” também é uma estratégia que pode ser adotada.

As encostas, naturalmente áreas de risco ficam ainda mais perigosas com o desmate e o lançamento de esgoto in natura no terreno. Medidas de reflorestamento e saneamento básico ajudam a reduzir riscos, dizem, além de construção de contenções. Em Recife, a prefeitura dá material de construção e apoio técnico para que os próprios moradores façam reparos contra deslizamentos.

“Cada litro de água de chuva infiltrado na encosta equivale a uma massa adicional de um quilo. Além disso, a chuva reduz a resistência do solo. Quando chove muito, temos redução da resistência e aumento da carga”, explica Mauricio Ehrlich, professor de Engenharia Civil da Coppe/UFRJ, especializado em geotecnia. “Uma coisa objetiva a ser feita é drenar a água, fazer canaletas, para minimizar o impacto. Evitar a erosão do solo também ajuda a água a descer mais devagar.

RIO - Tragédias como a de São Sebastião, litoral norte paulista, reforçam a importância de ter sistemas de resposta a alertas de desastres naturais, como de chuva forte. Para especialistas ouvidos pelo Estadão, sistemas de alarmes são uma medida indicada para áreas com alto risco de deslizamentos de terra. O modelo, dizem, não é solução definitiva, mas pode salvar vidas quando há um desastre como o do carnaval, que teve 65 mortos. Precisa vir acompanhado de outras estratégias, como definir rotas de fuga, treinar moradores, avisos em celulares, informes na mídia e ofertar abrigos para quem precisa deixar a casa às pressas.

Sirenes instaladas em comunidades do Rio desde 2011 – quando tragédia semelhante na Região Serrana deixou mais de mil mortos – vêm salvando vidas, conforme especialistas. Apesar de eventuais revezes do sistema de alarme (como avisos cujo eventos climáticos não são tão fortes quanto o previsto), ele é o mais usado internacionalmente quando é preciso alertar o maior número possível de pessoas rapidamente sobre uma ameaça iminente - seja ela natural ou não. São sirenes, por exemplo, que alertam a população da Ucrânia para bombardeios russos e indicam o momento de procurar abrigo.

No Rio, as sirenes nas comunidades em áreas de risco de deslizamento são acionadas pelo Centro de Operações Rio (COR) – órgão da prefeitura que monitora a cidade e integra ações para reduzir impactos de ocorrências como chuvas fortes, desabamentos, enchentes, incêndios. No COR é possível acompanhar o volume de chuva e o ponto em que determinadas encostas podem se tornar instáveis. Mas apenas soar a campainha não resolve.

“Não adianta acionar a sirene se as pessoas não sabem o que fazer”, diz Paulo Canedo, professor da Engenharia da Coppe, da Universidade Federal do Rio (UFRJ). “É preciso ter um plano de contingência para evacuação que indique, por exemplo, quem sai primeiro, para onde as pessoas vão, quem vai subir para salvar os idosos que não conseguem descer sozinhos, tudo isso. É muito complexo fazer plano de contingência.”

Após tragédia no litoral norte, governo de SP prometeu sirenes em áreas de risco Foto: Andre Penner/AP

Nos Estados Unidos e no Japão, por exemplo, os planos de contingência para tsunamis e furacões envolvem várias etapas de alerta – via mídia, mensagens de celular – até o acionamento das sirenes e de veículos que circulam com mensagens de som. Há também treinamentos regulares, com rotas de fuga estabelecidas.

Para os casos de temporais fortes, por exemplo, a Agência Meteorológica japonesa estabelece cinco níveis de alerta para a população. No nível três, idosos e moradores com deficiência já são orientados a sair da zona de perigo, justamente por levarem mais tempo para se deslocar. A evacuação de todos é recomendada só a partir do nível quatro.

Com alto risco de terremotos e ondas gigantes, no Japão o treinamento de respostas a desastres integra até currículos escolares. Um caso, conhecido como Milagre de Kamaishi, virou referência após alunos de uma escola na área costeira sobreviverem ao tsunami de 2011 justamente porque sabiam como agir.

Nos últimos anos, Alemanha e França também têm reformulado seu sistema de alerta, com sirenes e mensagens de celular. Na Cúpula do Clima no Egito, em 2022, as Nações Unidas anunciaram plano de reunir US$ 3,1 bilhões (R$ 16,1 bilhões) para que todo o planeta tenha cobertura de sistema de alerta até 2027. É caro, mas a Comissão Global de Adaptação calcula que US$ 800 milhões (R$ 4,2 bilhões) para países em desenvolvimento evitam prejuízo de até US$ 16 bilhões (R$ 83,4 bilhões) ao ano.

Acreditar no alarme

Outros problemas recorrentes são tomar a decisão de acionar a sirene e acreditar na sirene. “O prefeito, às vezes, pode ter dificuldade de acionar a sirene. Acontece de a sirene ser acionada, todo mundo sair de casa e, no fim, a chuva nem ser muito grande. Ai todo mundo xinga o prefeito”, pondera Canedo. “Outro problema é (fazer) a população acreditar na sirene e sair de casa. "

Líderes comunitários também podem acionar sirenes localmente. Em alguns lugares, são usados pluviômetros caseiros, feitos com garrafas PET, marcador barato e eficiente para estimar o volume de água e os riscos imediatos. Algumas lideranças também usam apitos para alertar os moradores e têm até grupos previamente treinados para resgatar aqueles com dificuldades de locomoção.

“Um plano de contingência precisa ser construído com calma, não com chuva caindo”, diz Marcelo Seluchi, do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden). “É preciso ter bom mapeamento das áreas de risco, rotas de fuga, saber onde estão os abrigos. É importante que a população saiba qual a rota de fuga mais próxima, para onde ir, fazer simulados, e saber qual o momento de abandonar as casas. Vai ter sirene, SMS, gente batendo na porta?”

O Cemaden monitora nacionalmente níveis de chuva e riscos de deslizamento e também envia alertas às Defesas Civis locais. Sobre São Sebastião, o órgão federal diz ter enviado alerta à Defesa Civil paulista mais de 24 horas antes. A precipitação, porém, foi subestimada: a previsão era entre 200 e 250 milímetros, e foram mais de 600 mm.

Esse é outro problema. As previsões do tempo e dos desastres naturais se baseiam em monitoramento de dados, usando séries históricas. Com a aceleração das mudanças climáticas, olhar para o comportamento da natureza do passado tem ajudado menos a prever o futuro.

A Defesa Civil paulista, por sua vez, afirma ter feito os alertas nas redes sociais, na mídia e também por meio de mensagens no celular. O número de aparelhos cadastrados no litoral norte, segundo o governo, é de 34 mil. O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) reconheceu, porém, que os alertas não foram efetivos e prometeu instalar sirenes em pontos críticos para chuvas.

Ocupação irregular torna as áreas vulneráveis às quedas de barreira Foto: Andre Penner / AP

O Rio também envia mensagens pelo celular para moradores de áreas de risco. E o COR faz alertas gerais, por meio da imprensa, sobre condições meteorológicas e eventuais riscos, além de mobilizar equipes dos Bombeiros.

Em Campos do Jordão (SP), equipes da Defesa Civil vão para as ruas preventivamente em caso de chuva forte fazer rondas. Caso constatem algum sinal de deslizamento iminente, a própria equipe bate de porta em porta, alertando moradores. É uma estratégia difícil, no entanto, de ser aplicada em cidades maiores ou em bairros de difícil acesso. “Cada município tem suas especificidades”, destaca Seluchi, do Cemaden. “As autoridades municipais é que têm de criar um plano de contingência e revisá-lo frequentemente.”

Especialistas concordam, no entanto, que tais medidas são emergenciais. Eficientes para evitar tragédias ainda mais dramáticas, mas distantes de ser a solução ideal. “Sirene serve para o lugar indevidamente ocupado, onde a coisa saiu do controle. Ou morre todo mundo ou põe uma sirene”, diz Canedo, especialista em recursos hídricos da Coppe-UFRJ. “Mas que tal não precisar ter sirene, tirar pessoas das áreas de risco? Ao menos não deixar novas comunidades nessas áreas?”

Historicamente, o Brasil não teve grande plano habitacional estruturado para a população mais pobre. O resultado é que esses grupos ocupam irregularmente as áreas mais desvalorizadas, entre elas, as encostas. Segundo especialistas, a melhor solução para o problema seria realocar tais pessoas ou, pelo menos, impedir que mais comunidades se criem em áreas de risco. Até porque, com o aquecimento global, eventos extremos, como a chuva de São Sebastião, ficarão cada vez mais frequentes.

Em Petrópolis, há um ano, encostas também rolaram Foto: Wilton Júnior/Estadão

Realocar famílias é possível?

A prefeitura de Maricá, no Rio, por exemplo, está tentando realocar as pessoas que vivem em regiões vulneráveis. Recentemente, anunciou a compra de imóveis desocupados na cidade para os moradores. Um “aluguel social” também é uma estratégia que pode ser adotada.

As encostas, naturalmente áreas de risco ficam ainda mais perigosas com o desmate e o lançamento de esgoto in natura no terreno. Medidas de reflorestamento e saneamento básico ajudam a reduzir riscos, dizem, além de construção de contenções. Em Recife, a prefeitura dá material de construção e apoio técnico para que os próprios moradores façam reparos contra deslizamentos.

“Cada litro de água de chuva infiltrado na encosta equivale a uma massa adicional de um quilo. Além disso, a chuva reduz a resistência do solo. Quando chove muito, temos redução da resistência e aumento da carga”, explica Mauricio Ehrlich, professor de Engenharia Civil da Coppe/UFRJ, especializado em geotecnia. “Uma coisa objetiva a ser feita é drenar a água, fazer canaletas, para minimizar o impacto. Evitar a erosão do solo também ajuda a água a descer mais devagar.

RIO - Tragédias como a de São Sebastião, litoral norte paulista, reforçam a importância de ter sistemas de resposta a alertas de desastres naturais, como de chuva forte. Para especialistas ouvidos pelo Estadão, sistemas de alarmes são uma medida indicada para áreas com alto risco de deslizamentos de terra. O modelo, dizem, não é solução definitiva, mas pode salvar vidas quando há um desastre como o do carnaval, que teve 65 mortos. Precisa vir acompanhado de outras estratégias, como definir rotas de fuga, treinar moradores, avisos em celulares, informes na mídia e ofertar abrigos para quem precisa deixar a casa às pressas.

Sirenes instaladas em comunidades do Rio desde 2011 – quando tragédia semelhante na Região Serrana deixou mais de mil mortos – vêm salvando vidas, conforme especialistas. Apesar de eventuais revezes do sistema de alarme (como avisos cujo eventos climáticos não são tão fortes quanto o previsto), ele é o mais usado internacionalmente quando é preciso alertar o maior número possível de pessoas rapidamente sobre uma ameaça iminente - seja ela natural ou não. São sirenes, por exemplo, que alertam a população da Ucrânia para bombardeios russos e indicam o momento de procurar abrigo.

No Rio, as sirenes nas comunidades em áreas de risco de deslizamento são acionadas pelo Centro de Operações Rio (COR) – órgão da prefeitura que monitora a cidade e integra ações para reduzir impactos de ocorrências como chuvas fortes, desabamentos, enchentes, incêndios. No COR é possível acompanhar o volume de chuva e o ponto em que determinadas encostas podem se tornar instáveis. Mas apenas soar a campainha não resolve.

“Não adianta acionar a sirene se as pessoas não sabem o que fazer”, diz Paulo Canedo, professor da Engenharia da Coppe, da Universidade Federal do Rio (UFRJ). “É preciso ter um plano de contingência para evacuação que indique, por exemplo, quem sai primeiro, para onde as pessoas vão, quem vai subir para salvar os idosos que não conseguem descer sozinhos, tudo isso. É muito complexo fazer plano de contingência.”

Após tragédia no litoral norte, governo de SP prometeu sirenes em áreas de risco Foto: Andre Penner/AP

Nos Estados Unidos e no Japão, por exemplo, os planos de contingência para tsunamis e furacões envolvem várias etapas de alerta – via mídia, mensagens de celular – até o acionamento das sirenes e de veículos que circulam com mensagens de som. Há também treinamentos regulares, com rotas de fuga estabelecidas.

Para os casos de temporais fortes, por exemplo, a Agência Meteorológica japonesa estabelece cinco níveis de alerta para a população. No nível três, idosos e moradores com deficiência já são orientados a sair da zona de perigo, justamente por levarem mais tempo para se deslocar. A evacuação de todos é recomendada só a partir do nível quatro.

Com alto risco de terremotos e ondas gigantes, no Japão o treinamento de respostas a desastres integra até currículos escolares. Um caso, conhecido como Milagre de Kamaishi, virou referência após alunos de uma escola na área costeira sobreviverem ao tsunami de 2011 justamente porque sabiam como agir.

Nos últimos anos, Alemanha e França também têm reformulado seu sistema de alerta, com sirenes e mensagens de celular. Na Cúpula do Clima no Egito, em 2022, as Nações Unidas anunciaram plano de reunir US$ 3,1 bilhões (R$ 16,1 bilhões) para que todo o planeta tenha cobertura de sistema de alerta até 2027. É caro, mas a Comissão Global de Adaptação calcula que US$ 800 milhões (R$ 4,2 bilhões) para países em desenvolvimento evitam prejuízo de até US$ 16 bilhões (R$ 83,4 bilhões) ao ano.

Acreditar no alarme

Outros problemas recorrentes são tomar a decisão de acionar a sirene e acreditar na sirene. “O prefeito, às vezes, pode ter dificuldade de acionar a sirene. Acontece de a sirene ser acionada, todo mundo sair de casa e, no fim, a chuva nem ser muito grande. Ai todo mundo xinga o prefeito”, pondera Canedo. “Outro problema é (fazer) a população acreditar na sirene e sair de casa. "

Líderes comunitários também podem acionar sirenes localmente. Em alguns lugares, são usados pluviômetros caseiros, feitos com garrafas PET, marcador barato e eficiente para estimar o volume de água e os riscos imediatos. Algumas lideranças também usam apitos para alertar os moradores e têm até grupos previamente treinados para resgatar aqueles com dificuldades de locomoção.

“Um plano de contingência precisa ser construído com calma, não com chuva caindo”, diz Marcelo Seluchi, do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden). “É preciso ter bom mapeamento das áreas de risco, rotas de fuga, saber onde estão os abrigos. É importante que a população saiba qual a rota de fuga mais próxima, para onde ir, fazer simulados, e saber qual o momento de abandonar as casas. Vai ter sirene, SMS, gente batendo na porta?”

O Cemaden monitora nacionalmente níveis de chuva e riscos de deslizamento e também envia alertas às Defesas Civis locais. Sobre São Sebastião, o órgão federal diz ter enviado alerta à Defesa Civil paulista mais de 24 horas antes. A precipitação, porém, foi subestimada: a previsão era entre 200 e 250 milímetros, e foram mais de 600 mm.

Esse é outro problema. As previsões do tempo e dos desastres naturais se baseiam em monitoramento de dados, usando séries históricas. Com a aceleração das mudanças climáticas, olhar para o comportamento da natureza do passado tem ajudado menos a prever o futuro.

A Defesa Civil paulista, por sua vez, afirma ter feito os alertas nas redes sociais, na mídia e também por meio de mensagens no celular. O número de aparelhos cadastrados no litoral norte, segundo o governo, é de 34 mil. O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) reconheceu, porém, que os alertas não foram efetivos e prometeu instalar sirenes em pontos críticos para chuvas.

Ocupação irregular torna as áreas vulneráveis às quedas de barreira Foto: Andre Penner / AP

O Rio também envia mensagens pelo celular para moradores de áreas de risco. E o COR faz alertas gerais, por meio da imprensa, sobre condições meteorológicas e eventuais riscos, além de mobilizar equipes dos Bombeiros.

Em Campos do Jordão (SP), equipes da Defesa Civil vão para as ruas preventivamente em caso de chuva forte fazer rondas. Caso constatem algum sinal de deslizamento iminente, a própria equipe bate de porta em porta, alertando moradores. É uma estratégia difícil, no entanto, de ser aplicada em cidades maiores ou em bairros de difícil acesso. “Cada município tem suas especificidades”, destaca Seluchi, do Cemaden. “As autoridades municipais é que têm de criar um plano de contingência e revisá-lo frequentemente.”

Especialistas concordam, no entanto, que tais medidas são emergenciais. Eficientes para evitar tragédias ainda mais dramáticas, mas distantes de ser a solução ideal. “Sirene serve para o lugar indevidamente ocupado, onde a coisa saiu do controle. Ou morre todo mundo ou põe uma sirene”, diz Canedo, especialista em recursos hídricos da Coppe-UFRJ. “Mas que tal não precisar ter sirene, tirar pessoas das áreas de risco? Ao menos não deixar novas comunidades nessas áreas?”

Historicamente, o Brasil não teve grande plano habitacional estruturado para a população mais pobre. O resultado é que esses grupos ocupam irregularmente as áreas mais desvalorizadas, entre elas, as encostas. Segundo especialistas, a melhor solução para o problema seria realocar tais pessoas ou, pelo menos, impedir que mais comunidades se criem em áreas de risco. Até porque, com o aquecimento global, eventos extremos, como a chuva de São Sebastião, ficarão cada vez mais frequentes.

Em Petrópolis, há um ano, encostas também rolaram Foto: Wilton Júnior/Estadão

Realocar famílias é possível?

A prefeitura de Maricá, no Rio, por exemplo, está tentando realocar as pessoas que vivem em regiões vulneráveis. Recentemente, anunciou a compra de imóveis desocupados na cidade para os moradores. Um “aluguel social” também é uma estratégia que pode ser adotada.

As encostas, naturalmente áreas de risco ficam ainda mais perigosas com o desmate e o lançamento de esgoto in natura no terreno. Medidas de reflorestamento e saneamento básico ajudam a reduzir riscos, dizem, além de construção de contenções. Em Recife, a prefeitura dá material de construção e apoio técnico para que os próprios moradores façam reparos contra deslizamentos.

“Cada litro de água de chuva infiltrado na encosta equivale a uma massa adicional de um quilo. Além disso, a chuva reduz a resistência do solo. Quando chove muito, temos redução da resistência e aumento da carga”, explica Mauricio Ehrlich, professor de Engenharia Civil da Coppe/UFRJ, especializado em geotecnia. “Uma coisa objetiva a ser feita é drenar a água, fazer canaletas, para minimizar o impacto. Evitar a erosão do solo também ajuda a água a descer mais devagar.

RIO - Tragédias como a de São Sebastião, litoral norte paulista, reforçam a importância de ter sistemas de resposta a alertas de desastres naturais, como de chuva forte. Para especialistas ouvidos pelo Estadão, sistemas de alarmes são uma medida indicada para áreas com alto risco de deslizamentos de terra. O modelo, dizem, não é solução definitiva, mas pode salvar vidas quando há um desastre como o do carnaval, que teve 65 mortos. Precisa vir acompanhado de outras estratégias, como definir rotas de fuga, treinar moradores, avisos em celulares, informes na mídia e ofertar abrigos para quem precisa deixar a casa às pressas.

Sirenes instaladas em comunidades do Rio desde 2011 – quando tragédia semelhante na Região Serrana deixou mais de mil mortos – vêm salvando vidas, conforme especialistas. Apesar de eventuais revezes do sistema de alarme (como avisos cujo eventos climáticos não são tão fortes quanto o previsto), ele é o mais usado internacionalmente quando é preciso alertar o maior número possível de pessoas rapidamente sobre uma ameaça iminente - seja ela natural ou não. São sirenes, por exemplo, que alertam a população da Ucrânia para bombardeios russos e indicam o momento de procurar abrigo.

No Rio, as sirenes nas comunidades em áreas de risco de deslizamento são acionadas pelo Centro de Operações Rio (COR) – órgão da prefeitura que monitora a cidade e integra ações para reduzir impactos de ocorrências como chuvas fortes, desabamentos, enchentes, incêndios. No COR é possível acompanhar o volume de chuva e o ponto em que determinadas encostas podem se tornar instáveis. Mas apenas soar a campainha não resolve.

“Não adianta acionar a sirene se as pessoas não sabem o que fazer”, diz Paulo Canedo, professor da Engenharia da Coppe, da Universidade Federal do Rio (UFRJ). “É preciso ter um plano de contingência para evacuação que indique, por exemplo, quem sai primeiro, para onde as pessoas vão, quem vai subir para salvar os idosos que não conseguem descer sozinhos, tudo isso. É muito complexo fazer plano de contingência.”

Após tragédia no litoral norte, governo de SP prometeu sirenes em áreas de risco Foto: Andre Penner/AP

Nos Estados Unidos e no Japão, por exemplo, os planos de contingência para tsunamis e furacões envolvem várias etapas de alerta – via mídia, mensagens de celular – até o acionamento das sirenes e de veículos que circulam com mensagens de som. Há também treinamentos regulares, com rotas de fuga estabelecidas.

Para os casos de temporais fortes, por exemplo, a Agência Meteorológica japonesa estabelece cinco níveis de alerta para a população. No nível três, idosos e moradores com deficiência já são orientados a sair da zona de perigo, justamente por levarem mais tempo para se deslocar. A evacuação de todos é recomendada só a partir do nível quatro.

Com alto risco de terremotos e ondas gigantes, no Japão o treinamento de respostas a desastres integra até currículos escolares. Um caso, conhecido como Milagre de Kamaishi, virou referência após alunos de uma escola na área costeira sobreviverem ao tsunami de 2011 justamente porque sabiam como agir.

Nos últimos anos, Alemanha e França também têm reformulado seu sistema de alerta, com sirenes e mensagens de celular. Na Cúpula do Clima no Egito, em 2022, as Nações Unidas anunciaram plano de reunir US$ 3,1 bilhões (R$ 16,1 bilhões) para que todo o planeta tenha cobertura de sistema de alerta até 2027. É caro, mas a Comissão Global de Adaptação calcula que US$ 800 milhões (R$ 4,2 bilhões) para países em desenvolvimento evitam prejuízo de até US$ 16 bilhões (R$ 83,4 bilhões) ao ano.

Acreditar no alarme

Outros problemas recorrentes são tomar a decisão de acionar a sirene e acreditar na sirene. “O prefeito, às vezes, pode ter dificuldade de acionar a sirene. Acontece de a sirene ser acionada, todo mundo sair de casa e, no fim, a chuva nem ser muito grande. Ai todo mundo xinga o prefeito”, pondera Canedo. “Outro problema é (fazer) a população acreditar na sirene e sair de casa. "

Líderes comunitários também podem acionar sirenes localmente. Em alguns lugares, são usados pluviômetros caseiros, feitos com garrafas PET, marcador barato e eficiente para estimar o volume de água e os riscos imediatos. Algumas lideranças também usam apitos para alertar os moradores e têm até grupos previamente treinados para resgatar aqueles com dificuldades de locomoção.

“Um plano de contingência precisa ser construído com calma, não com chuva caindo”, diz Marcelo Seluchi, do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden). “É preciso ter bom mapeamento das áreas de risco, rotas de fuga, saber onde estão os abrigos. É importante que a população saiba qual a rota de fuga mais próxima, para onde ir, fazer simulados, e saber qual o momento de abandonar as casas. Vai ter sirene, SMS, gente batendo na porta?”

O Cemaden monitora nacionalmente níveis de chuva e riscos de deslizamento e também envia alertas às Defesas Civis locais. Sobre São Sebastião, o órgão federal diz ter enviado alerta à Defesa Civil paulista mais de 24 horas antes. A precipitação, porém, foi subestimada: a previsão era entre 200 e 250 milímetros, e foram mais de 600 mm.

Esse é outro problema. As previsões do tempo e dos desastres naturais se baseiam em monitoramento de dados, usando séries históricas. Com a aceleração das mudanças climáticas, olhar para o comportamento da natureza do passado tem ajudado menos a prever o futuro.

A Defesa Civil paulista, por sua vez, afirma ter feito os alertas nas redes sociais, na mídia e também por meio de mensagens no celular. O número de aparelhos cadastrados no litoral norte, segundo o governo, é de 34 mil. O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) reconheceu, porém, que os alertas não foram efetivos e prometeu instalar sirenes em pontos críticos para chuvas.

Ocupação irregular torna as áreas vulneráveis às quedas de barreira Foto: Andre Penner / AP

O Rio também envia mensagens pelo celular para moradores de áreas de risco. E o COR faz alertas gerais, por meio da imprensa, sobre condições meteorológicas e eventuais riscos, além de mobilizar equipes dos Bombeiros.

Em Campos do Jordão (SP), equipes da Defesa Civil vão para as ruas preventivamente em caso de chuva forte fazer rondas. Caso constatem algum sinal de deslizamento iminente, a própria equipe bate de porta em porta, alertando moradores. É uma estratégia difícil, no entanto, de ser aplicada em cidades maiores ou em bairros de difícil acesso. “Cada município tem suas especificidades”, destaca Seluchi, do Cemaden. “As autoridades municipais é que têm de criar um plano de contingência e revisá-lo frequentemente.”

Especialistas concordam, no entanto, que tais medidas são emergenciais. Eficientes para evitar tragédias ainda mais dramáticas, mas distantes de ser a solução ideal. “Sirene serve para o lugar indevidamente ocupado, onde a coisa saiu do controle. Ou morre todo mundo ou põe uma sirene”, diz Canedo, especialista em recursos hídricos da Coppe-UFRJ. “Mas que tal não precisar ter sirene, tirar pessoas das áreas de risco? Ao menos não deixar novas comunidades nessas áreas?”

Historicamente, o Brasil não teve grande plano habitacional estruturado para a população mais pobre. O resultado é que esses grupos ocupam irregularmente as áreas mais desvalorizadas, entre elas, as encostas. Segundo especialistas, a melhor solução para o problema seria realocar tais pessoas ou, pelo menos, impedir que mais comunidades se criem em áreas de risco. Até porque, com o aquecimento global, eventos extremos, como a chuva de São Sebastião, ficarão cada vez mais frequentes.

Em Petrópolis, há um ano, encostas também rolaram Foto: Wilton Júnior/Estadão

Realocar famílias é possível?

A prefeitura de Maricá, no Rio, por exemplo, está tentando realocar as pessoas que vivem em regiões vulneráveis. Recentemente, anunciou a compra de imóveis desocupados na cidade para os moradores. Um “aluguel social” também é uma estratégia que pode ser adotada.

As encostas, naturalmente áreas de risco ficam ainda mais perigosas com o desmate e o lançamento de esgoto in natura no terreno. Medidas de reflorestamento e saneamento básico ajudam a reduzir riscos, dizem, além de construção de contenções. Em Recife, a prefeitura dá material de construção e apoio técnico para que os próprios moradores façam reparos contra deslizamentos.

“Cada litro de água de chuva infiltrado na encosta equivale a uma massa adicional de um quilo. Além disso, a chuva reduz a resistência do solo. Quando chove muito, temos redução da resistência e aumento da carga”, explica Mauricio Ehrlich, professor de Engenharia Civil da Coppe/UFRJ, especializado em geotecnia. “Uma coisa objetiva a ser feita é drenar a água, fazer canaletas, para minimizar o impacto. Evitar a erosão do solo também ajuda a água a descer mais devagar.

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