Colômbia quer plano progressivo para fim de exploração de petróleo na Amazônia


Ministra do Meio Ambiente, Susana Muhamad afirma que é importante colocar o tema em debate, mas compromisso final depende de presidentes

Por Paula Ferreira
Atualização:

A ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad, defendeu neste domingo, 6, um plano progressivo para pôr fim à exploração de petróleo na Amazônia. Ela afirmou que é importante iniciar a discussão sobre o tema para que os países discutam metas comuns, mas ponderou que a inclusão disso na declaração depende de um consenso entre os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).

Em entrevista durante a Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará, a ministra argumentou que a exploração do petróleo da região gera impactos graves, como a fragmentação dos ecossistemas e conflito com as comunidades amazônicas.

“O importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo tanto em Letícia (cidade colombiana onde foi assinado um pacto pela Amazônia em 2019) como aqui e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica”, disse.

Ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad Foto: Paula Ferreira

“É um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, mas porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.”

Muhamad argumentou que é preciso acelerar o processo de transição energética, mas de maneira que os países tenham segurança de fontes alternativas.

“Como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para obter um plano conjunto de não abrir mais bloco de petróleo na Amazônia pela necessidade de sustentar a integralidade ecológica?”, provocou.

A Colômbia tem defendido o fim da exploração de petróleo na Amazônia, mas encontra objeção de países membros da OTCA. O tema é espinhoso para o Brasil, que estuda perfurar um poço de petróleo na Foz do Amazonas. Mais cedo, a ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, afirmou neste domingo que o Brasil também tem metas ambientais ousadas, como o desmatamento zero, mas que as decisões precisam ser tomadas em consenso.

Floresta é tema de Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará Foto: Freepik

“Temos já dois presidentes que chegam aqui e os demais também com suas propostas, que trazem uma discussão muito contundente, muito forte nos seus países. Presidente Petro (da Colômbia) falando na não exploração de petróleo na Amazônia, e o presidente Lula falando a partir de consenso interno de desmatamento zero na Amazônia, o que é altamente ousado”, disse Marina.

“Mas, obviamente, que o presidente Lula não vai querer impor que os outros presidentes também digam que é desmatamento zero. É um processo de convencimento. Da mesma forma que os outros que têm outras propostas levantam suas propostas e buscam o convencimento. O multilateralismo é o consenso progressivo”.

Veja abaixo a conversa completa com a ministra, em que ela também fala sobre o Fundo Amazônia e uma possível negociação em bloco na COP-28:

A Colômbia defende que não haja exploração de petróleo na Amazônia, mas outros países não querem assumir esse compromisso. Há possibilidade de chegar a um meio termo?

Não poderia dizer como vai terminar, porque a negociação tem que ser ratificada pelos presidentes. Mas o importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo, tanto em Letícia como aqui, e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica. A integridade não é tanto para o tema das emissões de gases de efeito estufa, mas porque é um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao Norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.

Considera que é importante que a Declaração de Belém contenha alguma referência ao tema mesmo que não haja uma decisão concreta?

A Colômbia quer que o tema seja posto sobre a mesa, porque temos clareza que precisamos fazer um trabalho conjunto de acelerar a transição energética justa e esse processo é cheio de contradições. Entendemos também a necessidade de diferentes países, incluindo a Colômbia, de que essa transição energética seja segura, porque se não existe segurança energética o que podemos ter é um bumerangue de reação social frente à transição ecológica. Mas a reflexão que queremos colocar é sobre como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para conseguirmos um plano conjunto de não abrir mais blocos de petróleo na Amazônia devido à necessidade de sustentar a integralidade ecológica. Os cientistas estão dizendo que devemos preservar 80% da Amazônia íntegra para não chegar ao ponto de não retorno. É preciso fazer uma reflexão concreta e material do que isso significa e como pode afetar diferentes atividades econômicas, especialmente, o tema do petróleo.

Quando digo que seria uma mensagem muito poderosa ao Norte, é porque está claro que o acúmulo de gases do efeito estufa vem precisamente da industrialização do Norte. Há uma responsabilidade diferenciada, mas nós podemos começar a fechar fronteiras extrativistas. Essa uma mensagem muito poderosa, porque também há uma certa hipocrisia em querer compensar as emissões nas nossas florestas enquanto continuamos ampliando a fronteira extrativista. A que mundo isso vai nos levar? A política e os interesses econômicos tratam de mascarar essa realidade e por isso seria um exemplo. Mas entendemos também as dificuldades de uma transição energética justa. Usando uma metáfora da selva: Não podemos soltar um cipó e se não houver outro para segurar, podemos cair no abismo. Então entendo as dificuldades frente à responsabilidade da mitigação. Na Colômbia, assim como no Brasil, nossa principal fonte de emissões é o desmatamento, então para deter o desmatamento e a mudança da fronteira agrícola, é preciso ser claro: parte desse desmatamento veio do extrativismo, ou seja, da entrada de infraestrutura petroleira, de vias petroleiras nos projetos fomentados pelo próprio estado também geraram avenidas de desmate, então uma coisa não está separada da outra. E por isso buscamos colocar essa discussão e esperamos que ela pelo menos se inicie e seja formalizada para seguir acontecendo.

A senhora falou sobre a não proliferação de Petróleo na Amazônia. Mas existe uma posição do governo da Colômbia a respeito da disseminação da exploração de petróleo de modo geral?

Há uma posição de planejar a transição energética e ter as reservas necessárias para ter tempo de fazer a transição. O que buscamos é incentivar que todo o dinheiro de investimento estrangeiro, de orçamento nacional de Ciência e Tecnologia vá para a transição energética e possamos reduzir a necessidade de firmar novos contratos de exploração. Hoje temos um panorama onde pode haver reservas em processo de ser provadas que podem ajudar nesse tempo, mas, obviamente, é um processo dinâmico e o setor de Minas e Energia terá que calibrar isso. Há um compromisso de que a transição energética tem que ser segura, não podemos nos desconectar do petróleo de um dia para o outro. A mensagem do governo Petro é que o mais importante é acelerar a transição energética e começar já para que possamos ir nos desprendendo do petróleo. E tratar de fechar as fronteiras extrativistas.

Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o Brasil se ausentou do debate ambiental e a Colômbia assumiu protagonismo na região. Agora com o presidente Lula o Brasil volta a liderar os debates. Como equacionar a relação para que os dois países liderem o tema?

Os dois países têm posição de liderança. Para o mundo e para um país vizinho como a Colômbia é uma excelente notícia que o Brasil recupere sua liderança ambiental. Somos absolutamente interdependentes e acredito que nessa luta tão forte, com interesses econômicos tão difíceis, com transições tão complexas, quanto mais países líderes e mais líderes haja, muito melhor. A disputa por liderança ambiental não existe. Cada um tem seu papel, somos países muito diferentes e muito parecidos. Somos muito parecidos na diversidade cultural, na biodiversidade. Mas, obviamente, a escala de país do Brasil é muito diferente da Colômbia. Para nós, ao contrário, é muito importante uma política progressista na América Latina, no Brasil, e na Amazônia. Se o presidente Lula não tivesse subido ao poder, essa Cúpula não seria possível. Sem que houvesse outros mandatários na vizinhança com a mesma liderança essa convergência não seria possível. É muito bem-vindo que haja muita liderança. E, especialmente para a América do Sul, a liderança do Brasil é fundamental.

O Brasil tem o Fundo Amazônia e parte dele pode ser usada por outros países. Como a Colômbia entra nessas negociações para trazer recursos para proteger a Amazônia?

Nós criamos nosso fundo na Colômbia, se chama Fundo para a Vida e vai ter contas regionais, porque são vários ecossistemas, uma conta é a Amazônica. O presidente está comprometido a colocar US$ 120 milhões anuais durante 20 anos para o fundo da Amazônia colombiana. Seria muito importante contar com um fundo como o Fundo da Amazônia brasileira, ou que consigamos converter em um fundo regional e há propostas sobre isso, para o que são programas de escala regional, por exemplo o monitoramento ambiental, participativo e científico deve ser um propósito de toda região, porque entender a Amazônia como um todo nos ajuda também a adequar  à política interna de cada país. O processo de pesquisa científica poderia ser um programa regional, as cadeias de valor da bioeconomia social e comunitária entre os países pode ser um processo regional, então creio que há necessidade de ter um mecanismo financeiro para que cuba o financiamento regional, mas achamos que deve ser multilateral, em igualdade de condições e com uma governança comum. E talvez com a OTCA fortalecida possa gerar um mecanismo financeiro como ponto de partida.

Os países amazônicos pretendem negociar em bloco na COP-28? O que vocês podem levar para a conferência?

Há um papel estratégico dos países amazônicos, é preciso colocar que a Amazônia é o terceiro pilar da solução climática e acreditamos que isso nos dá um lugar específico, mas também há uma conversa interessante com os outros países florestais. Acredito que haja uma agenda conjunta, há muitos temas em discussão para a COP-28, por exemplo o artigo 6 da Convenção e do Acordo de Paris: qual vai ser a nossa posição frente aos mercados de carbono e o tema de compensação ambientais e o pagamento por resultados? É um tema importante. Como por meio de um plano conjunto iniciar conversas para ter uma posição conjunta frente à COP. Não é fácil na América Latina, não somos uma região unida em nossas posições políticas frente a esses temas, se os países amazônicos passarem a ter convergência vão mudar uma tendência política.

A ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad, defendeu neste domingo, 6, um plano progressivo para pôr fim à exploração de petróleo na Amazônia. Ela afirmou que é importante iniciar a discussão sobre o tema para que os países discutam metas comuns, mas ponderou que a inclusão disso na declaração depende de um consenso entre os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).

Em entrevista durante a Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará, a ministra argumentou que a exploração do petróleo da região gera impactos graves, como a fragmentação dos ecossistemas e conflito com as comunidades amazônicas.

“O importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo tanto em Letícia (cidade colombiana onde foi assinado um pacto pela Amazônia em 2019) como aqui e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica”, disse.

Ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad Foto: Paula Ferreira

“É um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, mas porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.”

Muhamad argumentou que é preciso acelerar o processo de transição energética, mas de maneira que os países tenham segurança de fontes alternativas.

“Como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para obter um plano conjunto de não abrir mais bloco de petróleo na Amazônia pela necessidade de sustentar a integralidade ecológica?”, provocou.

A Colômbia tem defendido o fim da exploração de petróleo na Amazônia, mas encontra objeção de países membros da OTCA. O tema é espinhoso para o Brasil, que estuda perfurar um poço de petróleo na Foz do Amazonas. Mais cedo, a ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, afirmou neste domingo que o Brasil também tem metas ambientais ousadas, como o desmatamento zero, mas que as decisões precisam ser tomadas em consenso.

Floresta é tema de Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará Foto: Freepik

“Temos já dois presidentes que chegam aqui e os demais também com suas propostas, que trazem uma discussão muito contundente, muito forte nos seus países. Presidente Petro (da Colômbia) falando na não exploração de petróleo na Amazônia, e o presidente Lula falando a partir de consenso interno de desmatamento zero na Amazônia, o que é altamente ousado”, disse Marina.

“Mas, obviamente, que o presidente Lula não vai querer impor que os outros presidentes também digam que é desmatamento zero. É um processo de convencimento. Da mesma forma que os outros que têm outras propostas levantam suas propostas e buscam o convencimento. O multilateralismo é o consenso progressivo”.

Veja abaixo a conversa completa com a ministra, em que ela também fala sobre o Fundo Amazônia e uma possível negociação em bloco na COP-28:

A Colômbia defende que não haja exploração de petróleo na Amazônia, mas outros países não querem assumir esse compromisso. Há possibilidade de chegar a um meio termo?

Não poderia dizer como vai terminar, porque a negociação tem que ser ratificada pelos presidentes. Mas o importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo, tanto em Letícia como aqui, e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica. A integridade não é tanto para o tema das emissões de gases de efeito estufa, mas porque é um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao Norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.

Considera que é importante que a Declaração de Belém contenha alguma referência ao tema mesmo que não haja uma decisão concreta?

A Colômbia quer que o tema seja posto sobre a mesa, porque temos clareza que precisamos fazer um trabalho conjunto de acelerar a transição energética justa e esse processo é cheio de contradições. Entendemos também a necessidade de diferentes países, incluindo a Colômbia, de que essa transição energética seja segura, porque se não existe segurança energética o que podemos ter é um bumerangue de reação social frente à transição ecológica. Mas a reflexão que queremos colocar é sobre como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para conseguirmos um plano conjunto de não abrir mais blocos de petróleo na Amazônia devido à necessidade de sustentar a integralidade ecológica. Os cientistas estão dizendo que devemos preservar 80% da Amazônia íntegra para não chegar ao ponto de não retorno. É preciso fazer uma reflexão concreta e material do que isso significa e como pode afetar diferentes atividades econômicas, especialmente, o tema do petróleo.

Quando digo que seria uma mensagem muito poderosa ao Norte, é porque está claro que o acúmulo de gases do efeito estufa vem precisamente da industrialização do Norte. Há uma responsabilidade diferenciada, mas nós podemos começar a fechar fronteiras extrativistas. Essa uma mensagem muito poderosa, porque também há uma certa hipocrisia em querer compensar as emissões nas nossas florestas enquanto continuamos ampliando a fronteira extrativista. A que mundo isso vai nos levar? A política e os interesses econômicos tratam de mascarar essa realidade e por isso seria um exemplo. Mas entendemos também as dificuldades de uma transição energética justa. Usando uma metáfora da selva: Não podemos soltar um cipó e se não houver outro para segurar, podemos cair no abismo. Então entendo as dificuldades frente à responsabilidade da mitigação. Na Colômbia, assim como no Brasil, nossa principal fonte de emissões é o desmatamento, então para deter o desmatamento e a mudança da fronteira agrícola, é preciso ser claro: parte desse desmatamento veio do extrativismo, ou seja, da entrada de infraestrutura petroleira, de vias petroleiras nos projetos fomentados pelo próprio estado também geraram avenidas de desmate, então uma coisa não está separada da outra. E por isso buscamos colocar essa discussão e esperamos que ela pelo menos se inicie e seja formalizada para seguir acontecendo.

A senhora falou sobre a não proliferação de Petróleo na Amazônia. Mas existe uma posição do governo da Colômbia a respeito da disseminação da exploração de petróleo de modo geral?

Há uma posição de planejar a transição energética e ter as reservas necessárias para ter tempo de fazer a transição. O que buscamos é incentivar que todo o dinheiro de investimento estrangeiro, de orçamento nacional de Ciência e Tecnologia vá para a transição energética e possamos reduzir a necessidade de firmar novos contratos de exploração. Hoje temos um panorama onde pode haver reservas em processo de ser provadas que podem ajudar nesse tempo, mas, obviamente, é um processo dinâmico e o setor de Minas e Energia terá que calibrar isso. Há um compromisso de que a transição energética tem que ser segura, não podemos nos desconectar do petróleo de um dia para o outro. A mensagem do governo Petro é que o mais importante é acelerar a transição energética e começar já para que possamos ir nos desprendendo do petróleo. E tratar de fechar as fronteiras extrativistas.

Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o Brasil se ausentou do debate ambiental e a Colômbia assumiu protagonismo na região. Agora com o presidente Lula o Brasil volta a liderar os debates. Como equacionar a relação para que os dois países liderem o tema?

Os dois países têm posição de liderança. Para o mundo e para um país vizinho como a Colômbia é uma excelente notícia que o Brasil recupere sua liderança ambiental. Somos absolutamente interdependentes e acredito que nessa luta tão forte, com interesses econômicos tão difíceis, com transições tão complexas, quanto mais países líderes e mais líderes haja, muito melhor. A disputa por liderança ambiental não existe. Cada um tem seu papel, somos países muito diferentes e muito parecidos. Somos muito parecidos na diversidade cultural, na biodiversidade. Mas, obviamente, a escala de país do Brasil é muito diferente da Colômbia. Para nós, ao contrário, é muito importante uma política progressista na América Latina, no Brasil, e na Amazônia. Se o presidente Lula não tivesse subido ao poder, essa Cúpula não seria possível. Sem que houvesse outros mandatários na vizinhança com a mesma liderança essa convergência não seria possível. É muito bem-vindo que haja muita liderança. E, especialmente para a América do Sul, a liderança do Brasil é fundamental.

O Brasil tem o Fundo Amazônia e parte dele pode ser usada por outros países. Como a Colômbia entra nessas negociações para trazer recursos para proteger a Amazônia?

Nós criamos nosso fundo na Colômbia, se chama Fundo para a Vida e vai ter contas regionais, porque são vários ecossistemas, uma conta é a Amazônica. O presidente está comprometido a colocar US$ 120 milhões anuais durante 20 anos para o fundo da Amazônia colombiana. Seria muito importante contar com um fundo como o Fundo da Amazônia brasileira, ou que consigamos converter em um fundo regional e há propostas sobre isso, para o que são programas de escala regional, por exemplo o monitoramento ambiental, participativo e científico deve ser um propósito de toda região, porque entender a Amazônia como um todo nos ajuda também a adequar  à política interna de cada país. O processo de pesquisa científica poderia ser um programa regional, as cadeias de valor da bioeconomia social e comunitária entre os países pode ser um processo regional, então creio que há necessidade de ter um mecanismo financeiro para que cuba o financiamento regional, mas achamos que deve ser multilateral, em igualdade de condições e com uma governança comum. E talvez com a OTCA fortalecida possa gerar um mecanismo financeiro como ponto de partida.

Os países amazônicos pretendem negociar em bloco na COP-28? O que vocês podem levar para a conferência?

Há um papel estratégico dos países amazônicos, é preciso colocar que a Amazônia é o terceiro pilar da solução climática e acreditamos que isso nos dá um lugar específico, mas também há uma conversa interessante com os outros países florestais. Acredito que haja uma agenda conjunta, há muitos temas em discussão para a COP-28, por exemplo o artigo 6 da Convenção e do Acordo de Paris: qual vai ser a nossa posição frente aos mercados de carbono e o tema de compensação ambientais e o pagamento por resultados? É um tema importante. Como por meio de um plano conjunto iniciar conversas para ter uma posição conjunta frente à COP. Não é fácil na América Latina, não somos uma região unida em nossas posições políticas frente a esses temas, se os países amazônicos passarem a ter convergência vão mudar uma tendência política.

A ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad, defendeu neste domingo, 6, um plano progressivo para pôr fim à exploração de petróleo na Amazônia. Ela afirmou que é importante iniciar a discussão sobre o tema para que os países discutam metas comuns, mas ponderou que a inclusão disso na declaração depende de um consenso entre os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).

Em entrevista durante a Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará, a ministra argumentou que a exploração do petróleo da região gera impactos graves, como a fragmentação dos ecossistemas e conflito com as comunidades amazônicas.

“O importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo tanto em Letícia (cidade colombiana onde foi assinado um pacto pela Amazônia em 2019) como aqui e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica”, disse.

Ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad Foto: Paula Ferreira

“É um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, mas porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.”

Muhamad argumentou que é preciso acelerar o processo de transição energética, mas de maneira que os países tenham segurança de fontes alternativas.

“Como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para obter um plano conjunto de não abrir mais bloco de petróleo na Amazônia pela necessidade de sustentar a integralidade ecológica?”, provocou.

A Colômbia tem defendido o fim da exploração de petróleo na Amazônia, mas encontra objeção de países membros da OTCA. O tema é espinhoso para o Brasil, que estuda perfurar um poço de petróleo na Foz do Amazonas. Mais cedo, a ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, afirmou neste domingo que o Brasil também tem metas ambientais ousadas, como o desmatamento zero, mas que as decisões precisam ser tomadas em consenso.

Floresta é tema de Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará Foto: Freepik

“Temos já dois presidentes que chegam aqui e os demais também com suas propostas, que trazem uma discussão muito contundente, muito forte nos seus países. Presidente Petro (da Colômbia) falando na não exploração de petróleo na Amazônia, e o presidente Lula falando a partir de consenso interno de desmatamento zero na Amazônia, o que é altamente ousado”, disse Marina.

“Mas, obviamente, que o presidente Lula não vai querer impor que os outros presidentes também digam que é desmatamento zero. É um processo de convencimento. Da mesma forma que os outros que têm outras propostas levantam suas propostas e buscam o convencimento. O multilateralismo é o consenso progressivo”.

Veja abaixo a conversa completa com a ministra, em que ela também fala sobre o Fundo Amazônia e uma possível negociação em bloco na COP-28:

A Colômbia defende que não haja exploração de petróleo na Amazônia, mas outros países não querem assumir esse compromisso. Há possibilidade de chegar a um meio termo?

Não poderia dizer como vai terminar, porque a negociação tem que ser ratificada pelos presidentes. Mas o importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo, tanto em Letícia como aqui, e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica. A integridade não é tanto para o tema das emissões de gases de efeito estufa, mas porque é um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao Norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.

Considera que é importante que a Declaração de Belém contenha alguma referência ao tema mesmo que não haja uma decisão concreta?

A Colômbia quer que o tema seja posto sobre a mesa, porque temos clareza que precisamos fazer um trabalho conjunto de acelerar a transição energética justa e esse processo é cheio de contradições. Entendemos também a necessidade de diferentes países, incluindo a Colômbia, de que essa transição energética seja segura, porque se não existe segurança energética o que podemos ter é um bumerangue de reação social frente à transição ecológica. Mas a reflexão que queremos colocar é sobre como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para conseguirmos um plano conjunto de não abrir mais blocos de petróleo na Amazônia devido à necessidade de sustentar a integralidade ecológica. Os cientistas estão dizendo que devemos preservar 80% da Amazônia íntegra para não chegar ao ponto de não retorno. É preciso fazer uma reflexão concreta e material do que isso significa e como pode afetar diferentes atividades econômicas, especialmente, o tema do petróleo.

Quando digo que seria uma mensagem muito poderosa ao Norte, é porque está claro que o acúmulo de gases do efeito estufa vem precisamente da industrialização do Norte. Há uma responsabilidade diferenciada, mas nós podemos começar a fechar fronteiras extrativistas. Essa uma mensagem muito poderosa, porque também há uma certa hipocrisia em querer compensar as emissões nas nossas florestas enquanto continuamos ampliando a fronteira extrativista. A que mundo isso vai nos levar? A política e os interesses econômicos tratam de mascarar essa realidade e por isso seria um exemplo. Mas entendemos também as dificuldades de uma transição energética justa. Usando uma metáfora da selva: Não podemos soltar um cipó e se não houver outro para segurar, podemos cair no abismo. Então entendo as dificuldades frente à responsabilidade da mitigação. Na Colômbia, assim como no Brasil, nossa principal fonte de emissões é o desmatamento, então para deter o desmatamento e a mudança da fronteira agrícola, é preciso ser claro: parte desse desmatamento veio do extrativismo, ou seja, da entrada de infraestrutura petroleira, de vias petroleiras nos projetos fomentados pelo próprio estado também geraram avenidas de desmate, então uma coisa não está separada da outra. E por isso buscamos colocar essa discussão e esperamos que ela pelo menos se inicie e seja formalizada para seguir acontecendo.

A senhora falou sobre a não proliferação de Petróleo na Amazônia. Mas existe uma posição do governo da Colômbia a respeito da disseminação da exploração de petróleo de modo geral?

Há uma posição de planejar a transição energética e ter as reservas necessárias para ter tempo de fazer a transição. O que buscamos é incentivar que todo o dinheiro de investimento estrangeiro, de orçamento nacional de Ciência e Tecnologia vá para a transição energética e possamos reduzir a necessidade de firmar novos contratos de exploração. Hoje temos um panorama onde pode haver reservas em processo de ser provadas que podem ajudar nesse tempo, mas, obviamente, é um processo dinâmico e o setor de Minas e Energia terá que calibrar isso. Há um compromisso de que a transição energética tem que ser segura, não podemos nos desconectar do petróleo de um dia para o outro. A mensagem do governo Petro é que o mais importante é acelerar a transição energética e começar já para que possamos ir nos desprendendo do petróleo. E tratar de fechar as fronteiras extrativistas.

Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o Brasil se ausentou do debate ambiental e a Colômbia assumiu protagonismo na região. Agora com o presidente Lula o Brasil volta a liderar os debates. Como equacionar a relação para que os dois países liderem o tema?

Os dois países têm posição de liderança. Para o mundo e para um país vizinho como a Colômbia é uma excelente notícia que o Brasil recupere sua liderança ambiental. Somos absolutamente interdependentes e acredito que nessa luta tão forte, com interesses econômicos tão difíceis, com transições tão complexas, quanto mais países líderes e mais líderes haja, muito melhor. A disputa por liderança ambiental não existe. Cada um tem seu papel, somos países muito diferentes e muito parecidos. Somos muito parecidos na diversidade cultural, na biodiversidade. Mas, obviamente, a escala de país do Brasil é muito diferente da Colômbia. Para nós, ao contrário, é muito importante uma política progressista na América Latina, no Brasil, e na Amazônia. Se o presidente Lula não tivesse subido ao poder, essa Cúpula não seria possível. Sem que houvesse outros mandatários na vizinhança com a mesma liderança essa convergência não seria possível. É muito bem-vindo que haja muita liderança. E, especialmente para a América do Sul, a liderança do Brasil é fundamental.

O Brasil tem o Fundo Amazônia e parte dele pode ser usada por outros países. Como a Colômbia entra nessas negociações para trazer recursos para proteger a Amazônia?

Nós criamos nosso fundo na Colômbia, se chama Fundo para a Vida e vai ter contas regionais, porque são vários ecossistemas, uma conta é a Amazônica. O presidente está comprometido a colocar US$ 120 milhões anuais durante 20 anos para o fundo da Amazônia colombiana. Seria muito importante contar com um fundo como o Fundo da Amazônia brasileira, ou que consigamos converter em um fundo regional e há propostas sobre isso, para o que são programas de escala regional, por exemplo o monitoramento ambiental, participativo e científico deve ser um propósito de toda região, porque entender a Amazônia como um todo nos ajuda também a adequar  à política interna de cada país. O processo de pesquisa científica poderia ser um programa regional, as cadeias de valor da bioeconomia social e comunitária entre os países pode ser um processo regional, então creio que há necessidade de ter um mecanismo financeiro para que cuba o financiamento regional, mas achamos que deve ser multilateral, em igualdade de condições e com uma governança comum. E talvez com a OTCA fortalecida possa gerar um mecanismo financeiro como ponto de partida.

Os países amazônicos pretendem negociar em bloco na COP-28? O que vocês podem levar para a conferência?

Há um papel estratégico dos países amazônicos, é preciso colocar que a Amazônia é o terceiro pilar da solução climática e acreditamos que isso nos dá um lugar específico, mas também há uma conversa interessante com os outros países florestais. Acredito que haja uma agenda conjunta, há muitos temas em discussão para a COP-28, por exemplo o artigo 6 da Convenção e do Acordo de Paris: qual vai ser a nossa posição frente aos mercados de carbono e o tema de compensação ambientais e o pagamento por resultados? É um tema importante. Como por meio de um plano conjunto iniciar conversas para ter uma posição conjunta frente à COP. Não é fácil na América Latina, não somos uma região unida em nossas posições políticas frente a esses temas, se os países amazônicos passarem a ter convergência vão mudar uma tendência política.

A ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad, defendeu neste domingo, 6, um plano progressivo para pôr fim à exploração de petróleo na Amazônia. Ela afirmou que é importante iniciar a discussão sobre o tema para que os países discutam metas comuns, mas ponderou que a inclusão disso na declaração depende de um consenso entre os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).

Em entrevista durante a Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará, a ministra argumentou que a exploração do petróleo da região gera impactos graves, como a fragmentação dos ecossistemas e conflito com as comunidades amazônicas.

“O importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo tanto em Letícia (cidade colombiana onde foi assinado um pacto pela Amazônia em 2019) como aqui e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica”, disse.

Ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad Foto: Paula Ferreira

“É um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, mas porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.”

Muhamad argumentou que é preciso acelerar o processo de transição energética, mas de maneira que os países tenham segurança de fontes alternativas.

“Como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para obter um plano conjunto de não abrir mais bloco de petróleo na Amazônia pela necessidade de sustentar a integralidade ecológica?”, provocou.

A Colômbia tem defendido o fim da exploração de petróleo na Amazônia, mas encontra objeção de países membros da OTCA. O tema é espinhoso para o Brasil, que estuda perfurar um poço de petróleo na Foz do Amazonas. Mais cedo, a ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, afirmou neste domingo que o Brasil também tem metas ambientais ousadas, como o desmatamento zero, mas que as decisões precisam ser tomadas em consenso.

Floresta é tema de Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará Foto: Freepik

“Temos já dois presidentes que chegam aqui e os demais também com suas propostas, que trazem uma discussão muito contundente, muito forte nos seus países. Presidente Petro (da Colômbia) falando na não exploração de petróleo na Amazônia, e o presidente Lula falando a partir de consenso interno de desmatamento zero na Amazônia, o que é altamente ousado”, disse Marina.

“Mas, obviamente, que o presidente Lula não vai querer impor que os outros presidentes também digam que é desmatamento zero. É um processo de convencimento. Da mesma forma que os outros que têm outras propostas levantam suas propostas e buscam o convencimento. O multilateralismo é o consenso progressivo”.

Veja abaixo a conversa completa com a ministra, em que ela também fala sobre o Fundo Amazônia e uma possível negociação em bloco na COP-28:

A Colômbia defende que não haja exploração de petróleo na Amazônia, mas outros países não querem assumir esse compromisso. Há possibilidade de chegar a um meio termo?

Não poderia dizer como vai terminar, porque a negociação tem que ser ratificada pelos presidentes. Mas o importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo, tanto em Letícia como aqui, e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica. A integridade não é tanto para o tema das emissões de gases de efeito estufa, mas porque é um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao Norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.

Considera que é importante que a Declaração de Belém contenha alguma referência ao tema mesmo que não haja uma decisão concreta?

A Colômbia quer que o tema seja posto sobre a mesa, porque temos clareza que precisamos fazer um trabalho conjunto de acelerar a transição energética justa e esse processo é cheio de contradições. Entendemos também a necessidade de diferentes países, incluindo a Colômbia, de que essa transição energética seja segura, porque se não existe segurança energética o que podemos ter é um bumerangue de reação social frente à transição ecológica. Mas a reflexão que queremos colocar é sobre como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para conseguirmos um plano conjunto de não abrir mais blocos de petróleo na Amazônia devido à necessidade de sustentar a integralidade ecológica. Os cientistas estão dizendo que devemos preservar 80% da Amazônia íntegra para não chegar ao ponto de não retorno. É preciso fazer uma reflexão concreta e material do que isso significa e como pode afetar diferentes atividades econômicas, especialmente, o tema do petróleo.

Quando digo que seria uma mensagem muito poderosa ao Norte, é porque está claro que o acúmulo de gases do efeito estufa vem precisamente da industrialização do Norte. Há uma responsabilidade diferenciada, mas nós podemos começar a fechar fronteiras extrativistas. Essa uma mensagem muito poderosa, porque também há uma certa hipocrisia em querer compensar as emissões nas nossas florestas enquanto continuamos ampliando a fronteira extrativista. A que mundo isso vai nos levar? A política e os interesses econômicos tratam de mascarar essa realidade e por isso seria um exemplo. Mas entendemos também as dificuldades de uma transição energética justa. Usando uma metáfora da selva: Não podemos soltar um cipó e se não houver outro para segurar, podemos cair no abismo. Então entendo as dificuldades frente à responsabilidade da mitigação. Na Colômbia, assim como no Brasil, nossa principal fonte de emissões é o desmatamento, então para deter o desmatamento e a mudança da fronteira agrícola, é preciso ser claro: parte desse desmatamento veio do extrativismo, ou seja, da entrada de infraestrutura petroleira, de vias petroleiras nos projetos fomentados pelo próprio estado também geraram avenidas de desmate, então uma coisa não está separada da outra. E por isso buscamos colocar essa discussão e esperamos que ela pelo menos se inicie e seja formalizada para seguir acontecendo.

A senhora falou sobre a não proliferação de Petróleo na Amazônia. Mas existe uma posição do governo da Colômbia a respeito da disseminação da exploração de petróleo de modo geral?

Há uma posição de planejar a transição energética e ter as reservas necessárias para ter tempo de fazer a transição. O que buscamos é incentivar que todo o dinheiro de investimento estrangeiro, de orçamento nacional de Ciência e Tecnologia vá para a transição energética e possamos reduzir a necessidade de firmar novos contratos de exploração. Hoje temos um panorama onde pode haver reservas em processo de ser provadas que podem ajudar nesse tempo, mas, obviamente, é um processo dinâmico e o setor de Minas e Energia terá que calibrar isso. Há um compromisso de que a transição energética tem que ser segura, não podemos nos desconectar do petróleo de um dia para o outro. A mensagem do governo Petro é que o mais importante é acelerar a transição energética e começar já para que possamos ir nos desprendendo do petróleo. E tratar de fechar as fronteiras extrativistas.

Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o Brasil se ausentou do debate ambiental e a Colômbia assumiu protagonismo na região. Agora com o presidente Lula o Brasil volta a liderar os debates. Como equacionar a relação para que os dois países liderem o tema?

Os dois países têm posição de liderança. Para o mundo e para um país vizinho como a Colômbia é uma excelente notícia que o Brasil recupere sua liderança ambiental. Somos absolutamente interdependentes e acredito que nessa luta tão forte, com interesses econômicos tão difíceis, com transições tão complexas, quanto mais países líderes e mais líderes haja, muito melhor. A disputa por liderança ambiental não existe. Cada um tem seu papel, somos países muito diferentes e muito parecidos. Somos muito parecidos na diversidade cultural, na biodiversidade. Mas, obviamente, a escala de país do Brasil é muito diferente da Colômbia. Para nós, ao contrário, é muito importante uma política progressista na América Latina, no Brasil, e na Amazônia. Se o presidente Lula não tivesse subido ao poder, essa Cúpula não seria possível. Sem que houvesse outros mandatários na vizinhança com a mesma liderança essa convergência não seria possível. É muito bem-vindo que haja muita liderança. E, especialmente para a América do Sul, a liderança do Brasil é fundamental.

O Brasil tem o Fundo Amazônia e parte dele pode ser usada por outros países. Como a Colômbia entra nessas negociações para trazer recursos para proteger a Amazônia?

Nós criamos nosso fundo na Colômbia, se chama Fundo para a Vida e vai ter contas regionais, porque são vários ecossistemas, uma conta é a Amazônica. O presidente está comprometido a colocar US$ 120 milhões anuais durante 20 anos para o fundo da Amazônia colombiana. Seria muito importante contar com um fundo como o Fundo da Amazônia brasileira, ou que consigamos converter em um fundo regional e há propostas sobre isso, para o que são programas de escala regional, por exemplo o monitoramento ambiental, participativo e científico deve ser um propósito de toda região, porque entender a Amazônia como um todo nos ajuda também a adequar  à política interna de cada país. O processo de pesquisa científica poderia ser um programa regional, as cadeias de valor da bioeconomia social e comunitária entre os países pode ser um processo regional, então creio que há necessidade de ter um mecanismo financeiro para que cuba o financiamento regional, mas achamos que deve ser multilateral, em igualdade de condições e com uma governança comum. E talvez com a OTCA fortalecida possa gerar um mecanismo financeiro como ponto de partida.

Os países amazônicos pretendem negociar em bloco na COP-28? O que vocês podem levar para a conferência?

Há um papel estratégico dos países amazônicos, é preciso colocar que a Amazônia é o terceiro pilar da solução climática e acreditamos que isso nos dá um lugar específico, mas também há uma conversa interessante com os outros países florestais. Acredito que haja uma agenda conjunta, há muitos temas em discussão para a COP-28, por exemplo o artigo 6 da Convenção e do Acordo de Paris: qual vai ser a nossa posição frente aos mercados de carbono e o tema de compensação ambientais e o pagamento por resultados? É um tema importante. Como por meio de um plano conjunto iniciar conversas para ter uma posição conjunta frente à COP. Não é fácil na América Latina, não somos uma região unida em nossas posições políticas frente a esses temas, se os países amazônicos passarem a ter convergência vão mudar uma tendência política.

A ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad, defendeu neste domingo, 6, um plano progressivo para pôr fim à exploração de petróleo na Amazônia. Ela afirmou que é importante iniciar a discussão sobre o tema para que os países discutam metas comuns, mas ponderou que a inclusão disso na declaração depende de um consenso entre os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).

Em entrevista durante a Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará, a ministra argumentou que a exploração do petróleo da região gera impactos graves, como a fragmentação dos ecossistemas e conflito com as comunidades amazônicas.

“O importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo tanto em Letícia (cidade colombiana onde foi assinado um pacto pela Amazônia em 2019) como aqui e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica”, disse.

Ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad Foto: Paula Ferreira

“É um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, mas porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.”

Muhamad argumentou que é preciso acelerar o processo de transição energética, mas de maneira que os países tenham segurança de fontes alternativas.

“Como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para obter um plano conjunto de não abrir mais bloco de petróleo na Amazônia pela necessidade de sustentar a integralidade ecológica?”, provocou.

A Colômbia tem defendido o fim da exploração de petróleo na Amazônia, mas encontra objeção de países membros da OTCA. O tema é espinhoso para o Brasil, que estuda perfurar um poço de petróleo na Foz do Amazonas. Mais cedo, a ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina Silva, afirmou neste domingo que o Brasil também tem metas ambientais ousadas, como o desmatamento zero, mas que as decisões precisam ser tomadas em consenso.

Floresta é tema de Cúpula da Amazônia, que acontece em Belém, no Pará Foto: Freepik

“Temos já dois presidentes que chegam aqui e os demais também com suas propostas, que trazem uma discussão muito contundente, muito forte nos seus países. Presidente Petro (da Colômbia) falando na não exploração de petróleo na Amazônia, e o presidente Lula falando a partir de consenso interno de desmatamento zero na Amazônia, o que é altamente ousado”, disse Marina.

“Mas, obviamente, que o presidente Lula não vai querer impor que os outros presidentes também digam que é desmatamento zero. É um processo de convencimento. Da mesma forma que os outros que têm outras propostas levantam suas propostas e buscam o convencimento. O multilateralismo é o consenso progressivo”.

Veja abaixo a conversa completa com a ministra, em que ela também fala sobre o Fundo Amazônia e uma possível negociação em bloco na COP-28:

A Colômbia defende que não haja exploração de petróleo na Amazônia, mas outros países não querem assumir esse compromisso. Há possibilidade de chegar a um meio termo?

Não poderia dizer como vai terminar, porque a negociação tem que ser ratificada pelos presidentes. Mas o importante é que o tema seja posto sobre a mesa e que isso seja um ponto de discussão, não porque um presidente ou outro disse isso, mas sim porque ficou claríssimo, tanto em Letícia como aqui, e nos diálogos internos que, sim, é um tema de preocupação para a integridade da conectividade ecológica. A integridade não é tanto para o tema das emissões de gases de efeito estufa, mas porque é um pouco paradoxal seguir pensando sobre petróleo frente à crise que temos, porque esses megaprojetos geram abertura de caminhos, fragmentação ecológica, perda de biodiversidade e sobretudo conflito com as comunidades. Seria lógico e uma mensagem muito poderosa ao Norte que fechássemos um plano progressivo, porque todos nossos países têm petróleo na Amazônia.

Considera que é importante que a Declaração de Belém contenha alguma referência ao tema mesmo que não haja uma decisão concreta?

A Colômbia quer que o tema seja posto sobre a mesa, porque temos clareza que precisamos fazer um trabalho conjunto de acelerar a transição energética justa e esse processo é cheio de contradições. Entendemos também a necessidade de diferentes países, incluindo a Colômbia, de que essa transição energética seja segura, porque se não existe segurança energética o que podemos ter é um bumerangue de reação social frente à transição ecológica. Mas a reflexão que queremos colocar é sobre como podemos cooperar e trabalhar conjuntamente para conseguirmos um plano conjunto de não abrir mais blocos de petróleo na Amazônia devido à necessidade de sustentar a integralidade ecológica. Os cientistas estão dizendo que devemos preservar 80% da Amazônia íntegra para não chegar ao ponto de não retorno. É preciso fazer uma reflexão concreta e material do que isso significa e como pode afetar diferentes atividades econômicas, especialmente, o tema do petróleo.

Quando digo que seria uma mensagem muito poderosa ao Norte, é porque está claro que o acúmulo de gases do efeito estufa vem precisamente da industrialização do Norte. Há uma responsabilidade diferenciada, mas nós podemos começar a fechar fronteiras extrativistas. Essa uma mensagem muito poderosa, porque também há uma certa hipocrisia em querer compensar as emissões nas nossas florestas enquanto continuamos ampliando a fronteira extrativista. A que mundo isso vai nos levar? A política e os interesses econômicos tratam de mascarar essa realidade e por isso seria um exemplo. Mas entendemos também as dificuldades de uma transição energética justa. Usando uma metáfora da selva: Não podemos soltar um cipó e se não houver outro para segurar, podemos cair no abismo. Então entendo as dificuldades frente à responsabilidade da mitigação. Na Colômbia, assim como no Brasil, nossa principal fonte de emissões é o desmatamento, então para deter o desmatamento e a mudança da fronteira agrícola, é preciso ser claro: parte desse desmatamento veio do extrativismo, ou seja, da entrada de infraestrutura petroleira, de vias petroleiras nos projetos fomentados pelo próprio estado também geraram avenidas de desmate, então uma coisa não está separada da outra. E por isso buscamos colocar essa discussão e esperamos que ela pelo menos se inicie e seja formalizada para seguir acontecendo.

A senhora falou sobre a não proliferação de Petróleo na Amazônia. Mas existe uma posição do governo da Colômbia a respeito da disseminação da exploração de petróleo de modo geral?

Há uma posição de planejar a transição energética e ter as reservas necessárias para ter tempo de fazer a transição. O que buscamos é incentivar que todo o dinheiro de investimento estrangeiro, de orçamento nacional de Ciência e Tecnologia vá para a transição energética e possamos reduzir a necessidade de firmar novos contratos de exploração. Hoje temos um panorama onde pode haver reservas em processo de ser provadas que podem ajudar nesse tempo, mas, obviamente, é um processo dinâmico e o setor de Minas e Energia terá que calibrar isso. Há um compromisso de que a transição energética tem que ser segura, não podemos nos desconectar do petróleo de um dia para o outro. A mensagem do governo Petro é que o mais importante é acelerar a transição energética e começar já para que possamos ir nos desprendendo do petróleo. E tratar de fechar as fronteiras extrativistas.

Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o Brasil se ausentou do debate ambiental e a Colômbia assumiu protagonismo na região. Agora com o presidente Lula o Brasil volta a liderar os debates. Como equacionar a relação para que os dois países liderem o tema?

Os dois países têm posição de liderança. Para o mundo e para um país vizinho como a Colômbia é uma excelente notícia que o Brasil recupere sua liderança ambiental. Somos absolutamente interdependentes e acredito que nessa luta tão forte, com interesses econômicos tão difíceis, com transições tão complexas, quanto mais países líderes e mais líderes haja, muito melhor. A disputa por liderança ambiental não existe. Cada um tem seu papel, somos países muito diferentes e muito parecidos. Somos muito parecidos na diversidade cultural, na biodiversidade. Mas, obviamente, a escala de país do Brasil é muito diferente da Colômbia. Para nós, ao contrário, é muito importante uma política progressista na América Latina, no Brasil, e na Amazônia. Se o presidente Lula não tivesse subido ao poder, essa Cúpula não seria possível. Sem que houvesse outros mandatários na vizinhança com a mesma liderança essa convergência não seria possível. É muito bem-vindo que haja muita liderança. E, especialmente para a América do Sul, a liderança do Brasil é fundamental.

O Brasil tem o Fundo Amazônia e parte dele pode ser usada por outros países. Como a Colômbia entra nessas negociações para trazer recursos para proteger a Amazônia?

Nós criamos nosso fundo na Colômbia, se chama Fundo para a Vida e vai ter contas regionais, porque são vários ecossistemas, uma conta é a Amazônica. O presidente está comprometido a colocar US$ 120 milhões anuais durante 20 anos para o fundo da Amazônia colombiana. Seria muito importante contar com um fundo como o Fundo da Amazônia brasileira, ou que consigamos converter em um fundo regional e há propostas sobre isso, para o que são programas de escala regional, por exemplo o monitoramento ambiental, participativo e científico deve ser um propósito de toda região, porque entender a Amazônia como um todo nos ajuda também a adequar  à política interna de cada país. O processo de pesquisa científica poderia ser um programa regional, as cadeias de valor da bioeconomia social e comunitária entre os países pode ser um processo regional, então creio que há necessidade de ter um mecanismo financeiro para que cuba o financiamento regional, mas achamos que deve ser multilateral, em igualdade de condições e com uma governança comum. E talvez com a OTCA fortalecida possa gerar um mecanismo financeiro como ponto de partida.

Os países amazônicos pretendem negociar em bloco na COP-28? O que vocês podem levar para a conferência?

Há um papel estratégico dos países amazônicos, é preciso colocar que a Amazônia é o terceiro pilar da solução climática e acreditamos que isso nos dá um lugar específico, mas também há uma conversa interessante com os outros países florestais. Acredito que haja uma agenda conjunta, há muitos temas em discussão para a COP-28, por exemplo o artigo 6 da Convenção e do Acordo de Paris: qual vai ser a nossa posição frente aos mercados de carbono e o tema de compensação ambientais e o pagamento por resultados? É um tema importante. Como por meio de um plano conjunto iniciar conversas para ter uma posição conjunta frente à COP. Não é fácil na América Latina, não somos uma região unida em nossas posições políticas frente a esses temas, se os países amazônicos passarem a ter convergência vão mudar uma tendência política.

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