Um buraco excepcionalmente grande apareceu nas nuvens, perto da fábrica da Norilsk Nickel, na Rússia, uma das maiores produtoras de níquel do mundo e uma grande poluidora do ar.
O cientista Velle Toll ficou intrigado com as imagens de satélite, mas não deu muita importância inicialmente. No entanto, à medida que ele e seu estudante de pós-graduação analisavam mais dados, notaram outros buracos estranhos nas nuvens - todos ao redor de grandes plantas industriais poluidoras.
Mais de três anos depois, ele e seus colegas descobriram o mecanismo por trás desses buracos: neve.
Especificamente, partículas de poluição de fábricas de metais e usinas de energia atuam como sementes que ajudam o gelo a se formar nas nuvens, iniciando a queda de neve que deixa buracos nelas.
Essas nuvens de gelo induzidas por poluição também são mais finas, cobrem menos área e refletem menos luz solar para o espaço - potencialmente afetando, pelo menos, o ambiente local, segundo estudo publicado na revista Science, nesta quinta-feira, 14.
A equipe encontrou plumas únicas de nuvens de gelo próximas a 67 fábricas de metais e cimento, indústrias de papel e usinas de energia na América do Norte, Europa e Ásia, especialmente no Canadá e na Rússia.
“Foi surpreendente que ninguém tivesse descoberto esse fenômeno. Não é algo tão raro”, disse Toll, autor principal do estudo. No entanto, ele admite que foi “sorte” ter notado a visão incomum.
Inicialmente, ele analisava imagens de satélite para estudar como a poluição de fábricas e navios afeta as nuvens, que normalmente são compostas principalmente por gotículas líquidas. Pesquisas anteriores já mostraram que poluentes industriais tendem a aumentar o número de gotículas líquidas nas nuvens, o que as torna mais brilhantes e reflete mais luz solar de volta ao espaço.
Alguns até propuseram essa ideia de “iluminação de nuvens” como forma de combater as mudanças climáticas e resfriar a Terra. No entanto, a pesquisa sobre como esses poluentes promovem a formação de gelo nas nuvens é menos robusta.
A teoria científica e medições em laboratório indicavam que os poluentes poderiam iniciar a formação de gelo, mas ninguém havia encontrado evidências observacionais diretas desse processo - até agora.
Quando Toll decidiu que esses buracos mereciam mais estudo, ele e sua equipe analisaram 21 anos de imagens de satélite e dados de radar meteorológico terrestre. Eles vasculharam centenas de milhares de imagens para identificar buracos em nuvens perto de áreas industriais. Os dados de satélite permitiram identificar se as nuvens continham líquido ou gelo, enquanto os dados terrestres indicavam a ocorrência de neve.
Toll explicou que precisaram usar uma abordagem “antiquada” de inspecionar manualmente todos os dados, em vez de usar algoritmos de aprendizado de máquina, pois não havia dados suficientes para treinar o software devido à novidade da descoberta.
Nas áreas industriais, a equipe encontrou um aumento diário de até 15 milímetros de acumulação de neve - o suficiente para cobrir uma pequena cidade, disse Toll.
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A neve, segundo Toll, está vinculada aos poluentes industriais. Em um ambiente sem indústrias ou poluição humana, as gotículas de nuvem líquida são resfriadas a temperaturas abaixo de 0ºC. Com a adição de poluentes das indústrias de metais ou minerais, ocorre a formação de cristais de gelo.
À medida em que os cristais de gelo crescem, consomem as gotículas líquidas da nuvem. Se crescerem o suficiente, neva. Os poluentes que ajudaram a formar a neve também caem junto com os flocos.
Nem todo poluente é uma boa partícula formadora de gelo, disse Toll, mas outras pesquisas são necessárias para identificar quais desempenham melhor esse papel.
Os cristais de gelo também alteraram as propriedades das nuvens. Enquanto as gotículas líquidas tornavam as nuvens mais brilhantes, o estudo mostrou que as nuvens de gelo refletiam 13,7% menos luz solar e absorviam mais radiação infravermelha.
Toll explicou que os cristais de gelo são maiores que as gotículas líquidas e refletem menos luz solar, fazendo com que a nuvem pareça “mais escura”. Isso pode reduzir o resfriamento observado em nuvens líquidas, acrescentou.
Depois que a neve caiu, as nuvens também se tornaram menores, aumentando a quantidade de luz solar que alcança a superfície. A equipe descobriu que a cobertura de nuvens perto desses pontos industriais era cerca de 8,3% menor e 18% mais fina.
O que significa esse estudo?
O estudo mostrou apenas efeitos locais na luz solar recebida, mas mudanças em maior escala precisariam ser analisadas para determinar um impacto climático mais amplo.
“Embora este estudo mostre que as nuvens serão afetadas, não está claro se os efeitos observados nessas nuvens se traduzirão em escalas espaciais maiores que possam impactar o clima”, disse Joyce Penner, cientista atmosférica da Universidade de Michigan (EUA), que não participou do estudo.
O cientista atmosférico Yuan Wang, também não envolvido no estudo, disse que ficou impressionado com a capacidade dos autores de identificar com precisão os pontos críticos de aerossóis industriais e vinculá-los à formação de nuvens de gelo.
“Este estudo avança nossa compreensão ao ilustrar quais tipos de aerossóis artificiais podem servir como partículas nucleadoras de gelo e onde encontrá-los”, disse Wang, professor da Universidade de Stanford (EUA).
Ele também afirmou que o estudo revela outro processo a ser considerado em modelos de clima e previsão do tempo. Os modelos precisam levar mais em conta “esses efeitos das atividades humanas sobre a precipitação, a radiação e as previsões climáticas”.
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