Como um sistema à base de gás pode evitar que apagões parem a distribuição de água?


Tecnologia vem se destacando em premiações que buscam soluções inovadoras em eficiência energética. Principais vantagens estão relacionadas à regularidade, estabilidade e segurança no fornecimento

Por Gonçalo Junior

Apagões recentes evidenciam como a dependência da energia elétrica afeta a vida da população e das empresas. A situação se torna ainda mais crítica nos serviços essenciais, como o fornecimento de água. Essa preocupação vai além dos momentos de crise: as metas do novo marco do saneamento exigem a universalização dos serviços de água e esgoto até 2033. Nesse contexto, a diversificação das fontes energéticas nas estações de bombeamento, com o uso do gás natural, por exemplo, contribui com a operação contínua e a disponibilidade de água.

Historicamente associado à geração de calor e eletricidade, o gás natural vem sendo cada vez mais utilizado como fonte de energia motriz para acionamento de bombas e compressores. As principais vantagens estão relacionadas à regularidade, estabilidade e segurança no fornecimento, além de menos poluição que motores a diesel.

Para a distribuição de água, as companhias de saneamento utilizam estações elevatórias com um sistema de bombeamento. Para esse sistema funcionar, é preciso energia elétrica. Com a nova tecnologia, o acionamento das bombas deixa de ser elétrico e passa a ser feito por um motor a gás natural. É uma tecnologia disruptiva, já presente em outros países, e que começa a ganhar força no Brasil.

Motores a combustão alimentados por gás natural reduzem os impactos de eventuais quedas de energia elétrica, que é vulnerável à ação dos ventos, tempestades e acidentes. Transportado por meio de tubulações subterrâneas, o gás garante regularidade e confiabilidade de fornecimento superior à eletricidade. “É muito raro um gasoduto parar”, opina o engenheiro mecânico Silvio Shizuo, professor de Engenharia Mecânica da FEI.

Um dos locais com o sistema instalado é a Estação Elevatória João XXIII, localizada na zona sul e responsável por bombear a água do sistema Guarapiranga para os municípios de Taboão da Serra, Cotia, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo Foto: Taba Benedicto/ Estadão

A eficiência energética também entra na equação. No sistema elétrico convencional de acionamento das bombas, as perdas de energia podem variar entre 15% e 30% em função da longa cadeia de transmissão e de componentes intermediários, como cabeamentos, cabines e transformadores. Os sistemas de bombeamento movidos a gás conectam o combustível diretamente ao motor. Isso significa aumento da eficiência.

Desenvolvida pela Fluxus Soluções em Energia, distribuída pela Energ Geradores e conhecida comercialmente como “Sistema Fluxus”, a tecnologia vem se destacando em premiações que buscam soluções inovadoras em eficiência energética.

Um deles foi a conquista do Desafio de Inovação do Saneamento Open Spot 2021, promovida pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES). O sistema foi finalista da chamada pública Lab Procel no desafio “Abastecimento de Água”, promovido pela Eletrobras, em 2020. “É uma diversificação das matrizes energéticas. Antes, só existia um caminho, o elétrico, ou a contingência, o gerador. Agora existe outro caminho”, explica Caio Mutz, diretor-executivo da Fluxus Soluções em Energia.

Tecnologia já está sendo utilizada pela Sabesp

A tecnologia de uso do gás natural como alternativa energética nos sistemas de bombeamento já está em funcionamento na Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

Atualmente são dez estações com o sistema já instalado ou em fase final de implantação. “A inovação no setor do saneamento tem grande potencial para melhorar a eficiência e otimizar o gerenciamento dos recursos naturais. O uso do gás natural, por exemplo, garante melhoria operacional e sustentabilidade ambiental”, diz a empresa.

Um dos locais com o sistema instalado é a Estação Elevatória João XXIII, localizada na zona sul e responsável por bombear a água do sistema Guarapiranga para os municípios de Taboão da Serra, Cotia, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo.

'É uma estação elevatória híbrida, ou seja, com bombas elétricas e bombas a gás. Se faltar a elétrica, ela vai funcionar com gás. Ou pode trabalhar as duas juntas', explica Bruno Teixeira Moreira (à dir.) acompanhado por Caio Mutz Foto: Taba Benedicto/ Estadão

De acordo com a Sabesp, ela é responsável pelo abastecimento de cerca de 845 mil habitantes de forma direta e, com o uso dos motores a gás, flexibiliza o abastecimento para mais 190 mil habitantes. O consumo médio de energia de instalação é de 1.550.000 kWh/mês.

Das seis bombas de 800 CV (1 CV é igual a 735,5 watts), duas funcionam a gás desde o final do ano passado. Até a utilização das bombas a gás, a estação enfrentava frequentes quedas de energia, o que ocasionava falta de água. Havia dificuldade de aumento da capacidade por causa de gargalos da infraestrutura de alimentação elétrica.

“É uma estação elevatória híbrida, ou seja, com bombas elétricas e bombas a gás. Se faltar a elétrica, ela vai funcionar com gás. Ou pode trabalhar as duas juntas”, explica Bruno Teixeira Moreira, diretor da Energ.

Na visão da companhia, o uso de duas matrizes “representa um novo conceito no sistema de adução que permite uma confiabilidade bem maior”.

Marcos Rosa, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Presbiteriana Mackenzie, ressalta que o uso do gás pode ser ainda mais relevante em condições climáticas atípicas, como na época da estiagem. A redução na quantidade de água disponível requer a utilização de fontes de água mais distantes ou mais profundas, aumentando os custos.

“Alguns players do mercado estão preocupados com a falta de chuva. O gás poderia atuar nesse cenário, ‘poupando’ o sistema hídrico”.

Marco do saneamento básico

A importância da diversificação das fontes energéticas no setor de saneamento vai além dos momentos de crise, como apagões e intempéries. A questão se relaciona também às metas do novo Marco Legal do Saneamento. Em vigor há três anos, a lei estabelece metas de 99% de acesso à água potável e 90% de acesso ao tratamento e coleta de esgoto até 2033.

Em média, o Estado de São Paulo apresenta números próximos à meta: 95,2% de acesso à água, 90,5% de coleta de esgoto e 88,2% de tratamento. Mas alguns municípios mantêm índices inferiores a 40%, como Guarulhos, Cotia, Itaquaquecetuba, Carapicuíba, Osasco e Barueri.

Estudo do Instituto Trata Brasil mostra que mais de 8 milhões de moradias brasileiras não estavam ligadas à rede geral de abastecimento de água tratada em 2022. São quase 35 milhões de brasileiros sem acesso à água tratada e 95 milhões não têm coleta e tratamento de esgoto.

A busca pela universalização do saneamento básico é uma questão de cidadania, com impactos diretos na saúde pública e na economia.

O físico Ely Dirani, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da PUC/SP, avalia que novas estações elevatórias podem contribuir com o alcance das metas do novo marco do saneamento.

“Será necessário construir mais uma série de estações elevatórias e a possibilidade de utilizar bombas a gás daria agilidade na construção, além de reduzir os custos”, diz o especialista. “Esta tecnologia não precisa de todos os componentes intermediários elétricos, como subestação, transformadores, painéis, inversores, motores elétricos e cabeamentos.”

Impactos no meio ambiente

Considerado como “combustível de transição”, etapa intermediária entre o petróleo para energias renováveis, o gás natural é um combustível fóssil, ou seja, contribui com a emissão de gases poluentes na atmosfera. Essa é a única desvantagem do uso do gás em relação à eletricidade na opinião de Adrianno Lorenzon, diretor de Gás Natural da Abrace, entidade que reúne mais de 50 grupos empresariais responsáveis por quase 40% do consumo industrial de energia elétrica do Brasil e 42% do consumo industrial de gás natural.

Essa é a mesma opinião de Shizuo, mas o professor faz uma ponderação em relação ao uso do diesel ou carvão. “O gás não é um combustível verde. Mas, considerando que o bombeamento seja feito por motores a combustão, o gás polui bem menos que o diesel.”

À primeira vista, Dirani afirma que pode parecer um “contrassenso” utilizar motores a combustão ao invés de motores elétricos para bombear água quando se pensa em sustentabilidade e poluição. “No entanto, ao considerar a solução completa, o principal problema relatado é a segurança no abastecimento”, diz o especialista.

Para neutralizar as emissões de gases poluentes, explica Mutz, a fonte de gás das bombas pode ser diversa, incluindo o biometano, que pode utilizar o lixo como matéria-prima, ou biogás (feito a partir da decomposição de materiais orgânicos). Ambos são 100% renováveis.

Apagões recentes evidenciam como a dependência da energia elétrica afeta a vida da população e das empresas. A situação se torna ainda mais crítica nos serviços essenciais, como o fornecimento de água. Essa preocupação vai além dos momentos de crise: as metas do novo marco do saneamento exigem a universalização dos serviços de água e esgoto até 2033. Nesse contexto, a diversificação das fontes energéticas nas estações de bombeamento, com o uso do gás natural, por exemplo, contribui com a operação contínua e a disponibilidade de água.

Historicamente associado à geração de calor e eletricidade, o gás natural vem sendo cada vez mais utilizado como fonte de energia motriz para acionamento de bombas e compressores. As principais vantagens estão relacionadas à regularidade, estabilidade e segurança no fornecimento, além de menos poluição que motores a diesel.

Para a distribuição de água, as companhias de saneamento utilizam estações elevatórias com um sistema de bombeamento. Para esse sistema funcionar, é preciso energia elétrica. Com a nova tecnologia, o acionamento das bombas deixa de ser elétrico e passa a ser feito por um motor a gás natural. É uma tecnologia disruptiva, já presente em outros países, e que começa a ganhar força no Brasil.

Motores a combustão alimentados por gás natural reduzem os impactos de eventuais quedas de energia elétrica, que é vulnerável à ação dos ventos, tempestades e acidentes. Transportado por meio de tubulações subterrâneas, o gás garante regularidade e confiabilidade de fornecimento superior à eletricidade. “É muito raro um gasoduto parar”, opina o engenheiro mecânico Silvio Shizuo, professor de Engenharia Mecânica da FEI.

Um dos locais com o sistema instalado é a Estação Elevatória João XXIII, localizada na zona sul e responsável por bombear a água do sistema Guarapiranga para os municípios de Taboão da Serra, Cotia, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo Foto: Taba Benedicto/ Estadão

A eficiência energética também entra na equação. No sistema elétrico convencional de acionamento das bombas, as perdas de energia podem variar entre 15% e 30% em função da longa cadeia de transmissão e de componentes intermediários, como cabeamentos, cabines e transformadores. Os sistemas de bombeamento movidos a gás conectam o combustível diretamente ao motor. Isso significa aumento da eficiência.

Desenvolvida pela Fluxus Soluções em Energia, distribuída pela Energ Geradores e conhecida comercialmente como “Sistema Fluxus”, a tecnologia vem se destacando em premiações que buscam soluções inovadoras em eficiência energética.

Um deles foi a conquista do Desafio de Inovação do Saneamento Open Spot 2021, promovida pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES). O sistema foi finalista da chamada pública Lab Procel no desafio “Abastecimento de Água”, promovido pela Eletrobras, em 2020. “É uma diversificação das matrizes energéticas. Antes, só existia um caminho, o elétrico, ou a contingência, o gerador. Agora existe outro caminho”, explica Caio Mutz, diretor-executivo da Fluxus Soluções em Energia.

Tecnologia já está sendo utilizada pela Sabesp

A tecnologia de uso do gás natural como alternativa energética nos sistemas de bombeamento já está em funcionamento na Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

Atualmente são dez estações com o sistema já instalado ou em fase final de implantação. “A inovação no setor do saneamento tem grande potencial para melhorar a eficiência e otimizar o gerenciamento dos recursos naturais. O uso do gás natural, por exemplo, garante melhoria operacional e sustentabilidade ambiental”, diz a empresa.

Um dos locais com o sistema instalado é a Estação Elevatória João XXIII, localizada na zona sul e responsável por bombear a água do sistema Guarapiranga para os municípios de Taboão da Serra, Cotia, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo.

'É uma estação elevatória híbrida, ou seja, com bombas elétricas e bombas a gás. Se faltar a elétrica, ela vai funcionar com gás. Ou pode trabalhar as duas juntas', explica Bruno Teixeira Moreira (à dir.) acompanhado por Caio Mutz Foto: Taba Benedicto/ Estadão

De acordo com a Sabesp, ela é responsável pelo abastecimento de cerca de 845 mil habitantes de forma direta e, com o uso dos motores a gás, flexibiliza o abastecimento para mais 190 mil habitantes. O consumo médio de energia de instalação é de 1.550.000 kWh/mês.

Das seis bombas de 800 CV (1 CV é igual a 735,5 watts), duas funcionam a gás desde o final do ano passado. Até a utilização das bombas a gás, a estação enfrentava frequentes quedas de energia, o que ocasionava falta de água. Havia dificuldade de aumento da capacidade por causa de gargalos da infraestrutura de alimentação elétrica.

“É uma estação elevatória híbrida, ou seja, com bombas elétricas e bombas a gás. Se faltar a elétrica, ela vai funcionar com gás. Ou pode trabalhar as duas juntas”, explica Bruno Teixeira Moreira, diretor da Energ.

Na visão da companhia, o uso de duas matrizes “representa um novo conceito no sistema de adução que permite uma confiabilidade bem maior”.

Marcos Rosa, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Presbiteriana Mackenzie, ressalta que o uso do gás pode ser ainda mais relevante em condições climáticas atípicas, como na época da estiagem. A redução na quantidade de água disponível requer a utilização de fontes de água mais distantes ou mais profundas, aumentando os custos.

“Alguns players do mercado estão preocupados com a falta de chuva. O gás poderia atuar nesse cenário, ‘poupando’ o sistema hídrico”.

Marco do saneamento básico

A importância da diversificação das fontes energéticas no setor de saneamento vai além dos momentos de crise, como apagões e intempéries. A questão se relaciona também às metas do novo Marco Legal do Saneamento. Em vigor há três anos, a lei estabelece metas de 99% de acesso à água potável e 90% de acesso ao tratamento e coleta de esgoto até 2033.

Em média, o Estado de São Paulo apresenta números próximos à meta: 95,2% de acesso à água, 90,5% de coleta de esgoto e 88,2% de tratamento. Mas alguns municípios mantêm índices inferiores a 40%, como Guarulhos, Cotia, Itaquaquecetuba, Carapicuíba, Osasco e Barueri.

Estudo do Instituto Trata Brasil mostra que mais de 8 milhões de moradias brasileiras não estavam ligadas à rede geral de abastecimento de água tratada em 2022. São quase 35 milhões de brasileiros sem acesso à água tratada e 95 milhões não têm coleta e tratamento de esgoto.

A busca pela universalização do saneamento básico é uma questão de cidadania, com impactos diretos na saúde pública e na economia.

O físico Ely Dirani, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da PUC/SP, avalia que novas estações elevatórias podem contribuir com o alcance das metas do novo marco do saneamento.

“Será necessário construir mais uma série de estações elevatórias e a possibilidade de utilizar bombas a gás daria agilidade na construção, além de reduzir os custos”, diz o especialista. “Esta tecnologia não precisa de todos os componentes intermediários elétricos, como subestação, transformadores, painéis, inversores, motores elétricos e cabeamentos.”

Impactos no meio ambiente

Considerado como “combustível de transição”, etapa intermediária entre o petróleo para energias renováveis, o gás natural é um combustível fóssil, ou seja, contribui com a emissão de gases poluentes na atmosfera. Essa é a única desvantagem do uso do gás em relação à eletricidade na opinião de Adrianno Lorenzon, diretor de Gás Natural da Abrace, entidade que reúne mais de 50 grupos empresariais responsáveis por quase 40% do consumo industrial de energia elétrica do Brasil e 42% do consumo industrial de gás natural.

Essa é a mesma opinião de Shizuo, mas o professor faz uma ponderação em relação ao uso do diesel ou carvão. “O gás não é um combustível verde. Mas, considerando que o bombeamento seja feito por motores a combustão, o gás polui bem menos que o diesel.”

À primeira vista, Dirani afirma que pode parecer um “contrassenso” utilizar motores a combustão ao invés de motores elétricos para bombear água quando se pensa em sustentabilidade e poluição. “No entanto, ao considerar a solução completa, o principal problema relatado é a segurança no abastecimento”, diz o especialista.

Para neutralizar as emissões de gases poluentes, explica Mutz, a fonte de gás das bombas pode ser diversa, incluindo o biometano, que pode utilizar o lixo como matéria-prima, ou biogás (feito a partir da decomposição de materiais orgânicos). Ambos são 100% renováveis.

Apagões recentes evidenciam como a dependência da energia elétrica afeta a vida da população e das empresas. A situação se torna ainda mais crítica nos serviços essenciais, como o fornecimento de água. Essa preocupação vai além dos momentos de crise: as metas do novo marco do saneamento exigem a universalização dos serviços de água e esgoto até 2033. Nesse contexto, a diversificação das fontes energéticas nas estações de bombeamento, com o uso do gás natural, por exemplo, contribui com a operação contínua e a disponibilidade de água.

Historicamente associado à geração de calor e eletricidade, o gás natural vem sendo cada vez mais utilizado como fonte de energia motriz para acionamento de bombas e compressores. As principais vantagens estão relacionadas à regularidade, estabilidade e segurança no fornecimento, além de menos poluição que motores a diesel.

Para a distribuição de água, as companhias de saneamento utilizam estações elevatórias com um sistema de bombeamento. Para esse sistema funcionar, é preciso energia elétrica. Com a nova tecnologia, o acionamento das bombas deixa de ser elétrico e passa a ser feito por um motor a gás natural. É uma tecnologia disruptiva, já presente em outros países, e que começa a ganhar força no Brasil.

Motores a combustão alimentados por gás natural reduzem os impactos de eventuais quedas de energia elétrica, que é vulnerável à ação dos ventos, tempestades e acidentes. Transportado por meio de tubulações subterrâneas, o gás garante regularidade e confiabilidade de fornecimento superior à eletricidade. “É muito raro um gasoduto parar”, opina o engenheiro mecânico Silvio Shizuo, professor de Engenharia Mecânica da FEI.

Um dos locais com o sistema instalado é a Estação Elevatória João XXIII, localizada na zona sul e responsável por bombear a água do sistema Guarapiranga para os municípios de Taboão da Serra, Cotia, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo Foto: Taba Benedicto/ Estadão

A eficiência energética também entra na equação. No sistema elétrico convencional de acionamento das bombas, as perdas de energia podem variar entre 15% e 30% em função da longa cadeia de transmissão e de componentes intermediários, como cabeamentos, cabines e transformadores. Os sistemas de bombeamento movidos a gás conectam o combustível diretamente ao motor. Isso significa aumento da eficiência.

Desenvolvida pela Fluxus Soluções em Energia, distribuída pela Energ Geradores e conhecida comercialmente como “Sistema Fluxus”, a tecnologia vem se destacando em premiações que buscam soluções inovadoras em eficiência energética.

Um deles foi a conquista do Desafio de Inovação do Saneamento Open Spot 2021, promovida pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES). O sistema foi finalista da chamada pública Lab Procel no desafio “Abastecimento de Água”, promovido pela Eletrobras, em 2020. “É uma diversificação das matrizes energéticas. Antes, só existia um caminho, o elétrico, ou a contingência, o gerador. Agora existe outro caminho”, explica Caio Mutz, diretor-executivo da Fluxus Soluções em Energia.

Tecnologia já está sendo utilizada pela Sabesp

A tecnologia de uso do gás natural como alternativa energética nos sistemas de bombeamento já está em funcionamento na Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

Atualmente são dez estações com o sistema já instalado ou em fase final de implantação. “A inovação no setor do saneamento tem grande potencial para melhorar a eficiência e otimizar o gerenciamento dos recursos naturais. O uso do gás natural, por exemplo, garante melhoria operacional e sustentabilidade ambiental”, diz a empresa.

Um dos locais com o sistema instalado é a Estação Elevatória João XXIII, localizada na zona sul e responsável por bombear a água do sistema Guarapiranga para os municípios de Taboão da Serra, Cotia, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo.

'É uma estação elevatória híbrida, ou seja, com bombas elétricas e bombas a gás. Se faltar a elétrica, ela vai funcionar com gás. Ou pode trabalhar as duas juntas', explica Bruno Teixeira Moreira (à dir.) acompanhado por Caio Mutz Foto: Taba Benedicto/ Estadão

De acordo com a Sabesp, ela é responsável pelo abastecimento de cerca de 845 mil habitantes de forma direta e, com o uso dos motores a gás, flexibiliza o abastecimento para mais 190 mil habitantes. O consumo médio de energia de instalação é de 1.550.000 kWh/mês.

Das seis bombas de 800 CV (1 CV é igual a 735,5 watts), duas funcionam a gás desde o final do ano passado. Até a utilização das bombas a gás, a estação enfrentava frequentes quedas de energia, o que ocasionava falta de água. Havia dificuldade de aumento da capacidade por causa de gargalos da infraestrutura de alimentação elétrica.

“É uma estação elevatória híbrida, ou seja, com bombas elétricas e bombas a gás. Se faltar a elétrica, ela vai funcionar com gás. Ou pode trabalhar as duas juntas”, explica Bruno Teixeira Moreira, diretor da Energ.

Na visão da companhia, o uso de duas matrizes “representa um novo conceito no sistema de adução que permite uma confiabilidade bem maior”.

Marcos Rosa, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Presbiteriana Mackenzie, ressalta que o uso do gás pode ser ainda mais relevante em condições climáticas atípicas, como na época da estiagem. A redução na quantidade de água disponível requer a utilização de fontes de água mais distantes ou mais profundas, aumentando os custos.

“Alguns players do mercado estão preocupados com a falta de chuva. O gás poderia atuar nesse cenário, ‘poupando’ o sistema hídrico”.

Marco do saneamento básico

A importância da diversificação das fontes energéticas no setor de saneamento vai além dos momentos de crise, como apagões e intempéries. A questão se relaciona também às metas do novo Marco Legal do Saneamento. Em vigor há três anos, a lei estabelece metas de 99% de acesso à água potável e 90% de acesso ao tratamento e coleta de esgoto até 2033.

Em média, o Estado de São Paulo apresenta números próximos à meta: 95,2% de acesso à água, 90,5% de coleta de esgoto e 88,2% de tratamento. Mas alguns municípios mantêm índices inferiores a 40%, como Guarulhos, Cotia, Itaquaquecetuba, Carapicuíba, Osasco e Barueri.

Estudo do Instituto Trata Brasil mostra que mais de 8 milhões de moradias brasileiras não estavam ligadas à rede geral de abastecimento de água tratada em 2022. São quase 35 milhões de brasileiros sem acesso à água tratada e 95 milhões não têm coleta e tratamento de esgoto.

A busca pela universalização do saneamento básico é uma questão de cidadania, com impactos diretos na saúde pública e na economia.

O físico Ely Dirani, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da PUC/SP, avalia que novas estações elevatórias podem contribuir com o alcance das metas do novo marco do saneamento.

“Será necessário construir mais uma série de estações elevatórias e a possibilidade de utilizar bombas a gás daria agilidade na construção, além de reduzir os custos”, diz o especialista. “Esta tecnologia não precisa de todos os componentes intermediários elétricos, como subestação, transformadores, painéis, inversores, motores elétricos e cabeamentos.”

Impactos no meio ambiente

Considerado como “combustível de transição”, etapa intermediária entre o petróleo para energias renováveis, o gás natural é um combustível fóssil, ou seja, contribui com a emissão de gases poluentes na atmosfera. Essa é a única desvantagem do uso do gás em relação à eletricidade na opinião de Adrianno Lorenzon, diretor de Gás Natural da Abrace, entidade que reúne mais de 50 grupos empresariais responsáveis por quase 40% do consumo industrial de energia elétrica do Brasil e 42% do consumo industrial de gás natural.

Essa é a mesma opinião de Shizuo, mas o professor faz uma ponderação em relação ao uso do diesel ou carvão. “O gás não é um combustível verde. Mas, considerando que o bombeamento seja feito por motores a combustão, o gás polui bem menos que o diesel.”

À primeira vista, Dirani afirma que pode parecer um “contrassenso” utilizar motores a combustão ao invés de motores elétricos para bombear água quando se pensa em sustentabilidade e poluição. “No entanto, ao considerar a solução completa, o principal problema relatado é a segurança no abastecimento”, diz o especialista.

Para neutralizar as emissões de gases poluentes, explica Mutz, a fonte de gás das bombas pode ser diversa, incluindo o biometano, que pode utilizar o lixo como matéria-prima, ou biogás (feito a partir da decomposição de materiais orgânicos). Ambos são 100% renováveis.

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