Apesar de importante, a restauração florestal exige um longo tempo para deixar determinada área parecida como o que era antes, explica Ricardo Gomes César, especialista em restauração florestal do Instituto de Pesquisas Ecológicas (Ipê). Nesta entrevista, o pesquisador também explica como ações ambientais efetivas podem contribuir para engajar a população na causa. Interromper a cultura antiambientalista que se instalou no País nos últimos anos, segundo César, também é uma tarefa urgente.
Os projetos de restauração florestal no Brasil vêm crescendo, mas há um enorme passivo acumulado. Quais as principais dificuldades para acelerar a disseminação desses projetos?
A principal dificuldade é o custo. Restauração não é algo barato. Há uma série de etapas complexas, incluindo estudos customizados, assistência técnica, treinamento, produção de mudas, preparação do solo e obras associadas, como a construção de cercas. Depois, é preciso fazer um acompanhamento cuidadoso ao longo de pelo menos dois anos.
Não é uma solução para larga escala, então?
Eu diria que não se pode pensar na restauração como uma solução mágica, mesmo porque, além dos custos, ela não substitui plenamente o que foi destruído pelo desmatamento. A restauração exige um longo tempo para que a área se torne parecida com o que era. É esperado que demore quase um século para que os estoques de carbono, a estrutura da floresta e a biodiversidade se aproximem dos originais. E, mesmo que dê tudo certo, o resultado nunca vai ser exatamente igual ao que era, porque o contexto será diferente de quando a área foi desmatada. O caminho é, portanto, parar com o desmatamento, interromper a cultura antiambientalista que se instalou nos últimos anos no Brasil.
Há indicadores universais confiáveis para monitorar áreas em restauração?
A referência mais citada costuma ser o número de árvores plantadas numa determinada área, mas isso, por si só, não é uma métrica relevante. É como dizer “doei 5 mil livros para uma escola” e imaginar que, apenas por conta desse ato isolado, as pessoas estão sendo educadas. Ações restaurativas nem sempre envolvem o plantio de árvores. Às vezes trata-se de colocar uma cerca para impedir a passagem do gado ou realizar uma obra para interromper o assoreamento. São ações que dão à natureza condições para que recupere os processos ecológicos. O mais importante é assegurar que esses projetos sejam sustentáveis a longo prazo.
Como engajar as pessoas em projetos de restauração?
Esse é outro ponto fundamental, pois certamente não existe restauração bem-sucedida a longo prazo sem o engajamento das pessoas. No caso do Ipê, a restauração é feita pela comunidade. Capacitamos as pessoas para produzir e vender mudas e contratamos gente local para executar o plantio, gerando empregos e renda. Boa parte da conscientização vem acontecendo também pela percepção de que o clima está mudando e as coisas estão deixando de ser como eram. Outro dia fomos procurados por um proprietário rural que contou que o rio dentro da propriedade, que nunca tinha secado, agora estava seco. Ele queria fazer algo a respeito. Infelizmente, esse tipo de constatação vai se tornar cada vez mais frequente.
O tamanho do desafio
O Observatório da Restauração e do Reflorestamento, iniciativa criada pela Coalização Brasil, vem consolidando informações sobre recuperação ambiental a partir de informações de campo e dados de satélite. O Observatório já mapeou 79,1 mil hectares de restauração – em grande parte concentrados na Região Sudeste e no bioma Mata Atlântica –, além de 11 milhões de hectares em regeneração natural e 9,4 milhões de hectares de reflorestamento. A desproporção entre o volume de áreas dedicadas à restauração (apenas 0,01% do território brasileiro) e o volume em regeneração natural e reflorestamento (2,39% do território) deixa claro o quanto há para avançar na prática da restauração.