O balanço do desmatamento na Mata Atlântica no último ano aponta em duas direções. Por um lado, o desmate caiu 27% (de 20.075 para 14.697 hectares) entre 2022 e 2023 nas áreas superiores a três hectares, consideradas de floresta madura, com maior biodiversidade. Mas, o desflorestamento no bioma aumentou cerca de 10% (de 74.556 para 81.356 hectares) nos fragmentos menores e menos consolidados, ou que estão em áreas de transição e incrustados na Caatinga e no Cerrado. No total, foram mais de 200 campos de futebol desmatados por dia.
Os dados foram divulgados nesta terça-feira, 21, na nova edição do Atlas da Mata Atlântica, monitoramento realizado pela Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) há 33 anos.
O diretor executivo do SOS Mata Atlântica, Luís Fernando Guedes Pinto, conecta os resultados nessas áreas com perfis distintos principalmente às diferenças na aplicação da lei federal 11.428/2006, que protege o bioma.
“O aumento do desmatamento no Nordeste está nas regiões de expansão da fronteira agrícola, que está derrubando matas em velocidade até maior do que no ano passado. Isso indica que nessas regiões a lei da Mata Atlântica não está sendo aplicada”, disse ao Estadão. Segundo ele, nessas áreas de fronteira ou de “ilhas” de Mata Atlântica em outros biomas, a lei muitas vezes é questionada por proprietários de terra e até por autoridades ambientais.
Por isso, ele considera a queda do desmatamento na floresta madura uma notícia boa, mas com restrições: “É sinal de que a governança está funcionando e que a lei da Mata Atlântica está sendo respeitada nas áreas maiores. Mas, sempre com a ressalva de que a gente não está satisfeito, que é para comemorar com cautela. Queríamos que o desmatamento fosse zero”.
Segundo o Atlas, apenas 0,9% das perdas se deu em áreas protegidas, como unidades de conservação, enquanto 73% ocorreram em terras privadas. Hoje, os remanescentes da Mata Atlântica correspondem a apenas 24% da área da floresta Atlântica pré-colonização. O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima informou que um plano de proteção à Mata Atlântica deve ser lançado entre setembro e outubro deste ano (leia mais abaixo).
Duas boas e duas más notícias sobre a Mata Atlântica
- A queda para 14.697 ha desmatados nas áreas de floresta madura vem depois de dois anos com perdas superiores aos 20 mil ha registradas pelo Atlas;
- Houve diminuição do desmatamento em 13 dos 17 Estados que o bioma abrange
- Mesmo na porção onde houve queda, 14.697 ha ainda é considerado um número alto pela SOS Mata Atlântica, por ter sido subtraído dos remanescentes mais bem conservados da floresta;
- O valor está acima do que foi desmatado de 2018 a 2020.
Plano da Mata Atlântica será lançado ainda este ano, diz secretário do MMA
As informações divulgadas pela Fundação SOS Mata Atlântica utilizam dois sistemas de monitoramento. O que consta no Atlas é feito pelo Inpe através de imagens de satélite e diz respeito a um retrato anual dos grandes fragmentos florestais do bioma.
Já o desmatamento das áreas menores, a partir de 0,3 ha, foi detectado pelo SAD Mata Atlântica. Trata-se de uma compilação de dados divulgados semanalmente na plataforma MapBiomas Alerta para detectar de forma ágil os focos de desmatamento e auxiliar no trabalho dos órgãos de fiscalização.
“É um óculos muito mais potente, que mapeia também as florestas jovens e que enxerga desmatamentos muito menores”, define Luís Fernando Guedes Pinto, da SOS.
Para o diretor da organização, o combate ao desflorestamento da Mata Atlântica depende da aplicação da lei que a protege nos 17 Estados em que ela está presente e do Código Florestal, principalmente no campo.
Ao Estadão, o secretário de Controle do Desmatamento do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, André Lima, afirmou que o plano para a Mata Atlântica deve ser lançado entre setembro e outubro deste ano. Segundo ele, Amazônia e Cerrado foram o foco principal nos primeiros dois anos de governo porque concentram 85% dos desmatamentos no País.
“Já estamos articulando também medidas complementares e parcerias com os Estados. Certamente, vamos chamar esses Estados que estão tendo dificuldade de aplicação da lei da Mata Atlântica, além de aumentar a fiscalização que já vem acontecendo por parte das ações do Ibama”, disse.
De 2006, a lei da Mata Atlântica foi um divisor de águas para os índices de desmatamento do bioma, que tinha patamares ainda mais altos até a década de 1990 e 2000. Na visão de Guedes Pinto, a aplicação rigorosa da legislação pode servir de inspiração para a proteção de outros biomas e sua aplicação nos encraves, os trechos de mata inseridos no Cerrado ou Caatinga, pode contribuir na sua conservação.