Ilhabela, no litoral norte de São Paulo, passou a contar, neste ano, com um Mercado Municipal. Desde o último dia 15, comerciantes oferecem ao público hortaliças, frutas, geleias e outros produtos oriundos da agricultura familiar, de terça a domingo, na Barra Velha. A ideia é fomentar a produção local, estimulando o consumo sustentável de alimentos saudáveis e orgânicos.
O frescor dos itens produzidos na ilha é um ponto crucial para o município, separado do continente por uma balsa. “Geralmente as coisas vêm de fora e, apesar de tudo passar por um controle de qualidade, recebemos produtos que não são totalmente frescos”, explica Mayra Hirakawa, secretária adjunta de Comunidades Tradicionais, Pesca e Agricultura, órgão responsável pela administração do mercado.
Segundo ela, o estabelecimento atende aos três pilares da sustentabilidade: social, econômico e ambiental, em prol de uma cultura diversificada e sem o uso de agrotóxicos. Hirakawa ressalta que a iniciativa pretende levar alimentação de qualidade à mesa do consumidor e apoiar pequenos produtores a viverem 100% da agricultura.
Mateus Borges é uma das exceções do município e vive da produção agrícola. Filho de produtores no Estado do Paraná, passou a produzir o próprio alimento em Ilhabela há 30 anos, estimulado pela falta de hortaliças livres de agrotóxicos nos mercados locais. “A horta acabou crescendo e virou meu negócio”, relata.
Cofundador e diretor operacional da Associação Mercado Verde, que representa alguns dos produtores presentes no novo estabelecimento, ele acredita que o mercado ainda tem um longo caminho pela frente até atingir todo o seu potencial.
“Ser produtor agrícola em terras caiçaras é muita resistência”, afirma a turismóloga e mestre em sustentabilidade Camila Lopes Seixas, outra fundadora da associação. “É muito importante que os agricultores tenham esse espaço para comercializar produtos que, por tantas vezes, nós vimos indo para doações e até jogados fora.”
Com uma economia centrada no turismo, a produção de alimentos não é uma prioridade em Ilhabela. A aposta dos agricultores é de que o mercado mude essa história.
A associação, que vinha enfrentando as intempéries do clima em feiras nas praças públicas desde 2020, passa a contar com a estrutura coberta e refrigerada do mercado, que ainda oferece banheiros, estacionamento e a ajuda da Prefeitura na divulgação do espaço e de seus expositores.
“Com um espaço digno para expor seus produtos, muita gente tem voltado a se animar para continuar produzindo, melhorar as produções e fazer investimentos”, observa Camila. “Esse protagonismo que o mercado traz para o produtor local é imprescindível para o desenvolvimento econômico, social, ambiental e cultural de Ilhabela, além de servir como exemplo para as cidades vizinhas.”
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Sem produtos animais
Massas, pães, bolos, compotas, arranjos florais, chás e chocolates estão entre os demais itens que podem ser comercializados no mercado, que ainda não aceita produtos de origem animal.
“Nesse primeiro momento, a gente preferiu não mexer com mel, queijos, leite e derivados de produtos animais. Embutidos só se forem de origem vegetal, como salsichas e hambúrgueres de soja, de carne de jaca, etc...”, explica a secretária municipal. “Com a expansão do mercado, a gente pretende abraçar esses produtos de origem animal que são muito ricos e procurados”, diz Hirakawa.
Entre os motivos da restrição estão entraves legais que ainda impedem a implementação efetiva de um serviço de inspeção municipal. A adoção do serviço, via consórcio intermunicipal, está em processo e também deve permitir a venda dos produtos de Ilhabela para outras 14 cidades, como Taubaté, no Vale do Paraíba.
Força comunitária
O nome Benedito Sampaio de Oliveira, que batiza o mercado municipal, homenageia o marinheiro caiçara “Seu Lico”, que, após se aposentar da profissão, dedicou-se ao cultivo de banana, milho, feijão, mandioca e hortaliças, e à pecuária, com a criação de gado leiteiro.
“Os mercados são ancestrais, são espaços de troca, e não só monetária e de alimentos, mas de saberes vindos das histórias da produção agrícola local, de resistência das famílias indígenas, quilombolas e caiçaras”, observa a gestora ambiental Natália Almeida Souza, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em agricultura tradicional e alimentação.
A especialista, integrante da diretoria da Associação Brasileira de Agroecologia, avalia como fundamental a inauguração do mercado. “Angra dos Reis, Paraty, São Sebastião, Caraguatatuba e Ubatuba têm muito o que aprender com essa iniciativa para que a gente possa construir uma grande rede territorial de equipamentos públicos voltados à soberania e à segurança alimentar, que privilegia as comunidades tradicionais, em diálogo com os movimentos sociais e os órgãos de pesquisa”, diz.
Espaço restrito
Apesar dos avanços, a Associação Mercado Verde reclama do espaço reduzido reservado à entidade no local. Dez associados se revezam para que quatro produtores possam comercializar seus produtos a cada dia em uma baia de 4m². A previsão é de que mais 12 associados se somem ao revezamento até dezembro.
Segundo Camila, a associação dialoga com a secretaria municipal para expandir o espaço da entidade, que possui cerca de 160 cadastrados, incluindo produtores de economia criativa, artesanato e alimentos. A Prefeitura afirmou que pretende limpar o terreno próximo ao mercado para iniciar uma obra de expansão no início do próximo ano.
No total, a gestão municipal disponibiliza 16 vagas de 4m² para cada comerciante ou entidade voltada à produção artesanal. Até o momento, além da associação, quatro microempreendedores individuais marcam presença no local, ao custo de uma taxa mensal de R$ 150. As inscrições para as 11 vagas restantes podem ser feitas até agosto de 2025.
Serviço
Mercado Municipal Benedito Sampaio de Oliveira
Local: Rua Benedito dos Santos Sampaio, 418 – Barra Velha - Ilhabela (SP)
Horário: Terça a sábado, das 8h às 17h; domingos, das 8h às 14h.