O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse em seu discurso na COP-27 nesta quarta-feira, 16, que pretende oferecer o Brasil para sediar a 30ª edição da conferência climática, a ser realizada em 2025. O anúncio faz parte de uma estratégia já antecipada pelo petista durante sua campanha, e reforçada nas últimas semanas, para reposicionar o País no cenário internacional de combate às mudanças climáticas e degradação ambiental. A tarefa, entretanto, pode ser mais difícil do que parece.
Em seu guia oficial, a Organização das Nações Unidas (ONU) aponta que os países interessados em sediar uma Cúpula do Clima precisam se programar com, pelo menos, 485 dias de antecedência. Há ainda uma lista de compromissos, regras e responsabilidades a serem cumpridas pelo candidato.
“O sucesso (para esses encontros) depende de um esforço coordenado e cooperativo em escala nacional”, aponta a ONU. O principal documento a guiar essa empreitada é o Acordo de País Anfitrião (Host Country Agreement - HAC, em inglês).
Como é o processo de seleção para um país sediar a COP?
Primeiro, o país precisa convencer os outros membros do seu grupo regional de que sua oferta será a escolhida entre eles. São cinco grupos, segundo a ONU: África, Ásia-Pacífico, Europa Oriental, Europa Ocidental e Outros, e América Latina e Caribe, do qual o Brasil faz parte.
Uma vez que a oferta for acordada entre os países daquela região, o representante do grupo envia uma carta oficial como “manifestação de interesse” à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCC, na sigla original), seguindo um modelo padrão da organização.
A COP então aceita a oferta e envia um representando ao país para uma “missão” que determina se há “elementos logísticos, técnicos e financeiros disponíveis para sediar os encontros”. O resultado é entregue ao escritório da COP ainda no primeiro trimestre do ano em que o evento acontecerá, mas as negociações podem ser iniciadas com até cinco anos de antecedência.
O que um país precisa para sediar a COP?
O anfitrião da COP precisa seguir uma série de recomendações em eixos que vão de comunicação e hospedagem a segurança, infraestrutura e transporte. As situações e exigências são adaptadas de acordo com o contexto de cada país, mas seguem algumas lógicas básicas, como:
- Cronograma: a produção para o evento deve começar com mais de um ano de antecedência e ser feita em conjunto com os oficiais da ONU, que precisam acompanhar todas as etapas e problemas que possam surgir. Como indicativo, a organização sugere que o primeiro encontro oficial seja feito pelo menos 485 dias antes da data prevista para a COP.
- Segurança: a COP reúne alguns dos maiores líderes mundiais e cabe ao país anfitrião garantir que todos os participantes, locais e eventos sigam uma série de diretrizes para garantir a segurança dos participantes durante a Cúpula.
- Viagens: o país também se compromete a bancar os custos de deslocamento, incluindo bagagens e hospedagem, para todos os funcionários da COP e das Nações Unidas.
- Infraestrutura: o país é o responsável por providenciar o local para a realização da COP, com capacidade para 17 mil participantes, incluindo escritórios e salas de reunião, móveis, acesso a internet, suporte técnico etc.
- Comunicação: logo, hashtags, site oficial, difusão na mídia e alinhamento da mensagem geral e engajamento sobre o evento também são de responsabilidade do país.
- Vistos: garantia do visto e da entrada de todos os participantes da COP, independentemente do país.
- Encontros prévios: o país também precisa organizar uma série de encontros e reuniões a serem realizadas antes da data oficial de início da COP e feitas em parceria com o secretariado da UNFCC para garantir uma representatividade mínimas das nações participantes.
O Brasil já sediou alguma COP?
Não. O Brasil promoveu a Conferência ECO-92 ou Rio-92, realizada na capital fluminense entre 3 e 14 de junho daquele ano. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida também como Cúpula da Terra, foi um marco internacional de cooperação pelo meio ambiente, contou com representantes de 179 países e resultou em uma série de tratados, acordos e planos de ação pela preservação ambiental e pelo desenvolvimento sustentável.
Em 2019, o Brasil seria o anfitrião da COP-25, mas o evento foi cancelado no País a pedido do presidente Jair Bolsonaro. À época, um comunicado do Itamaraty justificou a decisão dizendo que o País “se viu obrigado” a retirar sua candidatura por “restrições fiscais e orçamentárias”. A conferência então foi realizada em Madri, na Espanha.
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Quais países da América Latina já sediaram a COP?
Apenas três países do grupo América Latina e Caribe, ao qual o Brasil pertence, já receberam a COP desde que a conferência anual foi criada em 1997. A Argentina foi a anfitriã da COP-4 e da COP-10, realizadas em 1998 e 2004, respectivamente, em Buenos Aires. Em 2010, foi a vez de o México realizar a COP-16, em Cancún. E a última conferência realizada na região foi em 2014, quando o Peru sediou a COP-20 em Lima.
Por que Lula propôs sediar a COP-30?
Em seu discurso, Lula frisou que “a agenda climática será uma das prioridades” de seu governo e prometeu “zerar o desmatamento e a degradação de nossos biomas até 2030″. Caso o plano se concretize ou esteja minimamente avançado até 2025, receber ministros e líderes mundiais na Amazônia pode ser uma forma de transformar a COP-30 em uma grande vitrine das ações ecológicas do governo e retomar o prestígio internacional do Brasil nesta área.
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O que o Brasil ganha se sediar uma COP?
Sediar uma COP pode trazer vantagens políticas, econômicas e midiáticas ao Brasil, uma vez que há um grande movimento no setor turístico para receber todos os convidados e repórteres, ao mesmo tempo em que o país anfitrião ganha um nível de prestígio internacional pela realização do evento.
Ao mesmo tempo, a organização do país precisa ser minuciosamente planejada com antecedência, uma vez que ele estará sob uma lupa mundial e será cobrado por seu engajamento ecológico, defesa prática do meio ambiente e todos os problemas logísticos possíveis. Logo, a produção de um evento do tamanho da COP na Amazônia pode ser particularmente desafiadora, considerando dificuldades como transporte, hospedagem e segurança em boa parte da região.
Onde serão as próximas COPs?
A COP-28, que é a próxima, já tem data e local definidos: será em Dubai, nos Emirados Árabes, entre 6 e 17 de novembro de 2023.
A COP-29, a ser realizada no ano seguinte, já é motivo para uma disputa informal entre a República Tcheca, a Bulgária e a Austrália.
Por ora, o Brasil é o único país que manifestou interesse em sediar a COP-30.