Peixes e praias de Ubatuba estão contaminados com microplásticos, diz estudo


Material de pesca se confunde com alimento natural, é ingerido por animais e se acumula no trato digestivo; Secretaria do Meio Ambiente diz desenvolver programa Mar sem Lixo

Por Roberta Jansen e Clara Marques

Pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp) publicaram um estudo que investigou vestígios de microplásticos nas águas, areias e peixes de regiões de Ubatuba, litoral norte de São Paulo, e detectaram grandes níveis de contaminação.

Em Barra Seca, um dos locais observados, metade dos peixes analisados tinha partículas plásticas no trato intestinal. Nos últimos anos, cientistas têm identificado vestígios desse material em tecidos humanos, como nos pulmões, e os riscos à saúde ainda são investigados.

Procurada pela reportagem, a Secretaria de Municipal de Meio Ambiente de Ubatuba não respondeu. Já a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística destacou o programa Mar sem Lixo, coordenado pela Fundação Florestal (leia mais abaixo).

Pesquisadores encontraram partículas plásticas no trato intestinal de metade dos peixes da praia de Barra Seca; águas mais calmas facilitam acúmulo de sujeira no mar. Foto: Prefeitura Municipal de Ubatuba
  • Considerando os 65 fragmentos analisados para identificação química, 59 (90,8%) resultaram em polímeros sintéticos, em sua maioria plásticos. O polipropileno (PP) e o polietileno tereftalato (PET) predominaram, correspondendo a 50% e 28% dos microplásticos, seguidos por poliamida (11%) e poliéster (11%).

“Pelo tipo principal de microplástico observado no estudo, acreditamos que a maior fonte seja por meio de materiais de pesca como linhas e redes, assim como resíduos plásticos que se degradam ao longo do tempo, como garrafas plásticas”, diz Esteban Nogueira, pesquisador no Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do estudo.

Para o estudo, foram analisadas variáveis como temperatura, acidez e presença de sólidos suspensos/turbidez da água. Os pesquisadores aplicaram, em um primeiro momento, um critério visual para determinar a presença ou ausência de estruturas orgânicas nas amostras, cores e tipos de fibras encontradas. Após esse passo, foram feitas análises químicas, para comprovar que se tratavam de partículas plásticas.

‘Peixe-rei’ está com alto nível de contaminação

Além de amostras de areia, a espécie coletada foi o peixinho Atherinella brasiliensis, o “Peixe-rei”. Por ser pequeno, abundante na região e onívoro, ou seja, com dieta diversificada, os indivíduos dessa espécie eram bom indicador para os estudos, tanto por ser de fácil captura, como por ser bom indicador de impacto ambiental.

Peixe-rei tem uma dieta bastante diversificada; pesquisadores acreditam que animais confundem partículas com seu próprio alimento. Foto: Smithsonian Tropical Research Institute

Segundo os cientistas, a praia de Barra Seca foi o ponto com maior impacto de microplástico sobre os peixes - mais da metade deles contém partículas plásticas no trato gastrointestinal. A hipótese é de que, por ser de águas mais calmas, essa praia tende a acumular mais sujeira por conta das correntes marítimas.

Para Nogueira, os animais confundiam as partículas com seu próprio alimento. A maioria dos plásticos encontrados eram de cor azul ou transparente - uma armadilha para os peixes. Com o volume de consumo, no trato digestivo se acumula plástico e os animais morrem por não poder mais se alimentar.

O estudo da Ufscar e da Unesp foi feito ao longo de 2021. Foram coletados 120 peixes nas praias de Barra Seca e Perequê-Açú e encontradas partículas sintéticas de plástico no corpo de 38% dos peixes analisados.

Diferenças na concentração de microplásticos nas épocas do ano

Também foi analisada a concentração dos microplásticos de forma comparativa entre diferentes épocas do ano. Para os pesquisadores, o inverno apresentou menor quantidade de partículas na área de manguezal (Barra-Seca).

  • No verão, os microplásticos deságuam na região por conta do maior volume de chuvas. Em Perequê-Açú, a quantidade de microplásticos foi similar para os dois períodos (inverno e verão).
  • No verão, em Barra Seca, a concentração chegou a 490 partículas por metro cúbico. Em Perequê-Açú, nessa mesma época do ano, essa concentração indicava 300 partículas por m³.

“Acreditávamos que no verão, com mais turismo, haveria maior deposição de microplásticos na praia, devido a um aumento de lixo decorrente dos visitantes da praia”, acrescenta Nogueira.

Conforme a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, o programa Mar sem Lixo, coordenado pela Fundação Florestal, paga pescadores artesanais e de arrasto pela remoção de resíduos no oceano, além de ações educacionais. Segundo relatório da Fundação Florestal, o Mar sem Lixo já retirou, entre 2022 e este ano, 9,9 toneladas de lixo pela pesca de arrasto e 13,2 toneladas dos manguezais.

Prejuízos à saúde humana

Além de ingerirem microplásticos, humanos inalam as pequenas partículas em grande volume, segundo a professora Thais Mauad, da Faculdade de Medicina da USP. O grupo dela já encontrou microplástico em pulmões humanos.

“As principais maneiras de o microplástico entrar no organismo humano são por meio da ingestão ou da inalação”, explica Thais. “É um problema ambiental gravíssimo. São diferentes tipos de plástico com aditivos diversos, muitos deles com potencial cancerígeno e disruptor endócrino.”

  • Segundo Thais, estudos mostram que microplásticos têm capacidade de alterar a estrutura celular, induzir proteínas inflamatórias no organismo e causar danos ao DNA. Um dos trabalhos mostra ainda que as partículas podem induzir doenças autoimunes e elevar riscos de infarto e AVC. As micropartículas já foram achadas no pulmão, na corrente sanguínea, no trato intestinal e até no coração.

Ao que tudo indica, os microplásticos já estão em todo o planeta. Já foram encontradas partículas nas profundezas dos oceanos, no intestino de peixes, em aves, em desertos, na Amazônia e, até mesmo, no alto do Monte Everest. Segundo Thaís, um dos lugares mais contaminados é a nossa própria casa.

Estudos experimentais publicados este ano, conduzidos por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e publicados no periódico Journal of Toxicology and Environmental Health, observaram a presença de microplásticos em múltiplos órgãos.

A publicação mostrou que microplásticos (MPs) e nanoplásticos (NPs) podem causar danos físicos e químicos às células, tecidos e órgãos humanos. As observações apontam que a contaminação por esses componentes pode interromper processos celulares, desencadeando inflamação e estresse oxidativo, além de impactar o equilíbrio hormonal e de neurotransmissores. Além disso, essas partículas podem atuar como vetores de substâncias químicas tóxicas e patógenos.

Microplásticos podem se acumular nas artérias

Pesquisadores chineses mostraram, em estudo que revisou a distribuição ambiental, os níveis de exposição humana e a toxicidade dos microplásticos, que os humanos podem ser expostos aos microplásticos por ingestão oral, inalação e contato com a pele.

“Estudos apontam a presença de microplásticos em placas de ateroma, que se formam nas paredes internas das artérias. Esse depósito diminui o calibre arterial e aumenta em até quatro vezes o risco de problemas vasculares”, comenta Eliseth Leão, pesquisadora do Hospital Israelita Albert Einstein.

Tamanha a presença das micropartículas plásticas no ambiente, a cadeia alimentar tem sido seriamente afetada, com acúmulo nos diferentes níveis tróficos. Predadores topo, últimos na cadeia, têm apresentado maior concentração de microplásticos. Humanos também entram nessa conta.

“Sobre a biodiversidade, o principal impacto está na ingestão e na inalação dos plásticos, principalmente pelo fato de que eles são confundidos com alimentos pelos animais. Eles também podem afetar na forma como é feita a polinização, já que o plástico causa falsa saciedade nos animais”, diz Letícia Correia, doutoranda em Ecologia na Federal do Pará (UFPA).

Pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp) publicaram um estudo que investigou vestígios de microplásticos nas águas, areias e peixes de regiões de Ubatuba, litoral norte de São Paulo, e detectaram grandes níveis de contaminação.

Em Barra Seca, um dos locais observados, metade dos peixes analisados tinha partículas plásticas no trato intestinal. Nos últimos anos, cientistas têm identificado vestígios desse material em tecidos humanos, como nos pulmões, e os riscos à saúde ainda são investigados.

Procurada pela reportagem, a Secretaria de Municipal de Meio Ambiente de Ubatuba não respondeu. Já a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística destacou o programa Mar sem Lixo, coordenado pela Fundação Florestal (leia mais abaixo).

Pesquisadores encontraram partículas plásticas no trato intestinal de metade dos peixes da praia de Barra Seca; águas mais calmas facilitam acúmulo de sujeira no mar. Foto: Prefeitura Municipal de Ubatuba
  • Considerando os 65 fragmentos analisados para identificação química, 59 (90,8%) resultaram em polímeros sintéticos, em sua maioria plásticos. O polipropileno (PP) e o polietileno tereftalato (PET) predominaram, correspondendo a 50% e 28% dos microplásticos, seguidos por poliamida (11%) e poliéster (11%).

“Pelo tipo principal de microplástico observado no estudo, acreditamos que a maior fonte seja por meio de materiais de pesca como linhas e redes, assim como resíduos plásticos que se degradam ao longo do tempo, como garrafas plásticas”, diz Esteban Nogueira, pesquisador no Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do estudo.

Para o estudo, foram analisadas variáveis como temperatura, acidez e presença de sólidos suspensos/turbidez da água. Os pesquisadores aplicaram, em um primeiro momento, um critério visual para determinar a presença ou ausência de estruturas orgânicas nas amostras, cores e tipos de fibras encontradas. Após esse passo, foram feitas análises químicas, para comprovar que se tratavam de partículas plásticas.

‘Peixe-rei’ está com alto nível de contaminação

Além de amostras de areia, a espécie coletada foi o peixinho Atherinella brasiliensis, o “Peixe-rei”. Por ser pequeno, abundante na região e onívoro, ou seja, com dieta diversificada, os indivíduos dessa espécie eram bom indicador para os estudos, tanto por ser de fácil captura, como por ser bom indicador de impacto ambiental.

Peixe-rei tem uma dieta bastante diversificada; pesquisadores acreditam que animais confundem partículas com seu próprio alimento. Foto: Smithsonian Tropical Research Institute

Segundo os cientistas, a praia de Barra Seca foi o ponto com maior impacto de microplástico sobre os peixes - mais da metade deles contém partículas plásticas no trato gastrointestinal. A hipótese é de que, por ser de águas mais calmas, essa praia tende a acumular mais sujeira por conta das correntes marítimas.

Para Nogueira, os animais confundiam as partículas com seu próprio alimento. A maioria dos plásticos encontrados eram de cor azul ou transparente - uma armadilha para os peixes. Com o volume de consumo, no trato digestivo se acumula plástico e os animais morrem por não poder mais se alimentar.

O estudo da Ufscar e da Unesp foi feito ao longo de 2021. Foram coletados 120 peixes nas praias de Barra Seca e Perequê-Açú e encontradas partículas sintéticas de plástico no corpo de 38% dos peixes analisados.

Diferenças na concentração de microplásticos nas épocas do ano

Também foi analisada a concentração dos microplásticos de forma comparativa entre diferentes épocas do ano. Para os pesquisadores, o inverno apresentou menor quantidade de partículas na área de manguezal (Barra-Seca).

  • No verão, os microplásticos deságuam na região por conta do maior volume de chuvas. Em Perequê-Açú, a quantidade de microplásticos foi similar para os dois períodos (inverno e verão).
  • No verão, em Barra Seca, a concentração chegou a 490 partículas por metro cúbico. Em Perequê-Açú, nessa mesma época do ano, essa concentração indicava 300 partículas por m³.

“Acreditávamos que no verão, com mais turismo, haveria maior deposição de microplásticos na praia, devido a um aumento de lixo decorrente dos visitantes da praia”, acrescenta Nogueira.

Conforme a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, o programa Mar sem Lixo, coordenado pela Fundação Florestal, paga pescadores artesanais e de arrasto pela remoção de resíduos no oceano, além de ações educacionais. Segundo relatório da Fundação Florestal, o Mar sem Lixo já retirou, entre 2022 e este ano, 9,9 toneladas de lixo pela pesca de arrasto e 13,2 toneladas dos manguezais.

Prejuízos à saúde humana

Além de ingerirem microplásticos, humanos inalam as pequenas partículas em grande volume, segundo a professora Thais Mauad, da Faculdade de Medicina da USP. O grupo dela já encontrou microplástico em pulmões humanos.

“As principais maneiras de o microplástico entrar no organismo humano são por meio da ingestão ou da inalação”, explica Thais. “É um problema ambiental gravíssimo. São diferentes tipos de plástico com aditivos diversos, muitos deles com potencial cancerígeno e disruptor endócrino.”

  • Segundo Thais, estudos mostram que microplásticos têm capacidade de alterar a estrutura celular, induzir proteínas inflamatórias no organismo e causar danos ao DNA. Um dos trabalhos mostra ainda que as partículas podem induzir doenças autoimunes e elevar riscos de infarto e AVC. As micropartículas já foram achadas no pulmão, na corrente sanguínea, no trato intestinal e até no coração.

Ao que tudo indica, os microplásticos já estão em todo o planeta. Já foram encontradas partículas nas profundezas dos oceanos, no intestino de peixes, em aves, em desertos, na Amazônia e, até mesmo, no alto do Monte Everest. Segundo Thaís, um dos lugares mais contaminados é a nossa própria casa.

Estudos experimentais publicados este ano, conduzidos por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e publicados no periódico Journal of Toxicology and Environmental Health, observaram a presença de microplásticos em múltiplos órgãos.

A publicação mostrou que microplásticos (MPs) e nanoplásticos (NPs) podem causar danos físicos e químicos às células, tecidos e órgãos humanos. As observações apontam que a contaminação por esses componentes pode interromper processos celulares, desencadeando inflamação e estresse oxidativo, além de impactar o equilíbrio hormonal e de neurotransmissores. Além disso, essas partículas podem atuar como vetores de substâncias químicas tóxicas e patógenos.

Microplásticos podem se acumular nas artérias

Pesquisadores chineses mostraram, em estudo que revisou a distribuição ambiental, os níveis de exposição humana e a toxicidade dos microplásticos, que os humanos podem ser expostos aos microplásticos por ingestão oral, inalação e contato com a pele.

“Estudos apontam a presença de microplásticos em placas de ateroma, que se formam nas paredes internas das artérias. Esse depósito diminui o calibre arterial e aumenta em até quatro vezes o risco de problemas vasculares”, comenta Eliseth Leão, pesquisadora do Hospital Israelita Albert Einstein.

Tamanha a presença das micropartículas plásticas no ambiente, a cadeia alimentar tem sido seriamente afetada, com acúmulo nos diferentes níveis tróficos. Predadores topo, últimos na cadeia, têm apresentado maior concentração de microplásticos. Humanos também entram nessa conta.

“Sobre a biodiversidade, o principal impacto está na ingestão e na inalação dos plásticos, principalmente pelo fato de que eles são confundidos com alimentos pelos animais. Eles também podem afetar na forma como é feita a polinização, já que o plástico causa falsa saciedade nos animais”, diz Letícia Correia, doutoranda em Ecologia na Federal do Pará (UFPA).

Pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp) publicaram um estudo que investigou vestígios de microplásticos nas águas, areias e peixes de regiões de Ubatuba, litoral norte de São Paulo, e detectaram grandes níveis de contaminação.

Em Barra Seca, um dos locais observados, metade dos peixes analisados tinha partículas plásticas no trato intestinal. Nos últimos anos, cientistas têm identificado vestígios desse material em tecidos humanos, como nos pulmões, e os riscos à saúde ainda são investigados.

Procurada pela reportagem, a Secretaria de Municipal de Meio Ambiente de Ubatuba não respondeu. Já a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística destacou o programa Mar sem Lixo, coordenado pela Fundação Florestal (leia mais abaixo).

Pesquisadores encontraram partículas plásticas no trato intestinal de metade dos peixes da praia de Barra Seca; águas mais calmas facilitam acúmulo de sujeira no mar. Foto: Prefeitura Municipal de Ubatuba
  • Considerando os 65 fragmentos analisados para identificação química, 59 (90,8%) resultaram em polímeros sintéticos, em sua maioria plásticos. O polipropileno (PP) e o polietileno tereftalato (PET) predominaram, correspondendo a 50% e 28% dos microplásticos, seguidos por poliamida (11%) e poliéster (11%).

“Pelo tipo principal de microplástico observado no estudo, acreditamos que a maior fonte seja por meio de materiais de pesca como linhas e redes, assim como resíduos plásticos que se degradam ao longo do tempo, como garrafas plásticas”, diz Esteban Nogueira, pesquisador no Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do estudo.

Para o estudo, foram analisadas variáveis como temperatura, acidez e presença de sólidos suspensos/turbidez da água. Os pesquisadores aplicaram, em um primeiro momento, um critério visual para determinar a presença ou ausência de estruturas orgânicas nas amostras, cores e tipos de fibras encontradas. Após esse passo, foram feitas análises químicas, para comprovar que se tratavam de partículas plásticas.

‘Peixe-rei’ está com alto nível de contaminação

Além de amostras de areia, a espécie coletada foi o peixinho Atherinella brasiliensis, o “Peixe-rei”. Por ser pequeno, abundante na região e onívoro, ou seja, com dieta diversificada, os indivíduos dessa espécie eram bom indicador para os estudos, tanto por ser de fácil captura, como por ser bom indicador de impacto ambiental.

Peixe-rei tem uma dieta bastante diversificada; pesquisadores acreditam que animais confundem partículas com seu próprio alimento. Foto: Smithsonian Tropical Research Institute

Segundo os cientistas, a praia de Barra Seca foi o ponto com maior impacto de microplástico sobre os peixes - mais da metade deles contém partículas plásticas no trato gastrointestinal. A hipótese é de que, por ser de águas mais calmas, essa praia tende a acumular mais sujeira por conta das correntes marítimas.

Para Nogueira, os animais confundiam as partículas com seu próprio alimento. A maioria dos plásticos encontrados eram de cor azul ou transparente - uma armadilha para os peixes. Com o volume de consumo, no trato digestivo se acumula plástico e os animais morrem por não poder mais se alimentar.

O estudo da Ufscar e da Unesp foi feito ao longo de 2021. Foram coletados 120 peixes nas praias de Barra Seca e Perequê-Açú e encontradas partículas sintéticas de plástico no corpo de 38% dos peixes analisados.

Diferenças na concentração de microplásticos nas épocas do ano

Também foi analisada a concentração dos microplásticos de forma comparativa entre diferentes épocas do ano. Para os pesquisadores, o inverno apresentou menor quantidade de partículas na área de manguezal (Barra-Seca).

  • No verão, os microplásticos deságuam na região por conta do maior volume de chuvas. Em Perequê-Açú, a quantidade de microplásticos foi similar para os dois períodos (inverno e verão).
  • No verão, em Barra Seca, a concentração chegou a 490 partículas por metro cúbico. Em Perequê-Açú, nessa mesma época do ano, essa concentração indicava 300 partículas por m³.

“Acreditávamos que no verão, com mais turismo, haveria maior deposição de microplásticos na praia, devido a um aumento de lixo decorrente dos visitantes da praia”, acrescenta Nogueira.

Conforme a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, o programa Mar sem Lixo, coordenado pela Fundação Florestal, paga pescadores artesanais e de arrasto pela remoção de resíduos no oceano, além de ações educacionais. Segundo relatório da Fundação Florestal, o Mar sem Lixo já retirou, entre 2022 e este ano, 9,9 toneladas de lixo pela pesca de arrasto e 13,2 toneladas dos manguezais.

Prejuízos à saúde humana

Além de ingerirem microplásticos, humanos inalam as pequenas partículas em grande volume, segundo a professora Thais Mauad, da Faculdade de Medicina da USP. O grupo dela já encontrou microplástico em pulmões humanos.

“As principais maneiras de o microplástico entrar no organismo humano são por meio da ingestão ou da inalação”, explica Thais. “É um problema ambiental gravíssimo. São diferentes tipos de plástico com aditivos diversos, muitos deles com potencial cancerígeno e disruptor endócrino.”

  • Segundo Thais, estudos mostram que microplásticos têm capacidade de alterar a estrutura celular, induzir proteínas inflamatórias no organismo e causar danos ao DNA. Um dos trabalhos mostra ainda que as partículas podem induzir doenças autoimunes e elevar riscos de infarto e AVC. As micropartículas já foram achadas no pulmão, na corrente sanguínea, no trato intestinal e até no coração.

Ao que tudo indica, os microplásticos já estão em todo o planeta. Já foram encontradas partículas nas profundezas dos oceanos, no intestino de peixes, em aves, em desertos, na Amazônia e, até mesmo, no alto do Monte Everest. Segundo Thaís, um dos lugares mais contaminados é a nossa própria casa.

Estudos experimentais publicados este ano, conduzidos por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e publicados no periódico Journal of Toxicology and Environmental Health, observaram a presença de microplásticos em múltiplos órgãos.

A publicação mostrou que microplásticos (MPs) e nanoplásticos (NPs) podem causar danos físicos e químicos às células, tecidos e órgãos humanos. As observações apontam que a contaminação por esses componentes pode interromper processos celulares, desencadeando inflamação e estresse oxidativo, além de impactar o equilíbrio hormonal e de neurotransmissores. Além disso, essas partículas podem atuar como vetores de substâncias químicas tóxicas e patógenos.

Microplásticos podem se acumular nas artérias

Pesquisadores chineses mostraram, em estudo que revisou a distribuição ambiental, os níveis de exposição humana e a toxicidade dos microplásticos, que os humanos podem ser expostos aos microplásticos por ingestão oral, inalação e contato com a pele.

“Estudos apontam a presença de microplásticos em placas de ateroma, que se formam nas paredes internas das artérias. Esse depósito diminui o calibre arterial e aumenta em até quatro vezes o risco de problemas vasculares”, comenta Eliseth Leão, pesquisadora do Hospital Israelita Albert Einstein.

Tamanha a presença das micropartículas plásticas no ambiente, a cadeia alimentar tem sido seriamente afetada, com acúmulo nos diferentes níveis tróficos. Predadores topo, últimos na cadeia, têm apresentado maior concentração de microplásticos. Humanos também entram nessa conta.

“Sobre a biodiversidade, o principal impacto está na ingestão e na inalação dos plásticos, principalmente pelo fato de que eles são confundidos com alimentos pelos animais. Eles também podem afetar na forma como é feita a polinização, já que o plástico causa falsa saciedade nos animais”, diz Letícia Correia, doutoranda em Ecologia na Federal do Pará (UFPA).

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