John Kerry, enviado especial do presidente americano Joe Biden para o clima, planeja deixar o cargo na primavera do hemisfério norte, encerrando uma gestão de três anos em uma importante função diplomática que foi criada especialmente para ele e que terá um futuro incerto com sua saída.
A China também está promovendo mudanças na área e nomeou Liu Zhenmin, ex-vice-ministro das Relações Exteriores, como o novo representante especial do país para o clima, em substituição a Xie Zhenhua, que está deixando o cargo por motivos de saúde.
Kerry, de 80 anos, tem atuado como o principal diplomata do presidente Biden em relação às mudanças climáticas desde o início de 2021, trabalhando para persuadir os governos de todo o mundo a reduzir agressivamente suas emissões de gases de efeito estufa que aquecem o planeta.
Ele liderou a equipe de negociação dos Estados Unidos em três cúpulas climáticas das Nações Unidas, reafirmando a liderança americana depois que o país se retirou do acordo climático de Paris durante o governo Trump.
Kerry defendeu a cooperação sobre o aquecimento global entre os Estados Unidos e a China, os dois maiores poluidores do mundo, em tempos de tensão.
Descarbonização
Liu Zhenmin, de 68 anos, atuou como embaixador da China nas Nações Unidas e foi chefe do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU. Seu antecessor, Xie, de 74 anos, representou a China nas negociações globais sobre o clima nos últimos anos, realizando diversas reuniões com seu colega norte-americano, John Kerry.
A última reunião entre eles ocorreu em novembro passado na Califórnia, depois que Kerry pediu à China que descarbonizasse o setor de energia, cortasse as emissões de metano e reduzisse o desmatamento.
Em setembro de 2020, a China se comprometeu a atingir o pico de emissões de CO2 até 2030 e a neutralidade de carbono até 2060.
Também se comprometeu a reduzir suas emissões de CO2 por unidade do PIB em pelo menos 60% até 2030, em comparação com os níveis de 2005, de acordo com um plano climático apresentado em 2021.
Além disso, até 2030, pretende fazer com que os combustíveis não fósseis respondam por 25% da energia gerada no país, onde o carvão ainda é a fonte de energia dominante.
Por outro lado, Pequim criticou o que considera ser um “fracasso dos países ricos em cumprir” as questões climáticas e defendeu o princípio de “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”.
Intenção de renúncia
Na quarta-feira, Kerry se reuniu com Biden na Casa Branca para informar o presidente de sua intenção de renunciar, de acordo com uma pessoa familiarizada com a reunião.
No sábado, sua equipe ficou sabendo de sua decisão em uma reunião organizada às pressas.
Kerry disse à equipe que pretendia partir nos próximos meses, e espera-se que ele se envolva na campanha presidencial de 2024 para ajudar a aumentar a conscientização sobre o trabalho de Biden em relação às mudanças climáticas. Ainda não foi escolhido um sucessor.
O Departamento de Estado confirmou a saída planejada de Kerry. A Casa Branca não respondeu no sábado a um pedido de comentário. Os planos de Kerry foram relatados pela primeira vez pelo Axios.
Enquanto isso, Kerry está planejando participar de uma reunião da Agência Internacional de Energia em Paris, em fevereiro.
Ex-senador de Massachusetts, candidato democrata à presidência e secretário de Estado do presidente Barack Obama, Kerry trouxe um status de celebridade para as cúpulas globais sobre o clima.
Biden criou a função especificamente para Kerry, e ele recebeu um assento no Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, marcando a primeira vez que um funcionário desse órgão foi dedicado especificamente às mudanças climáticas.
Considerado um incansável defensor da ação climática, Kerry viajou para 31 países em um esforço para restaurar a confiança nos Estados Unidos em relação às mudanças climáticas e persuadir outros países a fazer mais para ajudar a impedir que a temperatura média global suba mais de 1,5 grau Celsius em relação aos níveis pré-industriais.
Esse é o limite além do qual, segundo os cientistas, os perigos do aquecimento global - incluindo o agravamento de enchentes, secas, incêndios florestais e colapso do ecossistema - aumentam consideravelmente. Os seres humanos aqueceram o planeta em uma média de 1,2 grau Celsius desde o século XIX, principalmente pela queima de combustíveis fósseis.
Metas
Kerry desempenhou um papel fundamental ao pedir a Biden que estabelecesse uma meta mais agressiva para as emissões de gases de efeito estufa nos Estados Unidos, o que o presidente fez ao se comprometer a reduzir as emissões praticamente pela metade até 2030. Mas, o histórico de Kerry em persuadir outras nações a agir foi misto.
Mais de 30 países concordaram em reforçar suas metas climáticas antes de uma cúpula climática das Nações Unidas em Glasgow, Escócia, em 2021, um fato amplamente creditado aos esforços diplomáticos de Kerry. No entanto, sua capacidade de influenciar a China, o maior poluidor climático do mundo, muitas vezes falhou.
Em novembro, os Estados Unidos e a China concordaram em combater conjuntamente o aquecimento global aumentando a energia eólica, solar e outras energias renováveis com o objetivo de substituir os combustíveis fósseis.
O ex-vice-presidente Al Gore, em uma declaração no sábado, chamou o trabalho de Kerry sobre as mudanças climáticas de “heroico”. Mas o futuro da função de enviado climático nos Estados Unidos é incerto.
Kerry não estava sujeito à confirmação do Senado quando foi nomeado, fato que irritou alguns republicanos. De acordo com uma disposição do projeto de lei de gastos em 2022, todos os novos cargos de enviado especial subordinados ao secretário de Estado terão de obter a aprovação do Senado.
Os legisladores do Partido Republicano criticaram o papel de Kerry e disseram que ele estava prejudicando os Estados Unidos ao negociar com a China.
Em uma audiência acalorada no Congresso no ano passado, os republicanos também acusaram Kerry de voar em jatos particulares. Kerry chamou isso de uma mentira “estúpida”, dizendo que, embora sua esposa possua um jato, ele não o utilizou em sua função de enviado climático. /COM THE NEW YORK TIMES E EFE