Em São Sebastião, moradores cobram prefeitura e obras antienchente vão parar na Justiça


Moradores reivindicam diálogo; poder municipal diz que associações foram chamadas e afirma que intervenções dispensam licenciamento ambiental

Por Gonçalo Junior
Atualização:

Cerca de um ano após a chuva histórica que deixou 64 mortos em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, associações de moradores da Vila Sahy, epicentro da tragédia, buscam o Ministério Público e a Justiça para cobrar transparência da prefeitura sobre as obras de prevenção de novas catástrofes.

Entidades reclamam que o poder municipal ainda não apresentou as licenças, alvarás e estudos de impacto ambiental para as obras de drenagem no leito do Rio Sahy em uma área de proteção ambiental. Elas questionam ainda as razões técnicas para construir um muro de contenção que pode ter impactos significativos para o meio ambiente.

Um ano após desastre com 64 mortos, São Sebastião ainda convive com as cicatrizes da tragédia  Foto: Tiago Queiroz/Estadão

A Prefeitura de São Sebastião informa que as instituições da Vila Sahy e Barra do Sahy foram convidadas para reunião no gabinete do prefeito e apenas duas estiveram presentes (Instituto de Conservação Costeira e a PROSAN). Segundo a prefeitura, a legislação dispensa o licenciamento ambiental em casos de emergência.

O foco principal das queixas dos moradores são obras de limpeza, desassoreamento e contenção da margem do rio. Na visão das lideranças locais, o gargalo tem sido a falta de diálogo com o poder público. “A obra não foi discutida com a sociedade, em especial com moradores que foram os mais afetados. Que obra se faz sem projeto?”, questiona o publicitário Mauro Motoryn, de 76 anos.

“Não somos contrários às obras, que são necessárias para evitar novas tragédias. Só queremos que sejam feitas com transparência”, afirma o médico Claudio Panutti, de 78 anos. “A prefeitura não informou antecipadamente aos munícipes nem apresentou documentação sobre impactos para a população e o ecossistema.”

Diante da falta de informações, a Associação Amigos do Bairro do Sahy, a Associação de Moradores da Vila Sahy e o movimento ‘Sahy pede respeito’ contataram o Ministério Público de São Sebastião que, por sua vez, acionou a Justiça.

A primeira manifestação foi favorável aos moradores. O juiz Vitor Hugo Aquino de Oliveira deu prazo de dez dias para que a prefeitura apresente os “projetos, estudos de impactos ambientais, licenças, alvarás (...) a fim de que possam analisá-los e constatar se referida obra será feita dentro dos parâmetros técnicos mínimos, o que não foi atendido até a presente data”.

Moradores fazem abraço simbólico da ponte do Rio Sahy e cobram transparência da prefeitura de São Sebastião Foto: Tcharlie Tuma

Questionada pelo Estadão sobre a apresentação das licenças, a prefeitura informou que “o mesmo sempre esteve disponível na Secretaria de Obras”.

Nesse contexto, existe grande preocupação com a preservação histórica e o patrimônio ambiental da região, que abriga a Área de Proteção Ambiental Baleia-Sahy. A Vila Sahy fica às margens do Parque Estadual da Serra do Mar.

Por isso, as entidades se mobilizam de várias formas. Uma delas foi a própria criação do coletivo ‘Sahy pede respeito’, formado por 250 moradores a partir das obras do poder municipal. Neste domingo, 17, moradores e frequentadores da praia se mobilizaram e fizeram protesto em defesa da ponte do Rio Sahy, que faz a ligação histórica com a Igreja da Barra do Sahy, que está em processo de tombamento. Também está em andamento abaixo-assinado que já conta com mais de 2,6 mil assinaturas.

Os moradores reconhecem que a intervenção no rio é importante para evitar alagamentos causados pelo acúmulo de sedimentos. O transbordamento do rio é um problema que se soma a deslizamentos de terra e desmoronamentos de casas, que deixaram centenas de desabrigados - as entidades também defendem a continuidade das obras em outros pontos afetados pelo deslizamento de terra em fevereiro de 2023, como a estabilização de encostas, construção de muros de arrimo e drenagem das encostas do morro.

No mês passado, o Estadão flagrou famílias que ainda vivem nas áreas de encosta. Parte fica por questões econômicas, como falta de dinheiro para uma nova casa na região e por não querer morar longe do trabalho. Também pesam razões afetivas, como relutar em sair de onde morou a vida inteira. O poder público, até agora, não conseguiu resolver as demandas de todos os moradores - e o Ministério Público cobra indenização para parte das famílias na Justiça.

Muro de pedras na foz do rio causa polêmica

No Rio Sahy, a prefeitura pretende limpar e desobstruir a foz e o leito, aumentando a calha em um processo de dragagem. Máquinas de sucção vão remover materiais sólidos do fundo do rio e todo o material será direcionado ao norte da Ilha das Couves, por meio de tubulação submersa. O objetivo é melhorar a vazão prejudicada pelo sedimento das chuvas extremas de fevereiro de 2023.

Outra etapa do projeto, mais polêmica, é a contenção da faixa de areia, com a criação de um muro de pedras. É uma espécie de “quebra mar” na foz do rio. As entidades afirmam que não foram divulgados levantamentos de fauna e flora e monitoramento durante a execução, além de justificativa técnica para muro. “No estuário do rio, existe um manguezal que pode ser afetado”, diz Panutti.

O Instituto de Conservação Costeira (ICC), que realizou visita técnica para avaliar os impactos ambientais da drenagem, enviou ofício ao poder municipal e também aguarda informações. O instituto afirma que propôs uma ação de restauração ambiental, com plantio de jundu em área degradada, como medida compensatória.

Representantes das associações questionam a eficácia da obra e se perguntam se o confinamento do rio pode promover apenas a valorização imobiliária dos terrenos às margens para lanchas de grande porte. Alguns alertam para a possibilidade de criação de uma marina no local e temem o desaparecimento do estuário do rio, o local onde ele desemboca no mar.

Outra reclamação se refere ao edital de dispensa de licitação, publicado no dia 29 de dezembro pela prefeitura, com a justificativa de obra emergencial - as associações lembram que a tragédia já completa mais de um ano. “Definir situação de emergência um ano após a tragédia é, no mínimo, uma ironia”, critica Motoryn.

A Prefeitura de São Sebastião publicou no dia 19 de agosto o decreto de situação de emergência nas áreas do município afetadas pelas chuvas do ano passado. Esse decreto dispensa a licitação para os contratos de prestação de serviços ligados à reabilitação dos cenários dos desastres e aquisição de bens necessários às atividades.

Cerca de um ano após a chuva histórica que deixou 64 mortos em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, associações de moradores da Vila Sahy, epicentro da tragédia, buscam o Ministério Público e a Justiça para cobrar transparência da prefeitura sobre as obras de prevenção de novas catástrofes.

Entidades reclamam que o poder municipal ainda não apresentou as licenças, alvarás e estudos de impacto ambiental para as obras de drenagem no leito do Rio Sahy em uma área de proteção ambiental. Elas questionam ainda as razões técnicas para construir um muro de contenção que pode ter impactos significativos para o meio ambiente.

Um ano após desastre com 64 mortos, São Sebastião ainda convive com as cicatrizes da tragédia  Foto: Tiago Queiroz/Estadão

A Prefeitura de São Sebastião informa que as instituições da Vila Sahy e Barra do Sahy foram convidadas para reunião no gabinete do prefeito e apenas duas estiveram presentes (Instituto de Conservação Costeira e a PROSAN). Segundo a prefeitura, a legislação dispensa o licenciamento ambiental em casos de emergência.

O foco principal das queixas dos moradores são obras de limpeza, desassoreamento e contenção da margem do rio. Na visão das lideranças locais, o gargalo tem sido a falta de diálogo com o poder público. “A obra não foi discutida com a sociedade, em especial com moradores que foram os mais afetados. Que obra se faz sem projeto?”, questiona o publicitário Mauro Motoryn, de 76 anos.

“Não somos contrários às obras, que são necessárias para evitar novas tragédias. Só queremos que sejam feitas com transparência”, afirma o médico Claudio Panutti, de 78 anos. “A prefeitura não informou antecipadamente aos munícipes nem apresentou documentação sobre impactos para a população e o ecossistema.”

Diante da falta de informações, a Associação Amigos do Bairro do Sahy, a Associação de Moradores da Vila Sahy e o movimento ‘Sahy pede respeito’ contataram o Ministério Público de São Sebastião que, por sua vez, acionou a Justiça.

A primeira manifestação foi favorável aos moradores. O juiz Vitor Hugo Aquino de Oliveira deu prazo de dez dias para que a prefeitura apresente os “projetos, estudos de impactos ambientais, licenças, alvarás (...) a fim de que possam analisá-los e constatar se referida obra será feita dentro dos parâmetros técnicos mínimos, o que não foi atendido até a presente data”.

Moradores fazem abraço simbólico da ponte do Rio Sahy e cobram transparência da prefeitura de São Sebastião Foto: Tcharlie Tuma

Questionada pelo Estadão sobre a apresentação das licenças, a prefeitura informou que “o mesmo sempre esteve disponível na Secretaria de Obras”.

Nesse contexto, existe grande preocupação com a preservação histórica e o patrimônio ambiental da região, que abriga a Área de Proteção Ambiental Baleia-Sahy. A Vila Sahy fica às margens do Parque Estadual da Serra do Mar.

Por isso, as entidades se mobilizam de várias formas. Uma delas foi a própria criação do coletivo ‘Sahy pede respeito’, formado por 250 moradores a partir das obras do poder municipal. Neste domingo, 17, moradores e frequentadores da praia se mobilizaram e fizeram protesto em defesa da ponte do Rio Sahy, que faz a ligação histórica com a Igreja da Barra do Sahy, que está em processo de tombamento. Também está em andamento abaixo-assinado que já conta com mais de 2,6 mil assinaturas.

Os moradores reconhecem que a intervenção no rio é importante para evitar alagamentos causados pelo acúmulo de sedimentos. O transbordamento do rio é um problema que se soma a deslizamentos de terra e desmoronamentos de casas, que deixaram centenas de desabrigados - as entidades também defendem a continuidade das obras em outros pontos afetados pelo deslizamento de terra em fevereiro de 2023, como a estabilização de encostas, construção de muros de arrimo e drenagem das encostas do morro.

No mês passado, o Estadão flagrou famílias que ainda vivem nas áreas de encosta. Parte fica por questões econômicas, como falta de dinheiro para uma nova casa na região e por não querer morar longe do trabalho. Também pesam razões afetivas, como relutar em sair de onde morou a vida inteira. O poder público, até agora, não conseguiu resolver as demandas de todos os moradores - e o Ministério Público cobra indenização para parte das famílias na Justiça.

Muro de pedras na foz do rio causa polêmica

No Rio Sahy, a prefeitura pretende limpar e desobstruir a foz e o leito, aumentando a calha em um processo de dragagem. Máquinas de sucção vão remover materiais sólidos do fundo do rio e todo o material será direcionado ao norte da Ilha das Couves, por meio de tubulação submersa. O objetivo é melhorar a vazão prejudicada pelo sedimento das chuvas extremas de fevereiro de 2023.

Outra etapa do projeto, mais polêmica, é a contenção da faixa de areia, com a criação de um muro de pedras. É uma espécie de “quebra mar” na foz do rio. As entidades afirmam que não foram divulgados levantamentos de fauna e flora e monitoramento durante a execução, além de justificativa técnica para muro. “No estuário do rio, existe um manguezal que pode ser afetado”, diz Panutti.

O Instituto de Conservação Costeira (ICC), que realizou visita técnica para avaliar os impactos ambientais da drenagem, enviou ofício ao poder municipal e também aguarda informações. O instituto afirma que propôs uma ação de restauração ambiental, com plantio de jundu em área degradada, como medida compensatória.

Representantes das associações questionam a eficácia da obra e se perguntam se o confinamento do rio pode promover apenas a valorização imobiliária dos terrenos às margens para lanchas de grande porte. Alguns alertam para a possibilidade de criação de uma marina no local e temem o desaparecimento do estuário do rio, o local onde ele desemboca no mar.

Outra reclamação se refere ao edital de dispensa de licitação, publicado no dia 29 de dezembro pela prefeitura, com a justificativa de obra emergencial - as associações lembram que a tragédia já completa mais de um ano. “Definir situação de emergência um ano após a tragédia é, no mínimo, uma ironia”, critica Motoryn.

A Prefeitura de São Sebastião publicou no dia 19 de agosto o decreto de situação de emergência nas áreas do município afetadas pelas chuvas do ano passado. Esse decreto dispensa a licitação para os contratos de prestação de serviços ligados à reabilitação dos cenários dos desastres e aquisição de bens necessários às atividades.

Cerca de um ano após a chuva histórica que deixou 64 mortos em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, associações de moradores da Vila Sahy, epicentro da tragédia, buscam o Ministério Público e a Justiça para cobrar transparência da prefeitura sobre as obras de prevenção de novas catástrofes.

Entidades reclamam que o poder municipal ainda não apresentou as licenças, alvarás e estudos de impacto ambiental para as obras de drenagem no leito do Rio Sahy em uma área de proteção ambiental. Elas questionam ainda as razões técnicas para construir um muro de contenção que pode ter impactos significativos para o meio ambiente.

Um ano após desastre com 64 mortos, São Sebastião ainda convive com as cicatrizes da tragédia  Foto: Tiago Queiroz/Estadão

A Prefeitura de São Sebastião informa que as instituições da Vila Sahy e Barra do Sahy foram convidadas para reunião no gabinete do prefeito e apenas duas estiveram presentes (Instituto de Conservação Costeira e a PROSAN). Segundo a prefeitura, a legislação dispensa o licenciamento ambiental em casos de emergência.

O foco principal das queixas dos moradores são obras de limpeza, desassoreamento e contenção da margem do rio. Na visão das lideranças locais, o gargalo tem sido a falta de diálogo com o poder público. “A obra não foi discutida com a sociedade, em especial com moradores que foram os mais afetados. Que obra se faz sem projeto?”, questiona o publicitário Mauro Motoryn, de 76 anos.

“Não somos contrários às obras, que são necessárias para evitar novas tragédias. Só queremos que sejam feitas com transparência”, afirma o médico Claudio Panutti, de 78 anos. “A prefeitura não informou antecipadamente aos munícipes nem apresentou documentação sobre impactos para a população e o ecossistema.”

Diante da falta de informações, a Associação Amigos do Bairro do Sahy, a Associação de Moradores da Vila Sahy e o movimento ‘Sahy pede respeito’ contataram o Ministério Público de São Sebastião que, por sua vez, acionou a Justiça.

A primeira manifestação foi favorável aos moradores. O juiz Vitor Hugo Aquino de Oliveira deu prazo de dez dias para que a prefeitura apresente os “projetos, estudos de impactos ambientais, licenças, alvarás (...) a fim de que possam analisá-los e constatar se referida obra será feita dentro dos parâmetros técnicos mínimos, o que não foi atendido até a presente data”.

Moradores fazem abraço simbólico da ponte do Rio Sahy e cobram transparência da prefeitura de São Sebastião Foto: Tcharlie Tuma

Questionada pelo Estadão sobre a apresentação das licenças, a prefeitura informou que “o mesmo sempre esteve disponível na Secretaria de Obras”.

Nesse contexto, existe grande preocupação com a preservação histórica e o patrimônio ambiental da região, que abriga a Área de Proteção Ambiental Baleia-Sahy. A Vila Sahy fica às margens do Parque Estadual da Serra do Mar.

Por isso, as entidades se mobilizam de várias formas. Uma delas foi a própria criação do coletivo ‘Sahy pede respeito’, formado por 250 moradores a partir das obras do poder municipal. Neste domingo, 17, moradores e frequentadores da praia se mobilizaram e fizeram protesto em defesa da ponte do Rio Sahy, que faz a ligação histórica com a Igreja da Barra do Sahy, que está em processo de tombamento. Também está em andamento abaixo-assinado que já conta com mais de 2,6 mil assinaturas.

Os moradores reconhecem que a intervenção no rio é importante para evitar alagamentos causados pelo acúmulo de sedimentos. O transbordamento do rio é um problema que se soma a deslizamentos de terra e desmoronamentos de casas, que deixaram centenas de desabrigados - as entidades também defendem a continuidade das obras em outros pontos afetados pelo deslizamento de terra em fevereiro de 2023, como a estabilização de encostas, construção de muros de arrimo e drenagem das encostas do morro.

No mês passado, o Estadão flagrou famílias que ainda vivem nas áreas de encosta. Parte fica por questões econômicas, como falta de dinheiro para uma nova casa na região e por não querer morar longe do trabalho. Também pesam razões afetivas, como relutar em sair de onde morou a vida inteira. O poder público, até agora, não conseguiu resolver as demandas de todos os moradores - e o Ministério Público cobra indenização para parte das famílias na Justiça.

Muro de pedras na foz do rio causa polêmica

No Rio Sahy, a prefeitura pretende limpar e desobstruir a foz e o leito, aumentando a calha em um processo de dragagem. Máquinas de sucção vão remover materiais sólidos do fundo do rio e todo o material será direcionado ao norte da Ilha das Couves, por meio de tubulação submersa. O objetivo é melhorar a vazão prejudicada pelo sedimento das chuvas extremas de fevereiro de 2023.

Outra etapa do projeto, mais polêmica, é a contenção da faixa de areia, com a criação de um muro de pedras. É uma espécie de “quebra mar” na foz do rio. As entidades afirmam que não foram divulgados levantamentos de fauna e flora e monitoramento durante a execução, além de justificativa técnica para muro. “No estuário do rio, existe um manguezal que pode ser afetado”, diz Panutti.

O Instituto de Conservação Costeira (ICC), que realizou visita técnica para avaliar os impactos ambientais da drenagem, enviou ofício ao poder municipal e também aguarda informações. O instituto afirma que propôs uma ação de restauração ambiental, com plantio de jundu em área degradada, como medida compensatória.

Representantes das associações questionam a eficácia da obra e se perguntam se o confinamento do rio pode promover apenas a valorização imobiliária dos terrenos às margens para lanchas de grande porte. Alguns alertam para a possibilidade de criação de uma marina no local e temem o desaparecimento do estuário do rio, o local onde ele desemboca no mar.

Outra reclamação se refere ao edital de dispensa de licitação, publicado no dia 29 de dezembro pela prefeitura, com a justificativa de obra emergencial - as associações lembram que a tragédia já completa mais de um ano. “Definir situação de emergência um ano após a tragédia é, no mínimo, uma ironia”, critica Motoryn.

A Prefeitura de São Sebastião publicou no dia 19 de agosto o decreto de situação de emergência nas áreas do município afetadas pelas chuvas do ano passado. Esse decreto dispensa a licitação para os contratos de prestação de serviços ligados à reabilitação dos cenários dos desastres e aquisição de bens necessários às atividades.

Cerca de um ano após a chuva histórica que deixou 64 mortos em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, associações de moradores da Vila Sahy, epicentro da tragédia, buscam o Ministério Público e a Justiça para cobrar transparência da prefeitura sobre as obras de prevenção de novas catástrofes.

Entidades reclamam que o poder municipal ainda não apresentou as licenças, alvarás e estudos de impacto ambiental para as obras de drenagem no leito do Rio Sahy em uma área de proteção ambiental. Elas questionam ainda as razões técnicas para construir um muro de contenção que pode ter impactos significativos para o meio ambiente.

Um ano após desastre com 64 mortos, São Sebastião ainda convive com as cicatrizes da tragédia  Foto: Tiago Queiroz/Estadão

A Prefeitura de São Sebastião informa que as instituições da Vila Sahy e Barra do Sahy foram convidadas para reunião no gabinete do prefeito e apenas duas estiveram presentes (Instituto de Conservação Costeira e a PROSAN). Segundo a prefeitura, a legislação dispensa o licenciamento ambiental em casos de emergência.

O foco principal das queixas dos moradores são obras de limpeza, desassoreamento e contenção da margem do rio. Na visão das lideranças locais, o gargalo tem sido a falta de diálogo com o poder público. “A obra não foi discutida com a sociedade, em especial com moradores que foram os mais afetados. Que obra se faz sem projeto?”, questiona o publicitário Mauro Motoryn, de 76 anos.

“Não somos contrários às obras, que são necessárias para evitar novas tragédias. Só queremos que sejam feitas com transparência”, afirma o médico Claudio Panutti, de 78 anos. “A prefeitura não informou antecipadamente aos munícipes nem apresentou documentação sobre impactos para a população e o ecossistema.”

Diante da falta de informações, a Associação Amigos do Bairro do Sahy, a Associação de Moradores da Vila Sahy e o movimento ‘Sahy pede respeito’ contataram o Ministério Público de São Sebastião que, por sua vez, acionou a Justiça.

A primeira manifestação foi favorável aos moradores. O juiz Vitor Hugo Aquino de Oliveira deu prazo de dez dias para que a prefeitura apresente os “projetos, estudos de impactos ambientais, licenças, alvarás (...) a fim de que possam analisá-los e constatar se referida obra será feita dentro dos parâmetros técnicos mínimos, o que não foi atendido até a presente data”.

Moradores fazem abraço simbólico da ponte do Rio Sahy e cobram transparência da prefeitura de São Sebastião Foto: Tcharlie Tuma

Questionada pelo Estadão sobre a apresentação das licenças, a prefeitura informou que “o mesmo sempre esteve disponível na Secretaria de Obras”.

Nesse contexto, existe grande preocupação com a preservação histórica e o patrimônio ambiental da região, que abriga a Área de Proteção Ambiental Baleia-Sahy. A Vila Sahy fica às margens do Parque Estadual da Serra do Mar.

Por isso, as entidades se mobilizam de várias formas. Uma delas foi a própria criação do coletivo ‘Sahy pede respeito’, formado por 250 moradores a partir das obras do poder municipal. Neste domingo, 17, moradores e frequentadores da praia se mobilizaram e fizeram protesto em defesa da ponte do Rio Sahy, que faz a ligação histórica com a Igreja da Barra do Sahy, que está em processo de tombamento. Também está em andamento abaixo-assinado que já conta com mais de 2,6 mil assinaturas.

Os moradores reconhecem que a intervenção no rio é importante para evitar alagamentos causados pelo acúmulo de sedimentos. O transbordamento do rio é um problema que se soma a deslizamentos de terra e desmoronamentos de casas, que deixaram centenas de desabrigados - as entidades também defendem a continuidade das obras em outros pontos afetados pelo deslizamento de terra em fevereiro de 2023, como a estabilização de encostas, construção de muros de arrimo e drenagem das encostas do morro.

No mês passado, o Estadão flagrou famílias que ainda vivem nas áreas de encosta. Parte fica por questões econômicas, como falta de dinheiro para uma nova casa na região e por não querer morar longe do trabalho. Também pesam razões afetivas, como relutar em sair de onde morou a vida inteira. O poder público, até agora, não conseguiu resolver as demandas de todos os moradores - e o Ministério Público cobra indenização para parte das famílias na Justiça.

Muro de pedras na foz do rio causa polêmica

No Rio Sahy, a prefeitura pretende limpar e desobstruir a foz e o leito, aumentando a calha em um processo de dragagem. Máquinas de sucção vão remover materiais sólidos do fundo do rio e todo o material será direcionado ao norte da Ilha das Couves, por meio de tubulação submersa. O objetivo é melhorar a vazão prejudicada pelo sedimento das chuvas extremas de fevereiro de 2023.

Outra etapa do projeto, mais polêmica, é a contenção da faixa de areia, com a criação de um muro de pedras. É uma espécie de “quebra mar” na foz do rio. As entidades afirmam que não foram divulgados levantamentos de fauna e flora e monitoramento durante a execução, além de justificativa técnica para muro. “No estuário do rio, existe um manguezal que pode ser afetado”, diz Panutti.

O Instituto de Conservação Costeira (ICC), que realizou visita técnica para avaliar os impactos ambientais da drenagem, enviou ofício ao poder municipal e também aguarda informações. O instituto afirma que propôs uma ação de restauração ambiental, com plantio de jundu em área degradada, como medida compensatória.

Representantes das associações questionam a eficácia da obra e se perguntam se o confinamento do rio pode promover apenas a valorização imobiliária dos terrenos às margens para lanchas de grande porte. Alguns alertam para a possibilidade de criação de uma marina no local e temem o desaparecimento do estuário do rio, o local onde ele desemboca no mar.

Outra reclamação se refere ao edital de dispensa de licitação, publicado no dia 29 de dezembro pela prefeitura, com a justificativa de obra emergencial - as associações lembram que a tragédia já completa mais de um ano. “Definir situação de emergência um ano após a tragédia é, no mínimo, uma ironia”, critica Motoryn.

A Prefeitura de São Sebastião publicou no dia 19 de agosto o decreto de situação de emergência nas áreas do município afetadas pelas chuvas do ano passado. Esse decreto dispensa a licitação para os contratos de prestação de serviços ligados à reabilitação dos cenários dos desastres e aquisição de bens necessários às atividades.

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