Vizinhos tentam blindar floresta criada pelo Conde Matarazzo em área que deve ter condomínio


Associação reivindica tombamento do espaço; incorporadora diz negociar com moradores ajustes no projeto, diz seguir legislação e prevê contrapartidas, como parque linear e plantio de mudas

Por Juliana Domingos de Lima
Atualização:

“Vista eterna para a natureza” é o que diz o anúncio do Reserva Golf Residence, empreendimento da incorporadora Ekko Group que inclui duas torres de apartamentos de alto padrão e um shopping na Vila São Francisco, em Osasco, próximo à divisa com São Paulo.

É parte de um projeto de bairro planejado, o Reserva Golf, que quer ocupar uma área do São Francisco Golf Club, fundado pelo Conde Luiz Eduardo Matarazzo nos anos 1930. O local pertencia a uma chácara, que servia para lazer e criar búfalos.

Desde que foi anunciado, em 2020, o complexo imobiliário motivou reação contrária de vizinhos, que veem riscos à floresta urbana de cerca de 40 hectares no local.

A incorporadora diz seguir a legislação ambiental e prever contrapartidas, como a criação de um parque linear e o plantio de 20 mil mudas. Também afirma que irá manter 85% de área verde preservada.

Área verde entre São Paulo e Osasco é remanescente de Mata Atlântica; incorporadora diz que manterá 85% da área preservada Foto: Felipe Rau/Estadão

Embora a Ekko prometa manter grande parte da área verde, os vizinhos temem que o adensamento urbano prejudique a mata. Especialistas também apontam a importância da cobertura verde para proteger a fauna e a flora e o ciclo hidrológico, diante da crise climática.

Ao Estadão, a diretora de incorporação da Ekko, Juliana Zogbi, diz negociar ajustes no projeto com os moradores. O empreendimento tem dez fases, ao longo de 20 anos, mas o número geral de torres não foi informado. O valor geral de vendas do Reserva Golf é calculado pela construtora em R$ 8 bilhões.

Protocolado em 2022, o projeto ainda não teve aprovação da prefeitura de Osasco, por haver duas ações civis públicas e uma ação popular na 6ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, além pedido de tombamento no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat). Uma liminar suspendeu o corte de árvores e as obras na propriedade.

Em nota, a prefeitura de Osasco diz contribuir com a “mediação e suporte técnico entre as partes”, além de ter informado aos empreendedores que “não será autorizado fazer nenhuma alteração em áreas de proteção permanente (APP)”.

Conselho deve decidir sobre tombamento em outubro

Em 2022, a Associação Vila que te quero Verde (Avive) entrou com o pedido de tombamento. Na região, há trechos de floresta protegidos por legislação estadual, municipal e em alguns casos federal, por conterem nascentes, o que as configura área de preservação permanente.

Formada por mais de 30 condomínios e associações da região, a entidade defende que o tombamento é um reforço à proteção legal, que pode estar sujeita a interpretações.

A proposta foi votada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado (Condephaat) em 12 de agosto. Foram sete votos favoráveis ao tombamento e dez contrários, mas é necessária maioria qualificada (2/3 dos presentes) para a decisão. Houve pedido de vistas para que o parecer seja discutido novamente.

Em nota, a Secretaria da Cultura do Estado, órgão ao qual o conselho está submetido, informou que a Avive anexou nova documentação ao estudo de tombamento, que será analisada para a elaboração de outro parecer. Uma vez finalizado pelo relator, esse parecer deve entrar novamente na pauta do conselho. Segundo a pasta, nova votação é prevista para outubro.

Além do patrimônio natural, a propriedade de aproximadamente 340 mil m² têm edificações históricas, como a sede do Golf Club e a casa de campo do escultor Victor Brecheret, tombada desde 2012 pelo Condephaat. Nela, estão os afrescos “São Francisco” e “Três Graças”, feitos por ele.

A incorporadora afirma que os imóveis serão preservados, restaurados e revitalizados. Diz ainda que pretende transformar a casa do artista em centro cultural. Por ser bem tombado, qualquer mudança no imóvel ou na área envoltória precisa de aval do órgão de defesa do patrimônio.

“É uma paisagem cultural, que tem componentes artísticos, históricos e ambientais”, diz a advogada da Avive, Lavinia Junqueira. A associação argumenta que a medida não beneficia só moradores da Vila São Francisco, mas traz impactos positivos a áreas de periferia adjacentes, como Vila Yara e Jardim D’Abril.

A associação diz não querer barrar o empreendimento e argumenta que o tombamento restritivo ocorreria só em áreas onde já há obstáculos legais, a grande maioria fora das zonas de interesse do setor de construção civil.

Já a Companhia São Francisco de Administração e Comércio, que representa a família Matarazzo, afirmou que ao longo das gerações a manutenção das áreas sempre foi feita no intuito de conservar um bairro verde.

Em nota, acrescentou que o empreendimento “prevê a edificação de residências integradas ao paisagismo local que, trabalhando conservadoramente dentro dos limites impostos pela legislação” traz “amplos benefícios à comunidade”.

Entre eles, citou a preservação de cerca de 280 mil m² de área verde, um novo parque e o plantio de árvores nativas, que estão entre as contrapartidas previstas pela Ekko (leia mais abaixo). O campo de golfe deve continuar aberto a associados, com redesenho do trajeto de jogo.

Na visão da companhia, o adensamento “permitirá melhor aproveitamento das riquezas naturais que hoje não são da comunidade”, além de benefícios para a infraestrutura local e melhora na segurança.

Incorporadora prevê plantio de 20 mil mudas

A Ekko Group afirma ter contratado relatório ambiental para analisar a vegetação e mais informações relevantes para o cálculo da área disponível e possíveis restrições ambientais.

Segundo a empresa, o imóvel é majoritariamente caracterizado por grande área gramada com árvores isoladas, em sua maioria eucaliptos e espécies exóticas. Há também “quatro trechos de fragmentos florestais formados por bosques de eucaliptos com estratos de vegetação nativa sob as copas”.

Para construir nesses trechos, afirma que “os projetos seguirão a legislação ambiental”. Em relação à fauna, esta seria composta por espécies generalistas, adaptadas ao meio urbano, sem registro espécie ameaçada ou endêmica. “O projeto foi baseado nesses relatórios (ambientais) e tem embasamento jurídico”, acrescentou Juliana Zogbi, da Ekko.

Floresta urbana tem cerca de 40 hectares e serve como corredor ecológico, segundo especialistas Foto: Alex Silva/Estadão

Além da conservação da maior parte das áreas verdes, a Ekko prevê entregar como contrapartidas um projeto de drenagem, um parque linear e o plantio de vinte mil mudas de árvores nativas.

As contrapartidas ambientais só são formalizadas com a aprovação do projeto e do licenciamento ambiental. Segundo a Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), a aprovação do licenciamento do Reserva Golf é de responsabilidade da prefeitura de Osasco.

Dos cinco processos submetidos à Cetesb para empreendimentos imobiliários na área, o órgão informa que um foi indeferido e os demais estão atualmente suspensos por decisão judicial.

Corredor ecológico e mudanças climáticas

Um dos principais argumentos da Avive contra a construção de um grande número de edifícios altos no local é que a vegetação da Vila São Francisco desempenha a função de corredor ecológico.

Conecta áreas remanescentes de Mata Atlântica e parques da região metropolitana, como a Reserva do Morro Grande, o Parque Estadual Jequitibá, a Reserva da Biosfera do Cinturão Verde e o Instituto Butantã, numa continuidade que chega até os parques Burle Marx e Ibirapuera. A conectividade entre essas áreas é citada em parecer encomendado pela Avive à consultoria Dimensão Ambiental.

Segundo o biólogo e professor da USP Giuliano Locosselli, essa ligação proporciona um refúgio e um caminho para a fauna silvestre, em meio à vegetação fragmentada na Grande São Paulo.

“Retirar este ponto de passagem limitará o alcance desta fauna, impedindo que chegue a outras áreas verdes como a USP, o Ibirapuera, o Trianon, o Parque do Carmo, entre outros”, diz ele, que também vê ameaça a espécies vegetais, como cedro e palmito juçara.

Uma das contrapartidas prometidas pela Ekko Group é a criação de parque linear privado aberto ao público Foto: Ekko Group/Divulgação

O climatologista Paulo Artaxo mora naquela região há 20 anos. Para ele, também professor da USP, a derrubada de árvores no local vai “na direção contrária” do que a cidade precisa fazer para se proteger de alagamentos e combater as ilhas de calor. Áreas mais adensadas e impermeabilizadas atingem temperaturas maiores e não ajudam na drenagem da água da chuva.

Osasco ocupa uma das piores posições no Estado — 643ª entre 645 municípios — em termos de cobertura vegetal, segundo dados de 2021 da plataforma UrbVerde, criada por pesquisadores do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos.

Locosselli vê ainda risco para os ciclos hidrológicos da região. A preservação da área permeável “sabidamente estoca água durante as chuvas mais intensas e mitigou por todo este tempo os efeitos das enchentes na região”, segundo ele.

“Vista eterna para a natureza” é o que diz o anúncio do Reserva Golf Residence, empreendimento da incorporadora Ekko Group que inclui duas torres de apartamentos de alto padrão e um shopping na Vila São Francisco, em Osasco, próximo à divisa com São Paulo.

É parte de um projeto de bairro planejado, o Reserva Golf, que quer ocupar uma área do São Francisco Golf Club, fundado pelo Conde Luiz Eduardo Matarazzo nos anos 1930. O local pertencia a uma chácara, que servia para lazer e criar búfalos.

Desde que foi anunciado, em 2020, o complexo imobiliário motivou reação contrária de vizinhos, que veem riscos à floresta urbana de cerca de 40 hectares no local.

A incorporadora diz seguir a legislação ambiental e prever contrapartidas, como a criação de um parque linear e o plantio de 20 mil mudas. Também afirma que irá manter 85% de área verde preservada.

Área verde entre São Paulo e Osasco é remanescente de Mata Atlântica; incorporadora diz que manterá 85% da área preservada Foto: Felipe Rau/Estadão

Embora a Ekko prometa manter grande parte da área verde, os vizinhos temem que o adensamento urbano prejudique a mata. Especialistas também apontam a importância da cobertura verde para proteger a fauna e a flora e o ciclo hidrológico, diante da crise climática.

Ao Estadão, a diretora de incorporação da Ekko, Juliana Zogbi, diz negociar ajustes no projeto com os moradores. O empreendimento tem dez fases, ao longo de 20 anos, mas o número geral de torres não foi informado. O valor geral de vendas do Reserva Golf é calculado pela construtora em R$ 8 bilhões.

Protocolado em 2022, o projeto ainda não teve aprovação da prefeitura de Osasco, por haver duas ações civis públicas e uma ação popular na 6ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, além pedido de tombamento no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat). Uma liminar suspendeu o corte de árvores e as obras na propriedade.

Em nota, a prefeitura de Osasco diz contribuir com a “mediação e suporte técnico entre as partes”, além de ter informado aos empreendedores que “não será autorizado fazer nenhuma alteração em áreas de proteção permanente (APP)”.

Conselho deve decidir sobre tombamento em outubro

Em 2022, a Associação Vila que te quero Verde (Avive) entrou com o pedido de tombamento. Na região, há trechos de floresta protegidos por legislação estadual, municipal e em alguns casos federal, por conterem nascentes, o que as configura área de preservação permanente.

Formada por mais de 30 condomínios e associações da região, a entidade defende que o tombamento é um reforço à proteção legal, que pode estar sujeita a interpretações.

A proposta foi votada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado (Condephaat) em 12 de agosto. Foram sete votos favoráveis ao tombamento e dez contrários, mas é necessária maioria qualificada (2/3 dos presentes) para a decisão. Houve pedido de vistas para que o parecer seja discutido novamente.

Em nota, a Secretaria da Cultura do Estado, órgão ao qual o conselho está submetido, informou que a Avive anexou nova documentação ao estudo de tombamento, que será analisada para a elaboração de outro parecer. Uma vez finalizado pelo relator, esse parecer deve entrar novamente na pauta do conselho. Segundo a pasta, nova votação é prevista para outubro.

Além do patrimônio natural, a propriedade de aproximadamente 340 mil m² têm edificações históricas, como a sede do Golf Club e a casa de campo do escultor Victor Brecheret, tombada desde 2012 pelo Condephaat. Nela, estão os afrescos “São Francisco” e “Três Graças”, feitos por ele.

A incorporadora afirma que os imóveis serão preservados, restaurados e revitalizados. Diz ainda que pretende transformar a casa do artista em centro cultural. Por ser bem tombado, qualquer mudança no imóvel ou na área envoltória precisa de aval do órgão de defesa do patrimônio.

“É uma paisagem cultural, que tem componentes artísticos, históricos e ambientais”, diz a advogada da Avive, Lavinia Junqueira. A associação argumenta que a medida não beneficia só moradores da Vila São Francisco, mas traz impactos positivos a áreas de periferia adjacentes, como Vila Yara e Jardim D’Abril.

A associação diz não querer barrar o empreendimento e argumenta que o tombamento restritivo ocorreria só em áreas onde já há obstáculos legais, a grande maioria fora das zonas de interesse do setor de construção civil.

Já a Companhia São Francisco de Administração e Comércio, que representa a família Matarazzo, afirmou que ao longo das gerações a manutenção das áreas sempre foi feita no intuito de conservar um bairro verde.

Em nota, acrescentou que o empreendimento “prevê a edificação de residências integradas ao paisagismo local que, trabalhando conservadoramente dentro dos limites impostos pela legislação” traz “amplos benefícios à comunidade”.

Entre eles, citou a preservação de cerca de 280 mil m² de área verde, um novo parque e o plantio de árvores nativas, que estão entre as contrapartidas previstas pela Ekko (leia mais abaixo). O campo de golfe deve continuar aberto a associados, com redesenho do trajeto de jogo.

Na visão da companhia, o adensamento “permitirá melhor aproveitamento das riquezas naturais que hoje não são da comunidade”, além de benefícios para a infraestrutura local e melhora na segurança.

Incorporadora prevê plantio de 20 mil mudas

A Ekko Group afirma ter contratado relatório ambiental para analisar a vegetação e mais informações relevantes para o cálculo da área disponível e possíveis restrições ambientais.

Segundo a empresa, o imóvel é majoritariamente caracterizado por grande área gramada com árvores isoladas, em sua maioria eucaliptos e espécies exóticas. Há também “quatro trechos de fragmentos florestais formados por bosques de eucaliptos com estratos de vegetação nativa sob as copas”.

Para construir nesses trechos, afirma que “os projetos seguirão a legislação ambiental”. Em relação à fauna, esta seria composta por espécies generalistas, adaptadas ao meio urbano, sem registro espécie ameaçada ou endêmica. “O projeto foi baseado nesses relatórios (ambientais) e tem embasamento jurídico”, acrescentou Juliana Zogbi, da Ekko.

Floresta urbana tem cerca de 40 hectares e serve como corredor ecológico, segundo especialistas Foto: Alex Silva/Estadão

Além da conservação da maior parte das áreas verdes, a Ekko prevê entregar como contrapartidas um projeto de drenagem, um parque linear e o plantio de vinte mil mudas de árvores nativas.

As contrapartidas ambientais só são formalizadas com a aprovação do projeto e do licenciamento ambiental. Segundo a Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), a aprovação do licenciamento do Reserva Golf é de responsabilidade da prefeitura de Osasco.

Dos cinco processos submetidos à Cetesb para empreendimentos imobiliários na área, o órgão informa que um foi indeferido e os demais estão atualmente suspensos por decisão judicial.

Corredor ecológico e mudanças climáticas

Um dos principais argumentos da Avive contra a construção de um grande número de edifícios altos no local é que a vegetação da Vila São Francisco desempenha a função de corredor ecológico.

Conecta áreas remanescentes de Mata Atlântica e parques da região metropolitana, como a Reserva do Morro Grande, o Parque Estadual Jequitibá, a Reserva da Biosfera do Cinturão Verde e o Instituto Butantã, numa continuidade que chega até os parques Burle Marx e Ibirapuera. A conectividade entre essas áreas é citada em parecer encomendado pela Avive à consultoria Dimensão Ambiental.

Segundo o biólogo e professor da USP Giuliano Locosselli, essa ligação proporciona um refúgio e um caminho para a fauna silvestre, em meio à vegetação fragmentada na Grande São Paulo.

“Retirar este ponto de passagem limitará o alcance desta fauna, impedindo que chegue a outras áreas verdes como a USP, o Ibirapuera, o Trianon, o Parque do Carmo, entre outros”, diz ele, que também vê ameaça a espécies vegetais, como cedro e palmito juçara.

Uma das contrapartidas prometidas pela Ekko Group é a criação de parque linear privado aberto ao público Foto: Ekko Group/Divulgação

O climatologista Paulo Artaxo mora naquela região há 20 anos. Para ele, também professor da USP, a derrubada de árvores no local vai “na direção contrária” do que a cidade precisa fazer para se proteger de alagamentos e combater as ilhas de calor. Áreas mais adensadas e impermeabilizadas atingem temperaturas maiores e não ajudam na drenagem da água da chuva.

Osasco ocupa uma das piores posições no Estado — 643ª entre 645 municípios — em termos de cobertura vegetal, segundo dados de 2021 da plataforma UrbVerde, criada por pesquisadores do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos.

Locosselli vê ainda risco para os ciclos hidrológicos da região. A preservação da área permeável “sabidamente estoca água durante as chuvas mais intensas e mitigou por todo este tempo os efeitos das enchentes na região”, segundo ele.

“Vista eterna para a natureza” é o que diz o anúncio do Reserva Golf Residence, empreendimento da incorporadora Ekko Group que inclui duas torres de apartamentos de alto padrão e um shopping na Vila São Francisco, em Osasco, próximo à divisa com São Paulo.

É parte de um projeto de bairro planejado, o Reserva Golf, que quer ocupar uma área do São Francisco Golf Club, fundado pelo Conde Luiz Eduardo Matarazzo nos anos 1930. O local pertencia a uma chácara, que servia para lazer e criar búfalos.

Desde que foi anunciado, em 2020, o complexo imobiliário motivou reação contrária de vizinhos, que veem riscos à floresta urbana de cerca de 40 hectares no local.

A incorporadora diz seguir a legislação ambiental e prever contrapartidas, como a criação de um parque linear e o plantio de 20 mil mudas. Também afirma que irá manter 85% de área verde preservada.

Área verde entre São Paulo e Osasco é remanescente de Mata Atlântica; incorporadora diz que manterá 85% da área preservada Foto: Felipe Rau/Estadão

Embora a Ekko prometa manter grande parte da área verde, os vizinhos temem que o adensamento urbano prejudique a mata. Especialistas também apontam a importância da cobertura verde para proteger a fauna e a flora e o ciclo hidrológico, diante da crise climática.

Ao Estadão, a diretora de incorporação da Ekko, Juliana Zogbi, diz negociar ajustes no projeto com os moradores. O empreendimento tem dez fases, ao longo de 20 anos, mas o número geral de torres não foi informado. O valor geral de vendas do Reserva Golf é calculado pela construtora em R$ 8 bilhões.

Protocolado em 2022, o projeto ainda não teve aprovação da prefeitura de Osasco, por haver duas ações civis públicas e uma ação popular na 6ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, além pedido de tombamento no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat). Uma liminar suspendeu o corte de árvores e as obras na propriedade.

Em nota, a prefeitura de Osasco diz contribuir com a “mediação e suporte técnico entre as partes”, além de ter informado aos empreendedores que “não será autorizado fazer nenhuma alteração em áreas de proteção permanente (APP)”.

Conselho deve decidir sobre tombamento em outubro

Em 2022, a Associação Vila que te quero Verde (Avive) entrou com o pedido de tombamento. Na região, há trechos de floresta protegidos por legislação estadual, municipal e em alguns casos federal, por conterem nascentes, o que as configura área de preservação permanente.

Formada por mais de 30 condomínios e associações da região, a entidade defende que o tombamento é um reforço à proteção legal, que pode estar sujeita a interpretações.

A proposta foi votada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado (Condephaat) em 12 de agosto. Foram sete votos favoráveis ao tombamento e dez contrários, mas é necessária maioria qualificada (2/3 dos presentes) para a decisão. Houve pedido de vistas para que o parecer seja discutido novamente.

Em nota, a Secretaria da Cultura do Estado, órgão ao qual o conselho está submetido, informou que a Avive anexou nova documentação ao estudo de tombamento, que será analisada para a elaboração de outro parecer. Uma vez finalizado pelo relator, esse parecer deve entrar novamente na pauta do conselho. Segundo a pasta, nova votação é prevista para outubro.

Além do patrimônio natural, a propriedade de aproximadamente 340 mil m² têm edificações históricas, como a sede do Golf Club e a casa de campo do escultor Victor Brecheret, tombada desde 2012 pelo Condephaat. Nela, estão os afrescos “São Francisco” e “Três Graças”, feitos por ele.

A incorporadora afirma que os imóveis serão preservados, restaurados e revitalizados. Diz ainda que pretende transformar a casa do artista em centro cultural. Por ser bem tombado, qualquer mudança no imóvel ou na área envoltória precisa de aval do órgão de defesa do patrimônio.

“É uma paisagem cultural, que tem componentes artísticos, históricos e ambientais”, diz a advogada da Avive, Lavinia Junqueira. A associação argumenta que a medida não beneficia só moradores da Vila São Francisco, mas traz impactos positivos a áreas de periferia adjacentes, como Vila Yara e Jardim D’Abril.

A associação diz não querer barrar o empreendimento e argumenta que o tombamento restritivo ocorreria só em áreas onde já há obstáculos legais, a grande maioria fora das zonas de interesse do setor de construção civil.

Já a Companhia São Francisco de Administração e Comércio, que representa a família Matarazzo, afirmou que ao longo das gerações a manutenção das áreas sempre foi feita no intuito de conservar um bairro verde.

Em nota, acrescentou que o empreendimento “prevê a edificação de residências integradas ao paisagismo local que, trabalhando conservadoramente dentro dos limites impostos pela legislação” traz “amplos benefícios à comunidade”.

Entre eles, citou a preservação de cerca de 280 mil m² de área verde, um novo parque e o plantio de árvores nativas, que estão entre as contrapartidas previstas pela Ekko (leia mais abaixo). O campo de golfe deve continuar aberto a associados, com redesenho do trajeto de jogo.

Na visão da companhia, o adensamento “permitirá melhor aproveitamento das riquezas naturais que hoje não são da comunidade”, além de benefícios para a infraestrutura local e melhora na segurança.

Incorporadora prevê plantio de 20 mil mudas

A Ekko Group afirma ter contratado relatório ambiental para analisar a vegetação e mais informações relevantes para o cálculo da área disponível e possíveis restrições ambientais.

Segundo a empresa, o imóvel é majoritariamente caracterizado por grande área gramada com árvores isoladas, em sua maioria eucaliptos e espécies exóticas. Há também “quatro trechos de fragmentos florestais formados por bosques de eucaliptos com estratos de vegetação nativa sob as copas”.

Para construir nesses trechos, afirma que “os projetos seguirão a legislação ambiental”. Em relação à fauna, esta seria composta por espécies generalistas, adaptadas ao meio urbano, sem registro espécie ameaçada ou endêmica. “O projeto foi baseado nesses relatórios (ambientais) e tem embasamento jurídico”, acrescentou Juliana Zogbi, da Ekko.

Floresta urbana tem cerca de 40 hectares e serve como corredor ecológico, segundo especialistas Foto: Alex Silva/Estadão

Além da conservação da maior parte das áreas verdes, a Ekko prevê entregar como contrapartidas um projeto de drenagem, um parque linear e o plantio de vinte mil mudas de árvores nativas.

As contrapartidas ambientais só são formalizadas com a aprovação do projeto e do licenciamento ambiental. Segundo a Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), a aprovação do licenciamento do Reserva Golf é de responsabilidade da prefeitura de Osasco.

Dos cinco processos submetidos à Cetesb para empreendimentos imobiliários na área, o órgão informa que um foi indeferido e os demais estão atualmente suspensos por decisão judicial.

Corredor ecológico e mudanças climáticas

Um dos principais argumentos da Avive contra a construção de um grande número de edifícios altos no local é que a vegetação da Vila São Francisco desempenha a função de corredor ecológico.

Conecta áreas remanescentes de Mata Atlântica e parques da região metropolitana, como a Reserva do Morro Grande, o Parque Estadual Jequitibá, a Reserva da Biosfera do Cinturão Verde e o Instituto Butantã, numa continuidade que chega até os parques Burle Marx e Ibirapuera. A conectividade entre essas áreas é citada em parecer encomendado pela Avive à consultoria Dimensão Ambiental.

Segundo o biólogo e professor da USP Giuliano Locosselli, essa ligação proporciona um refúgio e um caminho para a fauna silvestre, em meio à vegetação fragmentada na Grande São Paulo.

“Retirar este ponto de passagem limitará o alcance desta fauna, impedindo que chegue a outras áreas verdes como a USP, o Ibirapuera, o Trianon, o Parque do Carmo, entre outros”, diz ele, que também vê ameaça a espécies vegetais, como cedro e palmito juçara.

Uma das contrapartidas prometidas pela Ekko Group é a criação de parque linear privado aberto ao público Foto: Ekko Group/Divulgação

O climatologista Paulo Artaxo mora naquela região há 20 anos. Para ele, também professor da USP, a derrubada de árvores no local vai “na direção contrária” do que a cidade precisa fazer para se proteger de alagamentos e combater as ilhas de calor. Áreas mais adensadas e impermeabilizadas atingem temperaturas maiores e não ajudam na drenagem da água da chuva.

Osasco ocupa uma das piores posições no Estado — 643ª entre 645 municípios — em termos de cobertura vegetal, segundo dados de 2021 da plataforma UrbVerde, criada por pesquisadores do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos.

Locosselli vê ainda risco para os ciclos hidrológicos da região. A preservação da área permeável “sabidamente estoca água durante as chuvas mais intensas e mitigou por todo este tempo os efeitos das enchentes na região”, segundo ele.

“Vista eterna para a natureza” é o que diz o anúncio do Reserva Golf Residence, empreendimento da incorporadora Ekko Group que inclui duas torres de apartamentos de alto padrão e um shopping na Vila São Francisco, em Osasco, próximo à divisa com São Paulo.

É parte de um projeto de bairro planejado, o Reserva Golf, que quer ocupar uma área do São Francisco Golf Club, fundado pelo Conde Luiz Eduardo Matarazzo nos anos 1930. O local pertencia a uma chácara, que servia para lazer e criar búfalos.

Desde que foi anunciado, em 2020, o complexo imobiliário motivou reação contrária de vizinhos, que veem riscos à floresta urbana de cerca de 40 hectares no local.

A incorporadora diz seguir a legislação ambiental e prever contrapartidas, como a criação de um parque linear e o plantio de 20 mil mudas. Também afirma que irá manter 85% de área verde preservada.

Área verde entre São Paulo e Osasco é remanescente de Mata Atlântica; incorporadora diz que manterá 85% da área preservada Foto: Felipe Rau/Estadão

Embora a Ekko prometa manter grande parte da área verde, os vizinhos temem que o adensamento urbano prejudique a mata. Especialistas também apontam a importância da cobertura verde para proteger a fauna e a flora e o ciclo hidrológico, diante da crise climática.

Ao Estadão, a diretora de incorporação da Ekko, Juliana Zogbi, diz negociar ajustes no projeto com os moradores. O empreendimento tem dez fases, ao longo de 20 anos, mas o número geral de torres não foi informado. O valor geral de vendas do Reserva Golf é calculado pela construtora em R$ 8 bilhões.

Protocolado em 2022, o projeto ainda não teve aprovação da prefeitura de Osasco, por haver duas ações civis públicas e uma ação popular na 6ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo, além pedido de tombamento no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat). Uma liminar suspendeu o corte de árvores e as obras na propriedade.

Em nota, a prefeitura de Osasco diz contribuir com a “mediação e suporte técnico entre as partes”, além de ter informado aos empreendedores que “não será autorizado fazer nenhuma alteração em áreas de proteção permanente (APP)”.

Conselho deve decidir sobre tombamento em outubro

Em 2022, a Associação Vila que te quero Verde (Avive) entrou com o pedido de tombamento. Na região, há trechos de floresta protegidos por legislação estadual, municipal e em alguns casos federal, por conterem nascentes, o que as configura área de preservação permanente.

Formada por mais de 30 condomínios e associações da região, a entidade defende que o tombamento é um reforço à proteção legal, que pode estar sujeita a interpretações.

A proposta foi votada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado (Condephaat) em 12 de agosto. Foram sete votos favoráveis ao tombamento e dez contrários, mas é necessária maioria qualificada (2/3 dos presentes) para a decisão. Houve pedido de vistas para que o parecer seja discutido novamente.

Em nota, a Secretaria da Cultura do Estado, órgão ao qual o conselho está submetido, informou que a Avive anexou nova documentação ao estudo de tombamento, que será analisada para a elaboração de outro parecer. Uma vez finalizado pelo relator, esse parecer deve entrar novamente na pauta do conselho. Segundo a pasta, nova votação é prevista para outubro.

Além do patrimônio natural, a propriedade de aproximadamente 340 mil m² têm edificações históricas, como a sede do Golf Club e a casa de campo do escultor Victor Brecheret, tombada desde 2012 pelo Condephaat. Nela, estão os afrescos “São Francisco” e “Três Graças”, feitos por ele.

A incorporadora afirma que os imóveis serão preservados, restaurados e revitalizados. Diz ainda que pretende transformar a casa do artista em centro cultural. Por ser bem tombado, qualquer mudança no imóvel ou na área envoltória precisa de aval do órgão de defesa do patrimônio.

“É uma paisagem cultural, que tem componentes artísticos, históricos e ambientais”, diz a advogada da Avive, Lavinia Junqueira. A associação argumenta que a medida não beneficia só moradores da Vila São Francisco, mas traz impactos positivos a áreas de periferia adjacentes, como Vila Yara e Jardim D’Abril.

A associação diz não querer barrar o empreendimento e argumenta que o tombamento restritivo ocorreria só em áreas onde já há obstáculos legais, a grande maioria fora das zonas de interesse do setor de construção civil.

Já a Companhia São Francisco de Administração e Comércio, que representa a família Matarazzo, afirmou que ao longo das gerações a manutenção das áreas sempre foi feita no intuito de conservar um bairro verde.

Em nota, acrescentou que o empreendimento “prevê a edificação de residências integradas ao paisagismo local que, trabalhando conservadoramente dentro dos limites impostos pela legislação” traz “amplos benefícios à comunidade”.

Entre eles, citou a preservação de cerca de 280 mil m² de área verde, um novo parque e o plantio de árvores nativas, que estão entre as contrapartidas previstas pela Ekko (leia mais abaixo). O campo de golfe deve continuar aberto a associados, com redesenho do trajeto de jogo.

Na visão da companhia, o adensamento “permitirá melhor aproveitamento das riquezas naturais que hoje não são da comunidade”, além de benefícios para a infraestrutura local e melhora na segurança.

Incorporadora prevê plantio de 20 mil mudas

A Ekko Group afirma ter contratado relatório ambiental para analisar a vegetação e mais informações relevantes para o cálculo da área disponível e possíveis restrições ambientais.

Segundo a empresa, o imóvel é majoritariamente caracterizado por grande área gramada com árvores isoladas, em sua maioria eucaliptos e espécies exóticas. Há também “quatro trechos de fragmentos florestais formados por bosques de eucaliptos com estratos de vegetação nativa sob as copas”.

Para construir nesses trechos, afirma que “os projetos seguirão a legislação ambiental”. Em relação à fauna, esta seria composta por espécies generalistas, adaptadas ao meio urbano, sem registro espécie ameaçada ou endêmica. “O projeto foi baseado nesses relatórios (ambientais) e tem embasamento jurídico”, acrescentou Juliana Zogbi, da Ekko.

Floresta urbana tem cerca de 40 hectares e serve como corredor ecológico, segundo especialistas Foto: Alex Silva/Estadão

Além da conservação da maior parte das áreas verdes, a Ekko prevê entregar como contrapartidas um projeto de drenagem, um parque linear e o plantio de vinte mil mudas de árvores nativas.

As contrapartidas ambientais só são formalizadas com a aprovação do projeto e do licenciamento ambiental. Segundo a Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), a aprovação do licenciamento do Reserva Golf é de responsabilidade da prefeitura de Osasco.

Dos cinco processos submetidos à Cetesb para empreendimentos imobiliários na área, o órgão informa que um foi indeferido e os demais estão atualmente suspensos por decisão judicial.

Corredor ecológico e mudanças climáticas

Um dos principais argumentos da Avive contra a construção de um grande número de edifícios altos no local é que a vegetação da Vila São Francisco desempenha a função de corredor ecológico.

Conecta áreas remanescentes de Mata Atlântica e parques da região metropolitana, como a Reserva do Morro Grande, o Parque Estadual Jequitibá, a Reserva da Biosfera do Cinturão Verde e o Instituto Butantã, numa continuidade que chega até os parques Burle Marx e Ibirapuera. A conectividade entre essas áreas é citada em parecer encomendado pela Avive à consultoria Dimensão Ambiental.

Segundo o biólogo e professor da USP Giuliano Locosselli, essa ligação proporciona um refúgio e um caminho para a fauna silvestre, em meio à vegetação fragmentada na Grande São Paulo.

“Retirar este ponto de passagem limitará o alcance desta fauna, impedindo que chegue a outras áreas verdes como a USP, o Ibirapuera, o Trianon, o Parque do Carmo, entre outros”, diz ele, que também vê ameaça a espécies vegetais, como cedro e palmito juçara.

Uma das contrapartidas prometidas pela Ekko Group é a criação de parque linear privado aberto ao público Foto: Ekko Group/Divulgação

O climatologista Paulo Artaxo mora naquela região há 20 anos. Para ele, também professor da USP, a derrubada de árvores no local vai “na direção contrária” do que a cidade precisa fazer para se proteger de alagamentos e combater as ilhas de calor. Áreas mais adensadas e impermeabilizadas atingem temperaturas maiores e não ajudam na drenagem da água da chuva.

Osasco ocupa uma das piores posições no Estado — 643ª entre 645 municípios — em termos de cobertura vegetal, segundo dados de 2021 da plataforma UrbVerde, criada por pesquisadores do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos.

Locosselli vê ainda risco para os ciclos hidrológicos da região. A preservação da área permeável “sabidamente estoca água durante as chuvas mais intensas e mitigou por todo este tempo os efeitos das enchentes na região”, segundo ele.

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