RIO - Era 7 de outubro de 1984 e o médico Milton Nakamura revelou que o primeiro "bebê de proveta da América Latina" havia nascido em São José dos Pinhais, cidade paranaense a 20 quilômetros de Curitiba. Anna Paula Caldeira era a sexta filha da técnica de raio X Ilza Caldeira. Uma infecção na gravidez anterior a impedia de ter filhos com o segundo marido, o urologista José Antonio Caldeira. Os dois procuraram o especialista em São Paulo e foram o 23.º casal em que Nakamura fez o procedimento. De todos, só Anna Paula nasceria - uma menina de 50 centímetros e 3,3 quilos. Isso 6 anos e 2 meses depois da notícia da primeira bebê de proveta do mundo: Louise Brown, em Oldham, Inglaterra, que nasceu com 2,6 quilos. "Cresci sabendo que o dia em que nasci tinha sido uma data importante para a medicina. Meus pais sempre conversaram sobre isso comigo. Desde pequena tive o assédio da mídia e de outros curiosos para saber se meu desenvolvimento seria normal e se eu teria saúde. Uma sensação boa que tenho é saber que meus pais me queriam muito e fizeram um grande esforço para que isso acontecesse", diz a nutricionista Anna Paula, prestes a completar 30 anos, ainda sem filhos.
No nascimento de Anna Paula, Nakamura, morto em 1997, explicou em entrevistas que para passar pela técnica a mulher precisava "apenas de um ovário que funcionasse bem, um útero normal e um marido fértil". A fertilização era eficaz para aquelas que tivessem problemas nas trompas. Trinta anos depois, a técnica evoluiu e beneficia muito mais pessoas - mulheres na menopausa, casais em que um dos parceiros tem HIV ou hepatite B ou C, homens com baixa contagem de espermatozoide, casais homossexuais e pessoas que passarão por radioterapia e quimioterapia.
"Tentamos muitas pacientes. Mas, pela inexperiência e pela dificuldade das técnicas, o resultado era muito ruim", lembra o especialista em reprodução humana Isaac Yadid, diretor médico da Primordia Medicina Reprodutiva, integrante da equipe de Nakamura que continua em atividade.
Quando Ilza engravidou, os médicos coletavam um embrião por ciclo da mulher. E isso ocorria por laparoscopia, método cirúrgico minimamente invasivo. "Em alguns casos tínhamos de abrir o abdome para captar o óvulo, como em uma cesariana. Foi o que aconteceu com Ilza."
Custo.
O que ainda não mudou é o custo do tratamento, que continua alto - chega a US$ 9 mil, com as medicações. "Há poucos hospitais públicos e algumas clínicas que fazem atendimento de baixo custo, mas ainda assim é caro. O Rio de Janeiro não tem nenhum centro público que faça fertilização in vitro, por exemplo", afirma o médico Paulo Gallo, chefe do setor de reprodução humana do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. "Ganhei todos os equipamentos para abrir um centro público na Uerj, mas faltou o investimento de R$ 1 milhão em infraestrutura. Está tudo se estragando."
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