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O verdadeiro vencedor da Copa do Mundo

Faz algum tempo o torneio mundial é muito mais do que um dos maiores eventos esportivos do mundo

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Atualização:

Se você acha que uma final com seis gols, performance histórica dos maiores craques do mundo, prorrogação emocionante, lances dramáticos e uma disputa de pênaltis épica foi o auge dessa Copa do Mundo no Catar, você está muito enganado. Há algum tempo a Copa é muito mais do que um dos maiores eventos esportivos do mundo, os interesses e implicações geopolíticas ultrapassam em muito os gols incríveis, os lances geniais, os dribles plásticos ou o famigerado VAR. Essa coluna, como tantas outras, é sobre a Copa do Mundo, mas com um olhar diferente.

Sobe a plaquinha de substituição: sai o futebol e entra a política.

TOPSHOT - Mural mostra Messi e Maradona; (Photo by Luis ROBAYO / AFP) 

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Eu sei que é difícil, mas quem tirou os olhos do gramado e atentou pros takes nos camarotes durante as transmissões, percebeu que passaram por ali nomes como Muhammad Bin Salman, líder de fato da ditadura da Arábia Saudita, Emanuel Macron, presidente da França e do Conselho da União Europeia, e Elon Musk, um dos homens mais ricos do mundo e atual dono do Twitter, que curtiu a final ao lado de Jared Kushner, genro do ex-presidente dos EUA, Donald Trump.

É possível que essas figuras sejam mesmo grandes fãs do antigo esporte bretão, acompanhem campeonatos nacionais e sofram com seus times do coração tal e qual o torcedor comum, mas arrisco dizer que estavam ali muito mais por interesses políticos e possibilidades de negócios. O camarote de uma Copa hoje é o melhor ambiente para o “networking” de gente influente na área do esporte, da política e dos negócios. Principalmente aqueles que topam qualquer negócio.

É porque um dos aspectos mais importantes da geopolítica da Copa começa justamente na escolha da sua sede. Como definir quem terá o direito de ser palco de tantas possibilidades de negócios e mais? Entra em campo, a FIFA. A Federação Internacional de Futebol, esse órgão internacional com o poder de influência maior do que de muitas nações e com suas próprias regras diplomáticas (a Palestina, por exemplo, foi reconhecida pela FIFA antes de ser pela ONU), usa esse poder de escolha para tomar decisões pra lá de duvidosas.

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Disputa durante a semifinal da Copa do Mundo. (Photo by Odd ANDERSEN / AFP) Foto: ODD ANDERSEN

O seu sistema arbitrário de votação mexe há décadas com o tabuleiro do xadrez geopolítico mundial e já foi alvo de operação do FBI e documentário investigativo da Netflix. Ser agraciado com a oportunidade de mostrar seu país, sua cultura e a sua economia para o mundo todo tem um valor imensurável e os membros do Comitê da FIFA fazem uso do poder do seu voto..

Para se ter uma ideia do quanto vale esse evento em termos de cifras e influência, o último Super Bowl, a grande final do outro futebol, o americano, teve faturamento e audiência recordes: foram 400 milhões de dólares e mais de 100 milhões de espectadores em todo o mundo. Calcula-se que cerca de 3 bilhões de pessoas assistiram a final da Copa.

Uma audiência dessas proporções é uma oportunidade valiosa para aumentar a visibilidade e influência global de qualquer país, mesmo uma pequena nação árabe bilionária espremida no Golfo Pérsico entre a Arábia Saudita e o Irã (geográfica e metaforicamente).

Em tempos de “soft power” e “sports washing”, dois termos em inglês muito na moda que basicamente traduzem a estratégia de usar o esporte, no caso a Copa do Mundo de futebol, para projetar uma imagem positiva a nível global, o uso do futebol como ferramenta de diplomacia ganha ainda mais valor. Países que desejam melhorar sua imagem e suas relações com a comunidade internacional, escolhem sediar a Copa do Mundo e se colocar como ator global (no sentido geopolítico, por favor) criando oportunidades de diálogo e cooperação que na maioria das vezes não poderiam alcançar devido aos seus aspectos políticos ou culturais.

O Catar, um dos menores e menos influentes países do mundo árabe (mesmo sendo considerado o país mais rico do mundo), já vinha buscando reconhecimento através dos meios esportivos há algum tempo. Com sucesso inegável que tem a grande final dessa Copa como prova, realizada em um belíssimo estádio que uniu a modernidade e tecnologia à tradição e arquiteturas locais, a disputa tinha de um lado o argentino Lionel Messi e do outro o francês Kylian Mbappé, ambos craques do PSG, clube que tem como dono há alguns anos o próprio Catar, através de seu fundo de investimentos esportivos.

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México, Cidade do México. 21/06/1970. O capitão da Seleção Brasileira, Carlos Alberto Torres, levanta a Taça Jules Rimet Crédito:EQUIPE AE/ESTADÃO CONTEÚDO/AE 

Se por um lado, os olhos do mundo focados nesta pequena nação árabe levantaram questionamentos e cobranças quanto aos direitos humanos, tratamento de imigrantes, leis trabalhistas, opressão LGBTQIA+ e extremismo religioso, por outro o Catar apresentou um pouco de sua história, cultura e ambições no maior palco do mundo. No futebol, campeonatos muito disputados geralmente são decididos pelo saldo de gols.

No caso do Catar, os próximos anos podem ser decisivos para mostrar o saldo da Copa do Mundo para o país.

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