A região próxima à praia mais preservada de Balneário Camboriú, no litoral de Santa Catarina, teve parte de seus terrenos adquiridos por uma empresa privada no mês passado. Por R$ 31,5 milhões, a Biopark Gestão Sustentável arrematou, no dia 1° de novembro, uma área anexada à praia de Taquarinhas, com cerca de 600 mil m², em leilão feito pela Caixa Econômica Federal, até então detentora do lote.
“O leilão realizado recentemente envolveu os imóveis situados na região da Praia de Taquarinhas, e não a praia propriamente dita”. diz a prefeitura. A gestão municipal também destacou seu “compromisso com a preservação ambiental e a garantia do acesso público, sempre em consonância com a legislação”.
A Biopark não definiu ainda como vai explorar o espaço, mas afirma, em nota, que a ideia inicial é a construir um parque ambiental de preservação de fauna e flora com foco na observação de pássaros. A definição, segundo os novos proprietários, ficará para 2025. Mas dizem, junto com a prefeitura de Balneário Camboriú, que a praia continuará pública e não terá impedimentos ou cobrança para acessá-la.
Polo turístico de Santa Catarina, Balneário Camboriú tem se notabilizado nos últimos anos pelos investimentos imobiliários e pelas construções de prédios de alto padrão e arranha-céus. Em função da legislação, a região da praia de Taquarinhas tem ficado imune a esse avanço de empreendimentos.
Isso porque a área leiloada fica na Área de Proteção Ambiental (APA) Costa Brava, demarcada em 2000. A região da praia, especificamente, está enquadrada como área com fins de Proteção Integral, o que a torna muito restrita a qualquer tipo de intervenção.
“O plano de manejo da APA Costa Brava classificou a área da Praia de Taquarinhas como APETA – Área de Proteção Especial de Taquarinhas, com zoneamento especial”, afirma a administração municipal. Na prática, construir imóveis, pousadas ou restaurantes no território é proibido.
Para este tipo de área, é permitido apenas o uso dos recursos naturais para educação ambiental, pesquisa científica e turismo ecológico. E, se um proprietário almeja fazer alteração no terreno protegido, é necessário discutir a mudança em audiências públicas e votá-la pelo conselho gestor da APA.
A região da praia de Taquarinhas é composta por um promontório costeiro, elevação geológica que fica direcionada para o mar. A faixa de areia está entre dois costões rochosos, que tornam o espaço de difícil acesso. A formação geográfica e geológica ajudam a manter a sua vegetação de restinga e Mata Atlântica (e a biodiversidade que se abriga ali) altamente preservadas.
Proprietário deseja fazer parque das aves no local
Marcos Gracher, proprietário da Biopark, disse ao Estadão que um dos seus planos é criar um parque para preservar a fauna e a flora, com foco na observação de pássaros. A inspiração, diz ele, surgiu de uma visita que ele fez a um parque semelhante em Foz do Iguaçu, no Paraná, há três anos.
“Pensei: ‘vou tirar do papel esse parque porque em Balneário Camboriú só tem prédios. Não tem muitas áreas com vegetação e com mata nativa, onde os animais podem ficar tranquilos e não se estressar”, conta.
Os terrenos eram particulares e pertenciam a uma construtora paranaense, que fez um empréstimo com a Caixa na década passada para construir um hotel, deixando os lotes como garantia ao banco, segundo Gracher. Na época, o empreendimento não foi para frente. A construtora não pagou pelo empréstimo e os terrenos foram incorporados ao patrimônio do banco, acrescenta ele.
No site do Cadastro Nacional, a Biopark afirma que as principais atividades da instituição são a administração de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental. No entanto, este será o primeiro negócio do ramo para a empresa, que abriu as portas em 29 de outubro, especificamente para poder participar do leilão.
Gracher afirma ser da terceira geração de uma família tradicional do ramo imobiliário, do turismo e do entretenimento, com negócios em Santa Catarina desde os anos 1920. E ele é proprietário de uma rede de academias.
Preservação da área estaria garantida com uma administração pública, diz especialista
A engenheira florestal Rosemeri Marenzi defende a importância de manter o caráter de domínio público da área. “Além de ser aberto à população, ele vai demandar infraestrutura adequada para conservar a biodiversidade, que é o objetivo de uma unidade de conservação como a APA Costa Brava”, destaca ela, professora da Universidade do Vale do Itajaí (SC).
Em 2019, a prefeitura de Balneário Camboriú fez reuniões com a Caixa Econômica. A administração municipal tinha o interesse de que a praia de Taquarinhas se tornasse parque de preservação para atividades de educação ambiental e de turismo ecológico, o que não se concretizou.
Em nota, a gestão municipal só informou que “foram feitas diversas tratativas, mas com diversas negativas por parte da Caixa”.
Movimentos em defesa da conservação da área da praia de Taquarinhas se organizaram desde 2009, quando surgiu a possibilidade de ser construído um resort no local. Na época, Rosemeri chegou a fazer parecer apontando para a importância de a área se tornar de domínio público.
“Um parque ambiental particular tende a ter esse interesse para o turismo, para um retorno econômico em relação ao seu investimento. Quanto mais pessoas, mais interessante para o seu investidor”, pondera.
Mesmo dentro de uma área de proteção especial, Rosemeri entende que a região das Taquarinhas não está livre do risco de ter a sua biodiversidade e beleza cênica afetadas. “O plano de manejo pode, inclusive, ser alterado com o tempo.”
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