Arma de bolinha de gel vira febre e ‘paintball de rua’ preocupa PM; entenda riscos

Dez armas de gel foram confiscadas na zona sul de SP após homem ser atingido no olho; Secretaria da Segurança diz que equipamentos podem ser confundidos com armas de fogo

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Foto do author Giovanna Castro
Atualização:

Armas que disparam bolinhas de gel têm preocupado a Polícia Militar e moradores de várias cidades, incluindo São Paulo, especialmente nas zonas periféricas. Após a popularização do “brinquedo”, com divulgação nas redes sociais e convocação para “guerrinhas” – uma espécie de “paintball de rua” – em bairros como Jardim São Luís e Jardim Miriam, na zona sul, e Vila Verde, na leste, já há casos de pessoa atingida no olho e confronto de jovens com policiais usando a arma falsa.

Armas e bolinhas em gel vendidas por ambulantes na Ladeira Porto Geral, na região da Rua 25 de Março, no centro de São Paulo. Foto: Taba Benedicto/ Estadão

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Segundo a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP), no dia 10 a Polícia Militar deteve 18 pessoas, sendo seis delas adolescentes, após confusão no Jardim São Luís envolvendo o uso das armas de bolinha de gel. Dez armas de gel foram apreendidas.

A pasta diz que, na ocasião, um homem foi atingido no olho após jovens atirarem as bolinhas contra um estabelecimento comercial. “Ao tirar satisfação, um dos suspeitos ainda teria brigado com o homem, bem como ameaçado o seu colega, o que deu início à confusão. Os dois precisaram de atendimento médico.”

  • As armas de bolinha de gel funcionam por meio de bateria e sistema de propulsão a mola. Geralmente são coloridas, em vermelho ou azul;
  • São vendidas em lojas online e em centros populares de compras, como a Rua 25 de Março, no centro paulistano. O preço varia de R$ 80 a até R$ 380, dependendo do modelo;
  • As bolinhas de gel têm cerca de 8 milímetros e são lançadas a distâncias entre cinco e dez metros, segundo o Exército. A reportagem encontrou fornecedores que prometem, no entanto, disparo até 30 metros e guiado por laser.

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No caso do dia 10, os policiais apreenderam imagens de câmera de segurança para realizar a análise e, posteriormente, os envolvidos foram liberados. Um boletim de ocorrência foi registrado como lesão corporal e ameaça no 11° Distrito Policial (Santo Amaro).

Outras quatro ocorrências relacionadas ao paintball de rua foram registradas na Polícia Civil de São Paulo entre os dias 28 e 29 de agosto e 1 e 3 de setembro, todas na zona sul.

No dia 29, um homem, de 20 anos, foi detido por apontar a arma falsa a policiais militares no Jardim Miriam.

“A PM foi acionada porque diversos jovens estavam disparando essa munição em gel em pessoas que andavam pelo local. Quando as equipes chegaram, a multidão que brincava se dispersou, no entanto, os policiais notaram dois homens fugir em uma moto, quando um deles apontou a arma de brinquedo.”

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A SSP diz que houve breve perseguição, até que os envolvidos perderam o controle da moto e o motorista conseguiu fugir a pé. O homem que estava na garupa foi detido e encaminhado à delegacia.

No Instagram e no TikTok, vídeos circulam convidando pessoas para as “guerrinhas” de bolinha de gel e chamando a arma falsa de “nova moda”. Procuradas, a Meta, dona do Instagram, e o TikTok não quiseram se manifestar.

Brincadeira perigosa

“Esse tipo de brincadeira pode ensejar vários problemas, desde acidente de trânsito, ferimentos e até um mal-entendido. Quem vê pode pensar que é um arrastão, por exemplo”, diz o capitão Felipe Neves, do Centro de Comunicação Social da PM de São Paulo. A SSP também vê risco de uso para a prática de crimes, afirma a SSP.

A Secretaria da Segurança diz, ainda, que os equipamentos podem ser confundidos com armas de fogo. E, segundo o Estatuto do Desarmamento, a fabricação e comercialização de réplicas e objetos que podem ser confundidos com armas de fogo é vedada, assim como a utilização do objeto em confrontos e como meio de ameaças, como tem ocorrido em São Paulo.

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O Exército, responsável pela política de desarmamento do País, afirma por sua vez que “não se assemelham a arma de fogo, réplica ou simulacro e, dadas as definições dispostas na legislação em vigor, os lançadores de gel não se enquadram em como Produto Controlado pelo Exército, portanto fogem às atribuições regulatórias deste órgão técnico normativo.”

O entendimento do Exército é de que as bolinhas de gel são lançadas a baixas velocidades e a curtas distâncias, não causando danos às pessoas e ao patrimônio. Além disso, funcionam por meio de baterias e “não se confundem com armas de pressão, como airsoft”. “Suas características principais, como cor e peças (bulbo reservatório), não se assemelham a arma de fogo, réplica ou simulacro”, diz.

Médicos afirmam que o disparo de bolinhas por pistola a mola pode causar danos graves aos olhos e até cegueira, a depender da velocidade e distância de disparo. “É uma brincadeira muito perigosa para os olhos. A bolinha que é lançada tem o diâmetro menor do que a órbita (parede óssea que protege o globo ocular)”, diz Newton Kara Jose Junior, oftalmologista do Hospital Sírio-Libanês.

A órbita, composta pelos ossos que ficam abaixo da sobrancelha, por exemplo, protege o olho de impactos de objetos maiores, como bolas de futebol e de tênis. Mas no caso de bolas pequenas, como as de gel, a proteção não acontece e todo o impacto do disparo vai diretamente para o olho da vítima.

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“A consequência para o globo ocular seria muito grave, podendo ocorrer lesão na córnea, descolamento de retina, inflamação ocular, catarata e até ruptura do globo. O risco de cegueira é grande”, afirma Jose Junior.

“Mesmo com óculos de proteção, uma das grandes críticas que a gente tem é de que precisa haver regulamentação. Quem garante que essas arminhas compradas na internet vêm com óculos adequados para isso? É diferente das armas e equipamentos de paintball, que são muito bem regulamentados”, diz Emerson Castro, também oftalmologista do Sírio-Libanês.

Na 25 de Março, arma é vendida a até R$ 380

A reportagem esteve na Rua 25 de Março, uma das principais de comércio popular na capital paulista, nesta quarta, 18, e quinta-feira, 19, e encontrou armas de bolinha de gel sendo comercializadas por ambulantes e lojistas. O preço variava de R$ 250 a R$380, a depender do modelo: similar a pistola ou a fuzil. Já na internet, o preço mínimo encontrado foi de R$ 79,90.

Os objetos têm cores chamativas em azul, vermelho ou rosa e possuem um recipiente no topo para armazenar as bolinhas em gel, que são vendidas separadamente. A pessoa precisa colocar as bolinhas, a princípio minúsculas, em recipientes com água para que elas inflem e atinjam o ponto de munição da arma falsa.

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Uma cartela de bolinhas, capaz de encher cerca de dez vezes o recipiente da arma, custa cerca de R$ 20.

Arma de bolinhas em gel em formato de fuzil são vendidas por ambulantes na Rua 25 de Março. À esquerda, cartelas de bolinhas em gel. Foto: Taba Benedicto/ Estadão

Segundo ambulantes, as armas são recorde de vendas e aumentaram de preço após a popularização. A reportagem encontrou pais comprando os “brinquedos” para filhos a partir de 5 anos. “Todas as crianças do bairro têm, não quero que meu filho fique de fora da brincadeira. É inofensivo, igual as arminhas de feijão que usávamos quando éramos crianças”, disse um homem, sem se identificar.

A Prefeitura de São Paulo, responsável pelo confisco de mercadorias proibidas para venda na Rua 25 de Março disse que “a venda de armas com munição de gel não é proibida”. “A GCM (Guarda Civil Metropolitana) reforça, entretanto, que suas equipes estão preparadas para atuar em casos de lesão corporal ou outros crimes, adotando as medidas cabíveis.”

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