PUBLICIDADE

Avenida Paulista tem alegria, medo e catarse na hora da virada

Além de militantes, adoradores de Lula seguiram para a região como se tivessem de cumprir uma promessa

PUBLICIDADE

Foto do author Julio Maria

Dez minutos antes da virada de Lula, às 18h34, quando a vantagem de Bolsonaro minguava a menos de 1% dos votos, a Avenida Paulista já estava vermelha de bonés, camisas e bandeiras. Havia a militância profissional dos cantos ensaiados e dos fogos de artifício, mas também uma gente que falava como se não tivesse outra opção. Para eles, não haveria erro. Lula iria ganhar. “Não tem como não ser ele, não podemos seguir vivendo assim”, disse o confeiteiro Wallace Moraes Lins, 19 anos, usando um turbante, colares de muitas voltas e uma certeza quase religiosa. “Ele vai virar.”

Festa de Lula na Paulista Foto: ALEX SILVA/ESTADAO

As pessoas acompanhavam a apuração pelos celulares, celebrando cada décimo de avanço de Lula como se fosse um gol. “Subiu mais um!”, avisavam uns aos outros. Stefanie Fernandes, 22 anos, uma estudante do primeiro ano de Medicina da USP, percebeu o repórter ao lado e fez questão de se aproximar para dizer porque estava ali. “Eu fiz ProUni, cursinho e cheguei à USP graças às políticas públicas de Lula. Mas estou aqui pelo povo preto e pelos LGBTs. É preciso respeito.” Os gritos aumentavam enquanto Stefanie falava, e alguém às suas costas deu a notícia que tornou impossível que ela continuasse a entrevista. “Empatou!”

Festa de Lula na Av Paulista  Foto: Sebastiao Moreira

PUBLICIDADE

Ouviu-se um estouro de fogos e algumas pessoas abraçaram até os repórteres que estavam ali, incluindo cinegrafistas e fotógrafos, para pular e cantar por uma vitória que ainda não havia chegado. Sem a mesma euforia, um casal com dois filhos pequenos seguia sentado em um canteiro na calçada quase em frente ao Masp. Valdemir dos Santos e Lucineia Carvalho vieram de Mundo Novo, no interior da Bahia, há um ano. Mesmo sabendo que Lula poderia perder uma eleição de resultado imprevisível, levaram os dois filhos para a Paulista depois de percorrerem uma longa distância de ônibus do Grajaú, na zona sul, como se tivessem de cumprir uma promessa. Quais seriam seus planos se Lula vencesse? “Voltar para nossa terra para acabarmos de fazer nossa casa. Lula é nosso pai”, disse Lucineia, emocionada.

VIROU! Francisco Eduardo, de 22 anos, apenas começou a falar com a reportagem quando a notícia que as pessoas esperavam chegou. “Quero ver a bandeira do Brasil levar o lema ‘Amor, Ordem e Progresso’”, ele disse, antes de levar um susto. Lula era confirmado o novo presidente do País e um estrondo coletivo tomou a avenida. O cordão de segurança que mantinha as pessoas nas calçadas desapareceu em segundos, liberando as duas pistas para os adeptos de Lula. Havia gritos, desabafos e pessoas dançando com quem nem conheciam. Mãe e filha baianas de Teolândia, Luzinete Santos e Iasmim Sara falavam do quanto suas famílias deviam ao político. “Meus avós conseguiram ter água e bens que nunca tiveram. Viemos aqui por isso.” Elas se emocionavam dizendo do orgulho de serem de uma região do País que havia feito a diferença nas eleições. “Somos nordestinas!”, gritavam, pronunciando bem cada sílaba.

TODOS LADRÕES? A cinco quarteirões dali, nos Jardins, já perto da Avenida Brasil, um ponto de taxista silencioso e mal iluminado guardava outras sensações. “Será que terei de pensar que todas as pessoas que estão a meu lado são ladrões? Por que gostam tanto de eleger ladrão?” perguntou ao repórter o motorista José Fernandes. “É uma pena, o brasileiro tem o governo que merece”, disse, lamentando o resultado. Seu amigo, Carlos Souza, 74 anos, falava em medo. Medo de que o Brasil se tornasse uma argentina e medo de que Lula chamasse todos os seus “ex-ministros ladrões” de volta. Haveria alguma chance de ele ser surpreendido? “Não, acho que ele vai roubar de qualquer forma. Mas a vida segue, tenho de manter minha família, meus netos, meus filhos, a vida segue. E sou a favor de respeitar os resultados das urnas. Não gosto do resultado, mas temos uma Constituição a respeitar.”

Em frente ao ponto dos taxistas, em uma biscoiteria no Shopping Jardim Pamplona, a atendente Vitória dos Anjos, 18 anos, dizia ter claro o desafio de qualquer governante. “Fazer com que a gente ganhe o suficiente para pagarmos o que precisamos para comer e viver, é o mínimo. Eu viajo duas horas para estar aqui e mais duas para voltar, não consigo fazer muita coisa com o que eu ganho.” Não havia muito otimismo com o resultado. “Infelizmente, não acho que o Lula vai conseguir uma mudança drástica com relação a isso.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.