O relator da ação penal do chamado mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, apontou nesta quarta-feira crime de corrupção passiva de dirigentes partidários no que chamou de esquema de compra de apoio ao governo, e propôs um novo fatiamento do processo que deve deixar o julgamento do núcleo político do PT para a semana do primeiro turno das eleições municipais. Barbosa conclui na quinta seu voto sobre corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, e a expectativa é que o revisor, Ricardo Lewandowski, inicie seu voto na mesma tarde. Barbosa viu os crimes de corrupção passiva do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), do ex-deputado Bispo Rodrigues, do ex-tesoureiro do extinto PL Jacinto Lamas, do presidente do PTB, Roberto Jefferson, delator do suposto esquema, e dos ex-dirigentes do partido Romeu Queiroz e Emerson Palmieri. O relator apontou ainda que Costa Neto e Lamas também cometeram os crimes de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, este último também aplicado a Bispo Rodrigues. Antonio Lamas recebeu indicação de absolvição de Barbosa, que seguiu o pedido do Ministério Público Federal. Segundo um acordo realizado entre Barbosa e Lewandowski, o crime de corrupção ativa no mesmo capítulo, do qual são acusados também o núcleo petista --o ex-ministro José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoíno e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares--, será votado depois que todos os ministros avaliarem os crimes dos réus do PP, do então PL, do PTB e do PMDB. Pelo ritmo estimado pelos próprios ministros, este tópico deve coincidir com a semana do primeiro turno das eleições. Os ministros não quiseram avaliar o impacto político da decisão. FATIANDO O FATIAMENTO Petistas e aliados do governo federal afirmaram que a decisão terá impacto nas eleições, porque será tema da imprensa na semana que antecede o primeiro turno, em 7 de outubro. "É claro que não é uma coincidência", afirmou à Reuters um ministro do PT, sob condição de anonimato. No intervalo da sessão, Lewandowski afirmou a jornalistas que está preparado para a decisão de "fatiar o fatiamento", isto é, separar para o final do capítulo a análise de corrupção ativa, como proposto por Barbosa. "É como uma guerra, e eu sou da cavalaria", brincou Lewandowski ao afirmar que concordaria com o novo fatiamento proposto por Barbosa. Ele afirmou ainda que deve levar entre uma e duas sessões para votar os crimes já vistos pelo relator neste item. TROCA DE APOIO PARLAMENTAR Segundo Barbosa, ficou claro que houve pagamento de recursos em troca de apoio dos deputados aos projetos do governo na Casa. "A origem dos recursos era pagamento de vantagem indevida, pago em troca de apoio parlamentar, foi o que se verificou ao longo da legislatura", disse o ministro. Segundo Barbosa, Costa Neto recebeu cerca de 10 milhões de reais em espécie do PT, via o valerioduto --esquema de pagamentos coordenado pelo empresário Marcos Valério, que utilizava o Banco Rural e corretoras-- para apoiar o governo federal na Câmara dos Deputados. "Os vultosos pagamentos vinham influenciando o exercício do mandato do acusado, favorecendo os interesses (do governo)", disse o relator. Segundo Barbosa, os réus não apresentaram demonstrações de como o dinheiro foi utilizado, mas a destinação pouco importa para a materialização do crime de corrupção passiva. Barbosa disse ainda que Valdemar Costa Neto teve auxílio "estável e permanente" de Jacinto Lamas, seu assessor e da bancada, além de tesoureiro do PL. "O acusado não só tinha conhecimento do caráter criminoso das práticas do réu Valdemar Costa Neto, como também queria auxiliá-lo na prática criminosa", disse Barbosa sobre a participação de Lamas. Na segunda-feira, no início do julgamento do chamado núcleo político do suposto esquema, Barbosa disse não haver qualquer dúvida sobre a compra de votos na Câmara, ao apontar indícios de crime de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha de três réus do Partido Progressista (PP); além de dois sócios da corretora Bônus Banval, que teria participado da lavagem de dinheiro. "JEFFERSON SABIA" Já o presidente do PTB, Roberto Jefferson, teria recebido 4,5 milhões de reais entre dezembro de 2003 e maio de 2004, após assumir a presidência do partido. Ele teria sido auxiliado pelo também deputado Romeu Queiroz e por Emerson Palmieri, primeiro-secretário do PTB e que trabalhava como tesoureiro informal do partido. "Roberto Jefferson, que era líder parlamentar do PTB na Câmara, sabia da existência do que ele chamou de mesada a parlamentares. (Ele) tinha consciência que esses pagamentos eram feitos em troca da consolidação da base aliada do governo na Câmara", disse Barbosa. Jefferson admitiu ter recebido o dinheiro, mas disse que se tratava de acordos de campanha, o que foi rebatido pelo relator. Barbosa defendeu que Jefferson valeu-se da "sistemática de pagamento de dinheiro" oferecida pelo publicitário Marcos Valério e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e aceitou receber os valores. Jefferson delatou a existência do suposto esquema em entrevista em 2005. O dinheiro recebido por ele seria parte do valor de 20 milhões de reais que teria sido acertado com o então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, em troca de apoio do partido, segundo a denúncia do Ministério Público Federal (MPF). Barbosa viu também crimes de corrupção passiva por Queiroz e Palmieri, que "intermediou e atuou no sentido de viabilizar o recebimento da vantagem indevida".
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