Relatório do Ministério Público Estadual (MPE) do Rio mostra que o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, tem um patrimônio de milhões de reais que reúne, pelo menos, 48 imóveis, 36 contas bancárias e 12 automóveis em quatro Estados brasileiros. Os bens são resultado do esquema organizado pela quadrilha do criminoso para "lavar" o dinheiro da venda de drogas e das armas e transformá-lo em renda legal para ele, sua família e seus cúmplices, revela o documento, obtido com exclusividade pelo Estado. Ao contrário do anunciado inicialmente, as aquisições do traficante não foram feitas apenas no Parque Beira-Mar, favela no município de Duque de Caxias (Baixada Fluminense), onde ele ganhou o apelido. Lá, Beira-Mar comprou 15 imóveis, mas ele também tem propriedades em bairros da zona sul do Rio, entre eles um apartamento de dois quartos no Jardim Botânico e outro, também de dois quartos, em um condomínio luxuoso na Barra da Tijuca. Há ainda casas em áreas nobres da região serrana fluminense, como Petrópolis, Itaipava e Nova Friburgo. O patrimônio de Beira-Mar espalha-se ainda por outros Estados, como Paraná e Mato Grosso do Sul - considerados rota internacional do tráfico - e Paraíba. No Estado nordestino, o traficante tem outros 14 imóveis, a maioria residências no centro e em praias de João Pessoa. Foi em uma dessas praias paraibanas, a do Poço (onde a quadrilha tinha uma loja de material de construção), que foi presa a irmã do traficante, Alessandra da Costa, em janeiro de 2000. Alessandra - assim como outra irmã, Débora - era considerada braço direito de Beira-Mar. As duas foram condenadas e estão presas por tráfico. Na lista de bens levantada pelo Ministério Público, Alessandra é titular de duas contas bancárias. O valor das contas não é revelado pelo MPE, porque o processo corre em segredo de Justiça. Dos 92 itens do patrimônio, não há nenhum em nome de Luiz Fernando da Costa. Todos pertencem oficialmente a "laranjas", como são chamados aliados e parentes que emprestam o nome para proteger o traficante da Justiça. O esquema de Beira-Mar para lavar dinheiro fica claro quando se observa a relação de imóveis, explica Márcia Teixeira Velasco, um dos quatro promotores que desvendaram o esquema do traficante. Empresas Para legalizar a renda do tráfico, a quadrilha de Beira-Mar comprava empresas que negociam com mercadorias de difícil controle fiscal e usam bastante dinheiro trocado, como é o caso de fábricas de gelo, lava-rápidos, padarias etc. Assim, ele podia injetar dinheiro sujo nessas empresas sem levantar suspeitas. "Quando você vê, por exemplo, uma padaria jogada às moscas que, mesmo sem clientes, nunca fecha, você pode começar a desconfiar. É o mesmo caso de fábricas de gelo. Como eles usam apenas água, fica difícil controlar a fonte do faturamento e fácil colocar dinheiro do tráfico", afirma Adriene Senna, presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda. O Coaf foi criado em 1998 e é uma das medidas previstas na Lei 9.613, do mesmo ano, para dificultar a lavagem de dinheiro do tráfico de drogas. Beira-Mar também era cauteloso para guardar o dinheiro, acredita Adriene. O relatório do Ministério Público indica que outra estratégia usada pela quadrilha era dividir o faturamento do tráfico em diversas contas bancárias em nome dos "laranjas". "A pulverização dos recursos ilegais em várias contas é um recurso muito usado por narcotraficantes e funciona bem, porque dificulta qualquer rastreamento da polícia ou da Justiça", avalia a presidente do Coaf. "Hoje seria mais difícil abrir contas em nome de parentes porque a nova lei força gerentes de bancos a exigir de novos clientes provas e documentos que provem sua renda." Na lista dos correntistas, estão a irmã Alessandra, a mãe, Zelina, e duas das várias mulheres do traficante, Jaqueline Alcântara de Moraes e Elizete da Silva Lira. Há ainda parceiros na venda de drogas nos morros cariocas, como Marcos Monteiro Carneiro, Shirley de Figueiredo Ângelo, Marinilson Carneiro da Silva, Alexsandro Cardoso dos Santos, e doleiros, como Khaled Aragi, Omar Ayoub e Younnes Ismail. Ao todo, são 42 os acusados que constam no processo de seqüestro de bens que corre na 1.ª Vara Criminal de Duque de Caxias. Prisões Com exceção de três acusados desaparecidos e supostamente mortos e outros três foragidos, a maioria dos envolvidos já foi condenada e está presa. Além das irmãs, as mulheres também foram detidas. Jaqueline foi presa em Manaus em 28 de maio de 2001. Condenada a 4 anos por tráfico, seria a responsável por comprar celulares para Beira-Mar. Elizete foi presa em fevereiro, na Colômbia, e também foi condenada a 4 anos por tráfico. Ela seria a dona do apartamento do Jardim Botânico e de 2 dos 12 automóveis (uma Veraneio e um Kadett). Uma terceira mulher do traficante, Alda Inês dos Anjos, também está presa, mas não consta da lista dos titulares de contas correntes.
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