O governo do México reconheceu o esforço dos EUA na operação que prendeu 303 supostos integrantes do cartel mexicano La Familia em território americano na quinta-feira. As detenções - realizadas em 19 Estados - foram um duro golpe ao grupo, que ganhou destaque na guerra entre os cartéis mexicanos ao lançar uma ofensiva contra o governo no Estado de Michoacán, norte do país, torturando e massacrando agentes federais. Tudo, segundo eles, com uma bênção divina. Diferentemente dos outros cartéis, o La Familia investe em ações sociais e tem um "líder espiritual" que prega o "direito sagrado" da organização de eliminar seus inimigos.A preocupação social do grupo e sua insurreição direta contra o Estado, afirmam analistas, está mudando algumas das características fundamentais do conflito mexicano."Ao vender proteção para comerciantes e investir na sociedade, o La Familia está introduzindo a lógica da máfia italiana na luta entre os cartéis", afirmou ao Estado o analista político Jorge Chabat, do Centro de Investigação e Docência Econômicas, na Cidade do México.O grupo tem um rígido código de conduta que proíbe seus integrantes de beber, portar armas sem autorização e até mesmo exceder o limite de velocidade nas ruas e estradas do país. Preocupados em camuflar suas atividades criminosas, eles financiam a construção de escolas, promovem cultos religiosos e até mantêm centros de reabilitação para viciados. O evangélico Nazario Moreno González, conhecido como "El más loco", é um dos líderes da organização e usa trechos da Bíblia para "inspirar" os integrantes do grupo.Criado na década de 80, o La Familia é considerado um dos cartéis mais violentos do México. Em julho, após a prisão de um de seus líderes, o grupo realizou, em menos de uma semana, mais de dez ataques contra policiais federais, que mataram pelo menos 18 agentes.O cientista político Carlos Flores, do Centro de Pesquisas e Estudos Superiores em Antropologia Social, acredita que a decisão do grupo de lutar contra o governo mostra uma leve mudança de rumo no conflito: "Apesar de os combates entre cartéis continuar, funcionários federais agora passaram a ser alvo dos traficantes."Depois de lançar a ofensiva contra o governo, um homem identificado como Servando Gómez Martínez, um dos líderes do La Familia conhecido como "La Tuta", participou, por telefone, em julho, de um programa de TV ao vivo no qual ofereceu um acordo para o governo. "Queremos que o presidente Felipe Calderón saiba que nós não somos inimigos dele. Estamos abertos ao diálogo", afirmou La Tuta.A resposta do governo mexicano para a oferta foi reforçar a segurança em Michoacán, enviando mais 2,5 mil efetivos para a região. "Para Calderón esse é um assunto pessoal", ressaltou Erubiel Tirado, especialista em segurança da Universidade Ibero-Americana.
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