Com imigração venezuelana, Boa Vista vive problemas de metrópole
Imigrantes passaram a morar em praças sem acesso a banheiros nem água potável, lotar semáforos pedindo esmola ou vendendo alimentos e tomar calçadas com barracas
BOA VISTA - Cidade com a segunda menor população entre as capitais brasileiras, Boa Vista não estava acostumada, até pouco tempo, a cenas comuns das grandes metrópoles. Município pacato de 332 mil habitantes, arborizado, com bairros planejados e avenidas amplas, a capital de Roraima viu essa realidade começar a mudar no ano passado, com a chegada de milhares de venezuelanos que fugiam da crise econômica no país vizinho.
O resultado desse movimento, intensificado em 2018, foi o aumento relâmpago de 10% na população de Boa Vista em apenas um ano. Se os cerca de 40 mil imigrantes que vivem atualmente na capital roraimense formassem uma cidade, ela já seria a segunda maior do Estado.
Sem condições de comportar tal fluxo migratório, Boa Vista não tem conseguido dar tratamento digno aos vizinhos sul-americanos. Com dificuldades para obter um emprego, os venezuelanos passaram a morar em praças públicas sem acesso a banheiros nem água potável, lotar semáforos pedindo esmola ou vendendo alimentos e tomar calçadas com barracas ou comércios improvisados – todas situações até então raras no município. Uma minoria também começou a se prostituir ou praticar crimes, trazendo degradação e insegurança a alguns bairros.
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Vítimas da falta de alimentos e remédios em seu país, os venezuelanos protagonizam ainda disputa por restos de comida em restaurantes de Boa Vista e lotam hospitais e postos de saúde em busca de tratamento médico. O quadro dramático divide a opinião de moradores da cidade. Parte defende que a fronteira seja fechada, como solicitado pelo governo do Estado ao Supremo Tribunal Federal. Outros alertam que os estrangeiros estão sendo as maiores vítimas da falta de estrutura já existente nos serviços públicos.
“É verdade que em Boa Vista a gente não via mendigo em sinal, não via gente parando os carros para limpar para-brisas, não tinha tanto assalto. Mas os venezuelanos também estão sendo bodes expiatórios”, diz o taxista Edmilson Machado Gusmão, de 55 anos, que mora na cidade há 25. “A maioria deles só quer comida e um emprego. São poucos os que fazem coisa errada e todos levam a fama. É uma situação difícil porque eles saíram de lá para não morrer de fome.
A imigração venezuelana para o Brasil em 20 fotos
1 / 20A imigração venezuelana para o Brasil em 20 fotos
Roraima
Cerca de 40 mil imigrantes vivem atualmente em Boa Vista, capital de Roraima. Em um ano, chegada de venezuelanos aumentou em 10% a população da cidade... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Travessia
Cerca de 700 imigrantes fazem fila diariamente na fronteira da Venezuela com o Brasil, próximo ao município de Pacaraima, em Roraima Foto: Werther Santana/Estadão
Caminho
Após atravessarem a fronteira, muitos venezuelanos caminham por dias pela estrada até a chegada em Boa Vista. Foto: Werther Santana/Estadão
Carona
Na foto, a família de Francisco da Encarnación tenta conseguir uma carona pela BR-174 atéBoa Vista Foto: Werther Santana/Estadão
Abrigo
Os cinco abrigos de Boa Vista estão superlotados. Na foto, o abrigo do bairro Pintolândia, no qualimigrantes vivem dentrode um ginásio e em tendas no ... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Descanso
Nos abrigos, imigrantes dormem em colchões dispostos no chão ou em redes improvisadas Foto: Werther Santana/Estadão
Rotina
Na foto, imigrantes penduram roupas em ginásio transformado em abrigo pela Defesa Civil de Roraima Foto: Werther Santana/Estadão
Em praças
Com os abrigos lotados, imigrantes montaram barracas improvisadas nas praças, mas não contaram com a ajuda do poder público. Na Praça Simon Bolívar, p... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Falta de estrutura
Comércio no entorno de praça cobra R$ 3 para venezuelanos utilizarem banheiros. Sem alternativa, muitos procuram matagais próximos para urinar e defec... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Superlotação
Dentre os abrigos,a pior situação é a do localizado no bairro Pintolândia, que acolhe apenas venezuelanos indígenas. O local tem capacidade para 370 p... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Refeições
Na foto, venezuelanos esperam na fila para receber comida noGinásioTranquedo Neves, transformado em abrigo pela Defesa Civil em Boa Vista Foto: Werther Santana/Estadão
Refeições com sobras
Com a chegada de mais refugiados à cidade e a falta de vagas em abrigos, os que vivem em praças começaram a buscar alternativas para comer. Inicialmen... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Fechamento de fronteira
A governadora de Roraima, Suely Campos (PP), se encontrou na quinta-feira com a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), relatora da aç... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Higiene
Venezuelanos acampados em praça de Boa Vista andam mais de dois quilômetros até o Rio Branco para tomar banho ou lavar roupas. Foto: Werther Santana/Estadão
Comércio improvisado
Ruas do entorno do abrigo Tancredo Neves viraram uma espécie de feira ao ar livre de venezuelanos, com venda de alimentos e cigarros e prestação de se... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Trabalho
O trabalho autônomo foi a opção encontrada por imigrantes que não conseguem emprego na capital de Roraima. Alguns vendem os poucos itens que trouxeram... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Precarização
Outra mudança no mercado de trabalho de Boa Vista trazida pela imigração foi a redução no valor das diárias pagas a profissionais autônomos. Com muita... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Nas ruas
Venezuelanos trabalham nos faróis lavando os retrovisores de carros para ganhar trocados em Boa Vista Foto: Werther Santana/Estadão
Prostituição
Moradores contam que a presença de garotas de programa nas calçadas se intensificou com o aumento da imigração venezuelana na cidade. Antes, dizem ele... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Violência
Com o aumento da população, Boa Vista viu o número de ocorrências criminais dobrar. Mas apenas 0,5% dos crimes foi cometido por venezuelanos, segundo ... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Fronteira. A governadora de Roraima, Suely Campos (PP), se encontrou na quinta-feira com a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), relatora da ação em que o Estado pede o fechamento temporário da fronteira. "A nossa audiência teve uma preocupação em relatar pessoalmente à ministra as condições em que Roraima se encontra”, disse ao Estado.
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Em despacho do dia anterior, Rosa deu 30 dias para a União se manifestar sobre a ação e para um eventual encaminhamento à Câmara de Conciliação e Arbitragem Federal da Advocacia-Geral da União (AGU). O presidente Michel Temer, porém, já veio a público para afirmar que o bloqueio da fronteira é “incogitável”. Dentro do governo, várias autoridades também consideram qualquer negociação inviável, por violar uma série de tratados internacionais.