E se, no dia 14 de maio de 1888, um dia após a abolição da escravização, fosse instaurada uma assembleia constituinte com participação equitativa da população negra? Esse dia que não existiu é o ponto de partida de um edital da Prefeitura do Rio de Janeiro para artistas de todo Brasil chamado Constituinte do Brasil Possível.
A ação cultural vai selecionar obras de dez artistas sobre um hipotético curso da história brasileira se a população negra tivesse tido participação ativa nas decisões políticas do País após assinatura da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888.
Os projetos selecionados serão remunerados em R$ 4,5 mil e expostos no Centro Cultural dos Correios, no Rio de Janeiro, em outubro. As inscrições são gratuitas e devem ser feitas por pessoas com idade a partir de 18 anos, pretas e pardas, em formulário online, até 26 de junho.
O projeto se chama Linha de Cor, iniciativa inédita que envolve pesquisa, educação e audiovisual realizados por pessoas negras. O resultado do edital será divulgado no site Linha de Cor e nas redes sociais do projeto no dia 15 de julho. Mais informações podem ser conferidas no edital.
As propostas artísticas podem adotar diversas linguagens, como pintura (em variados materiais), escultura, impressão 3D, gravura, fotografia, indumentária, artesanato, arte gráfica, xilogravura, poesia visual, arte postal, zine, performance, grafite, lambe-lambe, stencil, colagem, fotoperformance, artes integradas e outras não especificadas anteriormente.
A ideia é que os artistas pensem um outro País em um exercício de reformulação histórica. “Uma nação mais includente e possível a partir da abolição”, diz Mariana Luiza, idealizadora do projeto, diretora e roteirista de cinema.
Nesse sentido, o projeto pretende dar destaque a importantes abolicionistas, personagens negros que foram invisibilizados pela História, como, por exemplo, Maria Amanda Paranaguá, Tia Ciata, André Rebouças e José do Patrocínio.
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Embora tenha posto fim à escravização, a legislação não previu medidas eficazes para reparar os mais de 300 anos de trabalho forçado. Além disso, a Lei Áurea não garantiu moradia, educação e saúde e os negros continuaram marginalizados
Em suas pesquisas, iniciadas em 2017, Mariana Luiza descobriu personagens históricos e políticos. “Foi aí que nasceu um desejo de trabalhar esse tema em uma outra linguagem e propor uma exposição de artistas negros que pudessem pensar junto com o nosso grupo de historiadores um outro País”, destacou Mariana.
As leis que estruturaram o racismo e marginalizaram a população negra no Brasil se fazem presentes desde a formação do País, passando pela primeira assembleia constituinte, em 1823, até a Constituição de 1988. Essa foi a conclusão a que Mariana chegou.
Sua busca já rendeu um projeto de pesquisa, uma instalação imersiva em Amsterdã, na Holanda, e a recente ação cultural, contemplada pelo Edital Pró-Carioca Diversidade Cultural, da Prefeitura do Rio de Janeiro, por intermédio da Secretaria Municipal de Cultura (SMC).
“Em 2023, ganhamos um edital da Lei Paulo Gustavo da Prefeitura do Rio de Janeiro para fazer essa exposição. Em paralelo começamos a pesquisar a elaboração de um site”, afirmou sobre o portal que será lançado junto à exposição em outubro deste ano.
Os projetos contam com a colaboração de Thula Pires, professora de Direito da PUC, no Rio, e Ana Flávia Magalhães, professora de História da Universidade de Brasília e diretora do Arquivo Nacional.
Além dos projetos já lançados, Mariana Luiza usará as pesquisas na produção de um documentário. “Ainda está em desenvolvimento e captação. Estamos captando para produção, pretendendo iniciar em 2025″, afirmou.
* Este conteúdo foi produzido em parceria com a Associação dos Produtores Audiovisuais Negros (APAN), grupo que promove o recorte racial na cadeia produtiva audiovisual (concepção, produção, distribuição e exibição).
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