PUBLICIDADE

Boleiros e baladas

PUBLICIDADE

Por danielpiza

Boleiros e baladas rimam desde que a bola rola e as rádios e TVs transmitem. Garrincha aproveitou as folgas na Suécia para fazer um filho que não conheceu. George Best declarou que gastou 80% do dinheiro com carros, bebidas e mulheres e "desperdiçou" os outros 20%. Maradona ultrapassou todos os limites. Sócrates fumava nos intervalos de partida. Neto fazia gol de bicicleta com peso de caminhão. Renato Gaúcho e Romário acumularam mulheres, não raro até algumas horas antes de uma decisão internacional. Foram todos craques, todos vitoriosos. E quem disse que é apenas no futebol? Um atleta como Michael Phelps foi recentemente flagrado com maconha numa festa, hábito que não o impediu de ganhar oito medalhas numa mesma Olimpíada.

PUBLICIDADE

É divertido, portanto, ver que a diversão de ídolos esportivos venha suscitando uma onda de moralismo, muitas vezes de falso bom-mocismo, entre comentaristas e torcedores do ludopédio. Sob o argumento de que "pessoas públicas não têm vida privada", porque deveriam ser exemplos de conduta para seus jovens fãs, o dedo-em-riste está em capas de revista, arquibancadas de treino e mesas redondas cada vez mais quadradas. Pior ainda, por ser mau jornalismo antes de mais nada, as suspeitas são automaticamente convertidas em fatos; mesmo que palavras como "supostamente" e "teria" sejam usadas no texto, não há dúvida sobre quem é réu e quem é juiz.

Basta um mero subtítulo "Escândalo" para uma matéria sobre a acusação de que Robinho teria estuprado uma moça na Inglaterra: o estrago já terá sido feito. Afinal, se a acusação for falsa, e até agora não há provas sólidas que a sustentem, cadê o escândalo? Escândalo é que a mídia continue a justificar a imagem que filmes como A Montanha dos Sete Abutres criaram a seu respeito. Qualquer Maria Chuteira tem todos os microfones do mundo abertos quando se trata de uma "denúncia" contra alguém mil vezes mais famoso do que ela. O tempo passa, a Justiça nada prova, mas o linchamento moral deixa marcas. "O nome dele apareceu na agenda de telefones de uma prostituta? Que a-bi-sur-do!"

Não estou dizendo que os atletas sejam santos, que não devam se cuidar nem ter consciência de que são imitados por adolescentes. Mas também podemos ensinar aos adolescentes que ídolos não devem ser imitados, que admirar uma pessoa não é repetir suas besteiras e que atletas não são animais de circo a quem não se perdoam os erros. Os que todo dia fumam ou bebem muito ou dormem tarde estão sendo burros; não entendem que sua carreira é curta e exige sacrifícios do corpo. Mas, como torcedor ou cidadão, o que quero é vê-los jogando bem, ganhando campeonatos, dizendo coisas razoáveis - como o pedido de desculpas de Phelps. Não faço questão de que se comportem de acordo com o código moral de uma época que, ironicamente, se gaba tanto de tolerar as diferenças.

O CHORO DE FEDERER

Publicidade

Sim, ídolos recebem quantidades astronômicas de dinheiro. Nem por isso deixam de ser humanos. O choro de Roger Federer no domingo foi o desabafo de alguém que mais uma vez perdeu para Rafael Nadal - e, se perdeu com enorme elegância, Nadal venceu com mais elegância ainda - e, acima de tudo, que sente a pressão de fora e de dentro para bater o recorde de Pete Sampras. Vencer o 14º Grand Slam tem sido difícil até para um jogador como ele. Por isso mesmo, quando vencer, o que seria apenas um número vai ganhar um toque feliz de humanidade.

ESTADUAIS

Dizer que os torneios estaduais não têm a importância do Brasileirão, da Copa do Brasil ou da Libertadores é como dizer que a bola é redonda.

(Coluna "Boleiros")

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.