Derrite defende retomar debate sobre reduzir maioridade penal; senadores se movimentam no Congresso

Medida está travada no Legislativo desde 2015; governo federal é contrário à ideia

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Foto do author Paula Ferreira
Atualização:

BRASÍLIA- O caso da vice-cônsul colombiana, Claudia Katherine Ortiz Vaca, baleada na Avenida Nove de Julho, em São Paulo, deu munição para o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, retomar a discussão acerca da redução da maioridade penal, travada no Congresso desde 2015.

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Segundo a investigação, dois adolescentes participaram da tentativa de assalto que terminou com Claudia baleada. Conforme o boletim de ocorrência, uma mulher em um táxi foi abordada por três criminosos, um policial militar de folga interveio, e disparou contra os ladrões. A diplomata passava a pé pela rua e foi atingida. Claudia já recebeu alta do hospital.

Em agenda com parlamentares em Brasília nesta semana, durante o Fórum de Segurança Pública organizado pelo Partido Progressista, Derrite usou o caso como exemplo para defender que o tema seja pautado no legislativo.

Ao Estadão, o secretário paulista afirmou que vê um ambiente favorável no Congresso para discussão de temas relacionados à segurança pública.

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Guilherme Derrite, secretário de Segurança Pública de São Paulo Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“Dos adolescentes infratores que foram apreendidos (no caso da vice-cônsul), um já foi apreendido nove vezes. Nove, nove oportunidades! O outro, 19 vezes. Comprovando que a gente tem de revisitar esse tema, que a redução da maioridade penal é algo necessário. Nada melhor do que mostrar na prática um caso como esse”, disse.

A redução da maioridade é um tema controverso e enfrenta oposição de especialistas em segurança pública. Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para reduzir a idade para responsabilização criminal, hoje em 18 anos, foi aprovada em 2015 na Câmara dos Deputados em dois turnos, mas travou no Senado.

Em 2019, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) propôs uma nova PEC que pretende reduzir a maioridade de 18 para 16 anos, e inclui a possibilidade de que adolescentes de 14 anos possam ser responsabilizados penalmente por crimes hediondos (crimes considerados extremamente graves, como homicídio e estupro), tortura, tráfico de drogas, terrorismo, e participação em organizações criminosas. A reportagem procurou o senador, mas não obteve resposta.

Discussão na CCJ

A PEC está pronta para ser votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, presidida pelo senador governista Otto Alencar (PSD-BA).

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Ao Estadão, Alencar afirmou que até o momento não recebeu pedidos para pautar o tema, e que há outras prioridades no radar da CCJ, como a segunda parte da regulamentação da Reforma Tributária e o Código Eleitoral. O senador ponderou, no entanto, que está aberto a ouvir a demanda dos líderes partidários.

“Em qualquer circunstância eu votaria contra (a redução da maioridade). Agora, como presidente tenho que ouvir os líderes. Isso tem que ser por conversa, no diálogo, no respeito, sem imposições indevidas", afirmou.

Relator da proposta, o senador Marcio Bittar (UNIÃO-AC) afirmou que conversará com o presidente da CCJ na próxima terça-feira, 1º, para pedir um espaço na pauta. Segundo ele, o tema é sua prioridade. O parlamentar afirmou que vai indicar no relatório que jovens de 14 anos possam ser responsabilizados em caso de crimes hediondos.

“Para crimes hediondos, se dependesse de mim, não haveria idade mínima. O crime organizado, é quase de conhecimento geral, utiliza esses jovens”, disse à reportagem.

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Divisão no Senado

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Os senadores a favor da proposta, no entanto, não terão tarefa fácil na Casa. Membro da base aliada do governo, o senador Fabiano Contarato (PT-ES), que atua em causas relacionadas à segurança pública, argumenta que a maioridade penal é uma cláusula pétrea da Constituição e não pode ser alterada.

A proposta do senador é aumentar para cinco anos o tempo de internação de menores de idade que cometam atos infracionais menos graves e sem violência; além de subir para dez anos o período de internação no caso de atos infracionais análogos a crimes com violência ou grave ameaça e hediondo. Ele argumenta que o Brasil tem regras muito brandas para punir menores de idade.

“Eu defendo aumentar o tempo de internação para adolescentes em conflito com a lei. Não é razoável que um jovem entre numa escola, como houve no Espírito Santo, saia atirando e fique no máximo três anos recolhido”, afirma Contarato. “Se a extrema-direita for a única a tratar de segurança, ela sempre pautará da pior forma”, diz.

Governo trabalhará contra

O governo federal é contra a redução da maioridade penal e trabalhará para barrar movimentações relacionada ao tema. De acordo com o secretário nacional de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Marivaldo Pereira, a redução da idade é ineficaz para melhoria da segurança pública e pode acarretar um encarceramento em massa da juventude mais pobre e negra. Ele afirma que essa bandeira é uma “saída fácil” que não traz resultados.

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“É algo que ofende gravemente aquilo que está previsto na Constituição”, afirma Pereira. “O que a gente precisa pensar para os jovens de 14 anos é mais acesso à cultura, à educação, ao esporte. É perspectiva de futuro profissional, de acesso à universidade. Pensar numa redução da maioridade para 14 anos é voltar para um sistema que há muito a gente já deveria ter abandonado.”

Risco de aprofundar o problema

Diretora de Pesquisa do Instituto Igarapé, Melina Risso explica que a questão da segurança pública não é tão simples de resolver e demanda uma reforma em todo o sistema que culmina na prisão, incluindo desde a denúncia até o processo de responsabilização.

Ela explica ainda que o próprio sistema penitenciário vive uma crise e não contribui para mudar a trajetória das pessoas que são presas. Colocar adolescentes neste ambiente poderia aprofundar o problema.

“Esses adolescentes vão entrar muito jovens, vão ter contato com pessoas muito mais perigosas e aprender muito antes situações sobre outras formas de criminalidade. Vão estar sujeitos a condições sub-humanas e, portanto, a gente não vai conseguir produzir um resultado mais efetivo na saída desse sistema”, diz.

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