PUBLICIDADE

Escritor transforma muros de Brasília em plataformas para publicação de livros

Diante da negativa de editoras, o escritor Hugo Barros teve de pensar em novas formas de publicar livros. A resposta estava no próprio trabalho literário, que abordava temas de vulnerabilidade social e situações de risco

PUBLICIDADE

Por Amanda Calazans

Em um muro de um posto de gasolina, o escritor Hugo Barros viu uma plataforma para publicar o livro O Menino Invisível, sobre o poder de invisibilidade de uma criança que vive nas ruas. A ação deu origem ao projeto Livro de Rua, que já ocupou três muros de Brasília e foi finalista do Prêmio PublishNews 2023 na categoria Inovação do Ano.

PUBLICIDADE

Com a negativa de editoras para avaliar seus originais em 2017, e sem dinheiro nem conhecimentos de distribuição para optar pela autopublicação, Barros teve de pensar em novas formas de publicar livros. A resposta, conta ele, estava no próprio trabalho literário, que abordava temas de vulnerabilidade social e situações de risco. “Pensei que talvez a história ganhasse ainda mais força se estivesse impressa em um muro onde realmente alguém já dormiu. A mensagem fica mais forte com a plataforma ajudando a contar a história.”

O projeto Livro de Rua conseguiu financiamento por editais de cultura do Distrito Federal. Assim, publicou o primeiro livro na SQS 413, na Asa Sul, com a artista Camilla Siren. As telas seguintes foram os muros da Biblioteca Nacional de Brasília e da Biblioteca Central da Universidade de Brasília (UnB), que receberam Cata Tesouro e (Des)iguais, respectivamente, ilustrados por Mikael Omik – muros com a função também de convidar as pessoas a entrarem para descobrir mais livros.

Muro da biblioteca da Universidade de Brasília (UnB) foi um dos locais de publicação de livros do escritor. Foto: Wilton Junior/Estadão

Todas as histórias grafitadas têm ISBN, código internacional de identificação de livros, mas não foi simples consegui-lo. Em um primeiro momento, a Agência Brasileira do ISBN não considerou ser livro “pinturas em parede” e negou o pedido. O escritor conseguiu o registro após fundamentar o recurso com bibliografia sobre a materialidade do livro, o que depois se tornou seu objeto de pesquisa no mestrado em Literatura Infanto-Juvenil da UnB.

Visitar o livro

A professora do ensino fundamental Ana Carolina Freitas ficou impressionada com o projeto e o divulgou no trabalho, uma escola particular na Asa Sul. Em 2017, várias turmas propuseram uma atividade extraclasse em que os responsáveis levassem as crianças para visitar o livro O Menino Invisível, com o registro de fotos e um depoimento. As famílias ficaram encantadas, conta Ana Carolina.

O livro no muro atendia a vários requisitos do processo de alfabetização e letramento pelo qual passavam as crianças e, desde então, é apresentado às novas turmas.

“A gente trabalha de forma interdisciplinar. A literatura foi o primeiro ponto, mas toda a parte de produção artística fazia sentido. Tem a questão social também. E vem o estímulo à leitura e à escrita”, diz a professora, que ainda convidou o autor para falar sobre a produção em um encontro literário na escola.

Publicidade

O projeto Livro de Rua conseguiu financiamento por editais de cultura do Distrito Federal. Foto: Wilton Junior/Estadão

Os benefícios para as crianças, no entanto, não excluem os adultos. “Os relatos mais emocionantes que eu recebo geralmente são de adultos falando deles mesmos, e não dos filhos”, diz Barros.

Embora “livro infantil” seja um conceito mais fácil no mercado editorial, o escritor prefere a definição “livro que é também para criança” para obras ilustradas que não sejam impróprias para menores, porque há muitas complexas ou só para adultos.

“No conceito de livro ilustrado, o texto sozinho diz uma coisa, a ilustração sozinha diz outra. E a mensagem que interessa é a produzida pela intersecção dessas coisas e de outras, como a plataforma em que o livro foi impresso.”

Depois de apresentar o projeto na Bienal Internacional do Livro de São Paulo em 2018, Barros conseguiu publicar O Menino Invisível no formato tradicional, em papel. Mas os planos para transformar a cidade em uma biblioteca continuam, diz ele, e para além do Distrito Federal.

Todas as histórias grafitadas têm ISBN, código internacional de identificação de livros, mas não foi simples consegui-lo. Foto: Wilton Junior/Estadão
Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.