Estupro contra crianças e adolescentes cresce entre os mais novos, mostra pesquisa

Registros desse tipo de crime aumentaram 23,5% entre vítimas de 0 e 4 anos

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Foto do author Giovanna Castro
Atualização:

O estupro contra crianças e adolescentes aumentou no Brasil em 2023, especialmente nas faixas etárias mais jovens. De acordo com a pesquisa “Panorama da Violência Letal e Sexual Contra Crianças e Adolescentes no Brasil”, divulgada nesta terça-feira, 13, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), os registros desse tipo de crime aumentaram 23,5% entre vítimas de 0 a 4 anos e 17,3% entre as de 5 a 9 anos.

  • Entre as vítimas de 10 a 14 anos, o aumento foi de 11,4% em relação a 2022;
  • Dos 15 a 19 anos, os casos cresceram 8,4%. Ou seja, houve aumento de estupros contra todas as faixas etárias consideradas pela pesquisa;
  • Na maioria dos casos, entre todas as faixas etárias até os 19 anos, o estupro acontece dentro da casa da criança ou adolescente.

O estudo compara dados de 2021 a 2023 e mostra que ocorreu crescimento ano a ano desse tipo de crime. Foram 164.199 estupros com vítimas de até 19 anos no País nos últimos três anos e um salto de 46.863 casos em 2021, para 63.430 em 2023.

Maioria de casos de violência sexual contra crianças e adolescentes acontece entre os 10 e 14 anos. Casos entre 0 e 4 anos, no entanto, são os que mais cresceram no último ano. Foto: AungMyo/Adobe Stock

Já as mortes violentas passaram de 4.803 em 2021, para 5.354 em 2022 e 4.944 em 2023, totalizando 15.101 nos três anos. Confira alguns destaques:

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  • Até os 9 anos de idade, meninas e meninos têm taxa de mortalidade violenta similar. A partir dos 10 anos, meninos superam 71% dos casos;
  • Em todas as faixas etárias, o risco de morte é maior para negros e pardos;
  • Arma de fogo é utilizada em 27% dos casos de morte de criança até 4 anos e 86% entre 15 e 19.

Meninas de 10 a 14 anos são as que mais sofrem estupros

A maioria dos crimes de estupro acontece contra garotas (87,3% do total de casos registrados), crianças de 10 e 14 anos (48,3%) e/ou identificados como negros (52,8%) – sobre esta última característica, por haver diferença pequena, a pesquisa considera que há proporcionalidade racial. A maior parte dos casos de estupros de meninos ocorre dos 0 aos 4 anos.

O gênero é o principal fator de risco de estupro: considerando os três últimos anos, a taxa de estupros por 100 mil habitantes, são 131 meninas de até 19 anos, ante 19,9 meninos. Isso significa que uma menina de até 19 anos tem sete vezes mais chance de ser vítima de estupro do que um menino da mesma faixa etária.

Foram considerados os dados de boletins de ocorrência das 27 unidades da federação, abrangendo toda a extensão territorial brasileira. O Estado de Goiás não forneceu a idade das vítimas fatais de violência policial.

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‘Números alarmantes’

O documento produzido pelo Unicef e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública sobre a pesquisa diz que “mesmo considerando apenas a quantidade de fatos registrados, a violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil já ostenta números alarmantes”.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que apenas 8,5% dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes são reportados às autoridades policiais, ou seja, o número real de ocorrências tende a ser muito maior.

“Quando estamos tratando de violência sexual, estamos necessariamente falando de uma violência contra crianças que muitas vezes sequer possuem a capacidade de compreender o ato violento que está sendo cometido, o que impõe muitas barreiras à proteção das vítimas e responsabilização dos agressores”, afirma o Unicef e o Fórum de Segurança.

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O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024 já havia mostrado que a violência sexual representa metade das agressões a meninas de 10 a 14 anos e familiares, como avôs, padrastos, tios e outras pessoas do relacionamento das crianças, majoritariamente do sexo masculino, são os principais agressores.

Conforme os dados, até os 9 anos, entre 84% e 86% dos crimes, o autor é conhecido da vítima. Considerando meninas entre 15 e 19 anos, os casos de autores conhecidos ficam em torno de 78%. Na maioria dos casos, em todas as faixas etárias, o crime acontece dentro da casa onde a criança mora.

Meninos negros morrem mais

Em mortes violentas de crianças e adolescentes – considerando homicídio doloso, feminicídio, latrocínio, lesão seguida de morte e Mortes Decorrente de Intervenção Policial (MDIP) –, a pesquisa mostrou que, em 2023, para cada 100 mil habitantes no País entre 0 e 19 anos, são assassinados 18,2 do sexo masculino e de cor negra. Já a taxa de mortalidade para o mesmo grupo entre brancos é de 4,1 por 100 mil.

“O risco relativo de um adolescente negro, do sexo masculino, ser assassinado no Brasil é 4,4 vezes superior ao de um adolescente branco”, destaca o relatório. Para meninas da mesma faixa etária e brancas, 0,9 são vítimas letais em cada grupo de 100 mil. “Isso significa dizer que um menino negro tem 21 vezes mais chance de ser vítima de um homicídio do que uma menina branca.”

Os 15 aos 19 anos também representam maior risco, com 91,6% dos casos nesta faixa etária. Mas houve crescimento nos assassinatos de crianças, especialmente na faixa etária de 5 a 9 anos, com alta de 49%, passando de 49 vítimas em 2021 para 73 em 2023. De 0 a 4 anos, houve aumento de 20,4% no período, passando de 103 para 124 vítimas.

“As violências impactam gravemente as crianças e os adolescentes no País. Meninos negros continuam a ser as maiores vítimas de mortes violentas. Já meninas seguem sendo as mais vulneráveis à violência sexual. E essas dinâmicas são ainda mais preocupantes com o aumento de casos dessas violências contra crianças mais novas”, diz Youssouf Abdel-Jelil, representante do Unicef no Brasil.

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Meninos negros são os que mais morrem de forma violenta, especialmente na adolescência. Foto: Diversity Studio/Adobe Stock

Algumas características na taxa de morte violenta se repetem em relação aos estupros. “Diferentemente do que ocorre entre os adolescentes, entre crianças a maioria das mortes ocorre na residência e são de autoria de conhecidos, o que nos permite inferir que frequentemente decorrem de maus-tratos que se passam no ambiente intrafamiliar”, aponta o relatório.

Quanto mais velha a criança ou o adolescente, maior é a chance de a morte ter sido provocada por arma de fogo – consta em 27% dos casos de morte de criança até 4 anos e em 86% entre 15 e 19. E dentre as 15.101 mortes violentas intencionais registradas em três anos, 2.427 foram provocadas por ação de forças estatais de segurança (16% do total) – é a segunda causa de mortes violentas de adolescentes (15 a 19 anos).

A título de comparação, a taxa de letalidade provocada pelas polícias entre habitantes com idade superior a 19 anos no Brasil é de 2,8 mortes por 100 mil. Já no grupo etário de 15 a 19 anos, a taxa é de 6 mortes por 100 mil habitantes (113,9% superior à taxa verificada entre adultos).

Em São Paulo, depois de queda de 18% nas mortes de crianças e adolescentes de 10 a 19 anos por intervenções policiais de 2021 para 2022, houve aumento de 26% de 2022 para 2023. A proporção de mortes provocadas por policiais em relação ao total de mortes violentas, foi de 29,5% em 2023.

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“Essa taxa, a partir de 10%, já indica que pode estar havendo força policial excessiva”, diz Samira Bueno, Diretora Executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, afirma que é o Estado que apresentou a menor taxa de Mortes Violentas Intencionais (MVI) de pessoas entre 0 a 19 anos, no ano passado. Quanto à proporção de mortes decorrentes de intervenções policiais em relação ao total de MVI, a pasta alega que São Paulo apresentou relevante recuo em 2023, em comparação ao último relatório divulgado, que traz dados de 2016 a 2020. O porcentual passou de 44,4% para 29,5%.

“Cabe destacar que todos os casos de MDIP (Mortes em Decorrência de Intervenção Policial) que ocorrem em São Paulo são rigorosamente investigados pelas polícias Civil e Militar, com acompanhamento das respectivas corregedorias, Ministério Público e Poder Judiciário. Para reduzir a letalidade, a SSP-SP investe continuamente na capacitação do efetivo, aquisição de equipamentos de menor potencial ofensivo e em políticas públicas. Além disso, os cursos ao efetivo são constantemente aprimorados e comissões direcionadas à análise dos procedimentos revisam e aprimoram os treinamentos, bem como as estruturas investigativas”, diz nota da SSP.