Exército sabia da rivalidade entre morros do Rio, diz relatório

Documento estudava possível tomada da Providência por traficantes do Complexo São Carlos desde novembro

PUBLICIDADE

Desde novembro - antes, portanto, de ser deflagrada a Operação Cimento Social no Morro da Providência, no centro do Rio - o Exército sabia da rivalidade entre os traficantes daquela comunidade (do Comando Vermelho) e os do Morro da Mineira, no Rio Comprido, para aonde os três jovens presos no sábado foram levados e acabaram sendo executados. A Mineira é uma da favelas que compõem o Complexo de São Carlos onde domina a facção Amigos dos Amigos (ADA). Veja também: Justiça determina a saída do Exército do Morro da Providência Câmara quer que Jobim explique morte de jovens Lula defende reparação para família das vítimas Defesa quer novo depoimento de sargento acusado Militares culpam tenente por mortes no Rio Opine: o Exército pode cuidar da segurança pública?  No Relatório de Inteligência preparado em novembro pela 9ª Brigada de Infantaria Motorizada - responsável pela segurança do projeto - já se falava da "suspeita de uma possível tentativa de tomada da comunidade pelos traficantes do Complexo de São Carlos (ADA)". Apesar de o relatório dizer que não havia nada de concreto, os militares da inteligência levantavam a possibilidade desta tomada ser feita de forma indireta, com a ajuda de policiais militares. O relato fala que traficantes do Complexo de São Carlos estariam oferecendo um montante considerável para corromper policiais militares. O interesse era de reforçar a repressão ao tráfico de drogas no morro da Providência de forma a "enfraquecer o tráfico local, abrindo caminho para a tomada da comunidade pelos integrantes da ADA", como descreve o relatório. Em 2006, segundo ainda o relatório, o traficante Pablo Pierre Mendes de Andrade foi morto a mando do chefe do tráfico da Providência, Evanilson Marques da Silva, o "Dão" - que já estava preso - por tentar um golpe para deixar o Comando Vermelho e aliar-se à ADA. Pelo levantamento, o tráfico na Providência contaria com um contingente entre 80 e 100 homens, entre eles um cabo, um soldado (ambos desertores) e um ex-soldado do Exército. A quadrilha disporia de 20 fuzis, uma metralhadora ponto 30 e dois lança-rojões. O faturamento mensal com a venda de drogas principalmente para freqüentadores do terminal de ônibus Américo Fontenelle e da estação ferroviária Central do Brasil, foi estimado em R$ 180 mil com a venda de 10 quilos de cocaína - a R$ 6 mil o quilo - e 40 quilos de maconha - a R$ 3 mil o quilo. Além de relatório de inteligência, o Exército preparou relatório que recomendava uma Ação Cívico Social (Aciso), para levar aos moradores da comunidade atendimento médico e dentário. Ela ocorreu nos dias 18 e 19 de fevereiro, mas o Comando Militar do Leste (CML) não respondeu ao pedido de informações sobre o número de atendimentos realizados. Havia ainda, nos preparativos da Operação Cimento Social, a preocupação de os militares realizarem Operações Psicológicas com o objetivo "de manter a credibilidade do Exército, ressaltar o profissionalismo de seus recursos humanos, ressaltar a excelência do preparo da tropa, ressaltar o Exército como o cimento capaz de restaurar fissuras do tecido social da cidade do Rio de Janeiro, demonstrar a eficiência, a eficácia e a efetividade pela divulgação dos resultados obtidos e orientar a opinião pública de forma favorável a atuação do Exército". Ontem, o CML não respondeu se elas foram realizadas, mas a ocorrência com os três jovens certamente colocou tudo por água abaixo.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.