Os crimes contra o patrimônio, como roubos de veículos, caíram no ano passado, mas um deles não para de crescer: o estelionato, especialmente aquele praticado por meio virtual. Entre os motivos para a alta, está a popularização do Pix, ferramenta do Banco Central que permite transações financeiras gratuitas, e outros aplicativos bancários.
O total de estelionatos cresceu 8,2% no País no ano passado ante 2022, segundo o Anuário da Segurança Pública, elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e divulgado nesta quinta-feira, 18. Foram quase dois milhões de pessoas vítimas de algum tipo de golpe. O Ministério da Justiça e Segurança Pública diz que que trabalha para aumentar a capacidade de investigação (leia mais abaixo).
Os pesquisadores do Fórum ponderam que o aumento porcentual, sobretudo na modalidade online, tem como um dos motivos uma alteração no Código Penal, que tipificou o crime de fraude eletrônica em 2021.
“Registros que antes eram classificados em outras naturezas delituosas passaram a ganhar uma categoria própria, trazendo à tona um fato que antes estava invisibilizado, não obstante causar danos significativos para a sociedade brasileira”, diz trecho do relatório.
Ainda assim, muitos Estados ainda não fazem distinção entre o golpe “comum” e o virtual. É o caso de São Paulo, que dessa forma registrou o maior aumento do crime de estelionato entre todas as unidades da federação, com crescimento de 22,7%.
O porcentual é quase três vezes maior que o aumento registrado no Brasil. O Amapá, por sua vez, viu esse tipo de crime reduzir 16,8% entre 2022 e 2023, a queda mais acentuada do País.
Os estelionatos virtuais estão intimamente ligados ao roubo e ao furto de celulares. No ano passado, quase um milhão de aparelhos foram subtraídos no País. Segundo Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os bandidos preferem roubar Iphones, que em geral pertencem a pessoas com mais poder aquisitivo - o que pode render mais ganhos com a aplicação de golpes.
“O crescimento dos estelionatos acontece no mundo todo, não é uma realidade só do Brasil”, diz Lima. “O poder público precisa melhorar as investigações, focar mais em receptação, por exemplo, mas é preciso também engajar o setor privado para fazer com que esse novo universo, o cibernético, não seja também um universo sem nenhuma proteção.”
Conforme mostrou o Estadão, os valores financeiros devolvidos por suspeita de fraude no 1º semestre deste ano não chegam a 10% do valor total solicitado. Dos R$ 2,89 bilhões requisitados, apenas R$ 243,3 milhões foram efetivamente devolvidos, segundo dados do Banco Central.
Nos últimos meses, também tem chamado a atenção a proliferação de golpes como o do Jogo do Tigrinho, em que criminosos se aproveitam do vício crescentes nesses games virtuais para tirar dinheiro de internautas. Em São Paulo, mais de 500 boletins de ocorrência (BOs) já foram registrados para investigar casos desse tipo.
Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública informou que “trabalha pela articulação da rede de DHPPs (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa), para aumentar a capacidade de investigação de homicídios pelas unidades especializadas, com vistas ao aumento da taxa de esclarecimento dos crimes em âmbito nacional.”
Ainda de acordo com a pasta, a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) tem reforçado parcerias com os Estados e o Distrito Federal em ações de inteligência e atuado de forma integrada com as polícias Civil, Militar, Federal, Rodoviária Federal e Científica, e em conjunto com os Ministérios Públicos estaduais e Federal no combate ao crime organizado.
“Nesse sentido, (o ministro Ricardo) Lewandowski defende a constitucionalização do Sistema Único de Segurança Pública (Susp) para que a União tenha mais poderes de fazer um planejamento nacional de caráter compulsório para os outros órgãos de segurança, sem prejuízo da competência dos Estados e do Distrito Federal de legislarem sobre o tema. O que se pretende é dar competência à União para elaborar um plano nacional de segurança pública e também um plano acerca do sistema prisional. Hoje, não existem instrumentos legais para fazer isso de forma vinculante aos demais entes federados.”
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.