MANAUS E BRASÍLIA - Cinquenta e seis presos foram mortos, decapitados, esquartejados e carbonizados após uma guerra entre facções criminosas no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus. A ação do grupo Família do Norte (FDN), ligado ao Comando Vermelho (CV), do Rio, contra membros do Primeiro Comando da Capital (PCC), com liderança em São Paulo, começou na tarde de domingo (1) e durou 15 horas. Treze funcionários e 70 detentos foram feitos reféns e depois liberados, parte com ferimentos. É a maior matança em prisões do País, após o Massacre do Carandiru, que deixou 111 mortos em 1992.
Após a rebelião, 184 presos fugiram, sendo 112 do Compaj e 72 do Instituto Penal Antonio Trindade (Ipat), complexo que fica ao lado – apenas 40 foram recapturados. A polícia ainda busca 144 foragidos.
O governo do Amazonas não pediu reforço da Força Nacional de Segurança. "Não há necessidade da Força Nacional. Não há uma situação de insegurança pública. Houve uma situação dura, muitas mortes dentro do presídio, mas não extrapolou para fora", disse o ministro da Justiça Alexandre de Moraes durante entrevista coletiva, em Manaus. O ministro prometeu transferir os líderes do massacre para presídios federais.
Situação carcerária. “Quando cheguei, já estavam todos mortos. Eles mesmos tiraram os corpos de dentro da penitenciária, antes de entregar os reféns. Tinha um contêiner cheio de braços e pernas. Um horror”, afirmou o juiz da Vara de Execução Penal do Estado, Luís Carlos Valois. Os mortos estavam no “seguro”, ala destinada aos ameaçados de morte. O Compaj mantinha 1.229 internos, mas tem capacidade para 454. “Tinha cela para cinco pessoas com mais de 30”, disse.
A Polícia Federal monitora a FDN desde 2015, na Operação La Muralla. Segundo investigadores ouvidos pelo Estado, o massacre tem relação com a saída de vários líderes da FDN do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). Cerca de 17 líderes da facção, entre eles José Roberto Barbosa e Alan Castimário, haviam sido encaminhados para presídios federais e outros, como Márcio Ramagem, conhecido como Garrote, para o RDD. De acordo com um investigador, as lideranças começaram a sair do RDD e passaram a organizar a retaliação aos detentos de outras facções.
O secretário de Segurança do Amazonas, Sérgio Fontes, atribuiu a disputa das facções ao narcotráfico. “Esse é mais um capítulo da guerra silenciosa que o narcotráfico jogou esse País. Nós sempre soubemos que o Brasil está numa guerra impiedosa. Vivenciamos ontem mais um capítulo”, disse.
Segundo o analista criminal e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Guaracy Mingardi, a guerra entre facções dentro dos presídios “tem raízes bem antigas no sistema prisional brasileiro” e é consequência da omissão do Estado. “Não começou com o PCC. O Estado se limita a cercar e manter os presos lá dentro, mas não tem controle nenhum interno.”
Ele acredita que a matança em Manaus seja resultado do acirramento de uma disputa territorial entre o PCC e o CV. “O PCC se espalhou pelo País como estratégia de poder, mas encontrou resistência em alguns Estados, onde as facções regionais são aliadas do CV. Essa disputa se acirrou há dois meses.”
Especialista em segurança e professor da PUC Minas, Luiz Flávio Sapori afirma que os crimes no Amazonas são um problema de segurança pública nacional. “É a confirmação de que o sistema prisional permanece fora da agenda política.”
O presidente Michel Temer não se manifestou.
Mais mortes. Também na segunda (2), quatro foram mortos na Unidade Prisional da Puraquequara. À tarde, presos do Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM) tentaram fugir. / COLABORAROU FABIO LEITE
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