A construção de uma hidrelétrica no rio Xingu cobrirá de água a casa de 16 mil pessoas, secará rios e incentivará os desmatamento na região, afirmaram ativistas e índios na quarta-feira em meio a um aumento da preocupação com a destruição da Amazônia. A renúncia, na semana passada, de Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente alimentou boatos de que o governo brasileiro acelerará a construção de estradas, oleodutos e usinas de energia na região a fim de dar sustentação a uma economia em rápida expansão. A ex-ministra era vista como uma guardiã da floresta. A represa de Belo Monte, projeto a cargo por enquanto da Eletrobrás, seria uma das maiores usinas hidrelétricas do mundo, ficando atrás apenas da de Três Gargantas, na China, e da de Itaipu, dividida entre Brasil e Paraguai. Mais de mil ambientalistas e indígenas reuniram-se nesta semana, na cidade de Altamira, norte do Pará, para protestar contra a represa e discutir alternativas. O engenheiro da Eletrobrás, Paulo Fernando Rezende, foi ferido e ficou hospitalizado durante um breve período, na terca-feira, depois de um ataque de índios caiapó armados com bordunas e facões. Depois de uma apresentação entusiasmada de Rezende, os índios reagiram iniciando uma dança de guerra. Em nota, a estatal se disse "indignada" com o incidente e afirma que "tomará todas as providências necessárias para que os responsáveis pela agressão sejam punidos". Diretores da Eletrobrás disseram na quarta-feira que os protestos não vai atrapalhar Belo Monte. Para sexta-feira os índios e ambientalistas planejam uma manifestação em Altamira. Em 1989, um protesto dos índios obrigou ao abandono de um projeto para a construção de uma represa semelhante. Naquela época, as imagens de uma índia caiapó encostando a lâmina de seu facão no rosto do hoje presidente da Eletrobrás ganhou grande destaque nos meios de comunicação brasileiros e estrangeiros. A represa de Belo Monte abarcaria cerca de 440 quilômetros quadrados e desviaria parte do rio Xingu, que corre para o norte em direção ao Amazonas. Os moradores da região temem que sua fonte de peixes e água fique prejudicada e dizem que essa obra e a abertura de novas estradas atrairão mais colonos e agricultores para a região, acelerando o desmatamento. "Estradas, prédios, empresas de serviços --como todos os grandes projetos da Amazônia, a represa trará mais destruição e poucos benefícios para os moradores locais", afirmou Ana Paula Santos Sousa, da Fundação Viver, Produzir e Preservar. "INEFICIENTE" As últimas grandes represas construídas na Amazônia, nos anos 70 --as de Tucuruvi e de Balbina--, provocaram falta de alimentos e a morte de rios, expulsando milhares de pessoas de suas casas, afirmou o grupo ambientalista ISA. Pessoas contrárias ao projeto afirmam que o governo ignora as questões ambientais envolvidas. Marina Silva viu-se cada vez mais isolada dentro do governo devido a sua oposição aos grandes projetos de infra-estrutura na região. "Esse governo vê no licenciamento ambiental um mero processo burocrático. Na verdade, eles não se importam com o que mostram os estudos de impacto ambiental", afirmou por telefone, à Reuters, Marco Antonio Delfino, promotor público em Altamira. Na semana passada, um juiz suspendeu temporariamente os preparativos para a licitação do projeto, prevista para 2009, citando irregularidades no licenciamento ambiental, disse Delfino. O governo afirma que, com a economia do Brasil crescendo a uma taxa de 5 por cento ao ano, a construção de usinas hidrelétricas em alguns dos muitos rios da vasta região amazônica é necessária para garantir o suprimento de energia durante a próxima década. "O Brasil precisa de energia limpa com o menor custo possível para a sociedade", disse a Eletrobrás em um comunicado. Belo Monte representaria a melhor opção porque a grande quantidade de energia a ser produzida ali poderá ser facilmente integrada na rede nacional de distribuição, afirmou. Na segunda-feira, um consórcio liderado pela empresa francesa Suez venceu a licitação para construir uma de duas usinas hidrelétricas previstas para o rio Madeira, na Amazônia, e que juntas foram orçadas em mais de 12,7 bilhões de dólares. A construção da Belo Monte levaria cinco anos e a usina geraria mais de 6 por cento da demanda brasileira por energia. Devido à sazonalidade das chuvas, a usina produzirá menos de 10 por cento de sua capacidade de 11.181 megawatts durante quase metade do ano, mostram estudos preliminares da Eletrobrás. "Essa será a represa mais ineficiente do mundo", afirmou Glenn Switkes, diretor do grupo International Rivers.
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