Metrô Santana: veja como foi o primeiro dia da estação em 1975

Reportagens do Jornal da Tarde contaram como foi a inauguração completa da linha Norte-Sul do metrô paulistano

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Foto do author Edmundo Leite
Atualização:

Um marco no sistema de transportes de São Paulo. Em 26 de setembro de 1975, um ano após a primeira viagem do metrô para o público, o sistema de transportes chegava ao bairro de Santana, na zona norte da cidade. Até aquele dia, a linha Norte-Sul ainda não estava completa e os trens que saíam do terminal Jabaquara só chegavam até a estação Liberdade, no centro.

O Jornal da Tarde acompanhou a novidade nos dias anteriores, no dia da inauguração e nos dias seguintes. Veja alguma das páginas e leia a reportagem de Olga Vazone sobre o primeiro dia em que o Metrô chegou à estação Santana.

Jornal da Tarde - 27 de setembro de 1975

Página do Jornal da Tarde sobre a chegado do Metrô a Santana em 1975. Foto: Acervo Estadão

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Primeiro dia: três vezes mais passageiros

No final da tarde, havia grandes filas, os trens chegavam saíam e chegavam lotados: ontem, no primeiro dia de toda a lina Norte-Sul do metrô, o movimento foi três vezes maior do que antes, quando só o trecho entre Jabaquara e Liberdade funcionava. No final da noite, depois que os números de cada estação foram somados, os técnicos anunciaram: 155.277 pessoas haviam viajado de metrô ontem, das seis da manhã até as 20h30. (Antes, a média de passageiros transportados era por dia era de 50 mil.

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A estação mais movimentada foi a de São Bento, a mais central de todas: por ela passaram 32.474 passageiros. Santana, que pela primeira vez recebeu os trens em operação comercial, foi a segunda mais movimentada: 23.854 passageiros.

O metrô foi muito elogiado pelas pessoas que o usaram, ontem, por causa da pontualidade e da rapidez dos trens. Mas houve queixas, principalmente contra a falta de informações sobre as linhas de ônibis da CMTC que fazem a integração com o metrô.

Jornal da Tarde - 27 de setembro de 1975

Página do Jornal da Tarde sobre a chegado do Metrô a Santana em 1975. Foto: Acervo Estadão

Filas, esbarrões: o metrô chega à confusão de fim de tarde

Reportagem de Olga Vazone

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Uma multidão invadiu a estação do metrô no Largo São Bento. São 17h55 do primeiro dia de funcionamento da linha Norte-Sul. Filas imensas formam-se em frente às bilheterias, nas passagens pelos bloqueios. E, nas plataformas, assim que um trem pára, homens, mulheres e crianças entram apressadamente pelas portas dos carros, dando encontrões com os passageiros que descem. Não se importam em ter de viajar de pé e meio espremidos, dentro dos carros superlotados.

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A estação do Largo São Bento está repleta. As pessoas sobem e descem pelas escadas rolantes e andam, sempre depressa, pela estação, à procura das saídas, dos acessos para as plataformas de embarque. Param, a cada momento, para se informar: querem saber como apanhar o trem para Santana ou para o Jabaquara, como chegar no Largo São Bento ou na avenida Prestes Maia. Na entrada dos bloqueios, um grande número de funcionárias do metrô (que chegaram à estação junto com o presidente da Companhia, Plínio Asmann, por volta das 17h40), satisfaz a todas as perguntas, orienta o público.

Um público um pouco diferente daquele que durante toda a tarde andou de metrô, de Santana ao Jabaquara ou vice-versa. São office-boys voltando do serviço para casa, homens de negócio com suas pastas executivas nas mãos; mães que foram buscar os filhos na escola ou compras no centro da cidade. Gente que usa o metrô para ir trabalhar, estudar ou fazer compras. Mas ainda existem os que foram apenas passear de metrô, conhecé-lo pela primeira vez.

Os funcionários do metrô repetem, centenas de vezes, as mesmas explicações para esses “passageiros de primeira viagem”. Gente que não sabe como colocar os bilhetes nos bloqueios, quando passar por eles, e não entende por que seus bilhetes ficam retidos, enquanto os de outras pessoas são devolvidos:

— O senhor comprou um bilhete simples. Não é o da integração. Só esse é que é devolvido depois da passagem pelo bloqueio.

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Plínio Asmann observa o grande movimento no acesso Anhangabaú — avenida Prestes Maia. As duas filas de pessoas para comprar bilhetes, quase chegam até a calçada da avenida. Parece assombrado com o número de pessoas. Durante a tarde ele informava, na sede da Companhia que 90 mil pessoas tinham utilizado o metró até às 15 horas. Na mesma hora, um dos funcionários da Estação São Bento dizia que só ali já tinham sido vendidos 14 mil bilhetes.

No acesso do Largo São Bento, uma mulher manobrava um grande rodinho para empurrar a água que ameaçava invadir a parte coberta do mezaninno. Nas quatro bilheterias ali existentes, as filas eram um pouco menores. Mas o chão estava muito molhado, com algumas poças de água que obrigavam as pessoas a formar filas irregulares, passando pelos lugares mais secos.

Ali, também, ouviam-se as mesmas perguntas a respeito dos locais de acesso às plataformas de embarque. Os trens, de sete em sete minutos, chegavam às plataformas já quase lotados. E saiam superlotados, sempre com gente meio espremida nos vagões. Bruno Spingola, um senhor de terno escuro e guarda-chuva na mão, saiu correndo do bloqueio, em direção à plataforma, assim que viu o trem parado. E justificava tanta pressa:

- Pego esse mesmo, apesar. de lotado. Quero ver a novela das 19 horas, na tevê de minha casa.

Até as 19 horas, as plataformas da estação permaneciam cheias. Centenas de pessoas aguardavam a chegada dos trens. Assim que um partia, a plataforma parecia ficar vazia por segundos. Em seguida, outra centena de homens e mulheres consultavam os seus relógios, à espera do próximo trem. Olhar relógios foi a principal diversão dos passageiros na parte da tarde de ontem, na Estação São Bento. Nas plataformas ou dentro dos trens, eles cronometravam o tempo que gastava para chegar à estação. E, dali, até o local onde queriam descer.

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Ernesto Mendes de Almeida, 68 anos, aposentado, ficou durante uma hora na estação de Santana cronometrando a pontualidade dos trens, E dizia, com orgulho:

- Sete minutos. Sem falha. Isso aqui é uma beleza. Como um relógio.

De Santana até a estação São Bento, os trensa demoravam ontem à tarde de 12 a 15 minutos. Horário cronometrado por Ernesto Mendes, por donas de casa, meninos e meninas. Dentro dos trens, os relógios eram acertados, minutos ou segundos de atraso eram discutidos e rediscutidos.

Nas estações, as preocupações eram outras. Os poucos funcionários distribuidos pelas estações de maior movimento - São Bento e Santana - redobravamos esforços para atender um público classificado por eles como “nunca visto antes”.

Às 15 horas, o agente de operações Guerrero era o único informante disponível para ensinar a centenas de pessoas como atravessar os bloqueios; a receber reclamações. Quando podia, solicitava para que os curiosos se afastassem da passagem dos bloqueios de entrada e saída. Os curiosos, na maior parte rapazes e velhos, formavam uma verdadeira cerca em volta dos bloqueios no acesso Anhangabaú. E não se cansavam: olhavam, comentavam, e se aproximavam um pouco mais, a cada distraída de Guerrero. E o agente reagia:

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- Por favor, minha gente, vamos saindo daqui. Vocês atrapalham a passagem. Só deve ficar quem for pegar o trem, por favor... É assim minha senhora, coloca o bilhete aqui (...) Não moço, primeiro põe o bilhete, depois passe pelo bloqueio (...) Vamos apostar, por favor...

Daniel Bispo da Silva, feirante, aproveitou a folga de ontem para conhecer o metrô. Comprou o bilhete, colocou na entrada certa do bloqueio, mas demorou para passar por ele. Quando tentou, a passagem estava trancado. Gritou, mostrou o troco dos Cr$ 10,00 que tinha usado para comprar o bilhete, xingou o bloqueio de “bichinho endemoniado’ , até que conseguiu convencer um funcionário do metrô a ouvi-lo ir com ele até a bilheteria. Provou que estava certo, e depois passou pelo bloqueio com um bilhete fornecido de graça pelo funcionário.

- Isso acontece de monte aqui - comentou Guerrero - Os piores são aqueles que compram bilhetes simples e ficam brigando conosco porque o bloqueio reteve o ticket errado e eles tem de comprar outro para pagar o ônibus da integração. Eu vim da Estação Vergueiro e nunca notei tanto movimento como hoje. Parece que o pessoal de toda São Paulo está chegando: gente que nunca ouviu falar em metrô e por isso erra tanto.

“Por que não vendem só bilhetes de integração”, reclamava uma mulher loira. “Assim evitariam tanta confusão”.

Na Estação São Bento, à tarde quatro escadas rolantes estavam paradas. Numa delas, uma equipe de manutenção do metrô troca uma bobina e Elcio Alcântara, supervisor de escadas rolantes, explicava que apenas uma delas não seria consertada ontem mesmo:

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— Há dois dias estamos trabalhando sem parar. Meus homens nem conseguiram mais abrir direito os olhos. Essas escadas, por causa da pressa, não foram testadas pela minha equipe. A que ficou mais avariada é a que usa para subir ou descer para o acesso do Anhangabaú. Estamos esperando a turma da Villares para vir consertá-la. Não podemos fazer esse serviço porque antes do nosso teste oficial a escada ainda não pertence ao metrô: tem de ser reparada pelos seus fabricantes.

O supervisor do período da manhã, José Américo Neto, dizia que a estação estava servida por quatro agentes de operação e nove bilheteiros, além de mais ou menos 15 faxineiros.

— E é pouca gente. Mas estamos funcionando bem. Não tivemos nenhum problema até agora. A todo momento, pelo sistema de som, um dos agentes de operação pedia às pessoas que não fumassem. Mas muitos desobedeciam ao aviso. Na plataforma, com grandes vassouras, as limpadoras varriam, para as suas pás de lixo, centenas de pontas de cigarro.

Alguns dos bloqueios das estações São Bento e Santana chegaram a apresentar defeitos durante alguns minutos. Mas foram defeitos pequenos, explicaram os agentes de operações:

— O bloqueio trancava, isso é, não recebia bilhete. Aí, a gente abria e consertava o defeito, em poucos segundos. O público, porém, nem chegou a notar essa falta de bloqueios durante a tarde: assim que entravam nas estações, as pessoas se ordenavam nas filas já existentes, na frente de bloqueios. E não adiantava pedir para usarem outros, sem filas:

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— Eles querem é aprender como é que o sujeito da frente faz ao passar por eles, para poderem fazer a mesma coisa, Por isso, não usam os bloqueios vazios.

As pessoas reclamavam, não das filas, mas das goteiras. Goteiras perto da plataforma de embarque na estação São Bento, Carandiru e Tietê. Reclamavam dos relógios que não estavam funcionando em nenhuma delas — a não ser na de Santana. E ficaram irritadas com o péssimo funcionamento da integração metrô-ônibus, em Santana.

Lá, saindo da estação, entre a rua e a chuva que caía, havia opções: à esquerda, um abrigo cor de laranja, com um poste onde se lia “integração metrô”. À direita, dois postes com a mesma legenda: um sob a marquise da estação, outro embaixo da chuva, sem abrigo.

A entrada dessa estação transformou-se, no fim da tarde, numa verdadeira pista de corridas: desorientados e molhados, os passageiros das linhas de integração corriam de um poste ao outro, à procura do seu ônibus.

Depois de 10 minutos de observação, Sílvio Correa descobriu que os ônibus que iam para Santa Teresinha e Tucuruvi paravam à esquerda, perto do abrigo cor de laranja. E os que iam para a Casa Verde e Mandaqui, nos postes da direita. E, então, desabafou:

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— E um absurdo: são duas linhas, 950 e 952, e quatro ônibus para lugares diferentes. Porque não colocaram quatro números. Somos obrigados a andar na chuva para ler o que está escrito no centro do poste. E muita gente não entende, porque realmente a explicação no poste está confusa.

Molhadas, cansadas de correr de um ponto de ônibus para o outro, queixando-se da falta de abrigo na parada de ônibus para a Casa Verde, muitas pessoas preferiram tomar outro ônibus, tipo comum, para ir embora.

Às 18 horas, hora do “pico” na Estação São Bento, o locutor responsável pelo som mudava as mensagens de “subam e visitem a estação São Bento, com seus sinos e relógios típicos, subam e conheçam o que é o metrô, renovando a paisagem com sua praça para pedestres”.

Passou a pedir para que as filas se distribuíssem melhor: afinal, existiam outras bilheterias, além da que dava acesso ao Anhangabaú. E repetia, muitas, vezes para que ninguém fumasse na estação — no que nem sempre era obedecido.

Jornal da Tarde - 26 de setembro de 1975

Página do Jornal da Tarde sobre a chegado do Metrô a Santana em 1975. Foto: Acervo Estadão

Jornal da Tarde - 27 de setembro de 1975

Página do Jornal da Tarde sobre a chegado do Metrô a Santana em 1975. Foto: Acervo Estadão

Jornal da Tarde - 26 de setembro de 1975

Página do Jornal da Tarde sobre a chegado do Metrô a Santana em 1975. Foto: Acervo Estadão

Jornal da Tarde

Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira. Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo. Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.

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