A vitoriosa trajetória do judô brasileiro nas Olimpíadas começou com uma medalha de bronze de Chiaki Ishii nos Jogos Olímpicos de Munique em 1972, mas o primeiro lugar no pódio só aconteceria pela primeira vez com Aurélio Miguel, na Olimpíada de Seul em 1988.
O feito da inédita medalha de ouro foi o destaque na capa de 1 de outubro do Jornal da Tarde: “Ouro no judô”, diz a manchete abaixo da frase “Garoto da Vila Sônia derruba um por um em Seul”.
Jornal da Tarde - 1 de outubro de 1988
“Quem poderia esperar que Aurélio voltaria de Seul com a medalha de ouro? Todos os habitantes do bairro de Vila Sônia, na zona oeste, que o conhecem desde pequenininho, quando o viam passar de quimono em direção à academia do mestre Shinohara.
A medalha de ouro que ele conquistou na categoria dos meio-pesados, não começou nessa Olimpíada de Seul com a derrota dos cinco fortes adversários. Ele é um lutador há 19 anos, já foi campeão mundial júnior, e tem muitos troféus. Aurélio Miguel estava confiante em ganhar uma medalha em Seul, e ao receber a de ouro, fez o mundo ouvir pela primeira vez o hino brasileiro na Olimpíada. Uma medalha inédita no judô.”
A história do menino que lutava dormindo
Desde criança, Aurélio sempre amou o judô. Sonhava com as lutas e até dava golpes nos travesseiros
“Não só sonhava com judô, como lutava dormindo; às vezes no meio da noite, eu acordava com um grito, quando ele dava um golpe no travesseiro.” E que ninguém duvide das histórias contadas por Carlos Augusto Fernandes Miguel, pois ele é o irmão mais velho - e melhor amigo - do judoca medalha de ouro em Seul, Aurélio Fernandes Miguel.
- Ele foi para buscar essa medalha. Inclusive minutos antes do embarque para Seul, lá no aeroporto de Cumbica, ele me garantiu: “Eu vou trazer esse ouro”. E eu não duvidei - conta Carlão, 26 anos, que começou a praticar o judô aos quatro anos, incentivado pela madrinha de Aurélio, dona Pepita, que também não encontrou dificuldades para convencer o afilhado, aos cinco anos, a seguir o caminho do irmãozinho.
Os dois meninos estudavam pela manhã no colégio Meninópolis, na avenida Morumbi, e depois do almoço ficavam sob olhares atentos da dona Cátia (falecida há dois anos), a mãe, que sempre colocou os estudos em primeiro lugar. Duas vezes por semana, das duas às três da tarde, Aurélio era submetidos às fatigantes aulas de piano, que não duraram tanto quanto às de judô, diariamente, das cinco às sete no São Paulo Futebol Clube.
Mas lá as coisas eram encaradas como mais como um passatempo, entre os preferidos de Aurélio: vôlei, natação, futebol de salão e basquete. A seriedade veio na adolescência, entre 13 e 15 anos, quando Aurélio foi treinar na Associação de Judô VIla Sônia, dirigida pelo professor Massao Shinohara.
- Apesar de o Lé (Aurélio) ter ganho o Campeonato Paulistano Mirim, em 73, só conhecemos mesmo o judô com o Shinohara, antes era só “marcha soldado” - lembra Carlão que, segundo o pai, Aurélio Miguel Marim, podia até ter sido melhor que o Aurélio “se não fosse tão folgado”.
Aliás, o pai, que tem sua fábrica (Biart Presentes) instalada a 200 metros de sua casa na Vila Sônia, nega que a conquista de Aurélio seja uma revanche ao corte para a olimpíada de 84 (consta que um desentendimento entre Aurélio e o presidente da Confederação Brasileira de Judô, Joaquim Mamede, num vôo de volta do Japão, alguns meses antes da Olimpíada, teria sido o motivo do corte):
- Ele ganhou desta vez porque o trabalho foi feito a vida toda para isso. O que aconteceu em 84 é melhor esquecer. O importante é essa medalha de ouro - diz o orgulhoso pai de Aurélio, que também nega que ele teria começado a praticar judô por motivo de saúde:
“Eu não sei de onde tiraram essa idéia. O meu filho sempre foi ‘troncudinho’. Ele só teve uma pneumonia quando nasceu, mas não tem nada a ver com o judô. Isso é só para incentivar o esporte. Mas eu acredito que não existe motivação melhor para qualquer atividade do que o reconhecimento que nos trás essa medalha do meu filho.”
Jornal da Tarde
Por 46 anos [de 4 de janeiro de 1966 a 31 de outubro de 2012] o Jornal da Tarde deixou sua marca na imprensa brasileira.
Neste blog são mostradas algumas das capas e páginas marcantes dessa publicação do Grupo Estado que protagonizou uma história de inovações gráficas e de linguagem no jornalismo.
Um exemplo é a histórica capa do menino chorando após a derrota da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.
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