Embora venha embalada em argumentos técnicos aparentemente fortes, pouco resultado prático deverá ter a mais recente tentativa do governo Lula de evitar que o Tribunal de Contas da União (TCU) determine a paralisação de obras eivadas de irregularidades, sobretudo as incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Desta vez, o governo pretende criar, por meio de decreto presidencial, um Escritório Avançado da Advocacia-Geral da União (AGU) dentro do TCU e quintuplicar o número de profissionais escalados para atuar junto ao órgão de fiscalização dos gastos públicos. O escritório, segundo anuncia o governo, terá como tarefa principal determinar correções nas obras e nos contratos antes de o TCU determinar a suspensão de sua execução.Entende-se o esforço do governo para reduzir o número de obras paralisadas por recomendação do TCU. Por causa da escassa capacidade gerencial do governo do PT, os projetos demoram muito para sair do papel mesmo sem interferências do TCU e, por isso, não são muitas as obras em execução.O balanço mais recente da execução do PAC ? que o governo transformou em sua principal peça de propaganda político-eleitoral para impulsionar a candidatura da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, à Presidência ? mostra que foram feitos apenas 50% dos investimentos previstos para o período 2007-2010. Nesse ritmo, para concluir tudo o que foi listado no PAC o governo teria de investir, em 2010, o mesmo que conseguiu investir nos três anos anteriores. O histórico de seu desempenho indica que não conseguirá fazer isso.Quando saem do papel, os projetos podem ser paralisados por apresentarem irregularidades. Em outubro, auditoria do TCU em 219 obras do governo federal constatou que em 149 havia falhas, algumas graves. Ou seja, 2 em cada 3 obras tinham problemas. Em 41, as irregularidades eram de tal gravidade que o TCU recomendou sua paralisação, mediante o bloqueio das verbas.Das obras cuja execução deve ser suspensa, 13 fazem parte do PAC e envolvem investimentos de R$ 7,38 bilhões. Entre elas estão grandes projetos, como o da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, fruto de uma parceria da Petrobrás com a venezuelana PDVSA. Se cumpridas à risca as recomendações do TCU, a execução do PAC, que até agora não deslanchou, ficará ainda mais lenta. E isso ocorrerá no ano da eleição presidencial que tanto preocupa o presidente Lula e sua equipe. Daí a irritação do presidente, que injustamente acusou o TCU de agir politicamente.Lula já tentou articular um amplo movimento de pressão sobre o TCU, com a participação de governadores, parlamentares, prefeitos, empresários, sindicalistas, para que o órgão "flexibilize" seus critérios de auditoria. Há pouco, num ato que marcou o compromisso da União, dos Estados e das capitais para a organização da Copa do Mundo de 2014, Lula pediu que os órgãos fiscalizadores (além do TCU, citou o Ibama) ajam com menos rigor no exame das obras ligadas ao evento.Agora, o governo anuncia que vai agir tecnicamente para evitar a paralisação de obras num ano eleitoral. "Vamos trabalhar no TCU de maneira sistemática, como fazemos no Supremo Tribunal Federal, com uma equipe que se antecipa aos julgamentos, despacha com os ministros e apresenta soluções", declarou o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, ao jornal Valor. "Queremos levar aos ministros do TCU informações que justifiquem as obras e deem legitimidade à atuação dos gestores."A leitura da lista das irregularidades identificadas pelos auditores do TCU nas obras federais permite concluir que os discursos e iniciativas políticas do governo para cercear a atuação do órgão fiscalizador e mesmo a iniciativa da AGU terão pouca utilidade.Entre as principais irregularidades estão sobrepreço, superfaturamento, alterações indevidas em projetos, orçamentos incompletos e até ausência de projetos executivos. São problemas que precisam ser resolvidos pelo próprio Executivo. Em lugar de criticar a fiscalização, o presidente deveria cobrar de seus auxiliares ? a começar de Dilma Rousseff, a quem deu o título de "mãe do PAC" ? mais competência, mais eficiência e, sobretudo, mais cuidados na elaboração e na execução dos projetos. É no governo que está o problema, não no TCU.