Você acredita na imprensa? Apoia o bom jornalismo?
Receio que essas perguntas despertem negativas com ira e revolta em muitas pessoas. Mas peço licença para tentar reverter essa percepção e explicar por que todos deveriam endossá-los.
No começo da carreira, aprendi que uma imprensa forte, livre e profissional é condição para o desenvolvimento de qualquer sociedade. Infelizmente a recíproca é válida: um país com um jornalismo fragilizado tende a ter uma população manipulada, submissa e limitada.
Ao longo de três décadas profissionais, comprovo como isso se mantém verdadeiro. No começo, quando visitava um lugar novo, comprava seus jornais e os dissecava, como uma criança descobrindo um brinquedo. Se possível, visitava as Redações, para ver como trabalhavam.
Com a ascensão do digital, isso ficou mais fácil e as análises mais amplas. E hoje percebo que a imprensa ser forte, livre e profissional não é mais suficiente: se ela não for prestigiada, todo esse esforço se perde e a sociedade sucumbe.
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Os EUA são um exemplo disso. Apesar de possuírem alguns dos melhores veículos jornalísticos do mundo, sua população padece de um declínio exponencial há uma década, justamente quando seu jornalismo começou a sofrer um implacável processo de deslegitimação, promovido por grupos que se beneficiam de uma população menos crítica e informada.
No Brasil, apesar de esse processo ter se acentuado a partir de 2018, ele é visto desde 2002. Disso constata-se melancolicamente o crescimento de uma população facilmente manipulável. Estudo do Instituto Reuters e da Universidade de Oxford, publicado em junho, indicou que 47% dos brasileiros deliberadamente não consomem notícias.
No extremo oposto, temos a Finlândia, o país mais feliz do globo há sete anos. Seu jornalismo é um dos melhores e mais confiáveis do mundo, e o país sempre se destaca na liberdade de imprensa. Além de possuir independência, os veículos finlandeses gozam de grande apoio e credibilidade junto a uma população altamente educada.
A origem do jornalismo profissional, no século XIX, está ligado ao apoio da população a um jornal local, que lhe contava o que acontecia no país e no mundo, ou a veículos que defendiam causas importantes. Foi o caso do Estadão, lançado em 1875 como Província de S.Paulo para defender ideais republicanos e a abolição da escravatura em pleno império brasileiro.
Essa relação de confiança foi abalada pelo meio digital, que fragmentou a comunicação e possibilitou que uma multidão de pessoas, sem compromisso com a verdade e que buscam apenas cliques, passassem a concorrer pelo público. Isso abriu caminho para o cenário atual de baixo senso crítico e ampla manipulação.
O jornalismo nunca se pretendeu infalível, até pela natureza humana do ofício. Mas uma imprensa, ainda que imperfeita, continua sendo essencial para o desenvolvimento de qualquer nação.
A quebra do vínculo entre ela e seu público coloca em risco um dos pilares da democracia: uma sociedade informada e capaz de tomar decisões conscientes. Ele precisa, portanto, ser reconstruído!
Os veículos precisam equilibrar tradição e inovação, mantendo o compromisso com a verdade, enquanto explorem novas formas de conexão com o público e financiamento, adaptando-se às dinâmicas digitais. E nisso podem aprender algo com os influenciadores.
Assim como no século XIX, o jornalismo profissional pode e deve ser novamente um farol de orientação em meio ao caos informacional, ajudando a sociedade a navegar pelos desafios de um mundo cada vez mais complexo.
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