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Opinião | Depois do "paywall", o "freewall"

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Atualização:

Desde que o The New York Times lançou, em março do ano passado, o seu "paywall", os jornais elegeram esses sistemas de controle de cobrança pelo seu conteúdo digital como a tábua de salvação de sua indústria em forte declínio. Não falam de outra coisa, como uma criança que encontrou antes da hora um presente escondido. Mas Raju Narisetti, vice-editor executivo do The Wall Street Journal, classifica os paywalls como "negativos".

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A declaração foi feita no 9º Congresso Brasileiro de Jornais, promovido pela ANJ (Associação Nacional de Jornais) nos dias 20 e 21 de agosto. Ironicamente o WSJ de Narisetti é o melhor exemplo de sucesso conteúdo digital fechado. Se quiser ler, tem que assinar. Muito mais "duro" que o modelo do NYT, que vem habitando os sonhos dos publishers, em que o leitor pode acessar páginas livremente até determinada quantidade, antes de ser convidado a pagar.

Como entender essa aparente contradição do executivo? O próprio Narisetti explica: o WSJ sempre cobrou pelo seu conteúdo, ao contrário de praticamente todos os demais jornais, que acostumaram seus usuários a consumir o conteúdo de graça. Agora precisam convencer seu público a pagar pelo que sempre foi grátis. Além disso, o conteúdo do WSJ é um verdadeiro diferencial, raramente equiparado por outros veículos, o que cria uma justificativa pela cobrança.

"Vocês devem descobrir o que funciona para o seu negócio e encontrar formas de beneficiar seus sites e seu jornalismo", disse no evento. Traduzindo: não há nenhuma garantia de que os sucessos dos modelos de paywall do NYT e do WSJ possam ser reproduzidos em outros veículos. Mais: para que isso tenha a mínima chance de acontecer, os veículos têm que oferecer um produto que mereça ser pago.

Problema: diferencial é algo que os jornais, os brasileiros com destaque, têm cada vez mais dificuldade de oferecer. Em época de cortes dramáticos de custos, as redações ficam povoadas de "focas", imaturos e com formação deficiente. E um bom jornalista só aparece ao longo dos anos, forjado na reportagem e na edição. Nossos veículos se tornaram reféns de sua falta de criatividade da inexperiência dos novos colegas, dependendo do denuncismo e do jornalismo palaciano, duas pragas que tentam mascarar essa triste realidade.

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Apenas para exemplificar, vejam as primeiras páginas de hoje do Estadão e da Folha:

 Foto: Estadão

Os dois jornais têm a mesma manchete, com o mesmo sujeito, mesmo verbo e mesmo objeto; a foto principal também retrata o mesmo personagem; três das outras principais chamadas também tratam do mesmo assunto.

Caramba: até o anúncio é o mesmo!

Mais dramático ainda: nada, absolutamente nada do material chamado nas duas páginas exigiu grande esforço. É material de assessorias, de agências, de pesquisas. E tudo isso também está disponível igualmente (e muito mais rápido) em portais como Terra, MSN e outros, que não dão a menor pinta de que passarão a cobrar pelo seu conteúdo. Sem falar na televisão aberta.

Fica a pergunta: quem vai pagar por isso? Ou ainda: quanto vale isso? Disse Suzana Singer, ombudsman da Folha, na sua coluna do dia 24 de junho : "para ler pequenos informes sobre o que aconteceu nas últimas horas, em textos mal-ajambrados, ou para saber das fofocas mais recentes sobre celebridades do 'mundo B', ninguém precisa gastar um centavo, há uma oferta enorme de sites e blogs gratuitos na rede."

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Os paywalls mudarão magicamente isso? O próprio Narisetti responde: "paywalls são inerentemente negativos. Estamos dizendo ao leitor que ele tem, por exemplo, 20 matérias grátis e que, quanto mais ele lê, mais perto fica de ter que pagar para nós."

"Freewall"?

O executivo do WSJ propôs então uma ideia no mínimo curiosa: talvez os jornais devessem considerar a alternativa de um "freewall", como ele mesmo chamou.

É como um programa de milhagem. Para ver o conteúdo, o usuário precisa pagar. Mas, quanto mais "engajado" esse usuário for com o veículo, menos pagaria, até chegar a uma eventual gratuidade.

A proposta tem seus méritos. Um usuário que participa ativamente do jornal -comentando, compartilhando, sugerindo- traz vários benefícios ao veículo, inclusive novos usuários. Compartilhamentos comentados aos amigos de redes sociais são uma forma complexa e eficiente de marketing, de uma maneira que o próprio veículo não consegue fazer por si só.

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Claro, é apenas uma ideia: ninguém falou ainda em como implantar tal coisa, ou quais seriam as regras de descontos, por exemplo. Mas o embrião do paywall poroso também era só uma ideia no NYT há três anos, quando começou a ser discutido internamente. Pode se tornar uma alternativa interessante a jornais que não sejam competentes o suficiente para ter sucesso com o paywall.

E por que então o WSJ não adota o freewall então? Bom, porque seu conteúdo é um diferencial e eles nunca deram isso de graça. Fecha-se o círculo.

Opinião por Paulo Silvestre

É jornalista, consultor e palestrante de customer experience, mídia, cultura e transformação digital. É professor da Universidade Mackenzie e da PUC–SP, e articulista do Estadão. Foi executivo na AOL, Editora Abril, Estadão, Saraiva e Samsung. Mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital pela PUC-SP, é LinkedIn Top Voice desde 2016.

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