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Ocitocina é o hormônio do bem ou do mal?

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Foto do author Dr. Joel Rennó
Atualização:

Há muito tempo o hormônio ocitocina foi caricaturado como a fonte de toda a bondade humana - a confiança, o altruísmo, o amor e a moralidade. Várias descobertas contribuiram para esta imagem como o efeito positivo da ocitocina sobre a confiança, a generosidade em jogos financeiros e no reconhecimento de faces. As mulheres ficaram sempre confiantes com o efeito da ocitocina sobre os aspectos importantes do vínculo mãe-bebê e até na facilitação do orgasmo.

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No entanto, a boa imagem tem ficado complicada recentemente com os resultados de alguns trabalhos (como um recente publicado no Social Psychological and Personality Science, 2014) que mostram que a ocitocina pode ter um "lado negro" - por exemplo, aumentando a inveja e "schadenfreude" (é um empréstimo linguístico da língua alemã  também usado em outras línguas do Ocidente para designar o sentimento de alegria ou satisfação perante o dano ou infortúnio de um terceiro - em português o termo mais adequado para se traduzir schadenfreude é "escárnio", embora não seja sinônimo).

Uma equipe de pesquisadores liderada por Nathan DeWall tem manchado ainda mais a reputação desta molécula idolatrada. Eles demonstraram que, para certas pessoas, em circunstâncias particulares, a exposição a ocitocina pode realmente levar ao aumento da violência. Isso seria realmente possível?

Os pesquisadores dividiram 93 estudantes (47 homens e 46 mulheres) em dois grupos - um grupo cheirou ocitocina, o outro grupo cheirou uma solução de água salgada. Os alunos não sabiam se eles tinham recebido a ocitocina ou o placebo, e os pesquisadores também não tinham conhecimento de quem havia recebido o quê (estudo duplo-cego). Em seguida, os alunos completaram duas tarefas destinadas a torná-los estressados, inclusive dando uma apresentação pública para uma platéia hostil. Finalmente, eles responderam a duas perguntas sobre as suas tendências para serem fisicamente agressivos e outras questões sobre o quão provável seria o envolvimento em violência contra um parceiro romântico atual ou anterior com base em como eles atualmente se sentiam.

Aqui é a principal conclusão. A ocitocina aumentou a probabilidade de confessar o ato de poder ser violento contra um parceiro, especificamente naqueles estudantes que admitiram ter uma propensão para a agressão física. A equipe de DeWall achou que isso poderia se encaixar com um entendimento emergente dos efeitos da ocitocina. É verdade que o hormônio desempenha um papel importante na manutenção de relacionamento humano, mas isso nem sempre é uma função inocente. Uma pesquisa anterior mostra que a ocitocina pode aumentar a intolerância e a agressividade contra estranhos na iminência de perda de um(a) parceiro(a). Agora sabemos que pessoas estressadas e propensas à agressão contra seus parceiros românticos podem ter esse comportamento patológico estimulado pela ocitocina.

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Isso me leva à seguinte conclusão: na vida, como na ciência, nunca há regras gerais ou panacéias, mesmo as questões científicas podem ter os dois lados e as suas controvérsias com mudanças repentinas de percurso ou ruptura de dogmas pré-estabelecidos até por marketing excessivo. A cura de todos os males sociais pela ocitocina está sendo questionada pela ciência dentro de uma visão abrangente e sem reducionismos.

 

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