A Justiça Federal começou a ouvir nesta quinta-feira, 3, seis dos 11 militares acusados de homicídio por terem entregado três moradores do Morro da Providência a traficantes de uma favela dominada por uma quadrilha rival. Ficou evidente a diferença da estratégia da defesa do tenente Vinicius Ghidetti de Moraes Andrade em relação à dos demais. O oficial tentou convencer o juiz Marcello Granado, da 7ª Vara Criminal Federal, de que só queria dar "um corretivo" nos jovens. Os praças insistiram que desconheciam a intenção do tenente. Ghidetti chorou, quando o juiz perguntou sobre como era sua vida. Ele disse que é casado há seis meses e que tem um filho de 2 meses. O tenente afirmou que não pretendia entregar os jovens aos traficantes. Sua idéia era deixar Wellington Gonzaga da Costa Ferreira, de 19 anos, David Wilson Florenço da Silva, de 24 , e Marcos Paulo Rodrigues Campos, de 17, perto de uma comunidade dominada por uma facção rival ao Comando Vermelho, que domina o Morro da Providência. "Houve um encontro fortuito, tanto que ficamos assustados. Por isso, o sargento Maia foi até eles explicar que não era uma operação. E que só queríamos dar um susto nos três, que tinham nos desacatado." Ele negou que tenha oferecido os jovens como "um presentinho", conforme depoimento dos praças à polícia. Inicialmente, Ghidetti tentou dizer que não pretendia desobedecer ordens do superior, o capitão Laerte Ferrari Alves . "Fui formado na academia e aprendi que se deve obedecer ordens dos superiores. Eu queria dar um susto." O juiz quis saber se foi na academia que ele aprendeu a dar "sustos" nas vítimas. Ele nada explicou. Com a tese de que a única intenção era "dar um corretivo", o advogado do tenente, Luiz Azenha, tenta descaracterizar a denúncia de homicídio doloso. Se ficar provado que o crime dos militares não foi contra a vida, o caso pode voltar para a Justiça Militar. A tese da defesa dos demais militares, segundo o advogado Sérgio André Moraes, que defende o sargento Leandro Maia Bueno, é mostrar que os subordinados desconheciam a intenção de entregar os jovens para traficantes. O sargento foi o segundo a depor e se contradisse várias vezes, sendo advertido pelo juiz. "Não caí de pára-quedas nessa cadeira. Não fui criado em apartamento do Leblon. Não soltei pipa em ventilador nem joguei bola de gude em carpete. Sou da zona norte. Portanto, quero coerência", disse Granado. Maia negou que tivesse avisado os traficantes de que estavam ali para dar um corretivo nos jovens. Confrontado pelo juiz com o depoimento do tenente, voltou atrás, mas insistiu que o fato de ter dito aos traficantes que estavam ali para dar um corretivo foi "mera coincidência" com o que pensava o tenente. Ele não teria recebido instrução do superior. Quarto a depor, o soldado Bruno Eduardo de Fátima contradisse o tenente. O oficial contou que teria levado sozinho os jovens até onde estavam os traficantes. Fátima dá outra versão: três soldados o teriam acompanhado. O soldado José Ricardo Rodrigues de Araújo contou que foi acordado pelo tenente para guiar o grupo até a Mineira. Mas negou que soubesse que os rapazes seriam entregues a traficantes - tanto que estava sem capacete e sem arma.