'Não vamos parar no Salman Khan'

Após a visita meteórica ao País do educador americano, diretor da Fundação Lemann promete novidades

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Quando aceitou, em 2011, o convite para trabalhar na Fundação Lemann, o advogado paulistano Denis Mizne achou por bem alertar o futuro patrão: "Eu não entendo nada de educação", disse. "Tudo bem, o Marcel Telles não entendia nada de cerveja quando a gente comprou a Brahma", respondeu o bilionário Jorge Paulo Lemann, referindo-se a um dos diretores da AB-InBev, grupo controlado por ele que virou o maior fabricante mundial de cerveja.

A parceria entre o empresário e Mizne, atual diretor executivo da Fundação Lemann, teve um ponto alto na semana passada, com a vinda ao Brasil do americano Salman Khan. Criador da Khan Academy, ele virou celebridade ao criar mais de 4 mil videoaulas que viraram hit no YouTube. Em 36 horas, o americano foi ouvido por autoridades, educadores e grandes empresários brasileiros.

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"A repercussão foi incrível", diz Mizne, que se notabilizou como um dos criadores do Instituto Sou da Paz, em 1997, durante o pico da violência em São Paulo. O instituto foi vital na articulação da sociedade para reverter a escalada dos homicídios e hoje é interlocutor até da Organização das Nações Unidas em temas relacionados ao controle de armas. A seguir, Mizne conta como convenceu Khan a desembarcar no Brasil.

Como começou a sua relação com a Fundação Lemann?

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Já tinha me decidido a deixar o Sou da Paz, porque o núcleo que criou o instituto sempre pensou em uma ONG que não fosse ligada a uma liderança específica. Mas ainda não sabia o que fazer. Uma amiga me ligou e disse que o Lemann estava procurando alguém porque queria mudar a orientação do trabalho da fundação. Ela perguntou se poderia dar meu nome e eu autorizei, claro. Um minuto depois recebi um e-mail do Jorge Paulo. Ele disse que queria conversar comigo, mas estava fora do Brasil. Fizemos uma conferência pelo Skype e conversamos pessoalmente um mês depois, aqui em São Paulo. Fiquei impressionado com a objetividade dele e com o fato de que nada passava por secretária ou assessor. Era sempre o Jorge Paulo quem ligava ou mandava e-mail. O discurso dele nas conversas era de que a fundação tinha ido bem até ali, mas era preciso olhar mais para a tecnologia. Ele estava muito ligado nisso, dizia que a tecnologia iria transformar a educação. Eu comecei a correr atrás, até porque não entendia de tecnologia. E comecei a ouvir falar muito do Khan, recebi muitos e-mails de pessoas entusiasmadas com as aulas que viam no YouTube.

Quando você fez o primeiro contato com a Khan Academy?

Comecei a trabalhar na fundação em fevereiro de 2011. Em março, mandei um e-mail para a Academy. Não recebi resposta. Aí meu irmão, Arthur, que trabalhou no mercado financeiro nos Estados Unidos, disse que conhecia o sujeito, da época em que o Khan estava em um hedge fund (fundo de investimento). Ele mandou um e-mail e o Khan respondeu, me encaminhando para o Bilal Musharraf, o responsável por traduções de conteúdo. O Bilal avisou que já tinha três voluntários aqui fazendo versões das videoaulas. Procurei os três por e-mail, oferecendo apoio, mas ninguém respondeu.

E quando você conseguiu finalmente falar com o pessoal da Khan Academy?

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Em junho de 2011 fui para a Califórnia, por causa da montagem do nosso centro de estudos em educação em Stanford (para o qual a fundação envia bolsistas brasileiros). Encontrei o Bilal Musharraf no Hard Rock Café de Mountain View, onde fica a sede da Khan Academy. Ele ainda estava meio desconfiado. Falei da fundação, da nossa visão do papel da tecnologia na educação e propus uma parceria. Ele disse que a gente poderia traduzir os vídeos. Eu insisti que a nossa proposta era começar a fazer projetos piloto de introdução do conteúdo da Khan Academy nas salas de aula, algo que eles tinham acabado de começar a fazer com escolas da Califórnia. O Bilal rejeitou. Disse que a prioridade deles era a tradução de conteúdo.

Mas a parceria foi fechada.

Mais ou menos. Um mês depois disso eles escreveram de novo dizendo que havia mais gente fazendo versões das videoaulas no Brasil. Foi meio um balde de água fria, porque achávamos que tínhamos ganhado os caras. Discutimos internamente e decidimos que tínhamos de impressionar os americanos, fazendo a melhor tradução de aulas que eles já viram. Era o único jeito de ter alguma exclusividade na relação com a Academy. Em outubro começaram a subir os primeiros vídeos no YouTube. E eles viram que a gente começou a conseguir centenas de milhares de visualizações. Usamos dubladores, arrumamos gente para escrever em português com a letra igualzinha à do Khan. Fizemos vários testes de voz nas escolas, porque um dos segredos do Khan é o jeito como ele fala. Cada disciplina tem um dublador. O da aula mais assistida, Anatomia de um Neurônio - que já teve 349.693 exibições -, é o que faz a voz do Goku, personagem do game Dragon Ball 2.

Em que momento o Khan começou a falar com vocês?

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Em maio do ano passado, quando o conselho da fundação foi todo para a Califórnia. Passamos três dias vendo coisas, conversamos com muita gente interessante. O Khan foi de longe o melhor, pela visão dele sobre educação. O Jorge Paulo desde o começo falou: "Isso aí é um gol, temos que apostar nesse negócio." Quando viram o piloto que fizemos em seis escolas municipais de São Paulo, eles perceberam que o trabalho era consistente e nos ofereceram a possibilidade de virar colaborador global da Academy. O plano de cinco anos de parceria prevê, entre outras coisas, a criação de conteúdos específicos para o público daqui.

O que mais vocês esperam com a parceria?

Sempre ressaltamos o objetivo de internacionalizar o site e a nossa disposição de estar com eles no dia a dia, sugerindo coisas e aprendendo. Que é basicamente o pacote que a gente sugere para todo mundo que a gente quer trazer.

Quem são os próximos alvos da fundação?

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Não posso dizer agora, mas é gente de peso também. Não vamos parar no Khan.

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