Entre tantos dias de alguma coisa no calendário, este 1º de março me chamou atenção. Não por ser o aniversário da minha cidade, Rio de Janeiro, mais lembrada pelo feriado do padroeiro, São Sebastião, em 20 de janeiro. E, sim, porque hoje é o Dia Nacional do Turismo Ecológico. Com a natureza que temos, seria motivo para muita comemoração. No entanto, mudanças climáticas e impacto ambiental nos destinos comprometem a sustentabilidade das nossas belezas naturais e das comunidades que nelas residem.
Esse quadro, é claro, afeta o turismo ecológico no Brasil. Segundo estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa de Reputação e Imagem (IPRI), divulgado hoje pelo Ministério do Turismo (Mtur), 6 em cada 10 brasileiros (63% dos entrevistados) consideram que as alterações no clima prejudicam a atividade turística. Por causa dessas mudanças, 27% das 2.029 pessoas ouvidas afirmaram que já deixaram de viajar a lazer.
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Me ocorre sempre um exemplo bem corriqueiro disso: a clássica pergunta 'quando é bom para ir' para determinado lugar, cada vez mais difícil de ser respondida com exatidão, se o aspecto considerado for a época de chuvas, por exemplo. Já o calorão que anda fazendo em cidades como Rio e São Paulo acaba desanimando viagens em janeiro.
Os incêndios em biomas como Pantanal e Cerrado são outras situações complicadas para o planejamento. Em 2020, quase 30% do Pantanal foi atingido por incêndios e, desde então, os riscos de estragos pelo fogo são frequentes a cada ano. Uma exposição de fotografia sobre o bioma estreia agora em março no Tomie Ohtake (leia abaixo no Check Out).
No comunicado à imprensa em que divulgou hoje a pesquisa, o Mtur lembrou que, "em 2023, passou a contar com um Departamento de Qualidade, Sustentabilidade e Ações Climáticas no Turismo, destinado a promover ações na área". E acrescentou: "Também passamos a integrar, pela primeira vez, o Plano para Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia (PPCDAm, criado em 2004), proporcionando o uso do turismo responsável como um forte vetor de proteção do bioma".
Impacto ambiental nos destinos
No estudo do IPRI, os entrevistados dos 26 estados e do Distrito Federal disseram que sua maior motivação para viagem é o turismo de sol e praia (59%), seguido por natureza e ecoturismo (27%). O Nordeste continua como campeão na preferência nacional.
O impacto do turismo de massa em destinos naturais no Brasil, aliás, é outra preocupação de muita gente (me incluo nessa). Afinal, não basta agir pela preservação do meio ambiente e entupir lugares pequenos com levas de visitantes em férias e feriados, sem envolver a comunidade local na atividade turística nem cuidar para manter viva a natureza que recebe todo mundo. É uma lógica imediatista.
Nas férias de verão, é comum ver a repetição de filas, falta de água ou luz, trânsito pesado e lixo em excesso, especialmente em destinos do litoral muito procurados pelos viajantes. Por isso, o Muda! Coletivo Brasileiro pelo Turismo Responsável, com forte atuação nessa área, defende que as atividades turísticas devem, primeiramente, favorecer os moradores e o destino.
Recebi um email da Ana Duék sobre isso, apontando esses problemas em lugares como Caraíva (BA), Boipeba (BA), Jericoacoara (CE), Porto de Galinhas (PE), Ilha Grande (RJ) e Bombinhas (SC). Do Viajar Verde, a Ana trabalha por um turismo mais sustentável e foi uma das mulheres que destaquei em Não dê rosas no 8 de março. Dê espaço para uma mulher crescer no turismo, meu texto no Dia Internacional da Mulher em 2023.
Nesse email, era citada Tatiana Paixão, autora da foto acima, proprietária da pousada Casa de Paixão, moradora de Caraíva e também integrante do Muda!. Ela explica que, apesar de algumas casas e hotéis terem fossas ecológicas, a maior parte da vila, não. Tatiana fala do temor de contaminação do Rio Caraíva e conta que, quando falta energia, também não é possível bombear do poço a água para consumo.
A situação do turismo de massa na também baiana Boipeba vem sendo abordada pela Elaine Villatoro, no perfil livemoretravelmore no Instagram. Além disso, Elaine dá dicas de como ser um turista consciente e aproveitar destinos sem contribuir para destruí-los.
Acrescento à lista o litoral norte de São Paulo e a Região dos Lagos do Rio de Janeiro, que viram um inferno a cada verão. Daí minha sugestão por destinos de natureza longe do circuito de Carnaval, na matéria que fiz aqui para o Estadão neste ano. Insisto em escrever sobre outras possibilidades não porque odeio folia, muito pelo contrário, mas para mostrar que existem opções diversas num país tão grande. Por isso, falei sobre isso em 2023, em Viagem de Carnaval com folia ou não? Ou melhor, lugar cheio ou vazio?.
COP 30 no Pará
Eventos como a Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas no Brasil, marcada para o fim de 2025 no Pará, dão visibilidade ao tema, já que discutem a sustentabilidade. Por isso, para 70% dos entrevistados no estudo do IPRI, a COP 30 será importante para Belém, a Região Norte e o Brasil.
O Muda!, porém, ressalta a importância de preservar o meio ambiente e, simultaneamente, encontrar alternativas socioeconômicas viáveis para comunidades ribeirinhas, indígenas e quilombolas. A geração de renda e a qualificação de pequenos empreendedores e comunidades levam à conservação da sociobiodiversidade. Mais do que tomar medidas para garantir infraestrutura e hospedagem aos participantes, a organização do evento pode fortalecer a bioeconomia por meio do Turismo de Base Comunitária.
A Raízes Desenvolvimento Sustentável e a Diaspora.Black estão trabalhando no desenho de um programa para apoiar a qualificação e o fortalecimento das operadoras de receptivo e também das comunidades que já operam ou desejam operar o turismo no entorno de Belém. Negócios e comunidades das ilhas e entorno da capital paraense podem participar do encontro online (inscrições pelo link https://x.gd/dBTDa). Gratuito e aberto, será realizado nesta segunda, 4 de março, às 16h.
CHECK OUT
Exposição de fotografia pela preservação do Pantanal
Com a curadoria do fotógrafo Eder Chiodetto, a mostra Água Pantanal Fogo apresenta 80 imagens feitas por Lalo de Almeida e Luciano Candisani no bioma. Delas, 6 fotografias estarão à venda, para arrecadar recursos para as Brigadas Pantaneiras. Em cartaz de 8 de março a 12 de maio (de terça a domingo, das 11h às 19h) no Instituto Tomie Ohtake, a exposição gratuita é promovida pela Documenta Pantanal.
Uma curiosa coincidência: Fernando Victorino, meu companheiro e sócio no Como Viaja, gravou a audiodescrição dessa exposição. Além de jornalista, ele é locutor profissional e realiza trabalhos pela nossa empresa de conteúdo, a DUO.
No Paraná, a Mata Atlântica conservada
Com trilhas e uma cachoeira de 100 metros de altura (que a batiza), a Reserva Natural Salto Morato (RNSM), no Paraná, fica dentro de uma área reconhecida como Patrimônio Natural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). É possível visitar a reserva com 2.253 hectares preservados de Mata Atlântica, criada em 1994 pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza. No litoral norte do Paraná, em torno de 170 km distante de Curitiba, o lugar já teve identificados 370 espécies de aves, 29 tipos de répteis, 93 mamíferos, 44 anfíbios, 63 peixes e 646 vegetais vasculares. Para até 12 barracas, o camping possui banheiros com chuveiros, água quente, churrasqueira e sistema wifi; faça reserva (site).
Roteiros de longas caminhadas pelo Brasil
Quem tem preparo e condicionamento físico pode experimentar um roteiro da Rede Brasileira de Trilhas (Rede Trilhas), existentes de Norte a Sul. O Caminho das Araucárias, com 600 km de extensão, corta o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Já os 1.100 km da Transmantiqueira atravessam 40 municípios de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. É possível fazer apenas trechos. Com o apoio do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e do ICMBio, a iniciativa traça rotas respeitando ecossistemas e capacita parceiros nos governos e na sociedade civil.
QUEM FAZ
Nathalia Molina viaja desde os 5 anos, adora café da manhã e aprecia um bom serviço no turismo. Essencialmente urbana, também tem seus dias de paisagem natural. É jornalista de viagem há 20 anos e ganhou 4 vezes o prêmio da Comissão Europeia de Turismo. Em 2011, criou o Como Viaja: acompanhe no Instagram @ComoViaja e em comoviaja.com.br
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