O que fazer para evitar cair em fraudes na hora de pedir cidadania italiana?

Brasileiros descendentes da linha paterna podem pedir passaporte europeu sem limite de gerações; investigação que cita Rodrigo Faro, que diz ser vítima de esquema, chama a atenção para o problema

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Foto do author José Maria Tomazela

O apresentador Rodrigo Faro foi citado pela imprensa italiana como suposto beneficiário de um sistema de fraudes para obtenção de cidadania - ele diz ter sido vítima. O caso chamou a atenção para um processo que interessa a milhares de brasileiros. O Brasil é um dos países que mais receberam imigrantes italianos no século passado e, pela lei daquele país, descendentes da linha paterna podem requerer a cidadania sem limite de gerações, desde que não tenha havido perda da cidadania italiana por aquisição de cidadania estrangeira.

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Segundo a imprensa italiana, foram expedidas certidões de residência para mais de 15 mil estrangeiros nos últimos anos, a maioria em favor de brasileiros. Entre as vantagens de ter a cidadania italiana, por exemplo, está a possibilidade de morar, estudar ou trabalhar em boa parte dos países da Europa sem a necessidades de vistos específicos.

Rodrigo Faro diz ter sido pego de surpresa ao ver o seu nome como beneficiário de um esquema fraudulento e afirma que, na verdade, foi vítima de um escritório contratado por ele para auxiliá-lo a obter a cidadania italiana (leia mais abaixo).

Brasileiros descendentes da linha paterna podem requerer a cidadania italiana sem limite de gerações. Foto: alexmu - stock.adobe.com

De acordo com o advogado Valerio Mazzuoli, professor de Direito Internacional que atua em processos de cidadania, o descendente brasileiro tem três maneiras de requerer a cidadania italiana:

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  1. Para quem tem a nacionalidade direta pelo pai, avô ou bisavô, é preciso comprovar com documentos a descendência e dar entrada com o pedido no consulado competente que, no caso do Estado de São Paulo, é o Consulado da Itália na capital.
  2. Estabelecer domicílio na Itália por um período de ao menos 30 dias, após o qual as autoridades italianas emitem o registro da cidadania.
  3. Entrar com ação judicial na Itália.

O especialista dá dicas de como evitar cair em uma cilada. “O melhor a fazer é entrar na fila do consulado, que um dia chama para a entrevista e emite o passaporte. É demorado, mas, se a pessoa quiser a via de estabelecer domicílio, precisa ser verdadeira e radicar de fato na Itália pelo período mínimo exigido, que muda conforme a região. Declarar o endereço na casa do primo ou do amigo, é fraude”, diz.

A advogada Roberta Firpo Bevilaqua, especialista em Direito Internacional, tem indicado a via judicial para clientes do seu escritório, no Rio Grande do Sul. “Como a legislação italiana estabelece que o pedido de cidadania precisa ser deferido em dois anos, a pessoa protocola o pedido no consulado e entra na Justiça italiana alegando o risco da extrapolação do prazo, argumento normalmente aceito pelos juízes italianos”, explicou.

Pela via judicial, o processo é concluído em menos de dois anos, mas acaba sendo mais oneroso porque tem o custo com honorários do advogado italiano.

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A reportagem procurou o Consulado da Itália em São Paulo, mas não obteve resposta.

Operação ‘Carioca’

Uma operação policial denominada ‘Carioca’ prendeu seis pessoas, além de funcionários do município de Villarica, na Campania, sudoeste da Itália, todos acusados do crime de associação criminosa visando corrupção e falsificação de documentos públicos. É nesta operação em que o nome do apresentador Rodrigo Faro foi citado pelo portal de notícias italiano RaiNews, na segunda-feira, 27. A divulgação da polícia não mencionou o nome dos envolvidos.

Rodrigo Faro alega inocência e pede que 'responsáveis por esse suposto esquema de corrupção sejam devidamente punidos'. Foto: LUCIANA PREZIA/ESTADÃO - 22/06/2017

Segundo a investigação, os suspeitos tentaram alterar a execução dos procedimentos legais para o reconhecimento de residência no município de Villarica, a fim de obter a cidadania italiana para pessoas que não cumpriram os requisitos exigidos.

Conforme a comandante da Polícia Metropolitana de Nápoles, Lucia Rea, chamou a atenção o “extraordinário número de estrangeiros, entre eles personalidades famosas”, que declararam residência na cidade italiana sem nunca ter sequer pisado lá.

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“As pessoas contratam agências internacionais que acabam praticando uma fraude, simulando um endereço fictício para o brasileiro. Na Itália, muitos documentos ainda são assinados sob a honra, ou seja, a autoridade presume que ele seja verdadeiro. A pessoa no Brasil recebe os documentos, assina e, quando a polícia desconfia e vai checar, ela acaba verificando que a pessoa nunca morou lá”, explica o advogado Valerio Mazzuoli.

Nota divulgada pela Polícia Metropolitana de Nápoles informa que os agentes executaram, no âmbito de investigação do Ministério Público de Nápoles, medidas cautelares contra seis pessoas, incluindo dois funcionários do cartório, um do registro civil e um policial municipal, acusados de fraudes em processos de cidadania. Os crimes imputados são de formação de quadrilha, falsificação de documentos públicos e corrupção.

Foram ordenadas duas medidas de prisão preventiva contra os proprietários de empresas que desempenhavam funções de intermediação na execução de pedidos destinados à obtenção de residência e à concessão da cidadania italiana. Foram ainda aplicadas quatro medidas de prisão domiciliar contra funcionários públicos do município de Villarica, incluindo os servidores do cartório e da polícia municipal.

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As investigações recorreram a escutas telefônicas e atividades de shadowing (sombreamento). Estas atividades revelaram que a atividade criminosa reconstruída pelas investigações, na verdade, tinha como objetivo fazer com que os moradores parecessem cidadãos brasileiros que não estavam efetivamente presentes no município de Villarica, permitindo-lhes assim solicitar a cidadania italiana.

Entre eles, estavam jogadores de futebol e apresentadores de televisão. Villarica é um município de 31 mil habitantes na região metropolitana de Nápoles.

Em nota oficial divulgada em sua conta no Instagram, o apresentador Rodrigo Faro afirma que, em 2021, indicado por um amigo que já havia tirado passaporte italiano, ele deu início ao processo de cidadania italiana para adquirir o passaporte para si e sua família. O escritório indicado para esse trabalho foi o Diritto di Cittadinanza (Direito de Cidadania), da Itália.

“Rodrigo, através de seus advogados aqui no Brasil, forneceu toda a documentação necessária, comprovou laços com seus descendentes na Itália e o processo foi aprovado e os passaportes foram concedidos”, diz a nota. O apresentador afirma ainda que foi “pego de surpresa com o suposto envolvimento dele num esquema de corrupção para obtenção de cidadania e passaporte italiano”.

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Ainda segundo a nota, a repercussão na imprensa brasileira deixa claro que Rodrigo e sua esposa “foram citados como beneficiários do esquema, ou seja, foram vítimas desse escritório e de sua equipe, uma vez que contrataram o serviço de uma empresa supostamente legal, idônea e que seguia os procedimentos de acordo com as leis italianas”.

A nota finaliza afirmando que Faro já acionou seus advogados no Brasil para que “todo esse mal entendido seja resolvido e para que os devidos responsáveis por esse suposto esquema de corrupção sejam devidamente punidos”.

O Estadão entrou em contato com o escritório mencionado na nota de Faro e aguarda retorno.

Fraudes envolvendo brasileiros

Não é a primeira vez que as autoridades italianas realizam ações contra fraudes em processos de cidadania envolvendo brasileiros. Em 2019, uma operação policial prendeu sete acusados de fraudar comprovantes de residência para brasileiros nas cidades de Verbania e Novara, no Piemonte, norte da Itália.

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Um padre também foi investigado por ter apresentado certidões de batismo falsas, supostamente em troca de dinheiro. Segundo a polícia italiana, cerca de mil cidadanias italianas foram obtidas por meio de fraude, em um volume de negócios estimados em mais de 5 milhões de euros. A operação investigou 800 brasileiros.

Em Catânia, na Sicília, extremo sul da Itália, quatro funcionários da prefeitura e outras duas pessoas, entre elas um despachante, foram presos e investigados, em 2020, por receber dinheiro para atestar a residência de candidatos brasileiros à cidadania.

A Operação ‘Tudo Incluído’ apurou que as vítimas pagavam 5 mil euros para terem acesso a alojamento, alimentação e a cidadania reconhecida em duas semanas. Os imóveis usados para hospedar as vítimas foram interditados.

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