Obama versus bancos

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Por Redação
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O presidente Barack Obama anunciou um plano com novas e mais duras medidas para disciplinar os bancos, limitar seu tamanho e reduzir o risco de crises financeiras de grande potencial destrutivo. "Nunca mais o contribuinte americano será refém de um banco grande demais para falir", prometeu o presidente. Defensores do setor financeiro e outros críticos do governo classificaram o plano como ação populista de um presidente acuado. Obama completou um ano de mandato com a popularidade em queda. Além disso - ou por isso -, teve de engolir uma derrota importante no Estado de Massachusetts, onde um republicano foi eleito para substituir o falecido senador democrata Edward Kennedy. Sejam quais forem as suas motivações, ele de fato escolheu como alvo um dos grupos mais impopulares da sociedade americana, os banqueiros. Milhões de cidadãos ainda sofrem os efeitos da crise financeira, mas os bancos voltam a exibir lucros e a distribuir generosos prêmios a seus diretores. Essas instituições foram salvas da falência com dinheiro do contribuinte, lembrou o presidente.Se o pacote for aprovado pelo Congresso, gigantes como JP Morgan Chase, Citigroup, Bank of America, Wells Fargo, Morgan Stanley e Goldman Sachs poderão ser obrigados a reestruturar-se e a dividir suas operações. As ações de todos esses grupos caíram na quinta-feira, quando o presidente apresentou as novas medidas. Obama procurou realçar as credenciais técnicas do plano. Atribuiu as ideias centrais a seu conselheiro especial Paul Volcker, ex-presidente do Federal Reserve e responsável principal pela recuperação do dólar no começo dos anos 80. Mas deixou de lembrar detalhes menos favoráveis. Um de seus assessores, Lawrence Summers, era secretário do Tesouro do presidente democrata Bill Clinton, em 1999, quando foi revogada a Lei Glass-Steagall. Essa lei, do tempo da Grande Depressão, garantiu durante décadas a separação das operações típicas de bancos comerciais (receptores de depósitos à vista) e bancos de investimento. Graças à revogação, os grandes grupos financeiros puderam ganhar dimensões enormes, operar nas duas áreas e assumir riscos muito maiores com o próprio capital e com o dinheiro de seus clientes. Summers contestou mais de uma vez essa interpretação. Várias instituições envolvidas em dificuldades, como Lehman Brothers e Bear Stearns, eram bancos de investimento independentes de bancos comerciais. Também independente era a seguradora American International Group (AIG). Todas essas instituições teriam entrado em crise, ainda que vigorasse a Lei Glass-Steagall. O argumento de Summers pode ser insuficiente para liquidar o debate, mas serve como alerta contra confusões. É preciso lembrar alguns fatos importantes. Dirigentes de bancos de investimento puderam assumir riscos sem restrições por falta de supervisão. Regras de controle valiam só para os bancos comerciais - e mesmo essas eram insuficientes. Mesmo os vínculos entre bancos comerciais e outras entidades eram obscuros e só se tornaram visíveis quando foi preciso reconhecer os prejuízos. Esse é o ponto essencial: é preciso criar regras e mecanismos de controle para todos os segmentos do mercado financeiro, sem deixar nenhuma área na obscuridade. O regime brasileiro é assim e tem funcionado satisfatoriamente.Pode haver bons argumentos a favor da separação entre tipos diferentes de instituições, mas a medida é inútil, como ficou provado nos Estados Unidos, sem um bom sistema de regras. Duas entidades multilaterais, o Fórum de Estabilidade Financeira e o Banco de Compensações Internacionais, de Basileia, já indicaram o caminho para a reforma do sistema: exigência de capitais maiores, formação de colchões de segurança, novas formas de classificação de riscos, limites mais estreitos para expansão de operações e assim por diante. Os americanos participaram desses trabalhos, mas têm seguido caminho próprio. Um projeto foi apresentado na Câmara de Representantes e outro, no Senado. Depois, o presidente propôs um "imposto de responsabilidade pela crise financeira". O novo plano reforça o aperto, mas estimula uma reação mais dura dos bancos. O resultado do jogo afetará todo o mundo. Ninguém fica imune a uma grande crise nos bancos americanos.

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